sexta-feira, 11 de julho de 2008

Sim, não, pelo contrário?

A editora Entrelinhas lançou na passada 4ª feira, na Fnac Chiado, o livro “Casamento entre pessoas do mesmo sexo”, da autoria dos juristas Pedro Múrias e de Miguel Nogueira de Brito. Antes de me poder pronunciar sobre o conteúdo propriamente dito, porque apenas o folheei, posso desde já dizer que ele tem a particularidade de se assumir como o verso e o reverso da medalha, logo na capa, metade branca, metade encarnada, uma a direito, outra de pernas para o ar, e as duas partes do livro seguem a mesma regra ou seja, a meio é preciso virar o livro ao contrário para continuar a ler a opinião que se segue. O livro organiza-se em duas partes, cada uma com a tese de um autor e os comentários do outro, de modo que ambos expõem e se expõem, como num diálogo organizado.
O editor, Joaquim Pedro Cardoso da Costa, disse que o livro é uma discussão sem gritos, é a prova de que é possível abordar tema tão polémico analisando criteriosamente cada argumento e procurando contrapor, sem elevar o tom de voz mas sem perder a vivacidade.
O apresentador, António Araújo, numa intervenção brilhante e cheia de inteligente sentido de humor, lembrou que esta é uma discussão antiga, já Fernando Pessoa, num texto inédito que identificou, lançava a proposta de se fundar de raiz um novo reino, ali no Bugio, onde a lei fundadora podia determinar que o casamento dispensaria a diferença de sexos, como forma de atrair os menos convencionais.
Disse também que há hoje uma tirania de opinião, no sentido de que é obrigatório ter opinião sobre tudo, seja sobre o efeito de estufa, a crise no mercado de capitais ou a evolução do PIB na China. Ora, temos que invocar o direito a não ter opinião, podemos apenas saber que os assuntos existem, informar-nos sobre as diferentes perspectivas, mas não é dever absoluto decidir no fim por um dos lados. Este livro apresenta dois pontos de vista antagónicos mas não seremos compelidos, no fim da leitura, a ter uma cristalina opinião sobre o tema.
Creio que o disse para os incitar à leitura, e eu achei uma boa ideia, gosto de ler um livro em liberdade, sem sentir que estou a ser condicionada para aderir a teses convictas, sejam elas quais forem.
Na Nota Prévia, os autores afirmam que têm posições opostas sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo (porque é que não dizem homossexuais, será que logo aqui aceitam a homofobia?) mas que “no que estão de acordo é em que as divergências políticas, morais ou jurídicas devem ser discutidas e devem tentar ser resolvidas com argumentos (…) que servirão sempre para pôr a descoberto as diferenças que não possam ser superadas e com que temos que viver ou que exigem novos argumentos”.
Por mim vou ler, com todo o interesse, tenho a certeza de que se trata de um contributo sério para um tema que anda cada vez mais na baila.

4 comentários:

  1. Cara Dra. Suzana Toscano:
    Os autores do livro ficam-lhe a dever esta abordagem tão cristalina…
    Essa do livro a dadas páginas ter de se virar ao contrário para se ler é uma ideia genial… assim como a explicação dada por si do motivo. É que o problema é mesmo esse...é tudo ao contrário!
    Para já, e enquanto não amadurecer mais, fico-me por esta excelente citação, extraída do texto:
    “Ora, temos que invocar o direito a não ter opinião, podemos apenas saber que os assuntos existem, informar-nos sobre as diferentes perspectivas, mas não é dever absoluto decidir no fim por um dos lados”

    ResponderEliminar
  2. Então, caro Jotac, parece-me ler aqui já uma opiniãozinha...nas entrelinhas!

    ResponderEliminar
  3. Tanta argúcia, numa só pessoa…
    Não invejo, mas é caso para dizer: uns com tanto outros com tão pouco!
    :)

    ResponderEliminar
  4. Suzana
    É bem verdade que hoje se vive uma tirania da opinião. Mas mais do que isso, vive-se uma tirania da opinião absoluta, isto é, completa, total e até radical. Na verdade não é obrigatório que tenhamos opinião, que tomemos partido deste ou daquele ponto de vista. Podemos até em pontos de vista antagónicos concordar e discordar, simultaneamente, parcialmente de ambos os lados. Não ter opinião é uma atitude que a maior parte das pessoas não respeita e não compreende. O direito de não ter opinião é tão válido como o direito a tê-la.
    É como o direito ao silêncio, ainda que tenhamos opinião. A tentação de não o exercer é grande, mas confesso que cada vez mais o aprecio e também mais o pratico...

    ResponderEliminar