Na sequência da revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças, de uma forma ou de outra, já anunciaram as grandes linhas da política orçamental e financeira do Estado para a presente legislatura, que se poderão sintetizar nos seguintes princípios: o défice orçamental ultrapassará os 3% nos próximos anos, o défice de 2005 será de 6%, ajustado pela análise de uma Comissão presidida pelo Banco de Portugal, o Governo não recorrerá a receitas extraordinárias, a tendência para um défice próximo dos 3% advirá primordialmente do crescimento económico e da luta contra a fraude e evasão fiscal.
Ou me engano muito, ou daqui a quatro anos, com esta política, estaremos em situação pior do que hoje, em termos de défice, e muitíssimo pior, em termos de dívida pública.
Pelo que se conclui da política governamental, a diminuição da despesa pública não assume carácter prioritário: por um lado, o Governo desistiu de um défice dentro do limite máximo do Pacto de Estabilidade, que continua a ser de 3% do PIB e, por outro, o Governo pensa que uma tendência para se chegar a 3% será assegurada automaticamente pelo crescimento e pelo aumento das receitas.
Trata-se de um equívoco medonho, de que um dia destes tratarei.
Hoje, dia 25 de Abril, o Sr. Presidente da República deixou um doce olhar sobre este problema, na tradicional mensagem no Parlamento.
Ternura que contrastou com a dureza de 2003, em pleno Governo de Durão Barroso, quando disse que havia vida para além do défice e do orçamento!...
Dureza que reforçou, agora com sinal contrário, quando, em artigo no Expresso de 25 de Setembro de 2004, em pleno consulado de Santana Lopes, o Sr. Presidente dizia, e passo a transcrever:
“Portugal tem um problema de finanças públicas que se traduz em défices orçamentais elevados. Em percentagem do PIB, o défice público sem o efeito de medidas temporárias…passou de 3,2% em 2000 para 4,4% em 2001…e deverá ficar próximo dos 5% no corrente ano. Ora, sejamos claros, défices públicos continuados desta ordem de grandeza são dificilmente compatíveis, quer com os requisitos da moeda única, a que o país está vinculado, quer com as exigências de protecção social dos cidadãos, que terão tendência a acentuar-se no futuro por força, desde logo, do envelhecimento da população portuguesa”. E mais adiante: “…Não será igualmente a revisão do Pacto que irá resolver os problemas das finanças públicas portuguesas…Todavia, a maior flexibilidade na interpretação do Pacto não deve induzir menos rigor orçamental…”
Em síntese: o Presidente da República dizia que défices públicos de 3% a 5% são incompatíveis com as nossas obrigações na EU, enquanto agora pouco diz e o Governo insiste neles; o Presidente dizia que devia haver uma política de contenção orçamental, enquanto agora aflora o tema com inefável leveza e o Governo insiste que o crescimento tudo irá resolver; o Presidente dizia, com firmeza, que uma maior flexibilidade na interpretação do Pacto não deveria induzir menos rigor orçamental, enquanto agora passa pelo tema com a maior delicadeza e o Governo parte dessa mesma flexibilização para deixar cair a contenção da despesa!...
Temos ou não vida para além do orçamento, Sr. Presidente?
Meu caro, é o doce e irresistivel aroma da rosa em dia de cravos...
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