quinta-feira, 16 de julho de 2009

Descomplexificar diz a OCDE...

A OCDE produziu um estudo a pedido do Ministério da Educação para avaliar o modelo de avaliação dos professores. Não conheço o estudo, mas a leitura que fiz de várias notícias publicadas sobre o diagnóstico feito pela OCDE e as recomendações apresentadas leva-me a confirmar que alguns dos problemas encontrados no modelo de avaliação dos professores são um clássico.
Quero com isto dizer que sempre que é concebido e implementado um modelo de avaliação do desempenho, em particular quando estamos perante organizações que não têm tradição ou maturidade na avaliação do desempenho e em que a gestão por objectivos não está institucionalizada, há um conjunto de cuidados a observar que, naturalmente, não podem igualmente ignorar as especificidades e a maior ou menor complexidade das organizações em causa.
Ora, as recomendações da OCDE revelam justamente aspectos que não foram adequadamente avaliados ou tratados. Vejamos o impacto gerado pelo facto de alguns desses aspectos não terem sido devidamente acautelados. A aceitação e o sucesso de um modelo de avaliação do desempenho implicam:
- O envolvimento dos profissionais abrangidos, avaliados e avaliadores, quer dizer, a compreensão do funcionamento do modelo, a percepção das vantagens e dos benefícios. A OCDE confirma a resistência que o modelo encontrou junto das escolas e dos professores pela falta de percepção das vantagens e das razões da sua importância para o ensino.
- Que as estruturas e profissionais envolvidos estejam preparados para aplicarem e gerirem o modelo. Normalmente, a implementação destes modelos implica formação para avaliados e avaliadores, não apenas no que se refere à gestão do processo, mas em particular em termos de construção de uma atitude e vontade pró-activas de contribuir para melhorar o desempenho individual e o desempenho colectivo. A OCDE refere, com efeito, o facto das escolas e dos professores não estarem preparados para a complexidade do modelo.
- Que os critérios e a cascata da sua ponderação sejam simples, claros e transparentes. A OCDE recomenda, justamente, a simplificação do modelo que se afigura complexo, mesmo considerando as “simplificações” que o Ministério da Educação introduziu na versão inicial.
Há depois outras recomendações apresentadas no estudo com as quais concordo, que em princípio tendem para credibilizar e fornecer mais confiança ao modelo, com resultados benéficos nos níveis de motivação e predisposição dos professores, e que podem contribuir para ultrapassar algumas das tensões que explicam a contestação ao modelo de avaliação do desempenho. Essas recomendações dizem respeito ao recurso à avaliação externa no que se refere à avaliação dos professores para efeitos de progressão na carreira, à maior autonomia da escola na condução do processo de avaliação e à exclusão dos critérios de avaliação da classificação dos alunos e da taxa do insucesso escolar.
O estudo confirma o que não deve ter discussão, que a avaliação do desempenho é fundamental para melhorar a qualidade do ensino. Não há razão nenhuma para que as escolas e os professores estejam fora de uma cultura moderna assente no mérito e apostada na qualidade. Imprescindível é que todas as partes se comportem como agentes activos do sistema e assumam a correspondente responsabilidade.
A ideia foi boa e continua a ser, mas alguns aspectos essenciais não foram suficientemente acuatelados. É tempo de o Ministério da Educação, as escolas e os professores fazerem uma reflexão séria e levarem a sério as recomendações da OCDE…

5 comentários:

  1. Cara Margarida Aguiar,

    Todas essas recomendações "vêm nos livros". Mas não tome estas palavras como desconsideração pelo seu texto, pelo qual, aliás, a felicito.
    Mas o problema é que ninguém diz como se faz uma coisa dessas numa organização com 150.000 empregados, todos com a mesma profissão e com elevado grau de autonomia profissional(porventura o mais elevado entre todas as profissões - professor).
    A somar a tudo isto, sem nenhuma estrutura hierarquica estabelecida.
    Como para se fazer avaliação é necessária a existência de estrutura hierárquica e para se criar a hierarquia é preciso avaliação, temos a "pescadinha de rabo na boca".
    Veja-se o problema que surgiu em simultâneo com a valiação da criação dos professores titulares, o 1º passo para a criação da hierarquia. Ninguém sabia como seleccionar e ninguém percebia para que servia.
    E estamos a falar de uma "empresa", repito, com 150.000 empregados, espalhados por ums milhares de "pontos de venda"!...
    E que não têm quem os represente. Porque estes sindicatos...
    Há "livro" que tenha a receita para isto?
    Alguém acredita que isto se fará sem dor?

    ResponderEliminar
  2. Mudanças evidentes
    são indispensáveis,
    os protestos foram candentes
    e de razões responsáveis!

    Uma avaliação falhada
    defendida com teimosia,
    uma ministra arrolhada
    por tanta hipocrisia.

    Insensível às preocupações
    e às razões conscientes,
    foram tantas as aberrações
    em declarações despicientes.

    Sem ter percebido
    a sua inabilidade,
    de insensatez embebido
    analisando a realidade.

    ResponderEliminar
  3. O problema central deve-se à ideologia impregnada neste sistema de "avaliação", o professor é responsável por tudo e mais alguma coisa, o aluno é hiper-protegido e os pais não existem!

    Este sistema parte do pressuposto que todos os alunos querem aprender e que todos os pais fazem o seu trabalho...

    Enquanto não se perceber que a ideologia imposta às escolas não funciona continuaremos todos a achar que...

    Filho meu na escola pública, enquanto a ideologia for esta, nem pensar!

    ResponderEliminar
  4. Cara Margarida Aguiar

    O seu post suscita-me o seguinte comentário.
    Peço desculpa, vou usar como modelo (ainda que adaptado) que me saiu num dos testes de mestrado.
    No final de década de 20 do século passado existia uma empresa que se dedicava a vender gelo para a "geleiras" da época; essa empresa era líder de mercado.
    Com o advento dos sistemas de frio que permitiam fabricar frio em pequenas dimensões, começaram a surgir os primeiros frigorifícos modernos.
    Esta empresa, tentou competir com os fabricantes de frígorifícos que nasciam, através de várias medidas, desde fabricando caixas mais pequenas, até aumentando a frequência das entregas. Foi tudo em vão, perdeu o mercado e foi à falência.
    A empresa não tinha compreendido que o seu negócio não era o frio, mas a distribuição de produtos. Tivesse percebido isso teria prosperado nesse segmento.

    O "nosso" Ministério da Educação ainda não compreedeu que o seu "negócio" não é a avaliação, mas sim aumentar a eficácia do ensino. Existindo no mercado mais do que um modelo de avaliação (aqueles que são usados nas escolas privadas), não compreendo porque não se socorreu de um, ou de todos, dando às escolas e aos professores, a liberdade de escolher o modelo.
    (Não percebo porque compra os computadores no mercado e não faz o mesmo com as avaliaçãoes, ou porque não aplica o mesmo critério que usou para a avaliação, na compra dos computadores; até temos o JP SÁ COUTO???!!!!).
    Gastou-se tempo,dinheiro e não manteve o "mercado" anterior.
    A parte da OCDE é o sintoma do estado de cafrealização em que nos encontramos, mas com um Primeiro Mnistro que vai vender computadores para uma cimeira, podemos esperar de tudo.
    Cumprimentos
    João

    ResponderEliminar
  5. Caro SC
    A avaliação do desempenho de escolas e de professores está implementada em muitos outros países. Não há portanto que "inventar a roda"! Há sim que encontrar um modelo que se adapte à realidade e envolver todas as partes interessadas numa solução. A percepção que tenho sobre o modelo de avaliação do desempenho dos professores e sobre o processo em que interagiram o Ministério da Educação e os sindicatos é que foram cometidos erros políticos e técnicos e foram assumidas posições irreversíveis. Creio que os sindicatos não ajudaram nada, estiveram mais interessados em ser um problema do que parte da solução.
    Parece-me que o modelo terá que ser efectivamente revisto, não esquecendo o que "vem nos livros", e que o processo da sua discussão terá que ser diferente.
    Uma coisa tenho como certa, é que os professores não têm que ser um mundo à parte, devem ser acarinhados e valorizados e devem prestar contas do seu trabalho. Com dor? Com alguma, talvez, porque há sempre quem não queira mudar coisa alguma!

    Caro Manuel Brás
    Levo a sério as recomendações da OCDE, pelo que terá que haver mudanças. Há coisas que o passar do tempo não corrige...

    Caro Fartinho da Silva
    O modelo de avaliação do desempenho é uma peça de um todo que tem muitos problemas. Lembrei-me daquela expressão portuguesa que às vezes usamos "Meter o Rossio na Rua da Betesga", uma tarefa impossível!

    Caro joão
    Bela ilustração o seu "case study". Ainda vai acontecendo por esse mundo fora e por cá também. Como atrás dizia ao nosso Caro Fartinho da Silva o modelo de avaliação é uma peça de um modelo de ensino em que a escola não tem um estatuto de maioridade. As centenas de escolas públicas que existem são comandadas pela 5 de Outubro. Um absurdo! O modelo de avaliação do desempenho não está fora desta concepção.

    ResponderEliminar