quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Olhando para a nuvem que passa...

O sarilho estava anunciado, os resultados só o vieram confirmar, embora não seja inevitável o futuro próximo de máxima turbulência que por aí se anuncia (e em que muitos apostam com visível satisfação). Eu, que considero que o maior erro dos mandatos do atual PR foi aceitar, em 2009, a solução de governo minoritário que o PS apresentou, faço votos para que desta vez se perceba a sageza de quem tem de a ter, e não falte sentido de Estado aos principais atores de modo a que aos interesses da comunidade não se sobreponham ambições pessoais ou taticismos partidários. Não há muitos anos (em 2010, salvo erro) as eleições gerais no Reino Unido foram ganhas pelos Conservadores, todavia sem maioria de assentos nos Comuns. Gordon Brown, o líder trabalhista enfraquecido pelos resultados eleitorais, teve a chance de constituir Gabinete com o apoio de liberais, democratas e outras pequenas representações, e a isso foi desafiado por muitos dentro e fora do seu partido. Porém, considerou que o mandato para formar governo, numa democracia representativa, deverá sempre ser atribuído à formação que mais mandatos obteve. Viabilizou desta forma o governo que sucedeu ao seu, a despeito da possibilidade, que poderia ter testado, de continuar à frente de um governo maioritário, constituído por todos ou parte dos que perderam as eleições.
Há óbvias diferenças entre a situação inglesa pós eleições de 2010 e a situação que vivemos, bem sei. Mas espero que daqui a uns tempos se possa dizer que em ambos os casos os políticos estiveram à altura das suas responsabilidades. Ainda que isso possa custar, como custou a Brown, um ocaso antecipado.

4 comentários:

  1. Concordando, no essencial, talvez o problema esteja exactamente em termos que procurar um exemplo externo. Acho que não sofremos o suficiente para aprendermos e a ideia de um governo de esquerda com o BE, PS e PCP parece-me cada vez mais simpática. Mas uma coisa que leve a inadimplência do estado, que faltem bens essenciais, que morram crianças por falta de medicamentos. Que seja de facto grave. Senão vamos passar o resto da vida a argumentar com exemplos externos e contra argumentar com ideologias do sec XIX que ninguém quer abandonar.
    E encontrar um maior erro no actual presidente da república é um exercício de minúcia admirável!

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  2. A realidade política e social no nosso país é, em tudo, diferente da de qualquer outro, mesmo que europeu e até, membro da UE. Pelo que, qualquer desenvolvimento que venha acontecer neste jogo de poderes, semelhante ao ocorrido noutro país, será sempre resultado de uma pura coincidência. As forças políticas no nosso país, agem, decidem e tomam posições, sempre subordinadas a interesses de vária ordem e nunca, a um ideal comunitário, a uma proposta de recuperação da economia e da situação financeira do país. Para mais, os comandos emanados sobretudo da Alemanha, que nos restringem, condicionam e obrigam a medidas descontextualizadas de um programa sério de recuperação e sustentabilidade. Em contrapartida, tem sido a mentira a rainha de toda a farsa que foi esta campanha eleitoral a todos os níveis, talvez por isso tenhamos voltado a assistir ao crescimento da percentagem de abstenção. Portanto, qualquer possível entendimento que venha a surgir entre partidos, inclusive os que formam a coligação, não irão passar certamente de um jogo de encenações, de malabarismos, de fintas e de esquivas. As negociações afiguram-se-me ao nível das que os turistas europeus estabelecem com os vendedores de tapetes marroquinos, quando lá se deslocam em turismo.

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  3. O importante é a ESTABILIDADE. Estabilidade na destruição de emprego e do aumento da precariedade, estabilidade na diminuição do nível de vida por cortes e diminuição nos salários, nas pensões e nas prestações da segurança social, e ainda estabilidade no agravamento dos impostos sobre os rendimentos do trabalho e pensões, estabilidade na degradação na educação, estabilidade na degradação nos cuidados de saúde, etc., etc., etc.

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  4. Lembrei-me agora deste poema de Manuel Alegre:

    Trova do vento que passa
    Pergunto ao vento que passa
    notícias do meu país
    e o vento cala a desgraça
    o vento nada me diz.

    Pergunto aos rios que levam
    tanto sonho à flor das águas
    e os rios não me sossegam
    levam sonhos deixam mágoas.

    Levam sonhos deixam mágoas
    ai rios do meu país
    minha pátria à flor das águas
    para onde vais? Ninguém diz.

    Se o verde trevo desfolhas
    pede notícias e diz
    ao trevo de quatro folhas
    que morro por meu país.

    Pergunto à gente que passa
    por que vai de olhos no chão.
    Silêncio -- é tudo o que tem
    quem vive na servidão.

    Vi florir os verdes ramos
    direitos e ao céu voltados.
    E a quem gosta de ter amos
    vi sempre os ombros curvados.

    E o vento não me diz nada
    ninguém diz nada de novo.
    Vi minha pátria pregada
    nos braços em cruz do povo.

    Vi minha pátria na margem
    dos rios que vão pró mar
    como quem ama a viagem
    mas tem sempre de ficar.

    Vi navios a partir
    (minha pátria à flor das águas)
    vi minha pátria florir
    (verdes folhas verdes mágoas).

    Há quem te queira ignorada
    e fale pátria em teu nome.
    Eu vi-te crucificada
    nos braços negros da fome.

    E o vento não me diz nada
    só o silêncio persiste.
    Vi minha pátria parada
    à beira de um rio triste.

    Ninguém diz nada de novo
    se notícias vou pedindo
    nas mãos vazias do povo
    vi minha pátria florindo.

    E a noite cresce por dentro
    dos homens do meu país.
    Peço notícias ao vento
    e o vento nada me diz.

    Quatro folhas tem o trevo
    liberdade quatro sílabas.
    Não sabem ler é verdade
    aqueles pra quem eu escrevo.

    Mas há sempre uma candeia
    dentro da própria desgraça
    há sempre alguém que semeia
    canções no vento que passa.

    Mesmo na noite mais triste
    em tempo de sevidão
    há sempre alguém que resiste
    há sempre alguém que diz não.


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