quinta-feira, 29 de setembro de 2005

A arqueologia dos interesses ou a gruta de Aladino

Uma notícia da RTP revela-nos um episódio bem elucidativo do quotidiano e da cultura cívica deste país. Moradores da Avenida Infante Santo, do Bairro da Lapa e dos Prazeres estão em pé-de-guerra contra a construção de um condomínio, já em fase adiantada de construção.
O primeiro argumento passou por invocar a volumetria contrária ao estipulado no PDM da cidade de Lisboa, que os 100 fogos de habitação e comércio e os 335 lugares de estacionamento fariam “degradar a qualidade de vida dos moradores”.
O segundo argumento centrou-se na proximidade de um troço do Aqueduto das Águas Livres e não obstante a aceitação por parte do promotor de um afastamento de pelo menos 10 metros com vista a construir-se um percurso pedonal (imposto pelo IPPAR), a tese dos moradores é reformulada em função de não existir “plano de pormenor de salvaguarda para a zona em causa”.
Por fim, surge o argumento derradeiro: alegam os moradores a existência de um conjunto de grutas. Quer o IPPAR quer os técnicos do Instituto Português de Arqueologia negam a existência de grutas no local e mesmo que existissem (o que ninguém consegue demonstrar) não estavam classificadas.
Mesmo assim, o IPPAR recomendou ao promotor do empreendimento a inclusão de arqueólogos que acompanhassem o desenrolar da obra.
No mais recente desenvolvimento ficamos a saber que os moradores, apesar dos pareceres do IPA, “já contactaram o professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL) e presidente da Sociedade Portuguesa de Espeleologia, José António Crispim, para fazer a avaliação no local através de uma técnica de Georadar que permite detectar a existência de eventuais cavidades no terreno”.
É esta iniciativa que dá título à notícia: “Moradores da Infante Santo querem demonstrar existência de grutas paleolíticas”.
Para ajudar a causa a Junta de Freguesia dos Prazeres já interpôs uma providência cautelar no Tribunal Administrativo Fiscal de Lisboa contra a Câmara, o IPPAR e a empresa promotora, com vista à “suspensão imediata das obras”.
Para compor o ramalhete este condomínio está já a ser investigado pelo Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Ministério Público “por indícios de ilegalidade no processo”.
Com toda esta mobilização conta-se à boca pequena que na referida gruta se encontra a famosa lâmpada de Aladino, essa mesmo, a dos três desejos, razão profunda da inquietação dos moradores e da ambição escondida (nas profundezas) dos seus líderes.
Moral da história: esqueçam o investimento, a criação de riqueza ou qualquer outra iniciativa lucrativa. Vamos todos dedicar-nos à espeleologia, mesmo nas grutas que não existem. É o que está a dar!

2 comentários:

  1. Anónimo22:07

    Não conheço os contornos do caso. Mas não me admirava nada que este possa ser um daqueles casos em que para defender interesses privados (de vizinhança) se procura instrumentalizar o interesse público. Quantas vezes se defende a importância ecológica, arqueológica, paisagistica,patrimonial do terreno da frente cuja desocupação nos continua a garantir as vistas?

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  2. O único comentário que consigo fazer perante este relato é:

    ISTO SÓ DÁ PARA RIR!... HILARIANTE DE FACTO!...

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