Está hoje em discussão na Assembleia da República as propostas de alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo visando adequar a organização do ensino superior aos princípios acordados entre os países europeus relativamente à reforma do ensino superior. À excepção do PSD, todos os partidos da oposição e o Governo apresentam propostas de alteração limitadas aos artigos e secções respeitantes ao ensino superior.
O PSD entendeu – na minha opinião, bem! – apresentar uma proposta de revisão geral da Lei de Bases colocando na agenda não só a reforma do ensino superior, mas a reforma global do sistema educativo.
Assinale-se, antes de mais, a coerência da posição do PSD, retomando a Lei de Bases da Educação que acabou vetada pelo Presidente da República.
Assinale-se igualmente a posição dos restantes partidos ao dar prioridade ao ensino superior e ao esquecer as reformas necessárias nos restantes graus de ensino. Quer queiramos, quer não, o único sinal que se retira desta posição é a da subalternização do ensino básico e secundário. É o sinal de que à urgência da reforma do superior se contrapõe a não urgência de reforma do básico e secundário. Este ficará para os “pequenos passos”.
Um último registo: o CDS-PP que havia subscrito a Lei de Bases da Educação, contenta-se agora em reformar o ensino superior.
À semelhança da posição do Sr. Presidente da República também estes partidos perdem autoridade moral para denunciar o “estado da educação em Portugal”.
Fica-nos a esperança de que em Bolonha ou qualquer outra cidade europeia emblemática se engendre um qualquer “processo” que nos faça avançar com as reformas necessárias.
Confesso que conheço mal as propostas do PS para cumprir o protocolado em Bolonha. Mas confesso tembém que sempre tive muitas dificuldades em compreender a necessidade de um "espaço único europeu de ensino sperior". Será porventura a minha visceral aversão à normalização a perturbar o entendimento e a arrastar-me para as profundezas da ignirância e da obscuridade anti-europeísta. Mas nesta matéria não vejo qualquer vantagem em abandonar as aquisições culturais das nossas academias em nome de uma pretensa uniformidade de critérios. Aliás, devo dizer que me dou mal com esta permanente tendência para tudo reduzir a um padrão, ignorando as tradições,as maneiras de ser, de aprender, de ensinar...
ResponderEliminarPor razões diferentes, acompanho as observações de Pinho Cardão no post sobre os "doutores de valor normalizado".
Para sair um tanto da obscuridade, fui ler o que alguns dos mais ilustres bem-pensantes dizem sobre a necessidade e interesse de Bolonha. Claro, muito claro, o texto de Vital Moreira, que elenca assim as vantagens da reforma:
ResponderEliminar"(i) aumentar substancialmente o número de pessoas com formação superior em Portugal, diminuindo o fosso que nos separa da média europeia; (ii) reduzir substancialmente a taxa de insucesso e de abandono no ensino superior, particularmente evidente nas formações de longa duração de acesso aberto, possibilitando a obtenção de um grau académico no mais curto tempo necessário, relevante em termos de saídas profissionais; (iii) facilitar o acesso a certas profissões onde os interesses corporativos fizeram elevar excessivamente os requisitos de formação académica; (iv) permitir aos jovens graduados entrar mais cedo na vida profissional, munidos de um grau de curta duração, mantendo a possibilidade de regressar mais tarde para obter um grau mais elevado, beneficiando inclusive dos créditos obtidos na actividade profissional; (v) e por fim maximizar as possibilidades de mobilidade entre escolas do mesmo país ou de países diferentes, e contribuir para a maior convergência possível a nível europeu dos graus nas mesmas áreas de formação e dos requisitos académicos para o exercício das mesmas profissões".
Será mesmo que as dificuldades de acesso ao mercado de emprego derivam da duração actual dos cursos superiores? E será crível que com a diminuição do tempo de obtenção do "canudo" se combate a deserção a este nível de ensino? Não revela esta postura uma preocupação quase obsessiva pela quantidade ("aumentar substancialmente o número de pessoas com formação superior em Portugal, diminuindo o fosso que nos separa da média europeia") e pouca pela qualificação académica e profissional? E quanto aos "interesses corporativos" em elevar a exigência de habilitações para ingresso em certas profissões, então não se verifica já, mesmo com cursos superiores de 5 anos de duração, dos maiores ratios de profissionais por 1000 habitantes em algumas áreas profissionais em relação aos restantes países da Europa, como é o caso paradigmático dos advogados?
Bom, vou ler mais, para ver se vejo a luz.
Ou então estudar para ser Doutor, agora que a coisa vai estar mais fácil e isto de viver torturado por tantas interrogações faz-nos sentir mal, sobretudo se pensarmos que os nossos europeus concidadãos - situados ali, na mediana europeia, esse padrão da felicidade terrena! - as não devem ter.
Desconfio porém que o grande problema do nosso sistema não é este, mas o completo desfasamento entre a natureza dos cursos superiores e as necessidades da sociedade futura, que é para essa que formamos gerações.
Ou não.
Mas que sei eu?
Vou mesmo esperar pelo doutoramento e depois volto aqui...
Ao ler este post e os respectivos comentários sou obrigado a recordar-me do longo e atribulado trabalho da Lei de Bases de Educação que acabou por ser vetada pelo senhor Presidente. Agora, e de uma forma ultra-rápida, é proposta uma alteração a fim de dar continuidade ao processo de Bolonha. E o resto? Quando é que vai ser alterado?
ResponderEliminarEu partilho da confusão de alguns dos comentadores. Depois de ler o esclarecimento de David Justino, continuo com uma questão que me parece central:
ResponderEliminarNão se trata, mais do que diminuir o tempo de formação, de baixar o nível da formação?
Só pode ser assim. Se uma licenciatura já era difícil de tirar em 4 anos, como vai ser em 3?
Se um doutoramento era difícil de tirar em 5 anos (pelo menos em Portugal) como vai ser em 3?
Parece-me que se trata de diminuir o grau de exigência da formação ou, em alternativa, de aumentar o número de 'chumbos' e desistentes.
Será assim tão bom, o Processo de Bolonha?
Só duas notas mais.
ResponderEliminar1ª - Pertinentíssima a questão colocada por adkalendas.
Mas o problema é (também) este: estão as nossas universidades preparadas para acrescer qualidade no ensino que se quer SUPERIOR com cursos reduzidos na sua duração? Soam bem as teses, impecavelmente expostas na revelação das vantagens da aproximação aos padrões europeus. Mas a realidade, meus caros, a realidade não pode nem deve ser obnubilada pelas pias intenções de quem quer estar sempre na "onda" do correcto. Sei do que falo, são mais de 25 anos de exercício de docência universitária...
Descontado o humor com que fiz o comentário ao post do David Justino (às vezes não resisto, mil perdões...), julgo que acontece com o processo de Bolonha o que tem acontecido em muitas ocasiões e em muitos outros sectores da vida nacional: o País, neste caso as academias, não se prepararam para esta dinâmica de "normalização" europeia dos diplomados por universidades e politécnicos. A tal que permitirá tudo o que de bom se assinalou que Bolonha trará.
Que não se preparou, é evidente. Mas agora pretende-se que a lei mude as coisas. Só que as coisas não mudam, quase sempre não mudam, porque o legislador quer que mudem. Acreditar que mudam porque muda a lei, é uma das muitas ilusões com que também se constrói esta "anarquia mansa" em que vivemos.
2ª - Não me esqueço do ensino básico e do secundário. Bem pelo contrário. Penso que é aí que temos de concentrar todos os esforços, porque não há ensino superior, à bolonhesa ou segundo qualquer outra receita, que resista à chocante falta de formação que se observa à entrada das universidades.
Apenas uma nota de humor:
ResponderEliminargostei da expressão de Ferreira d'Almeida, "ensino superior à bolonhesa".