terça-feira, 8 de maio de 2007

A (In)Segurança Social dos "Sem Abrigo"

Num País em que as desigualdades sociais são imensas e imensamente perturbantes o Dia da Segurança Social deveria ser motivo para não as omitirmos e antes assumi-las frontalmente.
Penso muitas vezes nos "Sem Abrigo", nestas pessoas tão desprotegidas e tão "sem vida", nesta realidade absurda que vive à nossa porta, que raramente damos por ela e sobre a qual ouvimos falar mas sobre a qual pouco sabemos.
Qual de nós é que já não tropeçou num "Sem Abrigo"? É deprimente e chocante a degradação da condição humana em que muitas destas pessoas vivem. Pensar nos "Sem Abrigo" neste Dia da Segurança Social é lembrar a sua existência, com a esperança de que a nossa Segurança Social se aplique para integrar e recuperar estas pessoas tão "desabrigadas" da vida.
As pessoas "Sem Abrigo" abarcam diversas situações, mas na maioria dos casos são assimiladas a pessoas "sem-tecto". Um estudo recente realizado pelo Instituto da Segurança Social dá conta que existem no País 1044 pessoas "sem-tecto" (números de 2005). O fenómeno é essencialmente urbano, com uma concentração em Lisboa e no Porto. São sobretudo homens em idade activa, solteiros e divorciados, de nacionalidade portuguesa, com escolaridade básica. Os principais motivos para esta situação prendem-se com problemas familiares (por exemplo, rupturas conjugais), de saúde (por exemplo, toxicodependência) e de desemprego.
A maior parte dos "Sem Abrigo" entram num círcuclo vicioso de exclusão social, porque a degradação de condições físicas e mentais são entraves à sua inserção profissional e inibidoras de procura de trabalho. A sua degradação social conduz como que a um "beco sem saída".
O não ter direito a um subsídio de desemprego ou a uma pensão social agudizam a precariedade económica, o recurso à mendicidade ou a situações ilícitas.
As instituições de solidariedade social são as entidades que prestam maior apoio, de carácter pontual, em especial na satisfação de necessidades básicas como a alimentação, o vestuário e a higiene diária.
São marcadamente deficitárias as ajudas com carácter estrutural, que passam designadamente pelo acesso a uma habitação, à inserção profissional, à formação, a programas ocupacionais e à resolução de problemas de saúde. São estas ajudas que necessitam de uma maior e melhor resposta por parte da Segurança Social – através da contratualização com instituições de solidariedade social – sem a qual não é sério pensar que o círculo vicioso de vida das pessoas "Sem Abrigo" possa ser quebrado.

7 comentários:

  1. "Penso muitas vezes nos "Sem Abrigo", nestas pessoas tão desprotegidas e tão "sem vida", nesta realidade absurda que vive à nossa porta, que raramente damos por ela e sobre a qual ouvimos falar mas sobre a qual pouco sabemos."
    Será que num espaço de tempo inferior a uma geração, se perdeu completamente o sentido de entreajuda, de solideriedade humana?
    Quando era criança, lembro-me de às 5ªs-feiras, em minha casa, ser habitual distribuir pelos necessitados que batiam à porta, sopa e meio pão saloio, geralmente recheado de uma fatia de carne assada. A minha mãe nunca oferecia dinheiro, para além do alimento, nas situações que lhe pareciam de maior carência, ela rebuscava aquelas roupas que tinham deixado de servir, ou estavam mais velhas. Aqilo que estou a relatar enquadra-se na realidade de uma família de escassos meios financeiros e de origens humildes. Esses aspectos, ou talvez devido a eles, a consciência das dificuldades era mais real e a vontade de ajudar com o pouco que sobrava era mais forte.
    Hoje, consciente das situações degradantes em que um já grande numero de pessoas se encontra, penso. Não haverá uma forma coerente e efectiva de se melhorar as condições de vida de todas as pessoas que não têm abrigo e não têm alimento?
    Vem-me à memória o intendente de policia ao tempo do marquês de pombal, pina manique. Naquele tempo grassava na cidade a indigência, a mendicidade e a criminalidade. Pina manique resolveu estes problemas sociais, prendendo quem encontrava nas ruas e estivesse nestas situações. Mas o acto de pina manique, não se resumiu a prendê-los, ele pensou ainda na forma de os tornar uteis, de os readaptar socialmente. Estamos a falar de ha 3 séculos atrás. Hoje, ao passar por certos locais da cidade, onde se encontram edifícios militares que deixaram de estar activos, penso: bastaria um destes edifícios para albergar condignamente apetrehados os mendigos e excluídos que deambulam e dormem pelas ruas.
    É certo que esta reforma teria um custo para o estado, mas, para além dos resultados benéficos que seriam obtidos reabilitando a maioria daquelas pessoas, criando-lhes a mais valia de se tornarem uteis e produtivas, creio que o estado daria uma imagem e um exemplo interno e externo de um governo humanista e respeitador dos direitos humanos.
    Depois penso, se todos estes seres humanos desatassem a cometer crimes, seriam certamente condenados e encarcerados durante anos, obrigando assim o estado a despender com eles verbas mais avultadas. Para alem de mais coerente, a solução de readaptar as instalações desactivadas, parece-me ser a solução mais económica.

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  2. Cara Margarida, só agora notei a extenção do meu comentário, peço-lhe desculpa pelo abuso.

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  3. Caro Bartolomeu
    O seu comentário é muito bem vindo. A sua reflexão é complementar e muito interessante. Leva-me a dizer mais umas coisas sobre os "Sem Abrigo".
    A política social tem obviamente custos financeiros. O que está em causa é, na área da acção social, a definição de prioridades políticas e a escolha de soluções de intervenção.
    A existência dos "Sem Abrigo" tem um custo social degradante que em nada nos dignifica. É uma função do Estado Social apoiar as pessoas e as famílias com comprovada carência económica, que as circunstâncias da vida colocou numa situação de privacidade de satisfação das necessidades mais elementares da vida.
    A comparação que estabelece com o custo que o Estado suportaria se, por absurdo, todos os "Sem Abrigo" desatassem a cometer crimes e fossem condenados a cumprir pena de prisão, ilustra muitíssimo bem a questão do custo financeiro/custo social.
    A necessidade de encontrar um "tecto" para os "Sem Abrigo" é fundamental; mas estas pessoas precisam de uma ajuda integrada que permita reabilitá-las, no sentido de ganharem a autonomia mínima que lhes confira capacidade de escolha e de decisão. É um trabalho especializado, com múltiplas valências, moroso e difícil que o Estado não sabe fazer, mas que pode e deve promover para que outras entidades, de forma articulada, tenham condições para dar resposta a esta problemática.
    As instituições de solidariedade social já prestam um grande apoio, mas focado na satisfação de necessidades muito básicas, insuficiente para "transformar" a vida destas pessoas. Podem fazer muito mais, mas o Estado também tem que as apoiar.

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  4. Estou completamente de acordo com o apoio que deve ser prestado a estas pessoas que se vêm completamente marginalizadas e desprovidas dos mínimos necessários a uma vida com mínimos de decência. Mas fico admirada com o que a Margarida diz quantoa o acesso ao subsídio de desemprego ou ao rendimento de inserção sicial, porque é que não têm direito? Há tempos vi um documentáriosobre os sem abrigo onde muitos deles assumiam a recusa de serem integrados, alguns mesmo nem querem dormir em abrigos, querem mesmo viver assim ao relento. Outros reconheciam uma total dependência da bebida e não querem ser "reabilitados". Há também alguns imigrantes que se viram na miséria e que procuram os acolhimentos e aceitariam de imediato uma ajuda efectiva, mas,pelo que percebi, há muitos dos sem abrigo que querem mesmo viver assim. Por isso pergunto à Margarida, porque sei que ela sabe muito dessa área e é parte activa nas redes de ajuda, se isso será de facto assim, da vontade deles, ou se será a ajuda que é insuficiente?

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  5. Suzana
    Apenas uma parte dos "Sem Abrigo", segundo o estudo citado, tiveram uma situação mais favorável dado possuírem um vínculo laboral, mas devido a dependências (droga e álcool), situação de doença ou a rupturas familiares, a manutenção de um emprego tornou-se insustentável, razão para o despedimento e pela qual estas pessoas não tem condições para procurar um novo emprego.
    O não ter direito a um subsídio de desemprego – situação comum – resulta de inserções precárias no mercado de trabalho ou a uma pensão social prende-se com a idade ainda longe da idade de reforma.
    O facto de haver pessoas "Sem Abrigo" que dizem que querem viver assim, não nos permite concluir que essa é a regra. Que não é. E também devemos ter presente que o estado de demência de alguns dos "Sem Abrigo" conduz a comportamentos e atitudes desviantes.
    Estas pessoas sofrem, sentem-se abandonadas à sua sorte, isoladas e excluídas, sem auto-estima e sem projecto de vida. Muitas delas acabam por se conformar e talvez por isso acabem por aceitar a sua condição.
    A reinserção social dos "Sem Abrigo" é uma tarefa muito difícil e os meios são efectivamente insuficientes.

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  6. Obrigada pelos esclarecimentos, Margarida, acho que foram muito úteis para se twer uma noção clara do problema que muito bem suscitou no seu post.

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  7. Boa noite Margarida e a todos,

    O que acha que se pode fazer concretamente para essa população? E em particular para a população imigrante sem abrigo?
    Um centro de Acolhimento? Será que vê outras soluções?

    Melhores cumprimentos,
    Fatima

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