quarta-feira, 5 de janeiro de 2005

Escolha par(a)lamentar - II

O processo da escolha dos candidatos a deputados do lado do PS revelou, afinal, que até no sacrifício dos mais elementares princípios, os partidos do centro político são muito idênticos.
Impressiona-me particularmente o caso de Paulo Pedroso. Sobretudo porque a solução que foi encontrada para o seu caso, contou, pelos vistos, com a sua anuência.
Paulo Pedroso foi, como se sabe, despronunciado do chamado Caso Casa Pia. Não está a ser julgado, embora se encontre pendente de decisão o recurso interposto pelo Ministério Público do despacho que decidiu não o levar a juizo.
Sei bem que um dos princípios civilizacionais mais importantes, o de que todo o cidadão se presume inocente até decisão definitiva em contrário por órgão legitimado para condenar, anda pelas ruas da amargura, sacrificado às necessidades de alimentar de escândalos os media. Apesar de ser proclamado no artigo 32º da Constituição com esta inequívoca formulação: "Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa" e supostamente vincular todos ao seu respeito.
Pois bem. Num primeiro momento a federação distrital que nas últimas eleições o propôs para cabeça de lista agora entende que, porque envolvido naquele processo, não é boa liderança nem sequer boa companhia para os camaradas rosa que se apresentarão a sufrágio pelo círculo de Setúbal.
Recebida a batata quente, a direcção nacional do PS fez pior com a inacreditável cumplicidade do próprio: remete-o para um (julgam) discreto 10º lugar da lista!
Então o Partido que se apresenta como alternativa para Governar um Estado de Direito que tem uma Constituição onde orgulhosamente se proclama o princípio da presunção da inocência como tributo ao valor superior da liberdade, não retira todas as consequências desse princípio? Não acredita nele ou, mais grave, desconfia da inocência do seu militante que todos efusivamente abraçavam em pleno Parlamento aquando da sua libertação?
Qualquer que tenha sido a explicação para esta conduta (e todos sabemos qual ela é, na realidade) seria mais decente, imensamente mais decente, apresentar um presumido inocente ao eleitorado se se reconhece que nele se reunem as qualidades de um bom parlamentar, comprometendo-se o próprio por razões de ética política a renunciar de imediato, se procedesse o recurso do Ministério Público e, ainda que presumidamente inocente, fosse levado a julgamento.
Escrito isto pergunto-me, porém, se decência é palavra com significado para os actuais directórios partidários...


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