A minha menor assiduidade no 4R tem um culpado: processo de Bolonha. Ainda mal refeito de dez anos de exercício de cargos políticos, dediquei-me de alma e coração a um autêntico processo de “reinserção social” no meio académico. Para além de ter retomado o ansiado contacto com os alunos, esperava dedicar o remanescente da minha agenda a investigar e a produzir alguma ciência de forma a recuperar nos próximos dois anos o que andei a desperdiçar em cerca de sete ou oito. Não seria uma missão impossível caso a vida académica não fosse além do que é fundamental: investigar, ensinar, formar. Só que a vida académica tem, cada vez mais, outros imperativos.
Em primeiro lugar, a responsabilidade de voltar a dirigir um departamento, cerzir um tecido macerado pelo conflito e pela dificuldade de cooperar cientificamente, dar despacho às resmas de papel e requerimentos que nos depositam diariamente na secretária, participar em dezenas de reuniões onde ouvimos os mesmos lamentos, detectamos os mesmos vícios identificados há dez ou vinte anos e de onde saímos com o sabor amargo do tempo perdido.
Em segundo lugar, o desafio da adesão ao processo de Bolonha, esse desígnio que uma vez mais a Europa nos coloca para que tenhamos a oportunidade de pormos a casa em ordem. As últimas semanas passei-as em reuniões onde se reconfiguraram currículos, distribuíram-se créditos, identificaram-se competências. Criaram e reconverteram-se cursos, disciplinas, áreas científicas, matrizes de 1.º e 2.º ciclos. Eu sei lá …
Depois de tudo isto não consigo ultrapassar os “mixed feelings” que me atormentam: parece que tudo tem de mudar para que tudo fique na mesma. É dramático!
Caro djustino,
ResponderEliminarCom a ressalva de que sou um sujeito que não percebo nada disto, cheira-me que os esforços de adaptação do ensino superior a Bolonha são fundamentalmente colocar aquilo que se fazia em 4 anos, em 3, pôr as culpas o legislador por tal facto e encontrar utilidade para o mesmo número de professores e matérias por mais inúteis que sejam. Pode ser que lá a "sua" casa seja uma excepção, mas nas outras...
Oxalá(expressão difícil de utilizar nestes últimos dias)o processo de Bolonha não venha a traduzir-se em mais um logro para o nosso Sistema Educativo. Haverá sector mais desanimador para a nossa experiência democrática de Abril ? Quantas reformas, quantos métodos, quantos processos já se experimentaram, com os pobres resultados conhecidos ? Já alguém saiu responsabilizado deste enorme insucesso processual ? Dois graus de Ensino, o Primário e o Secundário, em completo caos permanente, com taxas de insucesso vergonhosas, apesar dos baixos padrões de exigência ; um grau superior, que se desvaloriza em grande percentagem, mesmo se mantém ilhas de excelência; um mar de cursos sem credibilidade científica e/ou pedagógica, que ninguém consegue travar; enfim, um quadro negro, continuamente diagnosticado, mas pouco ou nada melhorado.E se passarmos aos restantes sectores da sociedade portuguesa : à Economia, à Indústria, à Agricultura, às Pescas, à Justiça, à Saúde, à Defesa, que poderemos dizer ? Ai, Portugal, Portugal, como te haveremos de ver no futuro ?
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ResponderEliminarCaro DJustino,
"Bolonha", pelo potencial transformador de mentalidades e processos, será talvez uma ultima possibilidade de, com nexo, reformar o decrépito ensino superior em Portugal e definitivamente transforma-lo em algo de efectivamente útil para o País.
"Bolonha" vale, sem dúvida, todo o seu esforço e empenhamento.
Cumprimentos,
Antonio Felizes
http://regioes.blogspot.com
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Caro David Justino
ResponderEliminarEsse sentimento de que fala, "parece que tudo tem de mudar para que tudo fique na mesma. É dramático!" é o mesmo que nós, professores dos ensinos básico e secundário, sentimos quando há uma reforma. E elas sucedem-se.
E as práticas? Reformam-se?
Caro Dr. "D",
ResponderEliminarVi-o falar sobre o processo de Bolonha e tive de aqui vir meter a colherada.
Relativamente a este assunto sabe há quanto tempo estão preparados os dossiers dos promotores de Bolonha? Há pelo menos 2 anos. Sabe há quanto tempo está pendurado o despacho? Há pelo menos 2 anos também. Sabe o que é que acontece cada vez que vamos às reuniões em Bruxelas? Desata-se tudo a rir quando olham para nós e dizem "Ah sim, Portugal é o costume, ainda está à espera" e passam à frente. É que nós curtimos "buézes" fazer estas figuras nas reuniões da Comissão. Aliás, aquilo que nós gostamos mesmo é, depois de fazermos todo o trabalho que nos é solicitado, que os despachos Ministeriais fiquem pendurados por causa das guerras de quintal e outras coisas afins.
Ah sim, e também ficamos loucos de alegria quando depois de termos feito todo o trabalho de sapa, vem um funcionário público iluminado e diz: "Agora, vamos dar isto a outros e fazer tudo do início", sem nunca ter havido um despacho inicial. A sério, isto tem a sua graça, porque depois quem tem de ir dar a cara às reuniões, somos nós. Mas ei! Ao menos divertimos os convivas e sempre vamos passear a Bruxelas à pala do erário público.