domingo, 25 de setembro de 2005

Um buraco à esquerda

O anúncio da candidatura de Manuel Alegre coloca o problema de se saber a quem se dirige e quem pretende representar.

Não será de todo em todo despropositado lembrar que a decisão de Manuel Alegre parece ter sido “empurrada” pela última sondagem da Aximage, cujos resultados revelam que a sua candidatura vai buscar quase metade dos seus votantes aos indecisos, quase um quarto a Mário Soares e cerca 1,5 pontos percentuais a cada um dos restantes candidatos em presença.

A tese de que Manuel Alegre retira a vitória a Cavaco Silva na primeira volta não colhe: lendo os resultados, o cenário 2 introduz, para além de Manuel Alegre, um hipotético candidato chamado Paulo Portas e é este que poderia contribuir para a existência de uma segunda volta. A tese poderá ser utilizada para desculpar a “traição socialista” de Alegre, mas não tem qualquer fundamento. O único fundamento da sua decisão é a de poder capitalizar a falta de identificação de alguma esquerda socialista com Mário Soares.

Porém, o que me parece mais saliente é o facto de a esquerda socialista, mais ou menos radical, ter de escolher entre, pelo menos, quatro candidatos (Soares, Alegre, Jerónimo e Louça). A direita e o centro apresentam-se unidos em torno de Cavaco Silva. Fica, assim, a faltar um faixa do eleitorado que poderá decidir uma vitória de Cavaco à primeira volta ou o recurso à segunda volta.

Essa faixa é o que poderemos designar de “esquerda moderada” que sociologicamente se identifica com a vitória e o programa de Sócrates nas últimas eleições legislativas. Conclui-se facilmente que este eleitorado não tem candidato natural (fugiu-lhes Guterres e Vitorino). Nem o eleitorado nem o próprio projecto político de Sócrates. Ambos ficam órfãos a não ser que Cavaco Silva tenha a capacidade de os convencer e adoptar. Não seria a primeira vez que o faria e por certo não será a última.
[Actualização]
O editorial de Nuno Pacheco no Público de hoje retoma a tese de que a entrada de Manuel Alegre na corrida presidencial retira a hipótese de vitória a Cavaco Silva, logo na primeira volta. O título é sugestivo: "Vamos lá à segunda volta". Trata-se de um bom exemplo para diferenciar o que é análise política do que é "wishful thinking". Pelos vistos, há também editorialistas cuja missão é "combater o candidato da direita" e potenciar a lógica bipolar da "esquerda-direita" tão ao gosto da esquerda socialista. Eles bem tentam, mas duvido que Cavaco vá na conversa.

9 comentários:

  1. Temos de admitir...o homem apesar de se ter acobardado no ínicio acabou por demonstrar que até "os" tem no sítio... Só por isso tenho de louvar a sua atitude...e merece mais respeito e admiração que todos os outros candidatos da esquerda juntos! Isto é uma Alegria...

    Este não deixa de ser de facto um Rectangulo das Surpresas à beira mar plantado... e mais piada ainda teria se o Prof.CS viesse no final dizer que não se iria candidatar... aí é que a direita ficaria de calças na mão... Mas como todos nós sabemos não vai ser bem assim (pois não????)!

    Quanto a ideias positivas é que infelizmente este novo candidato da esquerda em vez de apresentar uma candidatura pela positiva (podia ser que até acabasse por ganhar mais alguns votos) comete o erro crasso de todos os outros candidatos...ou seja, a ideia base da sua candidatura é a de derrotar o Prof.CS, o que convenhamos que para um lugar tão importante como o de Presidente da República não deixa de ser um pouco triste.

    Até agora o único (possível) candidato que não tem feito comentários pela negativa tem sido o Prof., que nem uma única vez o ouviram dizer que se se candidatar será para derrotar a esquerda, ou o candidato x ou y, mas sim para ajudar o país a encontrar o equilibrio que tanto precisa... e é por aqui que ele lá vai chegar!... Se ele vier...

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  2. Perante tantos e tão profundos problemas que o país atravessa não deixa de ser estranho os candidatos presidenciais da esquerda terem apenas como principal objectivo … derrotar a direita. Até Alegre que se assume como “representante” dos que não se revêem nos partidos parece ter pouco mais a oferecer. Estranho não?

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  3. Viva, Prof. Faustino!

    De modo geral, sou levado a concordar com as considerações que tece neste seu post.

    Creio, todavia, que lhe faltou analisar uma vertente, que julgo de extrema relevância, qual seja a de, mais do que saber se Cavaco Silva vence ou não à primeira volta, importa saber se Cavaco Silva vence. Tout court.

    Tal vertente e tal questão alicerçam-se na comezinha circunstância de haver muitos eleitores de Direita - curiosa e principalmente do PSD - que estão "fulos" com Cavaco Silva, tanto pelos danos que objectivamente tem causado ao Partido - e à área política em que se movimenta - em várias ocasiões, por omissão, mas também, e principalmente, por acção.

    Tão fulos, tão avessos a suportá-lo, que certamente não irão nele votar nem que a "vaca tussa"!

    Pode crer, Professor, que há imensos eleitores que, tendo sido do espectro de Cavaco Silva, digamos assim, de há anos para cá têm vindo a deixar de o ser e, mais acentuadamente, de há um ano para cá. Há muita gente que jamais esqueceu a traição de que ele foi capaz contra Fernando Nogueira, em plena campanha eleitoral para as legislativas vencidas por Guterres. Mas igualmente também não foi esquecida a intervenção política, pouco frontal, insidiosa, por que optou contra o governo liderado por Santana Lopes, a quem se fez o que nem a Sá Carneiro alguma vez alguém pensou fazer sequer.

    Entre os militantes do PSD, maxime, é notório esse afastamento, essa aversão a um homem que renega "os seus", chegando mesmo a impudicamente os apunhalar pela calada da noite, em vielas escusas, talvez por (peço desculpa pela crueza do termo, mas, quando menos, assim parece) néscia convicção de que os que perde entre os seus serão compensados pelos que ganha entre os outros. O que, bem sabemos, não passa de papa e bolo para enganar...

    Além disso, tantas vezes o cântaro vai à fonte que um dia lá deixa as asas. E CS levou o cântaro demasiadas vezes à bica e com injustificada displicência, mesmo laivos de sobranceria pouco avisada, menos inteligente, quiçá.

    Na verdade, o comportamento de Cavaco Silva, desde sempre, mas especialmente no último ano, manifestou-se muito lesivo dos interesses do PSD e, principalmente, do País, com a agravante de não se justificar sequer com o egocentrismo do benefício próprio.

    E o "crime" não pode compensar. Como não compensará, certamente.

    Esta animosidade contra a postura de Cavaco Silva, tanto no interior do PSD como no eleitorado social-democrata e não social-democrata, mas da área, é fácil de constatar. Bastará que se assista a assembleias de secção e se ouçam as conversas de rua, de café, de tertúlias, para tal se perceber.

    A tudo isso, que já não é pouco, acresce a persistência - que mais parece já teimosia pouco esclarecida - em algo que, logo à primeira, lhe trouxe maus resultados, ou seja, a abstrusidade dos tabús.

    "A malta", Professor, está farta de wise-guys playing smart-performances! Porque a política não é isto, não pode ser isto. E se o foi ou é ainda por algum tempo, tempo virá - e não tão longínquo com se suporá - que definitiva e irremediavelmente deixará de o ser. Para bem de todos os portugueses, até para que se perceba que alguns serão pouco esclarecidos durante algum tempo, outros serão pouco esclarecidos o tempo todo, mas não passa pela cabeça de ninguém com um mínimo de senso comum que seja possível que todos sejam pouco esclarecidos o tempo todo.

    No entanto, Portugal está cheio de políticos que, como Cavaco Silva, ainda o não perceberam. Vão perceber, porém. Mais cedo ou mais tarde, a custo menor ou maior, hão-de perceber.

    E talvez aprendam também a não sonharem com miríficas sondagens, preparadas e apresentadas para obterem determinados efeitos que, como se sabe, são, por via de regra, contrários aos desígnios da "nossa área".

    Apresento-lhe cumprimentos e peço-lhe desculpa pelo longo laudo.

    Ruben Valle Santos

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  4. Caro Ruvasa,

    estou inclinado a fazer minhas as palavras de djustino...

    Até porque não sei em que cafés V.Exa se passeia, mas certamente não serão os do comum português médio, e também não sei em que PSD's se mexe e conhece, mas também não será certamente nas bases do PSD que já o fizeram o grande partido que foi, e que esperemos um dia volte a ser para bem da democracia.

    Aqueles PSD's que v.Exa. se refere são aqueles barões que não gostaram de ver os seus feudos ameaçados e "abanados" pela clara descolagem do Prof. às grandes asneiras que o PSD fez nos seus últimos tempos de governação, e que o levou à sua pior derrota de todos os tempos em eleições legislativas (ou já se esqueceu disso???), e o porquê desse descalabro eleitoral? Porque os líderes do PSD de então "esqueceram-se" dos que os elegeram e do que prometeram defender, enveredando pelo caminho que sempre foi mais apanágio do PS que do PSD...

    Para concluir apenas posso dizer que se CS se candidatar, a questão da vitória não me parece muito premente... apenas a questão do "por quantos" vai ser a grande incógnita!...

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  5. Grande Dr."D"!...

    Se a inveja matasse, eu já estava esturricadinho no chão.

    Sinceramente, não sei como conseguem ser tão diplomáticos e politicamente correctos. Mas enfim, como diria alguém «são muitos anos a virar frangos».

    No que respeita ao tema em debate, vou-vos ser muito honesto. Sou grande adepto do Prof. CS, no entanto, acho que ele não se devia candidatar. A razão é muito simples, caso ele apresente a candidatura, vai estar a legitimar esta grande palhaçada em que se transformaram as eleições Presidênciais, pondo em causa a sua própria credibilidade.

    Na minha opinião (e as opiniões valem o que valem), é a sua credibilidade que o transforma num lider, é a sua credibilidade que faz com que cada vez que ele abre a boca, toda a gente se cale para ouvir o que tem a dizer e foi a sua credibilidade que lhe deu duas maiorias absolutas quando todos acharam que isso não era possível. A verdade, é que as pessoas acreditaram na visão que ele tinha daquilo que devia ser o futuro do país, mesmo quando essa visão implicou uma série de sacrificios.

    É claro que nunca se pode agradar a gregos e troianos, e vozes dissonantes aparecem em todo o lado, mas até essas vozes se calam cada vez que ele tem alguma coisa a dizer mesmo que seja para depois contrariar tudo o que foi dito. Só que até para tal, têm de lhe prestar bastante atenção.

    Assim, para mim, a questão é; se o Prof. CS aderir ao circo que se encontra instalado no país, vai transformar as eleições Presidênciais num confronto entre esquerda e direita quando não é disso que se trata. Para além disso, todos sabemos que quando se trata de um confronto entre esquerda/direita, a tendência vai para a esquerda. Porquê? Porque é o "socialismo" que permite a existência e proliferação dos mecanismos estatais que "tomam conta" do cidadão sem este ter de se esforçar para fazer o que quer que seja. Nós aqui nem sequer estamos no âmbito da teoria da "safety net" defendida por Hayek, estamos mesmo no âmbito dos beneficios sociais à força toda quer seja, estruturalmente, possível ou não. Mais, num país extremamente envelhecido é natural que os cidadãos queiram e exijam ter beneficios sociais, porque foi isso que sempre lhes meteram na cabeça desde a altura do «tio» Oliveira.

    Não é preciso possuir um Q.I superior a 15, para perceber que os presentes candidatos estão-se nas tintas para o país. O alvo é o Prof. CS e esta é a primeira oportunidade que têm de espantar os fantasmas que lhes estão atravessados desde 1995, quanto ao país logo se vê.

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  6. Viva, Vírus!

    Não pretendia voltar ao tema. Na verdade, não voltarei.

    Limitar-me-ei a dizer-lhe que o seu post me fez lembrar alguns benfiquistas quer andam sempre de benficómetro em riste, para ver quem é mais benfiquista ou menos benfiquista.

    Nessas brincadeiras, lá se foram perdendo e, actualmente, o Benfica é uma sombra do que foi. E nem os esforços dos actuais dirigentes têm conseguido retorná-lo à condição anterior.

    Pois bem, a sua atitude assemelha-se muito a essa postura. Se tal lhe causa tanto agrado assim, sirva-se à vontade e seja o maior dos social-democratas, frequente as assembleias e as tertúlias mais social-democratas do que as de toda a gente, reclame para si o exclusivo do pensamento e do sentir dos social-democratas.

    Permita-me apenas que lhe faça notar uma circunstância, também ela comezinha: não era disso que tratava o post do Prof. David Faustino nem tão pouco o meu comentário.

    Cumprimento-o efusivamente, por o saber tão excelso social-democrata. E, de tal modo, que - embora pressentindo que era já social-democrata inscrito e muito actuante quando o Amigo viu a luz do dia pela primeira vez - nem me atrevo a exibir os meus trunfos.

    Finalmente, lamento não poder saber quem o Amigo é, por o encontrar subreptício atrás de uma máscara, circunstância que não é propriamente atributo que conste do aparelhamento de social-democrata que se preze. Falhas inesperadas...

    Desculpe, Prof. David Faustino, este comentário, um pouco fora da norma geral do blog, mas há viroses e anthraxes, provenientes dos mesmos "laboratórios" que...

    Foi uma vez sem exemplo, creia.

    Ruben Valle Santos

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  7. «Desculpe, Prof. David Faustino, este comentário, um pouco fora da norma geral do blog,»... É "Justino", Ruvasa. Não é "Faustino". É uma indelicadeza tratar as pessoas pelo nome incorrecto, mas entende-se que tenha sido um lapso.

    «(...)mas há viroses e anthraxes, provenientes dos mesmos "laboratórios" que...»... dão cabo da "cumbersinha" toda, é o que é.

    É de facto aterrador quando se resolve passar por cima do politicamente correcto. Considere-o como um estado de sublevação do espírito.

    Mas de qualquer forma,tem toda a razão. Nós os dois vimos do mesmo laboratório.

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  8. Viva, novamente, Prof. David Justino!

    Peço-lhe que me desculpe por tê-lo rebaptizado. Não era minha intenção, como certamente reconhece, tal como não foi sua intenção quando, tempos atrás, me rebaptizou também.

    Nem eu, dessa vez, recalcitrei, nem o senhor, nesta oportunidade, o fará. Há coisas que não conseguem fazer com que percamos tempo, porque de minimis non curat praetor.

    Cumprimento-o

    Ruben Valle Santos

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  9. Concordo com a sua análise.
    Apenas as seguintes achegas:

    O PS andou vinte anos atrás de uma maioria absoluta. Apenas a conseguiu este ano e à custa do eleitorado que tinha votado PSD anteriormente.
    A presente eleição demonstrou uma fixação clara do eleitorado aos extremos do espectro político, repare que CDS naõ perdeu significativamente, BE aumentou e PCP manteve-se.
    A fixação explica-se pela conjuntura política, a maioria pode ser explicada pelo facto do eleitorado decisor ter optado por uma postura pragmática, ou útil.
    Nesse sentido, Prof Cavaco Silva (CS) bvai beneficiar do apoio do extremo, do eleitorado natural do PSD e do pragmatismo do eleitorado decisor, ergo, vitória à primeira volta. A pergunta pode ser: para quê uma segunda se ele é o melhor e assim perdemos menos tempo?
    Acresce que, nem que Lenine voltasse do alêm, o arquimandrita ortodoxo, camarada Jerónimo, consegue que os seus fiés votem, em bloco no nosso califa favorito Dr Mário Soares.
    Assim sendo...
    Cumprimentos
    Adriano Volframista

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