quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

A liberdade do Papa

“O perigo do mundo ocidental, para falar apenas neste, é que hoje o homem, justamente em razão da grandeza do seu poder e do seu saber, capitule perante a questão da verdade” e que a razão “ceda à pressão dos interesses e à tentação da utilidade erigida como critério supremo”, alerta o Papa.

A Universidade La Sapienza, fundada em 1303 pelo Papa Bonifácio VIII e que é uma das maiores instituições universitárias da Europa não conseguiu impedir que o protesto organizado de 67 (!) professores e uns tantos estudantes levasse ao cancelamento da visita do Papa, por ocasião da abertura do ano lectivo.
Uma vergonha, acho eu. Nem tanto o protesto, porque cada um é livre de se manifestar como muito bem entender e os outros de lhe darem a importância que merece. Pelo que li, o que é incompreensível é como é que uma manifestação deste tipo pode dar origem ao cancelamento da visita, dando assim uma dimensão quase universal, pelas repercussões, a uma atitude que só deveria merecer desprezo e censura.
Não aceito que um qualquer grupo que grite umas frases chocantes ou desrespeitosas seja suficiente para mudar a agenda do papa. É isso que assusta, é esta insuportável fraqueza perante a arrogância de quem acha que deve dizer aos gritos a sua opinião, tão alto que não deixe ouvir a dos outros, nem que seja a do Papa.
Acho muito triste que, de todas as notícias que procurei, nem uma tenha adiantado uma forte razão para a desistência, o risco de vida, os motins, a insegurança, sei lá, qualquer circunstância imbatível que não nos deixasse a acreditar que é fácil limitar os movimentos do Papa.
Também acho patético que todos os altos responsáveis políticos italianos se tenham apressado a manifestar grande repúdio pelas manifestações, grande preocupação pelo acontecido, como se fossem impotentes para o evitar, ainda por cima afirmando “o direito de o papa falar”, afirmação que, só por si, dá bem a imagem da cobardia e da hipocrisia política. Como se fosse sequer de admitir a dúvida sobre esse direito! Como se fosse precisa essa solidariedade!
A Igreja católica italiana convocou uma manifestação de defesa do pontífice para domingo na praça de São Pedro na hora da oração do Ângelus, dizem as notícias, e eu fico perplexa. O Papa vítima impotente de uma manifestação numa universidade, tolhido no seu direito de expressão, como um qualquer perseguido pelas fúrias indomáveis da tirania...!
Não admira, assim que, segundo um jornal, a ministra italiana para os Assuntos da União Europeia tenha tido o topete e a desconsideração de esclarecer que "Ninguém deseja calar o papa ou tentar negar-lhe o direito de expressão. Acho preocupante o quadro com que nos deparamos hoje: o único que tem espaço para falar, a qualquer hora, é o papa."
Por mim, não tenho sequer o impulso de comentar a atitude e o teor do protesto, mal teria dado por ele se não o tivessem promovido à desmesurada categoria de “ameaça à liberdade de expressão do papa”.
No meio disto tudo, perde-se a mensagem, apesar da publicação do discurso logo no dia da visita cancelada. Qual é o sinal de força de um papa “amordaçado” por um punhado de manifestantes numa Universidade em Roma?

10 comentários:

  1. Oportuno texto, cara Suzana.
    Cada vez mais os povos estão tolhidos por meia dúzia de energúmenos que impõem a sua vontade recorrendo à intimidação, sabendo que a cobardia dos estados a vai permitir, na senda do politicamente correcto.
    E a violência é maior quando, como é o caso, é imposta em nome da "ciência", como se a ciência verdadeira pudesse temer a expressão de pontos de vista diferenciados.
    Uma vergonha, esta capitulação das autoridades e do Estado italiano, aliás na sequência de outras capitulações que diariamente se vão verificando pelo mundo ocidental.

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  2. aro Pinho Cardão, os retextos para este tipo de atitudes interessam pouco porque são isso mesmo, pretextos e, como tal, nem nos devemos dignar a discutir se são de ponderar ou não. Nunca são, querem mesmo é chocar pela desfaçatez, confundir toda a gente para ampliarem o seu gesto e serem notícia. Conseguiram, sem dúvida.

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  3. Meus prezados amigos, perdoem-me a ignorância e a pergunta... o Estado do Vaticano não é composto por um gabinete de Imprensa?
    O estado do vaticano não mediou já em questões conflituosas entre facções Muçulmanas?
    Em Outubro do ano passado,o Cardeal Bertone, Secretário de Estado do Vaticano, criticou durante a Homilia proferida no encerramento das comemorações dos 90 anos das Aparições de Fátima, os actos de tentativa de "silenciamento" dos cristãos.
    Dizendo que os cristãos se devem "rebelar" perante aqueles que querem comprar ou impor "o silênciao dos cristãos". "Face aos pretensos senhores destes tempos (acham-se no mundo da cultura e da arte, da economia e da política, da ciência e da informação), que exigem e estão prontos a comprar, se não mesmo a impor o silêncio dos cristãos", indicou, "o mínimo que podemos fazer é rebelar-nos com a mesma audácia dos Apóstolos".
    Desculpem novamente a minha ignorância, mas... que é feito do Cardeal?... ou... em 2007 ainda havia fôlego no Vaticano?
    Ou... o Vaticano prefere "enviar os recados", quando os seus membros se encontram alem fronteiras?
    hmmmm, não creio que seja assim, é impossível que esteja a ser corente...

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  4. Impressionante, impressionante é ainda ligarem a um bandinho de italianos pseudo-revolucionários que não têm ideia, nem experiência (sim porque para se ser revolucionário há que ter experiência) do que é ser revolucionário.

    É de facto patético.

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  5. Car'Anthrax, o "bandinho" de 67 professores universitários de uma universidade que se dedica desde 1303 a experiênciar sobre o conhecimento, protesta a discussão acerca da pena de morte.
    O magnífico reitor da universidade, Dom Rino Fisichella, comunicou à imprensa italiana "Parece-me que há muita miopia e que há muitos preconceitos nessa perspectiva. Posso pensar em tudo, exceto que a Universidade e, portanto, o âmbito acadêmico, não seja ou não deva ser um lugar aberto à escuta de todos, à escuta das diversas instâncias presentes na sociedade. A Universidade nasceu para isso, a Universidade nasceu para ser lugar de confronto entre as próprias posições e as posições dos outros. A Universidade existe e deve existir justamente para que as diversas instâncias presentes como fruto da pesquisa, possam ser partilhadas e participadas. Se há uma preclusão ou uma pré-compreensão sobre a presença católica, parece-me, então, que haja uma auto-exclusão por parte de quem faz gestos dessa natureza. Essa atitude parece constituir uma falta para com a própria natureza da Universidade."
    Car'Anthrax... está a ver o Papa a dialogar este assunto dentro da própria natureza da Universidade?

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  6. Caro Bartolomeu:
    Chegou a vez de discordar do meu amigo. Alguma vez teria de ser!... O Vaticano não é para aqui chamado. O Papa foi convidado, como o poderia ter sido Prodi, Cavaco Silva ou Aznar ou Tony Blair. Meia dúzia de energúmenos, professores e alunos, oposeram-se e prometeram manifestações. Por isso, não houve conferência, porque o Estado italiano não se comprometeu a manter a ordem.
    Qualquer dia, é o 1º Ministro que não pode falar na Universidade, porque alguns professores e alunos não concordam coma as suas ideias.
    Trata-se, pois, de uma questão de liberdades, não de uma questão do foro particular do Papa, dos católicos ou do Vaticano.Atingiu agora o Papa, como no futuro, se tudo assim continuar, vai atingir outros.

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  7. Caro Pinho Cardão,
    A decisão em cancelar a visita à Universidade, foi exclusivamente da vontade do Papa. Tal como é noticiado, foi um grupo insignificante de estudantes a manifestar-se e um grupo significativo de professores. Crê efectivamente, caro Pinho Cardão que, apesar de as críticas apontadas ao Papa serem de carácter injurioso (?) eram suficientemente ameaçadoras e justificativas de um sentimento de perigosidade?
    Não me paresse que aqueles professores e alunos tenham ligações e apoios de grupos extremistas e radicais Judeus, ou muçulmanos, muito menos às máfias italianas.
    Pareceu-me mais uma "birra" papal, talvez com o sofisma de "arrebanhar" adeptos para uma causa "paranoica".
    Não nos podemos esquecer da euforia recente que se gerou quando durante a tradicional audiência das quartas-feiras, que são assistidas por 5.000 peregrinos, Joseph Ratzinger foi amplamente aplaudido quando gritou "liberdade".
    Liberdade, caro Dr.?
    Estamos a brincar, ou Igreja Católica é portadora e difusora de uma mensagem de paz para TODO O MUNDO? Mensagem essa que se apoia na entrega de um homem "Ecce Homo", ou o que foi imortalizado por Da Vinci e que representa o homem na sua dimensão universal.
    Não penso que seja possível equilibrar a verdade com demagogia, caro Pinho Cardão.

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  8. Caro Bartolomeu,

    Tal como o Dr. PC, também eu vou discordar meu caro amigo. Desde já, porque acho que - de facto - os professores universitários são um «bandinho» e isto, mesmo que possa parecer, não é dito num sentido assim tão perjurativo. Tenho o maior respeito pelos professores universitários (mesmo os intragáveis). São - na sua maioria - criaturas aluadas, que vivem num mundinho só seu, rodeados de possibilidades teóricas que exploram afincadamente. Além da sua dedicação (uns mais, outros menos) ao ensino daqueles que acham-que -um-dia-serão-como-eles-mas-estão-enganados, porque eles são espécimes únicos, dedicam-se também a criticar as teorias uns dos outros (exercício que é muito positivo porque permite evoluir), chegando a morderem-se de inveja quando alguém se lembra de um aspecto que eles não se lembraram.

    Os professores universitários vivem num estado de guerra permanente, o que vale é que é só entre eles.

    Tirando isso, de vez enquando resolvem aventurar-se no mundo real. Ora, quando isto acontece, os moços ficam um bocado baralhados. Porquê? Porque o ratinho, que anteriormente, corria desenfreadamente na rodinha que eles têm na cabeça, assusta-se e pisga-se. Logo, sem ratinho a correr na rodinha, a coisa não vai funcionar pelo melhor.

    Creio que toda a gente sabe qual é a função da Universidade, aliás, eu gosto de frequentar universidades (ando sempre à procura de qualquer coisa para fazer e que seja compatível com o meu orçamento) exactamente porque é o espaço que é, mas nunca me esqueço onde estou, nem quem é o quê ali dentro. Debater não é o mesmo que boicotar e aquilo foi um boicote, independentemente da natureza do assunto.

    Acresce o facto de, tal como disse o Dr. PC, o Papa ter sido convidado. Posteriormente, cancelou a visita e está no seu direito, porque ninguém vai a lado nenhum para ser insultado.

    Relativamente aos italianos em si, gosto muito deles. Gosto muito deles mas, não deixam de ser um tanto ou quanto parvinhos e acham que se falarem alto têm mais razão do que os outros. Além disso, são muito adeptos do multiculturalismo desde que língua seja o italiano, até porque se não for há ali uma barreira de comunicação que conduz a uma falta de compreensão.

    Finalmente, no que respeita à igreja católica, qual é que é o problema de pretender ser a difusora da mensagem de paz no mundo? Hmmmm? De uma maneira ou de outra todas as relgiões querem a paz no mundo (menos eu porque acho que iria dar mau resultado), ou seja, todas concordam no mesmo objectivo. O resto é apenas uma discussão de meios e uma grande campanha de marketing para angariar consumidores (da mensagem).

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  9. Car'Anthrax, para além do último parágrafo, o que resta do seu comentário, parece-me vago e inconsistente. E ainda no último paragrafo, não encontro o sentido da sua interrogação. Porém, e, alheando-me das considerações que tece acerca das características de personalidade de todos os professores universitários, chamo-lhe a atenção para um ponto que não deixei expresso nos meus comentários, mas que conto se depreenda. A questão teologica que parece estar na base das posições assumidas pelos professores e pelo Papa. Pensou nisso?

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  10. Ora meu caro amigo, :))

    O meu último parágrafo tem a consistência de alguém cuja importância que atribui aos assuntos teológicos é minima.

    Mesmo assim e discordando dos seus pontos de vista, gosto de os ouvir falar e gosto sempre de ouvir o que eles têm a dizer. Eles podem não ter influência no meio académico, mas em compensação têm uma força brutal na sociedade e esta é, unicamente, a parte que me interessa.

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