A propósito do post do Pinho Cardão, onde o anúncio fala da "alegria dos velhos", lembrei-me de um texto muito interessante que li há uns tempos (já não sei onde...) sobre alguns dos conceitos (ou mitos) da actualidade. Um desses conceitos engloba um largo extracto social e inclui as pessoas que têm mais de 50 anos , que vão deixando a vida activa mas que são supostas manter-se saudáveis, dinâmicas, bem dispostas, rodeadas de filhos e netos muito felizes, enfim, com uma imagem pública de bem estar e felicidade. Entre os adultos e os velhos "nasceu" uma nova classe social, heterogénea, alvo das mais diversas ofertas da sociedade de consumo e, muito especialmente, de programas de lazer. Mas também de habitações para "seniores", de produtos de beleza para tirar os sinais denunciadores do envelhecimento, de linhas próprias de vestuário, enfim, uma lista crescente ou, por outras palavras, de uma oferta crescente para esse novo segmento de mercado.
Essa fase da vida assim rebaptizada é apresentada como que uma nova oprtunidade de viver, já livres dos encargos do trabalho, já com as preocupçaões familiares resolvidas, em resumo, já com o direito e as condições para colher o que se semeou.
À antiga"terceira idade" já não se chama "velhos", mas "seniores" ou seja, pessoas bem instaladas, que não só não dão problemas nem exigem atenções especiais, antes podem e devem gozar a vida e a liberdade reconquistada.
O pior é que se deixa de ser "senior" quando se perde essa independência e se frustram as expectativas comerciais que contavam com esses consumidores. Para os doentes, os sozinhos, os que não têm meios económicos para aparecer sorridentes e bem dispostos, continua a reservar-se a palavra "velho". Não como sinal de respeito ou de merecido descanso, mas como sinal de exclusão de um mundo-maravilha que parecia feito à sua medida. E então, por pudor, para esconder essa realidade que não se quer encarar, a palavra "velho" foi sendo empurrada para as franjas do esquecimento,como se não valesse a pena perdermos muito tempo a lembrar que "eles" existem...
É por isso que o anúncio encontrado pelo Pinho Cardão aparece como um pouco estranho - é que, na nossa linguagem crua da modernidade, já pouco se encontra um produto destinado "à alegria dos velhos". A imagem hoje seriam dois seniores, muito direitos e bem vestidos, a mulher não estaria atrás mas ao lado de mão dada, a mesa posta num relvado muito verde na casa de campo.
Dos velhos não se falava.
É verdade, é muito interessante ver essa evolução e perder algum tempo a pensar no seu sentido. Outro dia ouvi uma pessoa dizer que ia "socializar" em vez de dizer que ia ter com o grupo de amigos...
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