segunda-feira, 31 de outubro de 2005

A Terapêutica-V


Traçado, nos quatro textos anteriores, o diagnóstico da economia e das finanças públicas, chegou o momento da terapêutica, no quadro de uma visão liberal, de um afastamento gradual do Estado interventor e no contexto do Orçamento de Estado, já que outras medidas são possíveis no âmbito mais largo das políticas públicas, sem recorrer ao OE.
Perante uma economia caracterizada por serem o consumo público e o consumo privado os indutores do seu débil crescimento, já que as contribuições do investimento ou da balança comercial são negativas, o Governo aumentou os impostos, há três meses o IVA e, no OE para 2006, vários outros, quer o IRS, quer o referente aos combustíveis, automóveis e muitos outros.
Trata-se de uma terapêutica absolutamente errada.
Com os consumidores a atingirem o endividamento alarmante de 120% do rendimento disponível e o consumo privado a ser o motor da economia, o desagravamento de impostos seria a terapêutica adequada para dar algum fôlego ao consumo e, nas circunstâncias descritas, favorecer algum crescimento económico.
Também com o actual nível de investimento negativo, o desagravamento de impostos seria a medida mínima a adoptar.
E com a falta de competitividade revelada pela economia, o desagravamento de impostos constituiria um tónico de valor determinante.
Mas o Governo decidiu que os cidadãos deveriam transferir mais dinheiro para o Estado (fomentando uma maior aplicação irracional de recursos, tantas vezes em obras inúteis, mas que dão honra e glória a muitos Ministros), em detrimento da aplicação, comprovadamente mais útil e racional desses recursos por aqueles que os geraram, em investimento, poupança ou consumo privado.
Os Governos que assim agem, e também o nosso, explicam que a redistribuição dos recursos retirados à economia se destina, no final de contas, a relançá-la, através dos “pacotes” clássicos de investimentos públicos.
É óbvio que, desta maneira, tal relançamento não irá acontecer.
Por um lado, porque os problemas da economia não se colocam do lado da procura, mas do lado da oferta, da falta de competitividade da oferta, como o denotam o elevado nível das importações e o definhamento das exportações.
Mais impostos significa menos competitividade e menos capacidade de modernização, situação que não será resolvida por mais ou menos TGVs ou mais ou menos OTAs.
Portanto, a terapêutica correcta, no quadro orçamental, seria, não o aumento de impostos, mas a sua diminuição, mesmo que simbólica, e a substituição dos investimentos públicos clássicos em bens não transaccionáveis (aeroportos, etc) em apoios a políticas públicas que visassem as empresas, a sua modernização e reorganização, bem como a competitividade e a inovação, única forma de assegurar o crescimento económico e do emprego.
Veremos seguidamente a terapêutica das Finanças Públicas.

5 comentários:

  1. Cara jessica klarkson,

    Nunca um comentário automático caiu tão bem....:-)

    Caro Pinho Cardão,

    Não sendo fundamentalista para não estragar as convicções a ninguém, o pacote de investimento público não é necessarimente mau. Há quem o faça bem. Mas há uma diferença substancial entre investimento público e deitar dinheiro ao lixo, coisa que na contabilidade pública não faz a menor diferença, como tem vindo a 'postar' muito bem.
    Como diria a Ferreira Leite, 'parem de chamar investimento às rotundas!'. Infelizmente, o PIB cresce com os dois no curto prazo, a receita fiscal também, o que fez de muito imbecil neste país um 'mago do crescimento económico'.

    Eu passava o problema para a incapacidade do estado português em entregar valor com os investimentos que faz. E pegando também na discussão dos cérebros, lembro-me que a OTA, por exemplo, era justificada por uma carrada de iluminados de Lisboa à Carolina do Norte fazendo a correlação entre o investimento público em infraestruturas e o crescimento do PIB, como se o território português fosse infinito. Como não é, cada km a mais de autoestrada tem um impacto decrescente, como é óbvio para quem não quer terraplanar o país. E a questão é tão simples de colocar:'É o nosso problema um problema de comunicações?'

    Tudo isto para semi-concordar no fim. Não, investimento público não é necessariamente mau. E sim, este público só faz maus investimentos e, logo, largue o dinheiro nas mãos de quem sabe, por definição, do que precisa: nós.

    ResponderEliminar
  2. Caro Pinho Cardão,

    Este comentário não tem nada a ver com o seu "post", mas é igualmente importante. Sou eu que tenho a sua caneta e está guardada. Depois terá de me dizer como é que a posso devolver.

    ResponderEliminar
  3. Posso sim senhor. Amanhã (4ª-feira) lá estará ela à sua espera. Nós ficámos foi um pouco preocupados porque não queríamos que pensasse que a tinha perdido.

    ResponderEliminar
  4. Caro Pinho Cardão,

    não fosse a hora de colocação deste post até parece que esteve no centro da amena cavaqueira que tive a oportunidade de ter com dois dos ilustres convidados na inauguração da Livraria. Sem tirar nem pôr é exactamente o que eu disse... aliás atendendo à hora da conversa e do blog até parece plágio da minha parte...

    Caro Tonibler,
    É exactamente isto que eu gosto em si e nas suas análises, eu discordo quase sistemáticamente de si, sem nunca conseguir verdadeiramente discordar. É impressionante, são raras as pessoas que conseguem fazer isso comigo, e o caro colega fá-lo com uma mestria assutadora.

    Equlibrio... é o que faz falta "para animar a malta!...". Mais houvesse assim.

    Só para rematar, e como eu dizia ontem, eu até nem me importava que os impostos sobre as empresas mantivessem o actual nível, sob condição de se reduzir drásticamente (se não mesmo eliminar por completo) os impostos sobre pessoas singulares (mantendo-se óbviamente as contribuições sociais). Sendo que os impostos sobre pessoas singulares resumir-se-iam aos impostos sobre o consumo (IVA e impostos especiais-ISPP, Tabaco, alcóol, etc.) e os impostos sobre bens registados em nome de particulares (casas, barcos, aviões, casas, etc. e tal) independentemente do seu nível de rendimentos e idade.

    Resumindo, as pessoas tinham um rendimento disponível maior para consumir/investir. Quando consumissem pagavam impostos aos quais é quase impossível fugir, quando investissem iriam pagar os impostos relativos a esses investimentos que fariam com o objectivo de melhorar o seu nível de vida (criação de empresas, compra de casas, carros, etc.). No meio disto tudo o Estado saía a ganhar, pois desenvolvia a economia, recebia mais dinheiro em impostos aos quais quase ninguém conseguiria escapar (quantos de nós não sabem como esconder rendimentos, agora vão lá tentar esconder uma casa ou um carro, ou uma empresa).

    Mas tudo isto era um abanão no sistema instituído... e demoraria alguns anos a transição, mas depois de feita... era só vantagens para o Estado e para a máquina fiscal.

    ResponderEliminar
  5. 1.A primeira grande questão é apenas sabermos se "nos aguentávamos" seguindo esse caminho no imediato. A Reforma do Estado e do papel Social do Estado não é possivel dum dia para o outro.E o Estado tem que pagar os seus compromissos.Sem dinheiro como era? Despediam-se os funcionários e não se lhes pagava idemeinzações nem pensões? Deixavam-se de pagar as pensões? Acabava-se com o Sistema de Saúde? Com atropa? Com a polícia? Com os tribunais?

    2.Creio que perante uma situação de emergência finaceira o Governo não tinha outra hipótese com Ferreira Leite não teve.

    3. Mas a grande questão, que há muito defendo e que Pacheco Pereira comça agora a levantar, é a de uma profunda Reforma conceptual do Estado Social e do Papel do Estado. Mas para a implementar é preciso ter ideias precisas de como o fazer sem criar roturas sociais. O PS já marcou op seu campo: A defesa dos Serviços Públicos Públicos. É importante que o PSD marque aquele que entendo que deve ser o seu: Serviços Públicos prestados por privados com base em tabelas sociais concertadas.

    5. Era importante que o PSD tivesse as suas propostas muito bem preparadas para as poder implementar em dois anos. Então sim poderíamos baixar os impostos

    António Alvim

    ResponderEliminar