quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Mulheres na política

Em poucos dias, as páginas dos jornais deram destaque às intervenções de várias mulheres com responsabilidades políticas e em todas encontramos um traço comum – a coragem de ir contra o politicamente correcto.
Na primeira sessão plenária da Cimeira EU-África, Angela Merkel condenou abertamente a situação no Zimbawe, Bielorrússia, Sudão e Birmânia, dizendo que “Não podemos olhar para o lado quando os direitos humanos são pisados seja onde for”, e que “os direitos humanos e boa governação devem ser parte “imprescindíveis” do novo relacionamento entre os dois continentes". Outros o terão dito de várias formas, mas o que é certo é que foram estas as declarações que mais impacto mediático tiveram.
Rama Yade, a jovem secretária de Estado francesa para os Negócios Estrangeiros e Direitos Humanos manifestou publicamente a sua opinião sobre Kadhafi, em entrevista ao jornal “Le Parisien”, dizendo que ele “não pode vir limpar os pés ensanguentados dos seus crimes” e que “a França não pode receber esse beijo da morte”. Foi também ao Senado francês exigir o esclarecimento das suspeitas de fraude nas eleições russas, encontrou-se com os opositores políticos na Tunísia e não perde uma oportunidade para evidenciar que não está na disposição de ficar “em desemprego técnico” quando se quer deixar na sombra a questão dos Direitos Humanos.
Mercedes Cabrera, Ministra da Educação espanhola comentou sem papas na língua os resultados do estudo PISA em Espanha, recusando leituras catastrofistas sem deixar de assumir o muito que ainda há por fazer. Quanto a este ponto, resumiu-o numa frase bombástica. “Não saber ler é pior do que fumar”, criticando a prioridade do combate ao tabagismo sobre o envolvimento da sociedade no combate à iliteracia. Prefere dizer que o “copo está meio cheio quando ainda há poucos anos estava meio vazio, é necessário continuar a enchê-lo”, e que o sistema educativo espanhol, mau grado os resultados do PISA – “se dissesse que são bons seria mal interpretada”, disse -, "não é um fracasso, porque tem sabido responder as desafios da sociedade nos últimos 30 anos”.
Estes são três registos muito diferentes, mas em todos se encontra uma coragem de falar diferente, de deixar as frases redondas que recusam evidências ou apenas deixam supor o que se quer dizer, e que depois cada um interpretará à sua conveniência.
Concorde-se ou não com o que cada uma delas diz ou faz, o certo é que não fica margem para interpretar. O que chama a atenção nestes casos não é tanto o que é dito, mas o modo desafrontado como foi dito. A surpresa que sentimos surpreende-nos, mostrando até que ponto nos conformámos com as mensagens cifradas, sem arestas, servidas depois de condimentadas por alguém que entretanto já lhes deu um sentido qualquer, de acordo com as conveniências.
As mulheres na política actual poderão dar nova luz à política? Saberão tirar partido da condescendência que as menorizava, usando os palcos a que agora têm acesso sem alienar a sua consciência ou perder a capacidade de olhar o mundo de um modo diferente? Deixem-me insistir. O que me fascina neste exercício é a percepção (ilusão?) de uma nova concepção de exercício do poder, um desprendimento quanto aos efeitos de se dizer “É isto que eu penso, gostem ou não, contem com isto” e continuar tranquilamente a fazer o seu trabalho.

10 comentários:

  1. Desenganem-se aqueles que ainda vêem a mulher exclusivamente mãe, dona de casa, ou um simples objecto fútil, que não pensa os problemas sociais, ou sem capacidade para pensar as suas soluções. Pelo contrário, a mulher é e sempre foi possuidora de uma visão mais abrangente e ainda mais sensível de tudo o que a rodeia. Os sentidos femininos são muitíssimo mais apurados e possuidores de um dom que lhe permitem com facilidade antever, prever, intuír. As mulheres têm ainda a faculdade da presistência, da tenacidade e... da sedução.
    "As mulheres na política actual poderão dar nova luz à política?"
    Acho Drª. Suzana, que esta frase não deveria terminar numa interrogação. Ela é peremptória e, é-o precisamente, pelo que deixa escrito, imediatamente a seguir.
    Só espero que a ascensão feminina ao poder, tenha o mérito de unificar os partidos num só. As sociedades não avançarão completamente, enquanto se mantiverem as rivalidades e os antagonísmos políticos.
    Excelente post, cara Drª. Suzana!!!

    ResponderEliminar
  2. Cara Drª. Suzana Toscano:

    Deixe-me que lhe diga: aqui está o retorno ao melhor da sua escrita.

    Não quero que pense com isto que sou um parvo dum invisível qualquer, demasiado exigente!?. Sou apenas um leitor habitual dos seus posts que, por isso, distingue um bom momento...

    ResponderEliminar
  3. Caro Bartolomeu,

    Lamento ter de discordar do meu amigo, não relativamente ao excelente post da Dra Suzana mas, relativamente ao seu último parágrafo.

    Todo e qualquer avanço só acontece quando há mudanças e as mudanças só ocorrem quando há momentos de tensão e de conflito. Uma sociedade onde "no pasa nada" é uma sociedade sem alma e sem fúria de viver. É uma sociedade cega, acomodada e dormente que nada faz mesmo quando "Tróia está a arder" (esta expressão não é minha, é da falecida Oriana Fallaci).

    Assim, é preferível que as rivalidades e os antagonismos se mantenham.

    ResponderEliminar
  4. Caro Antrhax: muito oportuno este recurso às palavras de Oriana Falacci, mais não seja, porque o momento exige "safanões" destes! E a propósito, se a memória não me atriçoa, recordo-me de ter lido que o Drº Mário Soares foi o único português a ser entrevistado por ela.
    Não há dúvida que esta senhora devia ser na sua profissão uma excelente "loba"...

    ResponderEliminar
  5. Amig'Anthrax, as minhas palavras não foram escritas no sentido que lhes atribui, mas eu explico-me melhor.
    Uma sociedade com um partido partido onde os seus militantes e dirigentes não se degladiem, mas pensem as soluções e com+patibilizem as diferentes opiniões e pontos de vista, com a finalidade de uma solução global, não pode ser nunca uma sociedade vazia de objectivos e objectividade, mas sim e tão só, uma sociedade consciente e irmanada. Uma vez que cita Oriani Fallaci, eu cito John Lenon e o seu "Imagine" fica aqui o link http://www.youtube.com/watch?v=jEOkxRLzBf0
    Nothing to Kill or die for... you may say i'm a dreamer, but i'm not the only one... a Brothewood of man!!!!!!!
    You can imagine...just trying.
    ;))))

    ResponderEliminar
  6. :)))))

    É Natal, É Natal, tudo é possível...

    ResponderEliminar
  7. Suzana
    Parabéns pelo tema! Se não formos nós as mulheres a falar destas coisas mais niguém se chega à frente.
    O que é fascinante na natureza humana é que as mulheres e os homens, embora sendo desiguais nas suas capacidades físicas, são iguais nas suas capacidades intelectuais mas exercem-nas com sensibilidade desigual, num registo de complementaridade, que ainda é olhado com medo e desconfiança.
    O peso das mulheres em lugares de topo na vida política e na vida empresarial é muito modesto. Mas as mulheres que lá chegam evidenciam-se e são notadas pela forma diferente como enfrentam e desbravam os problemas e lidam com as pessoas. Como são ainda poucos casos, esse modo desigual de "estar" tende a ser ainda mais distinto. Estou convencida que um maior contributo das mulheres nas decisões de alto nível será muitíssimo proveitosa mas sem nunca perder de vista que é na diversidade e complementaridade que estará o ganho! Estamos ainda longe de lá chegar, mas devagarinho lá chegaremos pelas mãos dos homens que acabarão por reconhecer os benefícios dos sentidos femininos...

    ResponderEliminar
  8. Cara Dra. Maragarida Aguiar.

    Deixe-me meter a foice na sua seara, só para lhe dizer que onde diz: -"...lá chegaremos pelas mãos dos homens que acabarão por reconhecer os benefícios dos sentidos femininos..."

    Eu atrevo-me a dizer que ficaria melhor dizer:

    " ...pela mão de alguns homens..."

    :)))

    ResponderEliminar
  9. Caras Suzana e Margarida:
    Pois é: os homens estão sempre prontos a dar a mão!...

    ResponderEliminar
  10. Quanta generosidade, meu caro Pinho cardão, quanta generosidade! Já chegaram mas foi à conclusão de que sozinhos não chegam a lado nenhum...:)
    Caro Invisível, vejo que já reconhece o tom, é curioso como as pessoas acabam por se conhecer mesmo na invisibilidade.
    Caros Bartolomeu e Anthrax, da discussão nasce a luz, é claro que é preciso diversidade e confronto de ideias mas compreendo oq ue Bartolomeu quer dizer, uma coisa é confrontar ideias outra é manter discussões estéreis que só desmobilizam os ouvintes.
    Margarida, acho que um mundo só governado por mulheres não deve ser nada bom, espero que o equilíbrio resulte de cada um ter as mesmas oportunidades e que sejam os melhores a chegar ao topo, aproveitando as capacidades que cada género pode trazer ás boas causas. Vamos ver, parece que já estiveram mais longe os tempos das provas dos nove...

    ResponderEliminar