quinta-feira, 3 de julho de 2008

José Sócrates e o IVA: Que grande lata!...

Um dos aspectos que me deixou boquiaberto na entrevista que ontem o Primeiro-Ministro José Sócrates concedeu à RTP1 foi a argumentação usada para garantir que, à luz da actual situação económica, voltaria a tomar a decisão de descer o IVA de 21% para 20%, uma medida que entrou em vigor no passado dia 1 de Julho. E até referiu que “hoje até encontro mais razões para descer o IVA”, lembrando que os cerca de 250 milhões de euros que o Estado deixa de receber vão “ficar na economia para ajudar as famílias e as empresas para enfrentarem momentos difíceis”.

Caro leitor: confesso que vi, ouvi, e nem queria acreditar!... Eu não diria melhor!...

… O problema é que, até ontem, o Primeiro-Ministro era um dos líderes da mentalidade maioritariamente instalada no nosso país na área fiscal, que defende que a política fiscal deve ser sempre (erradamente) pró-cíclica (isto é, amplificando os ciclos económicos) – e não anti-cíclica como, acertadamente, devia acontecer, para amortecer os ciclos económicos. Quantas vezes já ouvimos todos dizer que quando as “coisas” não vão bem não se deve baixar os impostos – e que só quando as “coisas” melhorarem é que isso se poderá fazer?!...

Como é sabido, o que desde há longos anos venho defendendo é exactamente o oposto – mas que é o que a Teoria Económica estabelece (e que é ensinado a qualquer estudante do primeiro ano da licenciatura em Economia): os impostos deverem ser utilizados como instrumento anticíclico, de molde a amortecer os ciclos económicos – o que significa que a carga fiscal deve ser diminuída para ajudar a transpor tempos de maior dificuldade como este em que vivemos. (Já sei que muitos me atirarão com o argumento do Pacto de Estabilidade e Crescimento e do “bendito” défice das contas públicas. Só que nem esse argumento é convincente: face à situação que estamos a viver e prevendo o Governo para 2008, um défice público de 2.2% do PIB (já incorporando a descida do IVA de 21% para 20%), será que seriam condenáveis umas décimas de défice a mais (que o mantivessem abaixo do limiar de 3%), resultantes de uma diminuição adicional de impostos (e não de desleixo do lado da despesa)?... Não creio…).

Foi, portanto, verdadeiramente alucinante (é o termo) ouvir ontem, pela primeira vez, o Primeiro-Ministro mudar o seu discurso na área fiscal – e, enfim, apresentar, do meu ponto de vista, alguma lucidez neste tema… mas apenas aparentemente, porque é evidente que só a aproximação das eleições de 2009 (que aliás já presidiram à descida do IVA agora concretizada, e ainda levarão a novos alívios fiscais no próximo ano) fez o Primeiro-Ministro mudar a sua postura.

O que revela um descaramento sem limites, de todo em todo desaconselhável para quem é… Primeiro-Ministro.

É mesmo caso para dizer: que grande lata, Engenheiro Sócrates!...

Nota: Para além desta vertente conjuntural da política fiscal (a sua utilização anti-cíclica), existe ainda a vertente estrutural, que diz respeito ao papel da política fiscal enquanto instrumento de competitividade e enquanto factor liberalizador da sociedade, criando a pressão necessária para reduzir a despesa pública – algo que, evidentemente cai fora do âmbito deste escrito (mas a que já muitas vezes me referi em anteriores ocasiões).

6 comentários:

  1. Caro Miguel Frasquilho,

    Antes de mais, endereço-lhe os meus cumprimentos. Há muito que não o comentava.

    Ao ler o seu post, fiz imediatamente uma pesquisa à palavra IVA publicada no seu blog, e como deve imaginar, são inumeros o posts da sua autoria abordando este assunto.

    Destaco neles algumas ideias gerais:

    - O meu caro sempre reclamou a descida dos impostos. Ela foi feita

    - O meu caro sempre reclamou que essa descida fosse feita num ciclo de recessão como forma de estimular a economia, e não num ciclo de crescimento como anunciava o ministro das finanças. Assim foi feito

    - O meu caro apostava na data de 2009 para ver essas reduções de impostos acontecerem. Foi melhor ainda, estamos já em 2008 e há reduções de impostos à vista! É bom? É mau? Sob que perspectiva?...

    Caro Miguel, permita-me deixar-lhe daqui uma alfinetada com toda a amizade: Deixe estar o IVA nos 20%. Assim já só faltam 3 pontos até aos 17 em que a Drª Ferreira Leite o encontrou, antes de o passar para 19....

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  2. tem muita razão Dr. Miguel Frasquilho.

    o menino de ouro é um menino com muita lata.


    na alemanha, a declaração de rendimentos dos cidadãos prevê rubricas para distribuição do imposto a cobrar, em sede de IRS, para obras públicas, apoio a instituições de 3ª idade, segurança social, etc.

    Seria muito mais transparente para o cidadão se se apercebêsse, através da susa própria declaração anual de rendimentos para onde vai o imposto que entrega ao Estado.

    Esta fórmula de cobrar individualmente, a cada cidadão, uma verba de IRS, que depois, não se tem a percepção de como é que distribuída, no total recebido pela DGT, de todos os cidadãos, dá aso a que, em discursos oportunistas e demagogos, como foi esta entrevista, possa ser utilizada da forma mais "conveniente".

    Das duas, uma:

    - ou o "menino" está mentecapto.

    - ou pensa que o Povo está.




    Nota - Senhor Carlos Monteiro, é interessante pôr o filme a andar para trás, mas por favor não pare, nos 17 para 19 % de IVA, vá recuando mais, e mais, encontrará muito disparate (fiscal) socialista. Ou só pára o filme onde lhe dá jeito ?

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  3. Agora até se já metem os despachos na gaveta....


    Hospital do Barreiro

    http://www.rostos.pt/inicio2.asp?cronica=81183&mostra=2

    caso que merece atenção, Dr. Miguel Frasquilho

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  4. e para quando uma proposta para uma taxa máxima de IVA não-usurária, como a que foi establecida pelo Sr. Silva e posteriormente aumentada pela MFL?

    Gosto bastante de o ler, mas acho que peca por tentar atirar as culpas da crise para o pós-cavaquismo... quando se iniciou ainda antes da pouco democrática adesão a Maastricht...

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  5. Caro C. Monteiro, ainda bem que estão a fazer uma (pequena) parte daquilo que venho defendendo em matéria fiscal... mas a minha questão aqui é o oportunismo político e a hipocrisia do PM. É que José Sócrates não acredita mesmo na via fiscal... e só tem este discurso agora por causa das eleições no próximo ano. Ora, parece-me um motivo muito pouco nobre para implementar políticas, sejam elas quais forem - e isso é que é inaceitável!... É uma questão de "lata", de descaramento se quiser, ou de pouca seriedade. Lamentável num PM.
    Agora, claro: sejam lá quais forem os motivos, ainda bem que o estão fazer... pior seria que nada fizessem!...

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  6. Conclui-se então que em política, "preso por ter cão e preso por não ter" é uma sina?

    :)

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