terça-feira, 23 de abril de 2013

Ainda os swaps...e outros produtos tóxicos

Começou a novela dos swaps e promete continuar. Repentinamente, brotou do nada uma chusma de escreventes e comentadores e especialistas autorizados a tirar conclusões, mesmo sem conhecerem nem o texto, nem o contexto. Lançam-se números, produzem-se acusações, referem-se prejuízos de milhares de milhões, umas vezes reais e outras potenciais, apontam-se culpados e presumíveis culpados. 
Por mim, que comprei swaps, vendi swaps, estruturei swaps, fiz notas para as empresas sobre vantagens e desvantagens dos derivados, potenciais benefícios e riscos, e sempre enfatizei estes últimos, e não conhecendo sobre os casos apontados mais do que a comunicação social vem referindo, confesso que ainda não percebi o que verdadeiramente está em causa. Nomeadamente se se trata de cobertura de risco de taxa de juro de financiamentos reais e em carteira, e de qual o indexante, ou de coberturas de outros riscos, por exemplo, cambiais, ou de derivados meramente especulativos ou sem “activo” subjacente. 
Quando, no Banco onde trabalhava, lidei de perto com esta matéria dos derivados, por força das funções que então exercia, lembro-me que uma empresa encomendou o desenho específico de um derivado de alto risco com que queria especular. Apesar dos reiterados avisos, orais e escritos, dos perigos que corria face à volatilidade dos mercados, a empresa concretizou o produto, convencida dos ganhos que daí retiraria. A instituição onde trabalhava ganhou uma boa comissão. A empresa perdeu muito, mas estava consciente do risco.
Referem-se, agora, prejuízos potenciais elevadíssimos. . Todavia,  se o que está em causa é o swap da taxa de juro (um dos derivados mais simples e primários), o juízo quanto à bondade do instrumento depende de muitos factores, e nomeadamente da maturidade do contrato; com efeito, num prazo a 10, 15 ou 20 anos muitas alterações de taxa de juro por certo advirão, e o que é prejuízo potencial hoje pode ser lucro real amanhã, ou vice-versa. No entanto, sem nada disto ter vindo a lume, as conclusões já são condenatórias.  De qualquer forma, se há derivados e, no caso, swaps que são recomendáveis e aceitáveis em certos contextos, já os derivados especulativos nunca deveriam constituir nunca opção de empresas públicas. Ora, na informação vinda a público, não se refere o que verdadeiramente está em causa. Porque ela apenas tem visado os mais sensacionalistas títulos dos jornais ou telejornais, o que se iniciou foi um novo julgamento popular. Onde o sujeito fica condenado à partida, sem que ninguém saiba verdadeiramente por que razão.
É que também a informação se pode tornar um verdadeiro produto tóxico, que mata e fere indiscriminadamente.

17 comentários:

  1. Anónimo14:55

    Meu caro Pinho Cardão, nuam sociedade cujos carburantes são o crime, o castigo e o escândalo, qual o interesse do rigor? Interessa a algum jornalista saber que há operações que visam justamente proteger o devedor do risco, embora também elas importem risco? Não interessa, obviamente, porque explicado como o meu Amigo explicou as coisas assumem, afinal, a natureza da não-notícia. Resta o escândalo dos secretários de estado substituídos para que o escândalo não alastre e contamine.
    .
    Ainda assim, e longe do que interessa aos jornais e aos caçadores de escândalos, estas operações levantam o problema da autonomia dos gestores públicos nos casos em que as empresas são públicas e o risco recai sobre os cotribuintes, em última análise.
    Há muito que defendo que as entidades empresariais públicas que dependem de transferências do OE ou de fontes públicas, deveriam ter uma gestão mais vigiada, pois nos casos de decisões, chamemos-lhes temerárias, não resolve todo o problema o instituto da responsabilidade dos gestores.

    ResponderEliminar
  2. Ainda há quem compre jornais? Já ninguém vê televisões generalistas, quanto mais ler jornais... Na verdade a ignorância dos swaps é um fenómeno entre uma franja da população que ainda não entendeu que o país em que viveram já não existe.

    ResponderEliminar
  3. Muito bem visto, caro Pinho Cardão além disso como é um assunto maçador, cheio de detalhes técnicos, em breve tudo se resumirá ao anúncio de milhares de milhões de "prejuízos" reais ou potenciais, e no fim, roladas as cabeças e ajustadas as contas, ficaremos todos a não perceber absolutamente nada dos swaps.

    ResponderEliminar
  4. Um contrato onde as perdas potenciais são muito elevadas nunca faz sentido numa empresa publica.

    Uma cobertura de taxas de juro deve ser contratado com um formato de seguro e não de forma que a perda possa ser imensa.

    paga-se para reduzir o risco e não para perder ou ganhar especulativamente.

    ResponderEliminar
  5. Caro António,

    Desculpa a insistência mas não me parece que a questão seja apenas, ou sobretudo, uma especulação dos media. Ainda que os media se lambam por coisas destas.

    Acontece que vinha agora de carro e ouvi o líder parlamentar do PSD dizer que vai a maioria requerer um inquérito parlamentar sobre o assunto. É uma intenção gratuita?

    Entretanto o anterior secretário de estado do tesouro, Carlos Pina, do PS, se bem percebi, veio a terreiro declarar que não exarou qualquer despacho a consentir tal tipo de operações.

    É evidente que um contrato de swap não é um crime nem para lá caminha. Mas já é crime se alguém, ultrapassando os limites das suas competências, jogar ou mandar jogar com o dinheiro dos contribuintes.

    Salvo melhor opinião.

    Porque um swap é sempre um jogo especulativo se não estiver escorado por uma operação simétrica. E as empresas públicas de transportes visivelmente não dispõem desses meios para o fazer.

    ResponderEliminar
  6. Caro Rui:
    Claro que, como dizes, "um contrato de swap não é um crime nem para lá caminha". Mas não é nenhum Carlos Pina ou nenhum Secretário de Estado do Tesouro, enquanto tal, que pode atestar da bondade ou maldade de um swap.~
    Dizes que um swap é sempre um jogo especulativo; claro que é um jogo, especulativo, não sei. Se contratas um empréstimo a taxa fixa estás a especular? Mas, se ao contrário, o contratas a taxa variável, estás a especular? Até aqui estás num jogo de expectativas. Qual a melhor? Mas se, em determinado momento, trocas a taxa variável por taxa fixa, ou vice-versa, estás a especular ou simplesmente a fazer o que deves?
    Mas, quanto ao caso concreto, o que eu disse e mantenho é que aquilo que foi publicado não autoriza qualquer conclusão. E se é preciso um inquérito parlamentar para averiguar uma coisa dessas, e sabendo-se que grande número dos elementos da comissão de inquérito nem sabe nem sonha o que sejam esses produtos, não auguro nada de positivo. É que, nos inquéritos parlamentares, nunca se chega a conclusão alguma; melhor, as condições estão retiradas `sa partida.

    ResponderEliminar
  7. "Se contratas um empréstimo a taxa fixa estás a especular?"

    Obviamente, não. Se a taxa é compatível com a capacidade de retorno do investimento para o qual se contratou um financiamento a taxa fixa é mesmo, do meu ponto de vista, a decisão adequada. Porque delimita os custos financeiros do investimento.

    Mas se um financiamento é contratado a taxas variáveis e sobre ele monta um swap de taxa de juro por uma questão de palpite do momento, não há racionalidade na decisão.

    Resumindo: aos administradores de empresas públicas de transportes pede-se que façam a melhor gestão operacional do serviço público que lhe está confiado. Se o fizerem bem, fazem o que devem. O resto não lhes compete. Ou não devia competir.

    ResponderEliminar
  8. Caro Rui:
    O racional de contratar taxa fixa num momento pode perder-se, por mudança de conjuntura; então, irracional seria não seguir outro caminho. Aí está a gestão.

    ResponderEliminar
  9. Caro António,

    Discordo.
    No momento em que é avaliado um projecto de investimento o mais importante é conhecerem-se com a maior aproximação possível os dados determinantes da sua rentabilidade futura.

    Eventualmente, as taxas podem evoluir no sentido da baixa relativamente à taxa fixada. Mas essa é uma evolução imprevisível no momento em que o mérito do projecto é avaliado e não pode uma avaliação séria contar com imprevisibilidades que podem indeterminar-lhe os resultados pretendidos.

    ResponderEliminar
  10. Caro Rui:
    O mérito de um projecto vai variando ao longo do tempo. Os pressupostos vão-se alterando e o enquadramento económico e financeiro diferente. Por isso, há que fazer as adaptações necessárias para que o projecto subsista. Chama-se a isso gestão. Deixar tudo como ficou previamente estabelecido, em nome de um determinismo qualquer, como se uma folha de cálculo condicionasse a evolução das coisas e dos tempos, é a negação da gestão. Completa.

    ResponderEliminar
  11. Caro Ferreira de Almeida:
    De facto, um jornalismo que fosse sério, isto é, que fosse jornalismo, enquadraria toda a situação e nunca se limitaria a vomitar títulos.
    Como lamentavelmente sucede.

    ResponderEliminar
  12. Não me parece que qualquer destas empresas tenha acesso a fazer trading com swaps. E ninguém faz swaps sozinho pelo que do outro lado os bancos também não os fariam com tal risco de contraparte. A conclusão de que é mera asneira dos jornais parece-me óbvia.

    ResponderEliminar
  13. "O mérito de um projecto vai variando ao longo do tempo..."

    É evidente que as circunstâncias envolventes se alteram. Mas nenhum empreendimento que requeira financiamento a largo prazo se pode sujeitar às vicissitudes da inevitável volatilidade dos mercados financeiros.

    Estou a pensar em projectos sérios, não em projectos preponderantemente especulativos.

    Talvez o facto de ter trabalhado na indústria durante dezenas de anos me tenha induzido alergia às jogadas financeiras.

    ResponderEliminar
  14. Já agora, conto-te um caso real que confirma a minha alergia à imponderabilidade dos custos financeiros- juros, câmbios, ou outros.

    Quando fui nomeado responsável financeiro pela empresa onde trabalhei a maior parte da minha vida, deparei-me com um financiamento do Banco Mundial em dólares a uma taxa variável, na altura estava em 10%, uma pechincha, uma vez que a inflação andava pelos trinta e muitos.

    Somados os juros às desvalorizações cambiais, o empréstimo do BM custava-nos cerca de 40%/ano.

    Como o investimento em causa tinha um período de carência de retorno de 15 anos,isto é, só ao fim de 15 anos começaríamos a ter proveitos - há investimentos assim - umas contas simples atiravam os custos de produção para as nuvens.

    Diligenciei imediatamente no sentido de lhe por termo, reembolsando-o. Opôs-se o Governo porque Portugal precisava de divisas. Mas consegui.

    O empréstimo foi passado a outra empresa nacional. Fechou alguns anos depois.

    ResponderEliminar
  15. Caro Rui:
    Estás a dar-me razão. O mérito de um projecto vai variando. E é preciso adaptação. Foi o que fizeste. E bem.

    ResponderEliminar
  16. Caro António,

    Não dei, não.

    Não houve adaptação, houve correcção de um erro de palmatória: terem subscrito contratos a muito longo prazo sem fixação dos custos financeiros do investimento.

    ResponderEliminar
  17. Desculpem a interferência, mas tenho que concordar com o Cardão, como dizia um colega meu estas coberturas de risco não deveriam ser feitas por períodos tão longos, de forma a poder acompanhar a curva de evolução conjuntural, apenas para ganhar o tempo de ajuste do mercado.

    ResponderEliminar