sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Investimento estrangeiro em terras: nova forma de colonialismo?

A recente turbulência nos mercados de matérias-primas agrícolas e, em especial, as políticas restritivas adoptadas por países produtores – das restrições impostas à exportação de arroz pela Índia, pelo Vietnam e pelo Egipto, ao bloqueio da Ucrânia aos embarques de trigo ou à imposição pela Argentina de um imposto extraordinário sobre as exportações de cereais – levaram alguns países importadores a repensar a sua estratégia de abastecimento desses produtos.
Curiosa a estratégia adoptada entre outros por países do Golfo grandes produtores de petróleo e também pela China, que consiste em adquirir extensas áreas de terra arável em países produtores de cereais para aí realizarem investimentos em plantações e garantirem por essa forma, para o futuro, os abastecimentos que têm estado sujeitos a enormes contingências.

Este tema mereceu destaque num interessante e desenvolvido texto publicado na edição do F. Times de 20 do corrente.
Entre os países investidores, cabe referir a Arábia Saudita e os Emiratos Árabes Unidos, para além da China e da Coreia do Sul.
Entre os países destinatários deste novo tipo de investimento destacam-se o Sudão, a Etiópia, a Ucrânia e o Kazakistão.
Caso notável é o do Sudão, onde o governo local demarcou 17 grandes áreas, num total de 880.000 hectares, para projectos de investimento estrangeiro na agricultura.
Também na Etiópia os responsáveis governamentais têm mostrado grande interesse na captação de investimento estrangeiro deste novo tipo, sendo provável que os sauditas venham a assumir aqui um papel importante.
Algumas organizações internacionais têm chamado a atenção para os riscos destas operações de investimento estrangeiro, as quais implicam a celebração de acordos entre investidores e países recipientes do investimento que, entre outras vantagens, dão aos investidores total autonomia na política comercial, não ficando por exemplo sujeitos s quaisquer restrições à exportação que venham a ser decretadas em tempos de crise.
Compreende-se perfeitamente que os investidores pretendam obter estas garantias – de outro modo não teriam as suas necessidades satisfeitas quando mais precisam.
Mas também se compreende que, em futuras crises de abastecimentos, nomeadamente nos países onde os projectos se situam, causará algum embaraço verificar que parte da produção interna desses bens seja dirigida para o exterior, para satisfazer as necessidades de populações com níveis de vida incomparavelmente superiores...
Jacques Diouf, Director-Geral da FAO, refere mesmo a expressão “neo-colonialismo” para caracterizar este tipo de acordos de investimento.
Direi, num breve comentário, que até poderá ser “neo-colonialismo”: só que neste caso estaremos perante um novo figurino de colonialismo, um colonialismo de tipo contratual, em que o “colonizado” aceita livremente as condições desejadas pelo “colonizador”.
Algum progresso em relação a anteriores formas de colonialismo, há que reconhecer...

2 comentários:

  1. Anónimo21:37

    Não vá mais longe meu caro Tavares Moreira. A compra de terra produtiva no regolfo e nas proximidades do Alqueva português por parte de espanhóis é uma realidade sobre que importa refletir.

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  2. Problemas como este só comprovam que a solução não está no actual modelo, nem no aumento das restrições, mas antes no reforço da liberalização dos mercados, símbolo máximo da aceitação da irredutível globalização.

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