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sábado, 28 de fevereiro de 2009

Pais espiões

Há poucos dias um jornal (o Público ou o DN, não sei ao certo) trazia uma reportagem sobre o crescente recurso dos pais a detectives para seguirem os filhos adolescentes, vigiarem as suas amizades e fiscalizarem o modo como se comportam quando vão às discotecas para o que usam, por vezes, imagine-se, outros jovens espiões. Aí dizia também que muitos pais aprendem a ler os registos do telemóvel dos filhos, as suas mensagens e telefonemas e ainda as mil maneiras de vasculhar nos computadores dos meninos. O argumento, ao que parece bastante banalizado, é o de que querem saber tudo da vida dos filhos, preocupam-se com eles e não aguentam a angústia de não saber por onde andam, com quem e a fazer o quê, por isso consideram legítimo recorrer a espionagem paga e à decifração dos registos da vida pessoal nesta fantástica tecnologia que tanto nos facilita a vida.
Quando eu era adolescente, tinha uma amiga cujo pai era irascível e meio doido e proibia-a de ir fosse onde fosse, fazia esperas à porta do liceu para ver se ela falava com algum rapaz e armava ciladas nas conversas para ver se ela mentia. Um dia, quando chegou das aulas, ele estava furibundo, com o diário dela na mão, o fecho arrombado e páginas arrancadas, e começou a bater-lhe como um doido porque tinha lido no diário que no sábado anterior ela tinha ido ao Estoril de comboio, a casa dos primos, e não lhe tinha dito. A violação do diário era uma declaração de guerra, um acto ignóbil que nem sequer era comparável com uma sova brutal para castigar um acto inocente. Não sei se ela alguma vez lhe perdoou esse e outros episódios, mas eu pensei que se os meus pais fossem assim nunca lhes confiaria uma dúvida, uma alegria ou um desgosto, nunca pediria conselho nem esperaria apoio. Faria tudo para que não soubessem de nada da minha vida porque não há amor sem confiança.
Por isso fiquei horrorizada com o que li no jornal e mais me escandalizou a falta de escândalo com que a notícia era acompanhada, como se fosse uma informação útil e não o relato de uma tendência doentia e irresponsável. Não se trata sequer de pensar se é legítimo ou ilegítimo, se uma criança ou um jovem também têm ou não direito a ser respeitados na sua individualidade, nem quero pôr a questão nesses termos porque antes de ser uma questão de direito é uma questão de formação moral e de educação. Pais que não confiam nos filhos a esse ponto, que não foram capazes de conhecer os seus amigos, que não sabem perguntar ou não acreditam nas respostas, que não querem arriscar confiar nos seus próprios filhos, que não são capazes de lhes dar liberdade e responsabilidade, são pais que também não merecem que os filhos confiem neles e os respeitem. Pais desses não podem esperar dos filhos um comportamento que não seja o de enganar, disfarçar e mentir.
Crianças e jovens que crescem junto de adultos que não lhes ensinam o que é a confiança e o respeito não podem, mais tarde, ser pessoas íntegras e leais. Vão ser fugitivos, espiões e delatores e vão achar-se uns heróis sempre que conseguirem enganar sem ser descobertos. Duvido que consigam alguma vez confiar em alguém ou que estejam habilitados a assumir responsabilidades, vão sentir revolta por os seus próprios pais admitirem que sejam uns malandros e, já que ninguém espera nada deles, também não têm que cumprir expectativas.

“Ecofunerais”

O problema da contaminação ambiental está na ordem do dia. Rara é a circunstância em que não se equacione o impacte ambiental. Ainda bem dirão muitos, porque deste modo talvez se consiga criar uma nova mentalidade face às inúmeras agressões antropogénicas capazes de provocar graves desequilíbrios.
Quem diria que o destino a dar aos corpos também começa a preocupar os ambientalistas? Enterrar e cremar constituem as formas mais comuns, mas há outras que estão na calha. Não entrando pelos aspetos culturais do culto dos mortos, enterrar um corpo pode não ser muito amigo do ambiente. A escolha da madeira e as “ferragens” utilizadas podem contaminar os solos. Nos E.U.A., os “metais” das urnas, enterradas anualmente, dão para fazer uma ponte como a Golden Gate e o cimento utilizado nas campas para fazer uma autoestrada de Nova Iorque a Detroit. Mas não ficam por aqui, porque certas substâncias utilizadas nos embalsamentos são perigosas e até carcinogénicas! Até a decomposição dos corpos, que se faz na ausência do oxigénio, liberta metano, um gás com poderoso efeito estufa. Mas se optar pela cremação, então as coisas poderão ser um pouco melhores, mas não muito, já que exige combustível, liberta substâncias tóxicas, caso das dioxinas, e, se o corpo tiver amálgamas nos dentes, até mercúrio sai pela chaminé! Quanto ao dióxido de carbono libertado por este processo o melhor é pensar comprar créditos a fim de evitar o aquecimento global. A “pegada ecológica” aumenta na ordem dos 10%. Até depois de mortos continuamos a poluir. Sendo assim, não é de admirar que comecem a aparecer correntes que defendem os “ecofunerais”. Nada de embalsamentos, utilização de madeiras menos nobres e mais facilmente degradáveis, nada de vernizes, nada de metais, enterrar o corpo não muito longe do local onde residem os familiares, de forma a evitar deslocações, optar pela incineração, caso não ofenda os costumes e desde que a “fábrica” funcione e queime bem. Mas também há outras opções, como é o caso da hidrólise alcalina, que liquefaz o corpo numa solução de cal e água. O produto final, cinzas de ossos e biofluidos, pode ser utilizado como fertilizante das plantas, mesmo as das nossas casas. Neste caso a pegada ecológica é 18 vezes inferior à cremação. Quem tiver costela de futurista, pode optar por colocar as suas, e o resto do corpo, em azoto líquido e depois ser fragmentado em pó. Ainda não estão comercializados. Mas é uma questão de tempo. Também existe a hipótese de lançamento no mar, entrando rapidamente na cadeia alimentar da fauna marinha. De qualquer modo, face às preocupações ambientais, às limitações dos espaços destinados aos cemitérios, ao número de matéria-prima em crescendo, quiçá a interesses imobiliários – não esquecer que muitos cemitérios ocupam lugares privilegiados -, às consequências da redução do tamanho das famílias com a subsequente diminuição dos cuidados nas campas e do culto tradicional dos mortos, teremos, muito provavelmente, que optar por novas formas de dar destino aos corpos. Algumas já foram enunciadas e não admiraria nada que ainda apareçam mais, do género lançá-los para o espaço. Parece que já enviaram alguns para aquelas bandas, mas, com tanto lixo a orbitar ao redor da Terra, é capaz de ser perigoso, não vá um dia o comandante de uma nave espacial colidir com o seu bisavô!
Mas que raio de tema eu tinha que abordar nesta tarde de cinza primaveril...

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Ir(r)a..

Não é raro ouvir dizer que fulano morreu subitamente. As causas da morte súbita são muito variadas, embora a maioria seja da responsabilidade do coração que, por doença das suas artérias ou devido a “transtornos elétricos”, se esquece de continuar a bater. Esquecimento fatal.
A situação atinge pessoas de todas as idades, inclusive jovens “saudáveis”. Algumas medidas, quando devidamente aplicadas, podem salvar vidas. O domínio das técnicas de suporte básico de vida, que qualquer um pode e deve dominar, assim como a utilização de aparelhos desfibrilhadores “inteligentes” ao alcance de um leigo minimamente esclarecido, podem fazer a diferença entre a vida e a morte. É pena que o entusiasmo e a divulgação dos cursos de suporte básico de vida não tenham continuidade e não estejam ao alcance da maioria dos portugueses. De vez em quando, algum responsável faz esforços nesse sentido, mas, logo a seguir, desaparece de cena. Por esquecimento? Não creio! Falta de apoios? O mais certo. A par desta técnica, tem sido enunciado a necessidade de colocar os tais desfibrilhadores inteligentes em locais estratégicos de modo a poderem ser utilizados por um cidadão com conhecimentos básicos nestas matérias. Nada de novo. Há muitos anos que, nalguns países, os vemos distribuídos pelos mais diversos locais. À chegada aos aeroportos de alguns países é habitual tropeçarmos com os aparelhos capazes de salvar vidas.
Certas arritmias podem ser fatais. Na sua génese, muitos fatores estão presentes, desde os genéticos, aos vasculares e a outros que desconhecemos. Também está bem esclarecido o papel do stresse físico e mental no desencadear desta situação. O cérebro influencia, e muito, o coração. Sabemos que após cataclismos naturais, caso de terramotos, em situações de guerra, e outras situações depressivas, as mortes súbitas por arritmias aumentam. Quando as pessoas andam aborrecidas, irritadas, ou enraivecidas o risco de sofrer arritmias aumenta dez vezes, logo, o risco de morte súbita é uma realidade preocupante.
Ao abordar este tema, tive o objetivo de chamar a atenção para que sejam implementadas as medidas de suporte básico de vida e a colocação dos desfibrilhadores em determinados locais, caracterizados por uma frequência elevada de pessoas e cujo ambiente seja arrritmogénico. São tantos os ambientes suscetíveis de provocar arritmias; estádios de futebol e certos encontros menos positivos para os adeptos, centros comerciais em que a frustração de não poder comprar certos produtos desperta um estimulo para alterar o ritmo dos ventrículos, à porta de centro do desemprego, à porta dos tribunais, à porta das finanças, à porta dos bancos e à porta das instituições de caridade, só para dar alguns exemplos. Mas face ao que vamos vendo e ouvindo, intervenções e esclarecimentos mais do que vergonhosos, atitudes provocatórias e verdadeiramente iníquas por parte de altos responsáveis da nação, suscetíveis de irritar, de aborrecer e até de provocar raiva, não me admiraria nada que o risco de arritmias aumente. Como não é possível ter um desfibrilhador ao lado de cada televisor, o melhor é desligá-lo, e, já agora, vou começar a dar um curso de suporte de vida cá em casa! Não vá o diabo tecê-las...
Irra!

Política económica: sinais de direcção proibida acumulam-se, autismo persiste...

1. Num últmo Post salientei que o elevadíssimo défice externo de 2008 - 10,6% do PIB, quando o BdeP menos de um mês antes tinha previsto 9% - constituia um sinal claríssimo de direcção proibida para a política económica ainda vigente.
2. É hoje notícia o forte aumento do “spread” da dívida pública portuguesa em relação à dívida alemã na maturidade mais significativa, 10 anos – temos agora que pagar mais 1,856% que a dívida alemã, quando há menos de um ano esta diferença era inferior a 0,5%.
3. É tema corrente nos mercados as dificuldades cada vez maiores que os países mais endividados da zona Euro e com mais elevados défices externos irão sentir para se financiarem no futuro próximo, no curto e no médio prazo.
4. Ainda ontem meu velho amigo Karl Otto Pohel, durante muitos anos Presidente do Bundesbank e ainda hoje uma voz muito respeitada na Europa alertava para a provável necessidade de a zona Euro ter de adoptar programas tipo FMI para acorrer às economias mais frágeis e com dificuldades de se financiar.
5. Entre nós, no entanto, o autismo perante estes sinais parece ser a palavra de ordem – mais dívida, mais despesa, mais impostos é o que os responsáveis pela política económica sabem prometer a um País extremamente confundido e sem rumo.
6. Torna-se cada vez mais visível o equívoco das opções desta política, nomeadamente do desenho das medidas do programa anti-crise. Não é com mais despesa pública, ainda por cima de muito má qualidade ou de qualidade duvidosa pelo menos, que se diminuem as dificuldades que assoberbam a economia – pelo contrário, este aumento da despesa pública vai agravar as dificuldades tornando cada vez mais problemático o acesso a financiamento.
7. Outro sinal vem da queda abrupta da receita fiscal em Janeiro – por este andar podemos arriscar um défice de 7 ou 8% do PIB em 2009, ultrapassando as previsões mais pessimistas...não esquecer que a Irlanda por exemplo espera um défice acima de 10% do PIB e a financeiramente disciplinada Holanda, de cerca de 6%...
8. Se isso vier a acontecer as necessidades de financiamento do Sector Público Administrativo irão disparar e o “spread” acima mencionado disparará com elas...
9. Até quando este autismo que nos arrasta para uma tão dolorosa experiência colectiva?

Como é importante a educação...

O cancro é uma doença terrível, qualquer que seja a perspectiva pela qual analisemos os seus efeitos e consequências. Seguramente que se trata de uma doença que as pessoas temem porque provoca grande sofrimento e são conhecidas as dificuldades para a enfrentar.
Se é verdade que os rastreios são importantes para atempadamente detectar sinais de início de desenvolvimento da doença, não são menos importantes na sua prevenção os hábitos alimentares e estilos de vida.
O estudo agora trazido a público vem justamente apontar o dedo à incidência que uma vida suadável tem na prevenção do cancro, concluindo que um terço dos doze cancros mais comuns nos países ricos e um quarto dos casos nos países pobres ou em vias de desenvolvimento poderiam ser evitados com uma dieta equilibrada, boa nutrição e exercício físico.
A percepção que tenho é que Portugal investe muito pouco na prevenção sustentável do cancro, o que passaria por educar as pessoas no sentido de as condicionar em opções de vida que favorecessem escolhas saudáveis e que concorressem para a sua prevenção e, inclusive, de outras doenças também graves e cujos factores de risco podem ser diminuídos.
Não compreendo, ou melhor até compreendo, porque não investimentos fortemente neste domínio. Não o fazendo espelhamos um padrão de desenvolvimento humano que nos coloca bem longe dos níveis de bem-estar e de qualidade de vida de que gozam os países mais desenvolvidos. Continuamos focados em indicadores de outra natureza, bem mais tangíveis, para avaliarmos e medirmos o nosso desempenho económico e social, preterindo apostas que levam tempo a produzir frutos, em que os resultados não são imediatos.
É uma questão política. No actual “estado da arte” é necessário, como é mencionado na notícia, tomar decisões políticas e definir estratégias de prevenção do cancro. A fraca sensibilização da população para a prevenção determina a necessidade de políticas públicas activas. Fazem muita falta!

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Síndroma da Ilha de Páscoa

Ao ler uma crónica de Enrique Gil Calvo, "La isla de Pascua y el colapso global", recordei a leitura, que fiz há três anos, do interessante livro de Jared Diamond, "Collapse". Uma análise profunda e original de um autor que já me tinha impressionado com um das mais belas obras que li e estudei até hoje, "Guns, Germs and Steel".
Enrique Gil, a propósito da crise atual, descreve as possíveis consequências, começando por abordar o fenómeno ocorrido na Ilha de Páscoa, com o qual estabelece um paralelismo com a situação que estamos a viver. Vale a pena lê-lo.
Foi pena que os responsáveis deste pobre planeta não tivessem lido Diamond. Quem sabe se não teriam aprendido alguma coisa!
Como foi possível desperdiçar um verdadeiro “diamante”?

Estratégia à chinesa

No jornal Público de hoje, o jornalista recém despedido Alfredo Mendes fala nos seguintes termos daquilo que ele classifica como Estratégia chinesa: "Todos os anos, centenas de jovens tentam entrar na profissão. Em vez de ter profissionais com experiência, com qualidade, nos quadros das empresas, tem-se estagiários a trabalhar à borla. E sai um jornalismo padronizado, sem memória, sem génio e sem arte. E as redacções transformam-se em espaços frios e tristes."
O pior, digo eu, é que esta é uma estratégia generalizada, senão mesmo global, com todas as consequências. Não serão só as artes e modelos financeiros os responsáveis por este desmoronar de uma forma de viver...

No bom sentido

Não conheço dos termos da Declaração de Impacte Ambiental (DIA) sobre o projecto da nova travessia rodo e ferroviária do Tejo em Lisboa, a não ser pelo que relatam os jornais de hoje.
A acreditar nos dados vindos a público, de tudo quanto li parece-me uma decisão correcta a de condicionar a conformidade ambiental do projecto à adopção de um sistema de portagens diferenciado em razão da procura, isto é, um preço de portagem rodoviária variável em função dos horários de maior e de menor tráfego (esperando-se porém que tal medida, se implementada, obedeça ao princípio da proporcionalidade).
Falta-me perceber se é viável caso não venha a ser adoptada também nas outras travessias, em especial na Ponte Vasco da Gama que concorre directamente com esta e para onde o tráfego tenderá a canalizar-se se o valor da portagem nas horas de ponta for mais competitivo.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Criação do Mundo

O homem desde sempre se interrogou sobre a criação de mundo, ato verdadeiramente fascinante ao ponto de constituir o estímulo mais universal e poético que esteve e continua a estar na base da mais divina das características humanas: a imaginação. Descrições belas, cheias de poesia, rescendendo a arte. São tantas as manifestações artísticas a este propósito. O Génesis, a Teogonia de Hesíodo, o Gilgamesh, as interpretações e variações ao redor deste tema, como o “Diário de Adão e Eva” de Mark Twain ou “Adão e Eva no Paraíso” de Eça de Queiroz, são algumas das minhas preferidas. Até a descrição do “muito douto e muito ilustre Usserius, bispo de Meath, arcebispo de Armagh, e chanceler-mor da Sé de São Patrício”, que o nosso grande escritor cita com particular ironia, é de uma imaginação sem limites. Quem diria que Usserius conseguisse, com precisão matemática, datar o dia e a hora da criação, nada menos nada mais do que às duas horas da tarde do dia 28 de Outubro de 4004 antes do nascimento de Cristo. Às tantas à hora da divinal sesta! Outras manifestações artísticas procuram registar esse momento. A mais polémica é “A Origem do Mundo”, segundo Gustave Courbet. Uma imagem da região pudenda de uma mulher em que se destaca uma espessa "trufa" de pelos púbicos.
A primeira vez que vi uma fotografia deste quadro, que andou sempre escondido até acabar por ser exposto no Museu d'Orsay, fez-me relembrar algo semelhante, mas ao vivo. Numa tarde de Verão, andava a nadar no rio, quando, após contornar uma pequena ilha, me deparei com uma mulher que, depois de ter passado o dia a lavar e a corar a roupa, se lembrou de se refrescar nas águas. Não tinha fato de banho, apenas uma combinação. Ao sair da água, começou a despir-se para se enxaguar e vestir a saia. Fiquei sem saber o que fazer, mas não deixei de olhar para o que estava à mostra. Lenta e discretamente fiz um compasso de espera, voltando a cabeça para o açude, dando tempo que a senhora acabasse de se vestir. Quando vi que estava tudo em “conformidade”, retomei o percurso, passando em frente e emitindo um sonoro “Boa-tarde”, o qual foi prontamente correspondido com: “Boa-tarde, menino”!
O acontecimento de Braga, em que foram apreendidos pela PSP volumes de uma obra, cuja capa correspondia ao quadro de Courbet, devido a queixas de alguns adultos que viram algo de maléfico para as crianças, parece-me mais do que excessivo, uma atitude deveras perigosa. Quanto aos adultos que fizeram a queixa não tenho nada a comentar. Têm todo o direito de mostrar a sua indignação face aquilo que consideram ser moralmente condenável. Querem proteger as crianças do mal e do vício. É certo que as crianças são muito curiosas e, desde sempre – não é só de agora -, que querem ver certas “coisas”. Mas quem é que não as quis ver? Muito poucas, decerto. E as que viram, em que é que se tornaram mais tarde? É bom não esquecer que, na altura, não tínhamos com dois clicks a oportunidade de ver o que se vê hoje e até sem clicks! Basta ver a televisão.
O que está a acontecer não augura nada de bom. A justiça e a polícia já começam a proibir e a apreender obras com base em pressupostos moralistas. É certo que no dia seguinte arrepiaram caminho. Apreendem livros. Qualquer dia passam a queimá-los. A seguir prendem pessoas e depois passam a “queimá-las”, também. Primeiro os livros, a seguir os homens.
Quando voltar a Paris, vou dar uma saltada ao Museu d´Orsay. Não vale a pena andar sempre a adiar...

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Os primeiros sorrisos da Primavera




Como os bolbos são muito efémeros e custa imenso deixá-los lá tão bonitos, à espera do próximo fim de semana, aqui fica o registo, para nos alegrarem os dias da semana!

Peru vai eliminar 20.000 leis em quatro meses

Não sabia que podia haver tantas leis!
Grande Peru! Vai eliminar 20.000 leis!
Grande matança!
O que é que tem a dizer sobre esta matéria o país do galo de Barcelos?
Coitado, deve estar velho demais para cantar...

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Lagartixas e pétalas de rosas

Mário Vargas Llosa escreveu um artigo fascinante no El País sob o título “Farsa elogiosa repugnante”. Nele denuncia as tentativas de se fazerem emboscadas aos mortos por parte dos políticos desejosos de tirarem proveito da vida dos outros, sobretudo quando os outros são “Jorge Luís Borges”.
A presidente da Argentina, o seu marido e os deputados que a sustentam pretendem retirar do eterno descanso, em Genebra, um dos maiores vultos da literatura mundial. Levá-lo para a pátria! O poeta procurou aquele lugar, onde tinha vivido na sua juventude, para passar os seus últimos anos, e aí ser sepultado. Tinha as suas razões. E que razões!
A proposta para o levar para a Argentina parece ter sido interrompida. No entanto nada impede que, no futuro, voltem à carga, violando a vontade soberana do escritor, argentino de nascença, descendente de portugueses, e, acima de tudo, um verdadeiro cidadão do mundo. Vargas aponta para uma interessante solução; “mais valia incinerar os seus ossos e espalhar as cinzas pelo mar ou pelas florestas. É mil vezes preferível alimentar os peixes ou os pássaros do que os inescrupulosos canibais que engordam com os despojos dos bons escritores”.
Esta análise obriga-nos a refletir sobre os comportamentos tidos e havidos com muitas individualidades, cujo reconhecimento post mortem não se coaduna com a falta de atenção e de respeito que em vida eram mais do que merecedores.
Jorge Luís Borges está sepultado numa linda praça que não tem qualquer parecença com um cemitério. Deve ser fonte de romaria, e muitos deverão colocar na tumba flores, rosas, muitas rosas. Estou certo que sim.
Quando alguém escolhe ser sepultado fora da sua pátria é por, parafraseando Javier Marías, “quererem morrer mais definitivamente”. Este autor, num seu escrito; “Veneza, um interior”, descreve a vida da cidade e as suas características únicas. Quando fala de uma das ilhas, a de São Michele, que não é mais do que o cemitério, chama a atenção para o túmulo de Ezra Pound. “Um túmulo verde só com o seu nome, perdido no meio do recinto evangélico que ninguém visita, o mais descuidado, com pedaços torcidos de cruzes caídas que se cravaram sobre as próprias lápides. Ninguém encontra o túmulo de Pound entre o matagal”. “Esses mortos são visitados no Verão por lagartixas, mais ninguém. Os estrangeiros morrem aqui mais definitivamente. Talvez por isso eles vêm, tanto, tentar a sorte”.
O túmulo de Pound é visitado por lagartixas no Verão, quando ele, num poema, “E assim em Nínive”, escreve o seguinte: "Sim! Sou um poeta e sobre minha tumba, Donzelas hão de espalhar pétalas de rosas, E os homens, mirto, antes que a noite, Degole o dia com a espada escura...
Mas eu sou poeta e sobre a minha tumba, Todos os homens hão de espalhar pétalas de rosa, Antes que a noite mate a luz, Com sua espada azul”.
Se Pound soubesse que não tem pétalas de rosa na sua tumba, mas apenas lagartixas, estou convicto de que preferiria que as suas cinzas tivessem sido transformadas em rosas vivas.
Uns são vítimas de verdadeiras emboscadas, outros são puramente esquecidos.
As cinzas dos mortos dão vida às flores mas a morte das flores não dão vida aos mortos...

Mesmo no carnaval, há coisas que são de levar a mal...

Somos insuspeitos de simpatia pelos actos de censura ou condicionamento de qualquer liberdade, neste blogue implacavelmente denunciados. Por isso, nenhum de nós aqui subscreveria a inqualificável atitude de uma magistrada movida por pulsões censoras das brincadeiras de carnaval, ainda que de gosto duvidoso, como aconteceu em Torres Vedras.
Dito isto, há também que dizer que não fazem sentido, não são justificáveis ou toleráveis imputações deste facto ao governo (como a que vem feita por Joana Amaral Dias). Ninguém acredita que o governo tenha influenciado (ainda que por indução) a infeliz decisão da magistrada, que de resto se redimiu ao retractar-se.
Sobram razões para a crítica justa ao governo. Esta, porém, nem o carnaval desculpa.

Defice externo em 2008: "direcção proibida" para política económica

1.A extensão do défice externo de 2008 – 10,6% do PIB segundo as estatísticas provisórias divulgadas no final da semana passada, muito acima das recentíssimas previsões do BdeP - confirma a extrema fragilidade financeira em que nos encontramos e que aqui temos comentado com frequência.
2. Tendo em conta o elevado nível de endividamento de todos os sectores institucionais, não é mais possível esconder ou pretender que não estamos a criar um grave problema de financiamento da economia e que, sendo assim, se justifica uma reviravolta, um verdadeiro U-turn na condução da política económica.
3. Não será mais possível continuar a engordar um sector protegido da economia, consumindo enormes recursos em projectos de rentabilidade negativa ou desconhecida ou gerando saldos negativos de exploração como se a capacidade de financiamento do País não tivesse limites.
. Não é mais possível continuar a gerir o sector público – Administração Central, Regional e Local, com seus respectivos e inumeráveis apêndices empresariais, quase todos deficitários – como se nada se passasse, como se não estivéssemos à beira de enfrentar uma grave escassez de recursos financeiros.
5. A insistência, a que presentemente ainda assistimos, nessa política de sacrifício de recursos irá lançar o País numa crise sem precedentes, de contornos bem mais graves e de solução bem mais dolorosa do que as experimentadas em anos passados (75/77 e 83/84) quando o FMI nos vinculou a programas de ajustamento de bastante dureza para quem ainda se recorda disso.
6. No entanto, parece que nada disto se passa ou que estamos aqui a levantar fantasmas...a política económica prossegue com aparente indiferença a esta realidade, mergulhada num imenso lago de autismo, desbaratando os escassos recursos que ainda podemos mobilizar.
7. Entre muitas outras coisas seria necessário: (i) suspender imediatamente todos os projectos chamados de investimento público ainda não iniciados ou apenas em fase de arranque, para se organizar um urgente balanço dos meios disponíveis e das prioridades indiscutíveis de despesa, (ii) apertar dur(issim)amente os orçamentos de exploração dos institutos públicos e das centenas de empresas públicas, regionais e locais, (iii) aliviar, drasticamente, a carga fiscal e para-fiscal sobre as empresas que se situam nos sectores expostos à concorrência e (iv) criar incentivos muito mais poderosos ao investimento e ao emprego nestes últimos sectores.
8. A política económica a que temos assistido tem agora pela frente mais um claríssimo sinal de “direcção proibido”...se esse sinal não for tomado a sério, vamos assistir, lamentável e desnecessariamente, a um dos mais dolorosos períodos da nossa vida colectiva.

Sabedoria

É um frenesim de análises e declarações políticas aos fins de semana.
Ouvindo algumas das entrevistas e comentários, percebe-se bem quão sábio se tornou Churchill quando, depois de uma longa carreira, dizia isto:
´A habilidade política é a capacidade de prever o que vai acontecer amanhã, na próxima semana, no próximo ano; e é a capacidade de depois explicar porque é que assim não sucedeu´

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Memória e sujidade


Passear pelo Jardim Botânico é um verdadeiro privilégio, sobretudo se for acompanhado dos netos. Um espaço mais que aprazível, um Éden dentro da cidade. Mas quando passamos em frente da estátua de Brotero, da autoria de Soares dos Reis, a beleza do parque enegrece-se com a escuridão a que está votada a memória do “amante dos mortais”. Suja, muito suja, a esconder a beleza de uma obra de arte e de tudo quanto a simboliza. Enquadrada por duas belas árvores, Ginkgo biloba, símbolo da paz e da longevidade, utilizada com fins terapêuticos para oxigenar o cérebro e até para “estimular a memória”, revela falta de cuidados por parte dos responsáveis. Não haverá um “mortal” responsável que a restitua à sua beleza original? Será que se esqueceram? Podia prescrever um chá de Ginkgo biloba para estimular a memória e, ao mesmo tempo, ganharíamos todos ao respeitar a Memória...

Ver...

As ideias e o pensamento são a maior riqueza do homem, a sua própria essência. Quanto à origem das ideias muito se tem discutido. Há quem considere que são inatas, como que a sugerir um toque divino, enquanto outros apontam para uma mente humana tipo tela em branco à espera de ser pintada. Seja como for, parece que não se alcança o entendimento sem passar, previamente, pelos sentidos.
De todos os sentidos, a visão ocupa um lugar de destaque. Basta ver a importância que o povo dá aos olhos e as inúmeras alegorias que, em todos os tempos e culturas, se constroem ao redor da visão. Os olhos também foram objeto de terríveis castigos humanos e divinos. A Sansão, os filisteus começaram por arrancar-lhe os olhos; o imperador Justiniano acabou por cegar o seu maior general, Belisário, que, ao mendigar, entoava a seguinte frase: “Dai uma esmola ao desgraçado Belisário, “a quem a fortuna cobriu de glória e a quem a inveja cegou”. O desespero ou a vontade de melhor compreender os fenómenos também fazem as suas vítimas, como aconteceu com Édipo quando quis aplacar a fúria dos deuses, e com Demócrito que, segundo a lenda, chegou, também, a extrair os olhos, no seu caso, para compreender a natureza do átomo.
Não há pior cego do que aquele que não quer ver”. Frase tão comum e que se aplica a várias situações, mormente quando se quer atestar menoridade, demonstrar ignorância ou denunciar má-fé. Mas, simultaneamente, também releva o facto de que a condição de cegueira orgânica não inviabiliza a realização do ser humano, ultrapassando muitos cegos os não cegos, na arte, na literatura, na ciência e na filosofia. Por vezes, as suas perceções até assustam, fazendo recordar Tirésias, a quem Hera cegou por não ter ganho um debate com Zeus, sobre se era o homem ou a mulher quem mais teria prazer. Como já tinha passado pelos dois sexos afirmou que era a mulher, facto que desagradou profundamente a Hera que considerava que era o homem. Foi então que Zeus minimizou a perda da visão atribuindo-lhe a capacidade da mântica, da previsão.
É difícil no mundo atual construir ideias a propósito de muitos acontecimentos que vemos ao nosso redor. Há os que nos querem cegar de todas as formas, como “castigo” por pormos em causa a sua “divina” presença. Há os que nos consideram cegos mentais, utilizando todas as artimanhas e falcatruas, legais e não legais, para continuarem a manter-se nos pedestais. Há os que se deliciam com as epidemias de cegueira, à boa maneira descrita por Saramago, porque dentro do caos há vantagens para alguns. Há os que se vestem de boas roupas, contrariando a moral do conto de Andersen, “A Roupa Nova do Imperador", segundo o qual “o rei vai nu!”. Os reis não vão nus, vão muito bem vestidos, só um cego orgânico é que não vê. Há também os que julgam que “no reino dos cegos quem tem um olho é rei”, o que não é, forçosamente, verdade, conforme a bela obra de H.G. Wells, “Em Terra de Cegos”, onde um pobre diabo com olhos, ao cair naquele reino andino, se deu conta das vantagens dos não conheciam o verbo ver. Enfim, talvez seja oportuno ler a obra de Diderot, “Carta sobre os Cegos para uso daqueles que veem”, para verificarmos a relatividade de todas estas reflexões, em que a normalidade pode ser considerada noutro lado a exceção.
As perversidades e as falsidades da sociedade, que pululam por ai como cogumelos, contrastam com o equilíbrio, a tranquilidade e a soberania dos cegos do conto de Wells no qual o ancião acabou por propor ao invasor com visão uma cirurgia para lhe extrair “esses corpos irritantes” - os olhos! Ah! Não vou nessa, porque poderia ser compensado com o dom da profecia de Tiresias o que seria ainda mais angustiante. Além do mais, continuo a comover-me com a beleza que me cerca, e que ainda vou conseguindo ver. Beleza que só os olhos podem descobrir...

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Um buraco negro!...

Ana Gomes dorme com os voos da CIA, desperta com os voos da CIA, toma banho com os voos da CIA, maquilha-se com os voos da CIA, telefona para as televisões sobre os voos da CIA, almoça os voos da CIA, vai às compras com os voos da CIA, janta os voos da CIA, intriga com os voos da CIA, tem como objectivo de vida os voos da CIA, tem uma fixação nos voos da CIA, não vive sem os voos da CIA, ama os voos da CIA, mais do que amar, tem uma paixão avassaladora pelos voos da CIA, não fala senão nos voos da CIA, não pensa senão nos voos da CIA, os voos da CIA são a sua obsessão, a razão de viver, o modo de vida, a própria vida.
Tem neurónios que nada mais captam do que os voos da CIA e nada mais difundem do que voos da CIA. Os voos da CIA constituem a sua primeira e última substância, o cérebro é um buraco negro que tudo transforma em voos da CIA.
Infelicidade suprema, a de Ana Gomes, que nada mais é capaz de ver, ouvir, cheirar, saborear ou sequer sentir!...Uma vítima da CIA!...

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Uma história carnavalesca!

Mais uma história carnavalesca de um agrupamento de escolas, desta feita de Paredes de Coura, e da já famosa Direcção Regional de Educação do Norte (DREN), conhecida pelo mau senso das suas decisões, desta feita por causa do Carnaval. É a história do Conselho Pedagógico do dito agrupamento de escolas que decidiu cancelar o desfile de carnaval dos professores pelas ruas de Paredes de Coura, optando por se mascararem e brincarem ao carnaval dentro dos estabelecimentos de ensino, porque os professores estão "atafulhados" de trabalho. Havendo uma gestão de prioridades a fazer, prescindir de um desfile de carnaval pelas ruas parece ser uma decisão aceitável, sem gravidade, tanto mais que a responsabilidade da definição e execução dos planos de actividades é das escolas. Alegaram os professores que um desfile a preceito exige muita preparação e tempo e que o tempo não dá para tudo.
Até aqui tudo, mais ou menos, bem! A partir daqui, a história virou notícia! Notícia carnavalesca!
A DREN com a sua particular habilidade para tratar com as escolas proibiu os professores de não fazerem o desfile pelas ruas e ordenou que os professores realizassem o cortejo, sustentando que as actividades de Carnaval fazem parte do Projecto Educativo e do Plano de Actividades do agrupamento e sublinhando a sua importância para a escola «cumprir a sua missão de processos de socialização e de aprendizagem para os alunos».
Hoje, sexta-feira, os professores lá foram desfilar pelas ruas de Paredes de Coura, cumprindo ordens superiores, "festejando" contrariados o Carnaval, devidamente mascarados em protesto contra a DREN.
E assim vai o Carnaval do nosso sistema de educação. Esta história mostra bem a falta de nível a que se chegou! Não sei se ria, se chore...

As mais lidas

Recebi há dias a seguinte mensagem de uma pessoa amiga:
"1.
Rapaz de 13 anos foi pai 20480
2.
Menina indiana obrigada a casar com um cão 4699
3.
Norte-americano teve sete filhos com meia-irmã 2564
4.
Milhares de cometas escuros podem colidir com a Terra 2483
5.
Pastora de Melgaço que ganhou 68 mil euros comprou um Mercedes e continua a tratar das cabras 2099

Abri um jornal on line e deparei com a tabela de artigos mais lidos que vai anexa. Acho que não é preciso dizer mais nada. "

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Trinta e três anos!

Viver num período de recessão comporta profundas modificações no estado de saúde das pessoas, muito para além das perdas na esfera do bem-estar. É natural.
O aumento do desemprego, a impossibilidade de assegurar os compromissos financeiros, a angústia em não proporcionar os meios necessários à educação dos filhos, a dificuldade no acesso aos cuidados de saúde e na aquisição dos medicamentos, a substituição de alimentos “saudáveis” por outros mais energéticos e perigosos, pondo em causa uma dieta equilibrada, originam perturbações muito graves, que não se esgotam na esfera psíquica, ao alastrarem-se a todas as esferas da economia.
Desde há muito tempo que tenho tido a oportunidade de avaliar os efeitos sociais na saúde das pessoas, mas nunca tinha observado um período tão grave como aquele que estamos a passar. Cada dia que passa, avolumam-se as evidências de uma situação económico-social muito preocupante. Os dados publicitados pela comunicação social reforçam no dia-a-dia o pendente negativo da crise. Doentes que deixam de tomar os medicamentos, entrando em descompensação, é uma realidade documentada pela redução da venda dos fármacos nos últimos tempos, outros entram num sofrimento psíquico atroz para os quais os antidepressivos, os tremoços da sociedade portuguesa, já não conseguem controlar os problemas. É de esperar um agravamento de muitas patologias em todas as áreas. Uma sociedade doente é menos produtiva, mais pobre e mais triste. Depois, somos confrontados diariamente com vários casos que nos fazem meditar. Ainda hoje uma aluna de mestrado procurou-me por causa do seu trabalho. Reparei que não estava muito feliz e perguntei-lhe se havia algum problema. Foi então que me contou que um jovem amigo se tinha suicidado inesperadamente. Um choque terrível, porque não havia nada que fizesse sugerir um desfecho desta natureza. Deixei-a falar, o que não é difícil de fazer quando a dor aperta. Afinal, tudo, pelo menos aparentemente, se deveu a uma recusa de uma entidade em lhe conceder a permissão de iniciar a sua atividade, depois de terem acertado nesse sentido. Tinha tudo preparado para iniciar o seu projeto com a ajuda de várias pessoas, quando, à última hora, lhe negaram a concessão. Usou cianeto, forma pouco vulgar de suicídio. Olhei através da janela. O Sol brilhava de uma forma particularmente agradável. As pessoas deslocavam-se de um lado para o outro desconhecendo a morte de um jovem e o sofrimento de uma família e de inúmeros amigos. Não querendo ser reducionista, não pude deixar, quase que instintivamente, de me questionar: será que a crise desempenhou algum papel neste caso? Quem sabe se vivêssemos noutras circunstâncias não teria sido possível evitar a morte deste jovem de trinta e três anos. Trinta e três anos! Precisamente a idade que a minha filha mais velha vai atingir amanhã. E lá fui a ruminar até casa sem saber bem o que pensar, temeroso de medos inimagináveis, afogado numa sensação de tristeza e, ao mesmo tempo, consciente de usufruir graças que, confesso, tenho que aproveitar e saborear sempre que puder.

Despedimentos versus lucros - debate estéril, a crise agradece!

1. O debate foi lançado há poucos dias por um grande estratega político, salvo erro numa convenção partidária ou coisa semelhante: não aos despedimentos nas empresas que apresentem lucros!
2. A nossa habitual comunicação social ávida de pronunciamentos grandiloquentes – sensatos ou insensatos pouco importa – ofereceu ampla ressonância a essa genial ideia e desde então têm-se sucedido as mais solenes tomadas de posição sobre o tema.
3. Ontem por exemplo o Secretário Geral da UGT apresentava uma variante muito curiosa da mesma ideia, afirmando que não faria qq sentido as empresas despedirem para “aumentarem os lucros” - nesta versão e num raciocínio “a contrario” já fará sentido despedir para não diminuir resultados...é uma versão bem mais liberal, que embora disfarçada/envergonhadamente já admite despedimentos em empresas com lucros...
4. Às vezes ainda pasmo (mas não devia pasmar) com a torrente de insensatez que vai percorrendo o País à medida que a crise se acentua: parece que esta, para além de atingir os rendimentos também está a atingir em força a (já muito escassa) lucidez de muitos dos chamados “opinion-makers”.
5. Com efeito, o princípio que consiste em dizer não a despedimentos em empresas com lucros não tem qq razão de ser.
6. A sua aplicação significaria, por exemplo, que (i) uma empresa em dificuldades, em perda acentuada de mercados por hipótese, com custos excessivos mas ainda em terreno positivo graças à inércia da conta de exploração, teria de aguardar mais 1 ou 2 anos para poder despedir colaboradores cuja produtividade é já baixíssima ou mesmo nula, ou que (ii) uma outra empresa porque tem ainda resultados positivos está impedida de tomar medidas preventivas de um sério agravamento da situação, só podendo tomar essa medidas quando já for tarde, arriscando mesmo a entrada em insolvência, ou ainda que (iii) uma empresa que hoje despediria 40 ou 50 colaboradores não o faz porque tem ainda resultados positivos, tendo que aguardar mais 1 ou 2 anos pela chegada dos resultados negativos e nessa altura em vez de despedir 40 ou 50 será obrigada a despedir 200 ou 300!
7. É claro que pode haver abusos em matéria de despedimentos e esses devem ser penalizados, mas isso tanto pode acontecer em empresas com lucros como nas que tenham prejuízos...e não é com regras tontas que se combatem os abusos - talvez até aumentassem...
8. Trata-se, como se constata, de um debate essencialmente estéril, que se esgota em grandes frases, em propaganda política vazia de conteúdo porque não vai ao âmago das questões e tem como objectivo dar espectáculo a um pobre País aturdido.
9. Ninguém se admire que com tais contributos a crise continue e até se vá mostrando cada vez mais próspera...a crise agradece!

O critério de Judite!...



O Ministro Santos Silva expressa conceitos de luta ao nível do caceteiro. Mas, não ficando pelo conceito, ele diz que gosta mesmo é de praticar, tem especial prazer nisso, e até substituiu o cacete pelo malho, que assegura mais operacionalidade.
Claro que a criatura e a sua rasteira criação cumpriram de imediato os estreitos e estritos critérios de Judite, que logo lhe aprazou, não fosse a oportunidade escapar-se, entrevista de fundo em tempo nobre, esta noite, na estação dita de serviço público.
Serviço público que ignora a luta esquecida, mas persistente dos voluntariado ao serviço da solidariedade, dos bons empresários, que lutam por salvar os postos de trabalho, da iniciativa dos empreendedores voltados para o futuro, dos excelentes investigadores com provas reconhecidas no avanço das ciências, dos filantropos, raros, mas que, até por isso, deviam ser reconhecidos.
Mas estes não trazem importância nem prestígio aos jornalistas de serviço.
Santos Silva, de tanto passar nos jornais, rádio e televisão, nada traz de novo, é carne repassada para encher chouriço televisivo de qualidade duvidosa, mas dá pompa ao entrevistador.
Política por política, nova é a Proposta de Manuela Ferreira Leite ontem apresentada e que mereceria, para o bem ou para o mal, ampla divulgação. Não está a televisão de serviço público para aí voltada. Interessa-lhe mais o serviço privado, a favor de Santos Silva e das suas cacetadas. E até aposto que, na entrevista, Santos Silva irá comentar as medidas de Ferreira Leite, aproveitando o serviço público para malhar no que o serviço público mal divulgou!...
Rasteirice é o que está a dar!...

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Os pecados segundo o género

O diário da Santa Sé, L'Osservatore Romano, publica uma curiosa investigação realizada pelo Vaticano, sobre os pecados confessados pelos homens e pelas mulheres, conduzida por Roberto Busa de 95 anos.
Primeira constatação que dispensaria o esforço do aturado estudo: tanto os homens como as mulheres pecam.
As restantes conclusões já são mais curiosas. Homens e mulheres infringem os mandamentos da Santa Madre Igreja de distinta forma. O pecado mais comum entre as mulheres, revela o estudo, é a soberba. Já nos homens é a luxúria.
O periódico do Vaticano esclarece ainda que os maiores vícios dos homens são, por esta ordem, a luxúria, a gula, a preguiça, a ira, a soberba, inveja e a avareza. No caso das mulheres, a soberba, a inveja, a ira, a luxúria e a preguiça (nem gulosas, nem avaras, ou então expiam estes pecados nos SPA e nos ginásios…).
Percebo agora melhor o pensamento dos cardeais. Não querem casamentos entre pessoas que coincidem nas condutas pecaminosas, já que estará obviamente condenada ao fracasso a ligação entre dois homens igualmente luxuriosos, ou entre duas mulheres soberbas no mesmo grau.

Inveja e felicidade

Sói dizer-se que o principal mal dos portugueses é a inveja, havendo mesmo quem argumente que é fonte do nosso atraso. Não sei se é ou não. O que eu sei é que se trata de uma das paixões mais universais, não havendo praticamente nenhuma cultura que a não revele de uma forma ou outra. Crianças, velhos, ricos, menos ricos, mendigos, políticos, santos e não santos, só para falar de alguns, sofrem de mal de inveja. A inveja, a par da insatisfação, são as principais causas de infelicidade. Mas quem diria que a inveja está relacionada com a democracia? Na perspetiva de Bertrand Russell “a inveja é a base da democracia” que, como todos sabemos, é a melhor forma de governo. O filósofo descreve que os gregos, ao afirmarem que “não há primeiro entre nós”, despertaram o movimento democrático.
“Não havendo primeiro entre nós”, levou a que muitos não aceitem que outros estejam em cima, que vivam melhor, que tenham mais património, mais honrarias e distinções. Daqui a afirmação russelliana de que “a inveja é a base da democracia” e, sabendo que não há melhor forma de governar, é fácil concluir que não há meio de a erradicar.
A inveja provoca sofrimento, insatisfação e gera a infelicidade. A melhor maneira de a tratar seria através da felicidade, mas, logo por azar, a inveja é um muro alto que dificulta chegar até ela. Existe, no entanto, muitas possibilidades de a alcançar e, consequentemente, prevenir, ignorar e desprezar a mais cancerosa de todas as paixões, a invídia.
A sensação de felicidade surge em muitas circunstâncias sem darmos conta e sem a valorizarmos. É pena. Uma sociedade em franca convulsão, como a nossa, não deve estar muito predisposta para andar em busca das três Graças, nem estas se preocupam connosco. Os povos quando começam a andar descontentes ou perderam o verdadeiro significado da vida ficam mais recetivos à propaganda das mensagens que apelam ao ódio do que à fraternidade. Somos bombardeados, constantemente, por mensagens que apontam nesse sentido. Violência verbal inaudita, cultivada por altos responsáveis, assusta.
Muitos portugueses andam tristes, meio macambúzios e sem vontade para nada. Por analogia, poderíamos afirmar que sofrem de sinais típicos de quebranto, cujo diagnóstico popular é muito comum. Seria interessante se houvesse alguém capaz de curar o mau-olhado. Claro que nos pequenos povos ainda existem pessoas que, com certas rezas e uso de brasas bem acesas, que acabam mergulhadas em tigelas com água, seguidas do ritual de beber três gotas, conseguem tirar o quebranto às pessoas. Mas a nível nacional começo a ficar com muitas dúvidas se haverá alguém capaz de exorcizar a inveja. Entretanto, o melhor é conseguir sentir, extrair, procurar, inventar, saborear, eu sei lá que mais, a felicidade, em pequenos gestos, em pequenas atitudes, no dia-a-dia profissional, pessoal e familiar.
Lembrei-me de passar a escrito esta despretensiosa reflexão depois de ter contemplado o final da tarde num pequeno jardim em frente do magnífico Botânico, conhecido pelo jardim dos Patos. Patos não os vi, assim como mais ninguém naquele pequeno recôndito da cidade. Senti uma sensação estranha provocada pela conjugação do calor pré primaveril, dos cantos de excitação sexual da passarada e dos efeitos multifacetados dos raios solares a atravessarem as romagens das árvores do outro lado da avenida, que interpretei como sinónimo de felicidade. Não senti qualquer inveja de fins de tarde ocorridos em inúmeros locais ditos paradisíacos deste planeta. O “meu local” proporcionou-me uma sensação de felicidade. Felicidade, a arma mais eficiente para lutar contra a inveja.
Se “a inveja é a base da democracia”, então, é a altura de a democracia começar a ser a base da felicidade...

Chamam a isto governar!...

Casamento dos homossexuais, eutanásia, regionalização, combate aos “ricos”, reuniões partidárias, eleições e congresso do partido socialista, defesa pessoal nos projectos de arquitectura, no Freeport e similares, delegado de vendas do Magalhães, viagens pelo país e pelo partido, conferências, simpósios e mesas-redondas, inaugurações, entrevistas, discursos, comentários à evolução do PIB, da inflação e do desemprego... E também umas corridinhas matinais para adequar o físico ao ritmo de dias vividos de forma tão intensa.
Chamam a isto governar!...

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Matéria confidencial

Das coisas que mais aborrecem neste Governo é que nos tome a todos por tolos.
Agora, a propósito da divulgação da lista de dados dos elementos das secretas, o Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros negou a existência de acesso indiscriminado a essa lista, dizendo que "não é verdade que a lista contendo nomes de elementos de um serviço de informações estaria a circular de forma aberta, acessível e indiscriminada porque a lista terá entrado num sistema de acesso restrito".
Bom, o acesso aos dados não era indiscriminado, mas restrito.
Mas os dados foram divulgados.
Então, mas que raio de restrição é essa que permitiu tão brilhante divulgação?...

Eurobonds: oportunidade ou miragem?

1. O ex-Presidente Sampaio emitiu ontem uma sugestão em torno do tema crise económica e financeira, que teve grande ressonância (sem surpresa) nos órgãos de comunicação social: a emissão de eurobonds como instrumento de combate à crise.
2. Não é a primeira vez que o Dr. Sampaio impressiona auditórios e comunicação social com pronunciamentos económico/financeiros. Aqui lembrei várias vezes o de 25.04.03, com a famosa expressão “há mais vida para além do orçamento”, a qual justa ou injustamente (pequena cedência ao Dr. Mendonça Pinto, meu ilustre amigo) produziu efeito devastador para a continuidade da penosa política de rigor orçamental que M. F. Leite até então protagonizara.
3. Não me vou pronunciar sobre os objectivos políticos da intervenção do Dr. Sampaio que algumas pessoas mais dadas a estas análises estão para aí fazendo. Tais objectivos, se existem, não me apoquentam em medida nenhuma.
4. Vou antes procurar muito sucintamente abordar a ideia dos eurobonds e a sua pertinência no actual contexto.
5. Não se trata de uma ideia nova, já na década de 80 foi discutida e creio que experimentada mesmo uma ou duas vezes, muito antes de existir ou mesmo de se falar no Euro. Passou para não mais voltar, apesar de algumas tentativas do ex-Presidente Delors para a ressuscitar.
6. Tratar-se-ia então da emissão de dívida (bonds) pela entidade União Europeia (euro), cujo produto seria depois repassado (mutuado) pela mesma União aos Estados membros necessitados em condições idênticas (prazo e juro) às da dívida emitida.
7. Significaria pois utilizar a capacidade de endividamento da União junto dos mercados – da Alemanha, da França e talvez dos Países Baixos, sejamos verdadeiros – para alargar as fontes de financiamento dos países membros em dificuldades (Grécia, Irlanda, Portugal, Itália...) sem agravamento das condições da dívida...uma nova “árvore das patacas” para aqueles que já se encontram sobre-endividados, usando uma expressão dos meus tempos de juventude...
8. Mais dívida, mais facilidades para endividamento não se ouve outra receita...talvez com os eurobonds se pudesse avançar mais afoitamente na realização do famoso Programão bem como aumentar a intensidade das políticas sociais como sugere o Dr. Sampaio...
9. Esta ideia não terá qq viabilidade no actual contexto organizativo da UE e tb de crise profunda instalada. Para ter alguma, seria necessário, entre outras condições (i) criar uma figura próxima de um Ministro das Finanças europeu (curiosamente sugerido ontem por George Soros), com autoridade indisputada sobre a política financeira dos Estados-Membros, bem como (ii) desenhar e implementar programas de ajustamento para os países assistidos semelhantes aos que o FMI aplicava penosamente nos velhos tempos em que o Escudo entrava em séria derrapagem por causa de desequilíbrios externos excessivos...mas muito inferiores aqueles que temos vindo a acumular, que continuamos e vamos continuar a acumular!!!...
10. Alguém crê que isso seja possível a não ser em caso de iminente ruptura do Euro?

António Vitorino e o regime

António Vitorino produziu ontem afirmações muito importantes. Importância acrescida por terem serem ditas por quem foram.
Numa conferência promovida pelo Instituto de Defesa Nacional dedicada a debater Estado, Desenvolvimento e Sociedade, relatam os jornais que António Vitorino considerou que o sistema de justiça necessita de uma alteração profunda (que o mesmo é dizer, que não se sustenta com as pretensas reformas ensaiadas nos últimos tempos); que o envelhecimento da população põe em causa a sustentabilidade das políticas públicas; e notou a incapacidade actual do sistema de partidos, defendendo uma revisitação à democracia representativa.
Quem assim pensa não desacredita somente no sistema. Entende que o problema começa a ser do próprio regime.
Estou de acordo com Vitorino. Venha a 4ª República.

A crise económica e a educação...

Têm vindo a surgir, mais recorrentemente, notícias sobre as dificuldades crescentes das famílias em pagar as mensalidades dos colégios privados dos seus filhos e ainda ontem foi notícia o aumento dos alunos do ensino superior com dificuldade em pagar as propinas, tanto no público como no privado. É fatal que a crise financeira e económica ao afectar a normalidade dos níveis do rendimento disponível das famílias, em torno dos quais os pais fizeram opções em relação a questões tão essenciais como a educação dos seus filhos, lhes provoque dificuldades ou, até mesmo, a impossibilidade em manter opções e compromissos assumidos.
Seria de admirar que a crise e os tempos difíceis não atingissem muitos pais na sua capacidade para manter as mensalidades dos colégios e as propinas das universidades e todo um conjunto de despesas que estão associadas à frequência da escola, começando por retardar pagamentos, para de seguida cortarem em actividades extra curriculares, mas necessárias muitas delas ao desenvolvimento equilibrado das crianças e dos jovens, para depois solicitarem os pagamentos em prestações ou o seu diferimento no tempo, porque falta o dinheiro no final do mês para fazer face a outras despesas também essenciais.
Vem sendo frequente as escolas e as universidades privadas aceitarem atrasos nos pagamentos das mensalidades e propinas, o que naturalmente terá limites porque estas entidades também têm despesas fixas para satisfazer, sob pena de não poderem funcionar.
A situação de falta de capacidade financeira dos pais para fazer face às despesas escolares tenderá a agravar-se, sendo que a solução não parece estar na mera transferência dos alunos das escolas privadas para as escolas públicas ou do ensino superior privado para o ensino superior público, até porque o Estado não só não tem capacidade de resposta imediata, como para problemas conjunturais o que se recomenda são soluções que, devendo ser sustentáveis no curto prazo, não coloquem em crise o actual modelo.
Num momento de emergência social, esta é uma área de prioridade absoluta, em relação à qual o Estado deve apoiar as famílias que atingidas pela crise necessitam de uma resposta concreta para as dificuldades que as impedem de continuar a suportar as despesas escolares dos filhos, em parte ou na sua totalidade. Ou seja, o governo terá, a meu ver, que estar preparado, para conceder diversos apoios que vão muito para além do subsídio de desemprego - lembrado aqui que há quem não o receba, seja porque não trabalhou o suficiente para adquirir o direito, seja porque esgotou o tempo de duração do direito à prestação – e das políticas de acção social escolar prosseguidas, incluindo bolsas de estudo.
No Reino Unido o governo foi mais longe e vai alterar o estatuto de algumas escolas privadas mais afectadas pela crise económica para que sejam financiadas e não tenham de fechar as portas. A intervenção anunciada passa pela conversão das escolas em academias financiadas pelo Estado. O objectivo é resolver dois problemas: o risco de encerramento de várias escolas privadas que muitos pais já não conseguem pagar e a perspectiva de uma grande afluência às escolas públicas que, em algumas regiões, já estão sobrelotadas.
Em tempos de recessão, o número de inscrições em estabelecimentos privados tenderá inevitavelmente a diminuir. A educação é um bem público e como tal deve ser protegido da crise. Espera-se, portanto, do governo respostas concretas para fazer face ao “iceberg” de problemas cuja ponta começa envergonhadamente a despontar.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Falta de tempo

“O que é o tempo? Se ninguém me perguntar, eu sei; se o
quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei."
(Santo Agostinho, 354-430)


- Senhor professor não vou conseguir fazer o trabalho. Não tenho tempo. É impossível. Não consigo fazer tudo! Ao mesmo tempo que fazem esta afirmação colocam uma máscara de angústia, em que a palidez se acompanha, às vezes, de umas gotículas de suor a nível da fronte. Não se ouve o coração, mas posso imaginar o seu compasso bem acelerado e a boca desprovida de saliva – Não tem tempo? Tem, pois! Esforço-me por os convencer que a perceção da pressão do tempo é que o verdadeiro responsável pela ansiedade, muito mais do que a falta de tempo. Tento acalmá-los, dando conta do que se passa comigo. Chego a dizer-lhes que tenho, praticamente desde que me conheço, um conflito com o tempo. Nunca me entendi com ele. Julgo não ter tempo para nada e, no fim, acabo por ficar com tempo de sobra ao ponto dos meus trabalhos apanharem “teias de aranhas” antes de os apresentar.
A propósito do tempo, acabo de ter conhecimento de um interessante trabalho em que foi demonstrado que se for transmitido às pessoas que não têm tempo para realizar as suas tarefas, ou se as mesmas estiverem convencidas de que não conseguem, então, entram mesmo em sofrimento e não vão lá. Em contrapartida, o facto de ser-lhes comunicado que tinham tempo foi suficiente para que conseguissem realizar os trabalhos e com qualidade superior. Os autores concluíram que o mais adequado não é dar mais tempo, mas sim mudar a perceção do tempo.
Aqui está um problema filho de um outro. O que é o tempo?
Suskind descreve no seu livro, “Sobre o amor e a morte”, semelhanças entre o amor e o tempo. Ao analisar este último, na perspetiva agostiniana, afirmou o seguinte; “quando menos refletirmos sobre ele, mais ele parece explicar-se por si mesmo; mas se começarmos a cismar nele, ficaremos completamente desorientados”.
De facto o tempo é muito esquisito e desorienta-nos frequentemente. Sei que há filósofos que se dedicam a este tema, mas, quando os leio, confesso que fico mais confuso. Heidegger, um dos principais pensadores, fez a seguinte reflexão: “Que é o tempo? Se o tempo encontra o seu sentido na eternidade, terá que ser compreendido a partir daí”. Pois é! Temos de fazer o caminho a partir da eternidade, mas para isso é preciso conhecê-la e compreender. Mas não consigo! Bem tento. Houve, no entanto, uma passagem do seu livro que me deu um certo conforto ao afirmar: “eu sou o tempo propriamente dito, tenho tempo. Na medida em que o tempo é em cada caso meu, tempos há muitos. O tempo é sem sentido; o tempo é temporal”. Pensei imediatamente: eu sou apenas tempo. Esta conclusão heideggiana já tinha sido bem poetizada, em tempos, por Jorge Luís Borges ao afirmar que “tempo é a substância de que sou feito”. Sendo assim, quase que me apetecia concluir que, afinal, os que andam em bolandas com a “falta de tempo”, ou, se quisermos ser mais corretos, os que têm uma má perceção do tempo andam mas é em conflito com eles próprios. Fazer o melhor que pudermos no tempo disponível é a melhor solução. Quando acabar, acabou! E se não acabar, fica para a próxima. Tenho que poupar o meu “tempo” e não dar cabo da cabeça, senão quem se amola sou eu!

A história da Carochinha (versão para adultos)


A história parecia ser mais um daqueles casos recorrentes de hipocrisia colectiva, uma comoção geral perante o caso de uma menina inglesa, de 15 anos, que teve um filho de um menino de 13 anos. Parece que o caso deu origem a também recorrentes debates sobre a gravidez precoce em Inglaterra e, provavelmente, a outras tantas e renovadas teorias.
Mas desconfio que todo este lamento colectivo foi um disfarce. O caso é que não foi a idade da mãe que gerou este alarido, provavelmente não seria notícia nenhuma que uma garota de 15 anos ficasse grávida e levasse a gravidez a bom termo, calculo que seja lamentavelmente frequente. O que deu brado foi a idade do pai, 13 anos! e suspeito que mais pelo facto de causar admiração geral a façanha física do que o escândalo do resultado. O menino, de facto, aparece com cara de anjo, olhinhos perdidos de inocência e cabelo cortado à escovinha, só lhe falta o bibe da escola e terá sido por isso que foi o alvo de todas as curiosidades, a ponto de uma repórter lhe ter perguntado “como é que ele tencionava assumir as responsabilidades?”, “garantir o sustento da família” e outra tantas tontices, mais tontas ainda do que as respostas atarantadas do miúdo.
O “fenómeno” de virilidade precoce foi logo aproveitado como “furo” editorial, e choveram propostas para fazer filmes ou novelas com os heróis da fita, tudo sob a capa do grande drama social ou, ainda vamos chegar a isso, com o pretexto de “ajudar” a jovem família.
Mas o dinheiro, ou a promessa dele, logo despertou memórias afrodisíacas em vários rapazolas da mesma idade e suas zelosas famílias que, perante testemunhas credíveis (até advogados!) logo se chegaram à frente para assumir a paternidade da criança. A avó materna do bébé, que devia estar no mínimo constrangida com o assunto, assegura que a única dúvida é que o jovem amante não mandou nenhum cartãozinho à namorada no Dia dos Namorados o que é, sem sombra de dúvidas, uma mancha negra sobre se afinal foi ele o autor da proeza. Se a garota tinha uma vida sexual no mínimo atribulada, apesar dos seus 15 anos, é coisa que não parece preocupar ninguém, salvo no facto de, pelo resultado, se tratar de “sexo desprotegido”. Mas todos esses detalhes, incluindo a fila de imberbes prováveis candidatos à paternidade da criança, são agora mais pimenta para o argumento que já está a ser escrito para consumo dos espectadores de novelas…Todo este espectáculo degradante parece uma versão cruel e sem ingenuidade da história da carochinha, que só arranjou pretendentes para se casar quando veio à janela anunciar que tinha achado 5 réis ao varrer a cozinha...

Código Tonibler para usar nos serviços públicos

Depois de dias e dias, horas e horas e deslocações várias gastas na Repartição de Finanças, na Conservatória e no Notário, para obter as necessárias correspondências dos artigos e inscrições, depois de acertados, entre o Notário e a Conservatória do Registo Predial, os precisos termos da escritura de herança e partilha de bens, para não haver problemas no registo, depois de entrega, há meses, da escritura na Conservatória, dizem-me agora que nova documentação tem que ser apresentada, de nada valendo quer as diligências anteriores como a própria escritura notarial.
De modo que, em desespero de causa, vou passar a usar o Código Tonibler para os Serviços Públicos, à disposição no Blog Tonibler e que, com a devida vénia, reproduzo.
1. Nunca pergunte se é ali. Se entra num serviço público e pergunta "olhe desculpe, é aqui que posso pedir o papel para porra nenhuma?", o camarada está completamente lixado e a sua vida vai entrar numa obscuridade crónica. A senhora do balcão vai endrominá-lo, mandá-lo para um serviço a 53 km dali, onde lhe vão responder que deveria ter tirado a senha no primeiro local onde foi. A solução é espetar com o seu problema em cima do balcão, refilar pelo facto do problema não estar já resolvido e por ter que se deslocar ali.
2. Está ali para achar um culpado. Quando entra num serviço público, o culpado é o funcionário que tem à sua frente. Culpado de quê? Daquilo que você não quer ser. E o seu desígnio de vida é encontrar um culpado para aquela situação. A explicação é simples, o funcionário público está ali para salvar a pele dele, não para resolver a sua situação.
3. Fato e gravata, sempre! Nenhum doutor se apresenta de calças de ganga. Um funcionário público não respeita idade, sexo, conhecimento, ou o que fôr. Só respeita o doutor. O doutor é o funcionário público superior, ainda mais inútil que aquele que tem à sua frente, só que tirou um curso de pedopsicologia curativa no Politécnico de Indanha, e meteu-se no PS aos 16 anos. Se o camarada se apresentar de fato e gravata, há a hipótese de ser amigo de um doutor ou, pior, ser mesmo um doutor.
4. Nunca fale baixo. Falar baixo é o primeiro sinal de que o camarada é um choninhas à espera de ser esquartejado pela calanzice. Dirija-se de forma clara e a 60% do volume para manter o sujeito em linha.
5. Nunca admita a culpa. Pouco interessa se o camarada foi lá com 2 meses de atraso ou se nunca pagou aquilo. A culpa não é sua. De quem é? Simples, veja a regra número 2.
6. Você é o patrão. Recorde várias vezes aos funcionários à sua frente que quem paga aquela m... é você e que você é o patrão deles. Se algum levantar os olhos, você olha para o anúncio do livro amarelo...
7. Pergunte pelo seu dinheiro. Todos os serviços têm um pagamento de qualquer coisa e, se não tiver, há sempre o serviço que você pagou com os impostos. Por isso, se a coisa não estiver a ir no sentido que lhe interessa, diga que quer o seu dinheiro para se ir embora. Obviamente que não vai receber dinheiro nenhum, mas dá ao funcionário a sensação de que lhe está a dever dinheiro e isso é pior que ter a culpa.
8. Escreva. Não há nada que um funcionário público tema mais que uma queixa escrita. Podem levar-lhe o filho mais velho, mas não escrevam nada que o possa implicar e, principalmente, possa implicar mais trabalho.
9. Afirme que foi você que fez a lei. Sempre que as regras anteriores não estiverem a resultar, recorra à lei. Claro que você não vê um boi da lei nem faz a mais pequena ideia de que lei está o estúpido a falar. Só sabe que a lei foi uma parida qualquer que um burro de um deputado resolveu inventar para lhe lixar a cabeça. Se você afirmar que quem fez a lei foi você, isso dá-lhe o poder de a alterar momentaneamente a seu favor. Note que sem cumprir a regra número 3, convém não aplicar esta.
10. Use as regras. Senão estive a escrever para o boneco.

O sem-fim da propaganda

A estrear lá para o fim do ano?

Depois do MAI anunciar por três vezes num só ano (e quando a violência a isso obriga), sempre em sessão solene, a admissão de mais 2000 agentes policiais, é a vez de o Ministério da Saúde anunciar pela enésima vez na legislatura a introdução da venda de unidoses dos medicamentos. Mas anuncia-se que a introdução não será à bruta, mas gentil, cuidadosa e assistida para que não doa: experimental e só nas farmácias hospitalares...

A mesma luta!...






Hugo Chavez na Venezuela!...
DI MARIA em Portugal!...
Nada mais existe sob o céu!...

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Justiça popular

O DN de hoje publica uma entrevista com o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha do Nascimento.
Duas das questões formuladas espelham perfeitamente o estado da justiça
DN-Não acha que prejudica a imagem da justiça termos na comunicação social o acompanhamento da investigação e um certo julgamento e depois em tribunal as decisões não serem aquilo que a opinião pública estava à espera?
NN-Mas os juízes decidiram mal os casos que foram julgados na comunicação social?
DN-A pergunta é exactamente sobre isso. Não serão precisas novas regras para que não se crie uma expectativa de uma sentença no tribunal que depois não existe?
Claro que não, digo eu. A justiça popular mediada pela comunicação social é que estar a dar!...Então os juízes podem lá desmentir tão doutas sentenças? Então eles não estão lá só para confirmar as sentenças? Novas regras? Querem voltar à censura salazarista?

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Biombos

O deficite de escrutínio da actividade do governo permitiu que se erguessem paulatinamente um sem número de biombos que ocultam a verdade sobre os pretensos sucessos da governação.
Aqui no 4R procurou demonstrar-se o embuste que foi a criação, por exemplo, das Estradas de Portugal, S.A., parte de um esquema pensado e montado para disfarçar a realidade das contas do Estado pela via da desorçamentação de despesas material e funcionalmente públicas. Hoje é o ´Expresso´ que revela o caso da Estamo (*), empresa do grupo Sagestamo detido a 100% pela Parpública, a holding que detém as participações do Estado, tutelada pelo Ministério das Finanças.
O governo vendeu à Estamo um conjunto de imóveis, entre eles terrenos onde estão instalados hospitais e quarteis em fase de desactivação. A existência deste esquema de intermediação imobiliária é em si mesmo questionável como são questionáveis muitas das entidades empresariais resultantes dos processos de convolação de serviços da administração central em empresas, desde logo do ponto de vista da racionalidade e da necessidade dessas operações. Sem prejuizo da relevância deste tema, o que aqui se anota é o signiifcado da denúncia feita pelo ´Expresso´, até agora não desmentida, de que em 2008 a Estamo (cujo capital que gere é integralmente público) comprou ao Estado nove imóveis por 147 milhões de euros, quando a avaliação feita lhes atribuiu o valor de 129,6 milhões de euros. Só este negócio representou, segundo o jornal, 0.2% do PIB. E as receitas assim geradas refletiram-se nos resultados exibidos pelo governo no que respeita ao controlo do déficite das finanças públicas.
Lembro-me bem do que o PS disse quando o XV governo constitucional, para tentar infletir os efeitos da pesada herança deixada pelos governos de António Guterres, lançou mão de receitas extraordinárias clara e transparentemente refletidas como tal no orçamento do Estado.
Ao invés, hoje usam-se os mais sofisticados biombos para tornar opacas operações que visam esconder a realidade das finanças públicas. Só que a realidade é o que é, e os sinais de que afinal nenhuma correcção estrutural foi feita, estão aí, indisfarçáveis.
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Indisfarçável continua a ser também a falta de acuidade visual da oposição para estes esquemas. Para quando a ida ao oftalmologista?
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Só por curiosidade diga-se que esta Estamo é a mesma que figura na lista dos rarissimos credores do Estado, a que nos referimos em tempos aqui.

"Mudam-se os tempos mas não se mudam as vontades...

Uma pequena nota no El País causou-me mal-estar. A Procuradoria Geral espanhola pediu um ano e meio de prisão para um homem que roubou “meia barra de pão”. O autor da nota, Joan Carrach, adianta que na Inglaterra do século XIX roubar uma laranja era um passaporte para a Austrália. “Mudam-se os tempos mas não se mudam as vontades”...
Os outros, os assaltantes de primeira gema, não precisam de ter medo de ir para a Austrália ou para a prisão. Gozam com o pagode!

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Ética animal

No dia do aniversário do nascimento de Darwin fui assistir a um colóquio, seguido de debate, na simpática livraria perto da minha casa. Sentei-me na última fila, junto da porta, não para me escapar a qualquer momento, mas com a fisgada de ficar calado. Às vezes apetece-me mais ouvir e, depois, pachorrentamente, ruminar sobre os assuntos. Acontece que a moderadora do evento, ao topar-me da mesa, acenou um largo e muito simpático sorriso. Pensei logo: já estou a ver que vai arranjar um pretexto à maneira para me pôr a falar. E é das tais que chama “manhoso” a Darwin, cuja obra e vida tão bem domina. Mas não lhe fica atrás! No final das exposições, curtas, precisas e suficientemente polémicas, abriu-se o debate. Para estimular o apetite da audiência, o pessoal da mesa ia “servindo alguns aperitivos”, através de alguns comentários, um pouco desgarrados, análises meio sedutoras, alfinetadelas espirituosas, no fundo, tentavam aquecer o ambiente. Foi quando a moderadora olhou para mim, com o seu sorriso verdadeiramente sedutor, apelando a uma intervenção. Não me fiz rogado, claro está, porque muitas das coisas que ouvi provocaram um verdadeiro terramoto no meu pobre cérebro ao ponto de as ideias começarem a entrar em ebulição. A vontade de as expor, de complementar algumas afirmações e introduzir novos conceitos foram determinantes para neutralizar a velha timidez de falar em público. Às tantas, já não sei se é o acumular e a produção do conhecimento que me impele a isso ou se já estou a manifestar uma das consequências do envelhecimento, que se traduz, com alguma frequência, numa desinibição oratória devido a alterações do córtex frontal. Se este último for o responsável, então, coitados daqueles que daqui a alguns anos terão que me aturar; um chato de primeira ordem! Espero que, entretanto, não tenha caído nesta esfera!
Como todos os debates, as intervenções descambam para aquilo que não estava previsto. E ainda bem! Recordo-me que, às tantas, o filósofo de serviço ter focado a ética animal, contestando a visão antropocêntrica da mesma, talvez, presumo eu, pelo facto da bióloga ter afirmado que não há hierarquias das espécies, em termos biológicos. Concordo. A senhora invocou a tradição judaico-cristã e a Bíblia, onde está contemplado que Deus criou o homem e os animais para o servirem, como justificativo da superioridade cultural da nossa espécie. Aqui começou a gerar-se alguma agitação com a intervenção, muito interessante, de um colega dos “direitos” que dissertou sobre os direitos dos animais, e a legislação produzida para os defender, nomeadamente, por exemplo, a proibição da experimentação animal na Nova Zelândia.
Recordei-me do muito do que lá foi debatido, bastante produtivo, conheci personalidades com as quais nunca me tinha cruzado, trocámos ideias, discutimos novos paradigmas, levantámos muitas questões e passámos uma noite verdadeiramente comemorativa de um homem que mudou o mundo.
Não estava nos meus planos lançar a mão à tecla, mas fi-lo por causa da ética animal.
Li que “As lojas IKEA de Alfragide e Matosinhos estão a devolver dinheiro aos clientes que adquiriram almofadas ou edredões feitos com penas de aves, depois da empresa ter descoberto que os produtos eram fabricados com penas arrancadas a aves vivas”. Onde? Onde havia de ser? Na China! É pratica comum, neste país, o não respeito pelos direitos dos animais. São inúmeros os relatos de atentados, verdadeiramente cruéis, contra os animais. Mas a pergunta que queria mesmo colocar diz respeito aos direitos dos seres humanos. Será que a IKEA, e outras empresas, desconhecem que inúmeros produtos são confecionados por crianças e trabalhadores em condições eticamente condenáveis? Não lhes arrancam as penas em vida porque não as têm. Mas arrancam, roubam e matam a dignidade de crianças, mulheres e homens. Ética animal versus ética humana? Afinal, um verdadeiro problema de “ética comercial”...

A ignorância é atrevida

A economia vem desmentindo, ponto por ponto, e continuadamente, toda a demagogia do Governo. As palavras eram triunfalistas: crescimento, diminuição de impostos, diminuição do défice, controle da dívida pública, Portugal preparado para as dificuldades, se elas se fizessem sentir.
Hoje, as notícias dizem que a quebra de 2,1% da economia portuguesa registada no quarto trimestre de 2008, data em que foi apresentado o OE para 2009, é a mais grave desde há quinze anos.
Há apenas dois meses, em Dezembro, aquando da aprovação do Orçamento, o Governo ainda mantinha as perspectivas de crescimento do PIB em 0,6% e o défice 2,2% e a taxa de desemprego em 7,6%, quando os indícios já eram claros da queda da actividade e da subida do desemprego. E enganava despudoramente os portugueses.
Passados uns dias, os factos impuseram-se e o Governo teve que propor um Orçamento rectificativo, a que chamou suplementar.
Claro que um Orçamento é uma previsão, não uma certeza.
Mas prever tão grosseiramente, em assunto de tão grande responsabilidade, só pode significar ignorância absoluta em matéria económica, ou demagogia absoluta na relação com os cidadãos. Ou um misto das duas, porque a ignorância é atrevida.
Tão atrevida, que até diariamente é exibida nas mais variadas festividades propagandísticas.

MARCHA-ATRÁS tornou-se grande desígnio nacional?

1. O INE acaba de divulgar a estimativa rápida da variação do PIB em 2008: 0%.
2. Ao longo do ano transacto e a partir de uma previsão governamental de uma taxa de crescimento de 2,2% subjacente ao OE para esse ano, foram-se sucedendo as revisões em baixa até aos míseros 0,3% sinalizados já no início de 2009 pela dupla Governo-BdeP...
3. Mas nem esse mísero 0,3% ao que parece se conseguiu atingir...a contribuição mais negativa da procura externa líquida até essa pequena parcela esfumou.
4. O 4R emitiu em Julho de 2008 a previsão de crescimento de 0,7%, na época considerada um exercício de mau gosto, pessimismo militante, quando a dupla Governo-BdeP ainda sinalizavam crescimentos acima de 1%...
5. Em Setembro baixamos a previsão para 0,5%...mais pessimismo!
6. Agora se percebe melhor o pessimismo do 4R, bem como o resultado das políticas de “animação” da economia em curso desde há meses.
7. Dizia há poucos dias o Dr. Eduardo Catroga que a insistência na realização de grandes projectos de obras públicas pode significar estarmos a cavar a nossa própria sepultura...aqui no 4R desde há muito que alertamos para essa consequência...mas somos pessimistas, claro, a nossa opinião é sempre descontada com base nessa premissa!
8. Em Post editado em 28 de Janeiro último avançamos uma previsão de recuo da economia em 2009 de -3 a -2%, explicando que o principal factor de tal recuo será - tal como em 2008, vemos agora – o fraco desempenho da procura externa líquida, que admitimos vir a ser bem pior do que o avançado pelo BdeP.
9. Cabe acrescentar que a estratégia de "combate" à crise, através da concentração de enormes recursos de capital em obras/projectos que não vão gerar qualquer rendimento no futuro, está condenada ao fracasso e pode arrastar o País para um beco sem saída...
10. Essas obras/projectos vão gerar dois fluxos negativos de rendimento no futuro: (i) o fluxo dos juros da dívida necessária para financiar a despesa (chamada) de investimento; (ii) o diferencial entre receitas e despesas de exploração, com as primeiras inferiores às segundas.
11. Mas, pior do que isso, essa estratégia vai roubar recursos que seriam fundamentais para apoiar os sectores mais dinâmicos da economia – aqueles, precisamente, que podem contribuir para um melhor desempenho da procura externa líquida...
12. Já entramos no Euro em marcha-atrás...agora vamos atacar a crise também em marcha-atrás? Será que a marcha-atrás se tornou o grande desígnio nacional?
E não venham a dizer-nos que no 4R se alimentam pessimismos. Querem ainda mais evidência?!

Cabedelo, uma reserva local de biodiversidade

Está de parabéns a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia.
Foi ontem publicado no Diário da República o regulamento da reserva natural local de Cabedelo e da Baía de S. Paio, em Canidelo, naquele município. Da relevância desta zona dá hoje nota o JN.
Prova-se com a criação da primeira área protegida local ao abrigo do novo regime jurídico da conservação da natureza, que os municípios podem e devem ser participantes activos na preservação dos recursos naturais e na gestão dos habitats, e não arredados dessas responsabilidades como têm sido nos últimos anos.

Um exemplo a seguir.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

As cegonhas não são suficientes...

Num mar de más notícias, uma notícia boa é duplamente bem vinda. Não sendo suficiente para alterar a tendência de descida da natalidade, é benéfica a decisão do governo de aumentar a licença parental para seis meses, com o reforço do incentivo à sua partilha entre mãe e pai através da melhoria do montante do subsídio a pagar pela segurança social.
Se outras razões não existissem, o facto de os bebés poderem crescer mais tempo junto dos afectos e cuidados permanentes dos pais e de os pais poderem melhor conciliar a vida familiar com a vida profissional constituem boas razões para justificar o alargamento da licença parental. Este tipo de medidas pré-natais que tem incidência nos primeiros meses de vida das crianças não chega para travar o declínio demográfico, sendo necessário apostar em apoios que melhorem a qualidade de vida das famílias.
Trata-se, ainda assim, de um passo positivo num tempo em que anda esquecida a importância de construirmos uma sociedade assente no desenvolvimento humano e na responsabilidade social. Pena é que continuemos a adiar a discussão sobre o envelhecimento da população e que não sejam adoptadas políticas integradas e coerentes susceptíveis de inverter sustentadamente a baixa da natalidade.

Os Dardos de que o 4R gosta

A Quarta República tem vindo a ser distinguida por vários Blogs.
Dos que aderiram à rede Deste gosto mesmo, bela iniciativa do Defender o Quadrado de Sofia Loureiro dos Santos, fomos honrados pelo Corta-Fitas, e pelo Praça da República.
E dos que aderiram à rede Dardos, outra excelente iniciativa, fomos honrados pelo Geração de 80 e pelo Pleitos, Apostilas e Comentários
Já que “noblesse oblige”, e entrando na onda, aqui vão alguns Blogs que constituem dardos de fino metal e de longo lançamento e de que a Quarta República muito gosta.
A Origem das Espécies
31 da Armada
E, claro, todos os que nos honraram!...

O que eles precisam é de Sol!

Há muitos anos tive uma curta experiência sobre os efeitos da falta de luz solar no comportamento. Passei um pouco mais do que uma semana, em pleno Dezembro, numa cidade universitária sueca. O frio pouco me incomodou, o pior foi ter que começar a trabalhar à tarde já praticamente de noite. Acabava de almoçar quase ao lusco-fusco e, de repente, sem dar conta, a luz solar desaparecia. Ao terceiro dia comecei a ficar aborrecido e perguntei para que me indicassem um edifício suficientemente alto. Olharam para mim com ar interrogador e lá lhes expliquei que queria ver o Sol. E assim fiz. Ao final da manhã do quarto dia, salvo erro, fui a um terraço do edifício da universidade e olhei com saudades para o disco solar que roçava discretamente o horizonte. Acabei por concluir que aquelas paragens não se coadunavam com a minha fisiologia, sobretudo a mental. Ás tantas devia pertencer ao grupo dos que sofrem de “doença afetiva sazonal”, situação que atinge muitas pessoas, as quais precisam de luz, muita luz, para poderem funcionar normalmente. Conclui: sou mesmo um “sulista”, um típico representante mediterrânico.
O Sol, na sua miríade de atributos, é vital para prevenir muitas doenças, caso do raquitismo, por exemplo. Através da síntese da vitamina D, produzida a nível da pele, devido à ação das radiações ultravioletas, o Sol consegue ir mais longe, ao ponto de ajudar a prevenir certas formas de cancro (mas o excesso de exposição provoca, por seu lado, tumores da pele). Mas não fica por aqui, também contribui para estimular as nossas defesas, diminui o risco de doenças inflamatórias e metabólicas, caso da diabetes, e, agora, chegou-se à conclusão de que a vitamina D reduz o risco de demência e de outras alterações da esfera cognitiva.
Investigadores norte-americanos concluíram que as pessoas com níveis elevados de vitamina D são mais equilibradas na forma de pensar, na compreensão e no comportamento face aos que apresentam níveis mais baixos de tão importante vitamina.
É certo que estamos no Inverno, em que os dias são mais pequenos, facto que pode atingir os mais sensíveis, mas, aliado a este fenómeno natural, andamos nos últimos tempos debaixo de chuva e praticamente sem luminosidade solar. Ontem, mas sobretudo hoje, o Sol fez a sua aparição em pleno. Para matar saudades, e venerá-lo, tive uma sorte dos diabos, acabando por ficar com a manhã praticamente livre, facto que me levou até à beira-rio onde divinamente me espraiei com um bom livro nas unhas.
Às tantas, acabei por fazer algumas associações e recordar certos acontecimentos, até porque o jornal que me acompanhava (mas que não abri!) exclamava na primeira página o debate parlamentar de ontem. De facto, a reportagem televisiva, ao mostrar os comportamentos dos intervenientes, causou-me mal-estar e mesmo indignação pela forma muito pouco correta com que se dirigiram uns aos outros, revelando falta de postura e de compreensão. Em síntese revelaram perturbações comportamentais que, eu, na minha boa fé, atribui à “falta de vitamina D” dos senhores deputados e membros do governo! Só pode ser isso, pensei. O melhor a fazer é pôr aquela rapaziada ao Sol, antes dos debates, contribuindo para aumentar os níveis desta vitamina. Para o efeito, poderiam deslocar-se a um país tropical, ou, em alternativa, caso o orçamento não contemple estas despesas, frequentar “solários”, a serem criados no Parlamento, obrigando-os a permanecer durante o máximo tempo possível para poderem usufruir os seus efeitos positivos, evitando tristes figuras.
A vitamina D é vital para combater o raquitismo (ósseo), como todos sabem, mas quem diria que pode ajudar a reduzir o “raquitismo mental”?