segunda-feira, 2 de julho de 2007

A morte é mais rápida que as filas de espera...

A primeira radiografia nacional, de Março deste ano, sobre a situação dos doentes com cancro em lista de espera revela que os doentes com cancro esperam em média por uma cirurgia 3,5 meses. Este relatório revela grandes disparidades de resposta ao longo do País, com uma espera mais reduzida na Região do Norte com uma média de 2,4 meses, enquanto que no Algarve atinge em média 6,6 meses. Não me satisfazem as médias baixas ou as esperas que em determinados pontos do País rondam os 15 dias. O que me impressionam são as médias altas e os casos em que as esperas atingem os 7 meses, como acontece no "Centro Hospitalar da Zona Ocidental" de Lisboa.

O tempo de espera para uma cirurgia é em larguíssimos casos uma questão de vida ou de morte. É esta questão que nos deve preocupar. Sabermos que há vidas que poderiam ser poupadas se as pessoas pudessem ou tivessem sido submetidas a uma cirurgia em tempo útil e necessário é qualquer coisa a que não podemos deixar de ser sensíveis. Muitos doentes não têm alternativa ao Serviço Nacional de Saúde, por não disporem de recursos para recorrerem à medicina privada. Estão como que "condenados", entregues à sorte, na esperança de um milagre. É, no mínimo, chocante!

Os esclarecimentos rápidos do Ministério da Saúde, estes sim sem espera, de que os tempos médios de espera, entretanto (desde Março), melhoraram e de que os hospitais já estão a alterar comportamentos e serão alvo de auditorias aos procedimentos não me convencem e muito menos me sossegam!
É tempo de sermos capazes de resolver a enorme injustiça de perdas de vida porque a morte é mais rápida do que as filas de espera...
Este e outros problemas, que verdadeiramente afligem as pessoas, deveriam estar na primeira linha das preocupações das políticas de saúde.

13 comentários:

  1. Cara Margarida

    Esta notícia é mais do que assustadora. Revela algo impensável, porque estamos perante um tipo de doença de elevadíssimo potencial mortal, em que o factor tempo desempenha, a par de muitas outras características, um papel fundamental. Além do mais, a carga emocional associada é gritante, angustiante e exponenciada com o passar do tempo.
    Já lidei com muitas situações do género. A minha preocupação número um é nem deixar que o doente “pense” no que tem e encontrar a solução mais adequada e rápida. Tenho conseguido, felizmente, na maioria dos casos, mas reconheço que a situação denunciada é no mínimo obscena e não respeita os direitos dos cidadãos. Claro que os que têm posses não lidam com estes problemas. E os “outros”? Os “outros” sofrem e são cada vez mais numerosos! Atendendo ao “evoluir” do Serviço Nacional de Saúde, é de esperar que a forma distorcida de um patético “darwinismo económico” faça com que os mais aptos consigam sobreviver, ou seja, no caso presente, “a sobrevivência do mais rico”, a qual não posso aceitar...

    ResponderEliminar
  2. Pois hoje ouvi uma tecnocrática Secretária de Estado do Ministério da Saúde congratular-se pelo facto de alguma cirurgias oncológicas só estarem em espera desde Maio, não disse se desde o início ou do fim...
    Ninguém com bom senso e sentimento, para mais Secretário de Estado com responsabilidades na matéria,deveria mostrar-se contentinho com tal situação. Mas é o ponto a que isto chegou!...

    ResponderEliminar
  3. Caro Professor Massano Cardoso
    É verdade, a situação é no mínimo obscena! Pensar que a morte pode roubar uma vida porque faltou assistência é uma monstruosidade. Mas acontece, as estatísticas das médias das esperas não deixam pensar outra coisa...

    Dr. Pinho Cardão
    Quando há pessoas que esperam meses por uma cirurgia que lhes poderá salvar a vida e quando há pessoas que morrem porque a cirurgia chegou fora de tempo ou pura e simplesmente não chegou a tempo não pode haver congratulações de espécie alguma! E também não pode haver contemplações para com quem as faz!
    Para além de tudo o mais, o que há é muita falta de dimensão humana!

    ResponderEliminar
  4. As estatísticas só mostram aquilo que já todos sabíamos, mais mês menos mês, nestes casos extremos de cancro, em que há uma corrida contra o tempo, mas também noutros, que podem não ser fatais mas em que a angústia não é menor até se saber a sentença. A questão não está na constatação, falta saber a razão, o motivo que leva a que nuns sítios as coisas corram bem e noutros muito mal. É falta de investimento? É falta de médicos? Quanto e o quê é preciso para que as coisas mudem? Sem essa parte, servirão de muito pouco as estatísticas a chover todos os dias.

    ResponderEliminar
  5. A primeira linha das preocupações das políticas de saúde é fechar...fechar muito... quanto mais melhor... isso leva... a POUPAR e a combater o défice...

    ResponderEliminar
  6. Sempre tive a opinião que o SNS português tem um lado dinamarquês e um sudanês. Uns 90% dos custos estão do lado sudanês, das filas das 5 da manhã, do médico que não aparece, do braço bom engessado, incómodo, incompetente, ineficiente, sujo, etc. Mas quando há uma vida em risco, entra em funcionamento o sistema dinamarquês, a "gaja" de estetoscópio é substituída por um ou dois técnicos especializados e experientes, surgem enfermeiras com dotes para lá de fazer camas e o equipamento do estado da arte, tudo a trabalhar em equipa.
    Confesso que esta notícia é surpreendente e mais surpreendente é a disparidade regional que, em caso de vida ou morte, não faz sentido nenhum. E, desta dupla face do SNS, sei que nada disto faz sentido porque há forma de salvar estas pessoas. O positivo é que sei que tem solução, é pôr as pessoas do lado dinamarquês. O negativo, é que esse parece ser exactamente o problema.

    ResponderEliminar
  7. Caro Tonibler
    Tem a ceretza de que "quando há uma vida em risco, entra em funcionamento o sistema dinamarquês"? O brilhante relatório agora conhecido mostra que não é assim! É o lado "sudanês" a funcionar. O lado dinamarquês estará na competência dos médicos quando se entregam a uma cirurgia para salvar uma vida e que tantas vezes fazem verdadeiros milagres!
    Só há mesmo uma solução, o lado dinamarquês!

    ResponderEliminar
  8. Está muito bem visto, isso do lado dinamarquês e do lado sudanês, no nosso sistema de saúde podemos encontrar os dois, com um pouco de sorte conseguimos mesmo mudar de um para o outro num momento de aflição. O grande problema está na imprevisibilidade...

    ResponderEliminar
  9. Suzana
    Costuma-se dizer que com a saúde não se brinca... A nossa falta de saúde é imprevisível! A qualquer momento podemos ter um problema e o que queremos, legitimamente, é um SNS preparado para nos auxiliar.
    Há quantos anos, já perdi a conta, é que convivemos "pacificamente" com as filas de espera nos hospitais e com medidas, ano sim ano não, para reduzir as filas de espera?
    A explicação, que também já tem anos, assente na falta de recursos, sejam humanos, materiais ou financeiros, e/ou numa organização (ou melhor desorganização) ou localização (ou antes deslocalização) inadequada dos serviços de saúde não é aceitável. E não é mais aceitável porque já tivemos tempo para fazer estudos, e mais estudos, diagnósticos, reformas e mais reformas! A situação que temos é intolerável e só há uma coisa a fazer: é resolver o problema. Se o SNS não tem capacidade de resposta então os doentes que sejam encaminhados para a medicina privada. Porque é que esta solução não está implementada?

    ResponderEliminar
  10. Cara Margarida,

    Por isso me surpreende, mas não duvido. Claro que a solução é essa. O grande problema é: porque é que não é?

    Cara Suzana,

    A aflição é a forma de funcionar deste país, não é?

    ResponderEliminar
  11. Sem querer pisar os terrenos de Tonibler, apetece-me assim de repente responder se não será porque a medicina privada é ainda mais cara e, sobretudo, não trata de doenças que não dêem retorno? Ou seja, onde é que Estado ia gastar o dinheiro, nos apoios selectivos à medicina privada e, ao mesmo tempo, mantendo no sistema de saúde o que fosse preciso? Creio que é esta fronteira que é difícil definir. Sobretudo, porque não podemos arriscar a ficar sem acesso a cuidados de saúde que ninguém quer assegurar. Não tenho qualquer objecção de princípio, mas também não tenho como certo que se gastasse menos para melhores serviços e para a mesma amplitude.

    ResponderEliminar
  12. De qualquer modo, o Diário de Notícias tem hoje a resposta às dúvidas e preocupações que motivaram este post da Margarida."Hospitais que tratam de cancro alvo de mudança", anunciando a reorganização numa nova rede destes serviços."Joaquim Gouveia evita falar em encerramentos ou concentrações mas, na prática, será este o resultado do trabalho dos peritos", lê-se na notícia. Quanto ao actual mapa, "a actual rede tem cinco anos mas nunca foi aplicada no terreno. Não foi implementada com toda energia necessária", lê-se ainda.

    ResponderEliminar
  13. Suzana
    Também li a notícia. Francamente lhe digo que não me impressionam os anúncios de reorganizações e reestruturações das redes de serviços de saúde. Evidentemente, que se os serviços de saúde não dão a resposta adequada, em rapidez, facilidade e eficácia do acesso à medicina, é porque alguma coisa está mal. E portanto é preciso mudar!
    Mas a prova da desconfiança, perfeitamente legítima, que sentimos e já comprovámos quando foi necessário recorrer ao SNS, está na transcrição do texto do seu últimos comentário: Quanto ao actual mapa, "a actual rede tem cinco anos mas nunca foi aplicada no terreno. Não foi implementada com toda energia necessária", lê-se ainda.
    E, no entretanto, as pessoas que tem cancro e precisam de uma intervenção cirúrgica vão continuar nas filas de espera do SNS? Não há alternativas? Ficamos à espera de mais uma reestruturação?

    ResponderEliminar