quinta-feira, 28 de junho de 2007

A fala dos peixes


Os Tesourinhos com que o Ferreira d’Almeida nos tem aqui surpreendido fazem-me lembrar os peixes a mexer a boca, dando a ilusão de que falam, mas depois só saem bolhinhas de ar que, invariável e monotonamente, sobem à tona e se desfazem. Não confundir com o Sermão de Sto António aos peixes!, esse não queria que as suas palavras se perdessem, achava era que até os peixes teriam mais sensibilidade que os homens para entender o que ele dizia, e que achava importante.
O que esses Tesourinhos nos provam, à evidência, é que há uma tendência atávica entre nós para transformar em bolhinhas vãs o que foi dito e escrito com todo o formalismo, para ser ouvido e feito conforme.

Talvez porque se confia que, em breve, aquela aparência fica em nada, “-Já foi assim das outras vezes em que se discutiu o assunto”, não estranhamos voltar aos temas, ouvir dizer as mesmíssimas coisas, com tanta ou mais convicção, fazendo transparente o que consta em letra de lei e, muito frequentemente, repetindo os mesmos processos de anúncio, discussão, aprovação e …extraordinário!, fazer crer que se progrediu.

Tudo com a maior placidez, faz-de-conta-que-agora-é-para-valer, nem interessa nada pensar porque é que se revoga e substitui o que dizia a mesma coisa, o que é que se passou entretanto?, também quem é que vai ler, quem é que se lembra, olha os peixes, que bolinhas tão bonitas, porque é que eles mexem a boca daquela maneira?

3 comentários:

  1. Suzana
    Fantástico aquário de "tesourinhos"!
    Bondade a sua numa comparação tão benévola. As bolhinhas dos seus peixinhos, por sinal muito bonitos, costumam ser inofensivas e normalmente dão uma certa vivacidade e colorido às águas. Mas há aquelas bolhas dos peixes grandes que turvam as águas para atacar, para confundir ou apenas para marcar presença. São bolhas perigosas para enganar os outros peixes que ficam tão confundidos que fogem ou então nem se aproximam.
    E nessa altura, o oceâno fica então dominado por esses grandes peixões...
    Fazer de conta que é a primeira vez, que agora é que se está a tratar do assunto, que finalmente se vai resolver um problema ou que "faz-de-conta-que-agora-é-para-valer" têm um nome: desonestidade!

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  2. Mas é que é mesmo assim.!!!
    Mas, para não passarmos por inconvenientes, e muitas vezes até alcunhados de espertos, não será melhor fingirmos, também, ver pela primeira ver as bolinhas tão bonitas que os lindos peixes fazem?
    Às tantas, nesta confusão toda, já nem sei o que é mais conveniente!!!

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  3. Tem razão, Margarida, o mundo aquático tem muitos cambiantes, há que distinguir!
    Caro invisível, nem sempre dá bom resultado fingir que somos "invisíveis", que não damos pelas coisas, pode ser confundido com concordância ou com passividade.

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