segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Relatório FMI: nada adianta tentar fugir à questão fundamental...

1. Seria sempre estultícia esperar que um documento como o “Rethinking the State – Selected Expenditure Reform Options”, editado pelo Fiscal Affairs Department do FMI e contendo um vasto conjunto de sugestões para a redução permanente da despesa pública em Portugal, alguma vez pudesse ser debatido com serenidade e objectividade pela comunicação social e pela generalidade da classe política, dado o estado de quase absoluta negação da realidade em que há bastante tempo caíram sem mostrarem, por ora, quaisquer sinais de retoma.
2. Mesmo assim, o coro de lamentações a que se vem assistindo desde há vários dias ultrapassa as piores expectativas, demonstrando uma avançadíssima falta de noção da gravidade dos problemas eco0nómicos, financeiros e fiscais que nos afligem e uma clara preferência pela velha técnica da avestruz de enfiar a cabeça na areia para não ter de enfrentar esse tipo de problemas.
3. Curiosamente, ao ler o mencionado relatório, encontrei, a páginas 18, o seguinte esclarecimento: “ While leaving aside the question of the exact magnitude of expenditure savings that the government should target, the analysis presented in this report offers a menu of options for achieving expenditure savings in key spending areas”...
4. Os autores do Relatório foram pois bem explícitos, esclarecendo que não estão propondo um objectivo para a redução da despesa, antes apresentando um vasto leque de opções - umas melhores e outras menos boas naturalmente - cabendo às autoridades nacionais escolher as que entenderem mais adequadas para cumprir o objectivo há muito anunciado de redução permanente da despesa pública.
5. Tentando abstrair do muito concorrido e estridente coro de lamentações em que se transformou a reacção dos "habitués" da Mesa do Orçamento à divulgação deste Relatório, importa recordar que existe uma questão à qual, por muito que se proteste, não poderemos escapar: se queremos ou não continuar a suportar uma carga fiscal que consideramos extremamente penalizante das famílias e das empresas e que, se nada for feito para conter de forma permanente a despesa pública, terá muito provavelmente de ser ainda agravada nos anos mais próximos...
6. Queremos ou não essa consequência fiscal? Se concluirmos que todas as medidas sugeridas pelo FMI são de rejeitar, por atentarem contra os mais nobres sentimentos dos portugueses, escolhendo manter a despesa pública em torno de 50% do PIB – e até admito que seja essa a conclusão (com o meu voto contra, inútil obviamente) – então preparemo-nos para mostrar uma cara mais alegre quando chegar a factura fiscal de 2013 (iminente) e dos anos seguintes...
7. O que não vale a pena é iludirmo-nos, clamando contra impostos que consideramos (muito justamente) excessivos e, ao mesmo tempo, rejeitar liminarmente qualquer sugestão de cortes permanentes na despesa pública por serem ofensivos da “dignidade dos portugueses”...como dizem os ingleses, não se pode ao mesmo tempo “have your cake and eat it”...
8. Esta é a questão fundamental a que não podemos fugir mas, aparentemente, estamos tentando fugir, perdendo o nosso tempo...

15 comentários:

  1. Caro Tavares Moreira,

    O FMI mais que ninguem deveria saber que reduzir a despesa publica deve incidir prioritariamente no desperdicio e não na despesa social, que é baixa em Portugal.

    Assim o seu relatorio deveria ter inicidido na reforma do estado burocratico não social.

    Como o FMI optou por uma proposta do tipo neoliberal anti-estado social, essa proposta não poderá ser levada a sério.

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  2. 1) Ninguém, até agora, projetou as consequências resultantes da adoção das medidas propostas.

    2) Depois de cortar os 4 mil milhões, rapidamente se concluirá que não chega, que é preciso cortar mais.

    3) Isto recorda-me um texto misto da 2.ª ou 3.ª classe: um rei sentava-se no trono e constatava que ele coxeava. Então, para nivelar as pernas do trono, foi cortando aos bocadinhos numa e noutra perna. O exercício foi-se repetindo, sem que o rei conseguisse equilibrar o trono, até verificar que tinha cortado tudo e já não lhe restava nada das pernas. Assim sucederá a Portugal.

    4) Na Grécia, já se dispara contra as sedes do governo, partidos e jornalistas. Falta pouco para a loucura se vira contra a pessoa em si e não os seus «bens».

    5) O Orçamento da Saúde ronda os 8 mil milhões e o da Educação os 5. O OGE ultrapassa os 70 mil milhões. Está mesmo a ver-se onde se deve cortar em primeiro lugar.

    6) Os motoristas do MEC têm vencimentos superiores aos dos progfessores.

    7) A banca e o setor empresarial do estado são inatacáveis, exceto nas negociatas das privatizações. Porém, o mono da RTP permanece, as CARRIS e os metros de Lisboa e Porto mantêm-se.

    8) É caso para dizer: e se fossem gozar com outros?

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  3. parafraseando um ex-PM
    'devo a este socialismo a desgraça de ser pobre'

    é dificil conceber esquerda politica e comunicacinal mais burra

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  4. Perfeitamente lógico : Para baixar os impostos é necessário aumentar os impostos ( OE 2013 com o tal aumento "enorme"...).
    São os "amanhãs que cantam" na versão neo-liberal !

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  5. Caro Paulo Pereira,

    A afirmação de que a despesa social é baixa em Portugal baseia-se em que dados comparativos, pode esclarecer?
    Eu concordo, e já o disse publicamente nomeadamente em canais TV, que é indispensável um capítulo da redução da despesa dedicado ao que chamo a da "superestrura político-administrativa" - os gastos mais ou menos dispensáveis de gabinetes ministeriais, de muitas outras estruturas de apoio aos principais órgãos do Estado, de uma pluralidade de serviços e fundos autónomos,das estruturas político-administrativas regionais e municipais, do sector empresarial central, regional e autárquico, etc, etc.
    pode não ser tão relevante, em termos quantitativos, como a que foi sujeita à análise do FMI, mas não pode deixar de ser considerada num exercício desta natureza, por 2principais razões: (i) não pode haver excepções aos cortes da despesa; (ii) é preciso dar o exemplo e se os políticos não começarem por dar o exemplo numa matéria tão sensível, o exercício fica imensamente mais difícil de cumprir.
    Mas, dito isto, não posso deixar de considerar, do que já li, que o relatório do Fiscal Affairs Department contém informação muito relevante para a redução permanente da depesa que se pretenda realizar, não contém nada de "neo-liberal" (se é que isso tem algum sentido útil para esta discussão), revela mesmo uma grande preocupação com o princípio da equidade na distribuição da despesa social.

    Caro Floribundus,

    Não sendo a dita "burrice" monopólio de quem refere, a verdade é que parece existir da parte dessa rapazidadan uma tendência virtualmente irresistível para o disparate, cujas consequências infelizmente todos nós temos de suportar...

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  6. Caro Tavares Moreira,

    Média da despesa social na OCDE em % PIB = 8% na saude + 7% na educação + 14% S.Social = 29% do PIB

    Em Portugal = 6% na saude + 5% na Educação + 15% na S.Social. = 26% do PIB

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  7. Caro Dr. Tavares Moreira,

    Eu não discuto a necessidade de se redefinir a extensão do Estado Social.

    Mas não consigo deixar de pensar que se hoje o Governo o considera tão importante assim, já o seria seguramente há 2 anos quando das eleições. E nestes 2 anos o que fez o Governo para lá de aumentar impostos?

    O Governo não teve coragem - se calhar nenhum teve até hoje - para atacar o monstro despesista agarrado ao Estado. E quando hoje diz que "é desta!", a exemplo do aumento da carga fiscal que foi brutal sobre o trabalho e mansinha sobre o capital, vai ao fácil, leia-se às pessoas (Saúde, Educação, Segurança Social).

    Aliás, o Governo nem sequer teve coragem para assumir as opções que quer, teve de refugiar-se num relatório do FMI para que percebéssemos o programa desejado. E, para mim, o relatório aparece agora como o papão para o eventual chumbo do OE no TC.

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  8. Paulo Pereira, não se canse, que esta malta só atenta nos dados mentirosos produzidos pelo relatório do Gaspar... er, do FMI, perdão.

    Por exemplo, na Educação, citam dados de 204, quando havia mais duas ou três dezenas de profes no sistema, comparativamente com os nossos dias. Na Saúde, idem.

    Já nas prestações sociais, a conversa é outra. Aliás, Portugal só pode superar a média, dado ser um dos quatro países com um brutal número de desempregados.

    Ainda estou à espera de ver aqui um «post» dos doutros acerca da imbecilidade da proposta de liberdade de escolha no caso do pagamento do SN e SF. Nada me diz que não tenho um funcionário meu a requerer o seu pagamento em duodécimos, outro nos meses habituais, outro que se arrepende a meio do ano e decide de outra forma. Enfim, uma cambada de imbecis!

    O mais dramático é que do outro lado temos o Seguro. Este país está entregue à ignorância absoluta!

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  9. Caro Paulo Pereira,

    Só na segurança social, quando aponta 15% do PIB, poderei apontar, no mínimo, servindo-me das informações muito actualizadas do hediondo relatório FMI, um total de 17,4% do PIB, resultado da soma de 14,5% das pensões e de 2,9% para outras prestações de segurança social entre as quais se incluem o Rendimento Social de Inserção e o Subsídio de Desemprego...

    Caro Jorge Lúcio,

    Essa de apontar faltas de coragem é muito bonito para quem está a ver o jogo na bancada!
    Eu gostava de o ver a tomar decisões destas...
    Mas, feito este leve comentário, não posso deixar de concordar consigo no ponto em que este trabalho deveria ter sido antecipado, pelo menos 1 ano, até pela razão óbvia de que hoje o grau de fadiga em relação à tomada de medidas deste tipo é muito maior, sendo consequentemente muito maiores tb a resistência à sua aplicação bem como o custo político inerente...
    De tal modo é assim que começo a ter muitas dúvidas - depois de assistir a esta imensa e ruidosa procissão de protesto dos muitos milhares de sentados à mesa do orçamento - sobre a exequibilidade política deste programa de reformas, e inclino-me para o prolongamento do castigo fiscal que, como bemsabe, é muito mais penalizador da economia...
    A ser assim, será uma opção pelo empobrecimento irreversível do País, mas uma opção livre e consciente pelo menos...

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  10. Caro Dr. Tavares Moreira,

    Não consigo perceber como há coragem para cortar pensões a idosos, mas não se altera a legislação que permite que autarcas tenham direito a pensão aos 47 anos.

    E que tal encerrar mesmo as empresas municipais e institutos públicos, em vez do faz-de-conta com as freguesias?

    Ou perceber (vamos em 38 anos em tempo de paz) que ainda se mantenham hospitais separados para os 3 Ramos das Forças Armadas?

    Ou decidir eliminar as verbas atribuídas a Fundações Privadas, em vez de publicar "relatórios" que são uma vergonha de mal feitos?


    Admito que seria precisa alguma coragem para deixar o Banif falir, ou devolver os Submarinos como dação em pagamento.

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  11. Caro Jorge Lúcio,

    Relativamente à definição da coragem para cortar pensões, é natural que os atingidos sejam idosos...para cortar pensões a jovens, creio que não será necessária qq dose de coragem...
    Mas, de certo modo repetindo-me, não posso deixar de o acompanhar nos pontos de interrogação que levanta; entendo que tem de haver resposta para esses casos que menciona, num programa de redução da despesa pública como o que foi objecto da atenção do FMI não pode haver excepções e é preciso dar o exemplo (veja, se tiver paciência para tal, minha 1ª resposta aos comentários de P. Pereira).

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  12. Caro Tavares Moreira,

    Não acha estranho no relatorio do FMI não vir indicada a despesa publica na saude e na educação em % do PIB ?

    Na verdade fui refazer as contas para o OE2013 pois estava a usar numeros de 2011, e cheguei a numeros ainda mais interessantes (pag 110 )

    a) despesa com educação = 6754 / 169000 = 4% do PIB

    b) despesa com saude = 8507 / 169000 = 5% do PIB

    ou seja 9% do PIB em saude e educação , muito abaixo da média da OCDE e da UE, o que torna absolutamente espantoso a fixação do FMI , Troika e Governo , nestes dois temas.

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  13. Caro Tavares Moreira,

    Orçamento da S.Social 2013

    Despesas Correntes 24944 / 169000 = 14,7%

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  14. Caro Paulo Pereira,

    Ora muito bem, acontece que na anterior resposta eu acabei por não dizer tudo (propositadmente?): com efeito, o insuportável relatório do FMI também quantifica as despesas com saúde (7% do PIB) e educação (6,2% do PIB).
    Em resumo e ao invés daquilo que o ilustre Comentador Paulo Pereira pretendeu demonstrar, com a sua habitual e respeitável serenidade, deveremos pois concluir que as despesas sociais têm em Portugal um peso bem superior ao da média da OCDE: 30,6% do PIB em Portugal, contra 29% na média da OCDE( a tomar o seu número como bom).
    O que até se entende, uma vez que Portugal é, ao contrário do que certos maldizentes pretendem, uma economia bastante mais avançada do que a média das economias dessa zona.

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  15. Caro Tavares Moreira,

    Os numeros que apresentei são os do OE2013 !

    4% + 5% + 15% = 24%

    Quais são os valores absolutos do FMI ?

    Será que o FMI usou os numeros certos actuais ?

    Não parece nada que tenham usado numeros actuais, devem ser os de 2010 como se pode ver em alguns quadros, antes dos cortes.

    do documento : "At 6.2 percent of GDP (in 2010), education spending was relatively high ..."

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