domingo, 2 de novembro de 2008

Provincianos...

A leitura da entrevista de Manuela Ferreira Leite, numa excepcional manhã de sol, na “minha esplanada”, junto à Ribeira das Hortas, na denominada Província, designação tão gostosa dos lisboetas, porque lhes permitem revelar a sua superioridade face ao resto do reino, despertou-me várias lembranças.
A uma pergunta dos jornalistas, a presidente do PSD respondeu: “Por exemplo, não há uma única proposta, que algum dia tenha sido aceite na Assembleia da República (pela maioria do PS). Entre aquilo que o PSD propõe nem tudo deve ser mau... Deve haver algumas coisas para aproveitar, penso eu!”. E, mais à frente: ...”Ou seja, (uma qualquer proposta) basta vir do PSD para ser imediatamente reprovada. Isto não é democracia”. Confrontados, os interlocutores reagiram: - Não era assim com a maioria do PSD de Cavaco Silva? - Não, não era! Não, não era!
Tive uma curta, e inesperada, vida parlamentar, mas foi mais do que suficiente para conhecer aqueles meandros. Apercebi-me de que as nossas vidas, mesmo nos aspectos mais simples, são condicionadas por tudo o que é aprovado naquele local, sede da democracia. Fiquei a saber que o uso da palavra oral e escrita atinge o seu máximo de importância no hemiciclo e nas comissões. Não me foi difícil adivinhar certos interesses, económicos, corporativos e doutrinários. Fui confrontado com atitudes não condizentes com os superiores interesses dos portugueses, nomeadamente, quando certas ideias e propostas vinham da oposição. De um modo geral, existe um comportamento ditado por reacções negativas a iniciativas vindas de outros quadrantes políticos como se fossem perigosas pestilências capazes de dizimar os “donos” da República. Sim, porque quando ocupam o poder, alguns sentem-se não como servidores mas como proprietários do país! E, de um modo geral, não como bons proprietários, mas com comportamentos mais semelhantes a certos animais, tão bem definidos pelos etólogos. “Mijam” por tudo quanto é sítio para marcar os territórios, avisando que quem manda são eles, chegando a mostrar as dentuças e emitindo grunhidos assustadores. Nem mais! Mas os que estão impedidos de ocupar os novos territórios atacam de todas as formas e feitios para os desalojar dos apetecíveis nichos eco-políticos. Dizem mal e não concordam com as iniciativas da “espécie” dominante. Mas é uma questão de tempo. Quando conseguem desalojá-los não têm qualquer pudor em admitir tudo aquilo que diziam que era mau quando estavam fora do território do poder. A par destas situações, reconheço que muitas propostas encerram finalidades que vão de encontro aos interesses dos portugueses. Se tiverem proveniência na maioria tudo bem, se tiverem como proveniência a oposição, tudo mal. No entanto, muitas propostas oriundas da oposição, interessantes, válidas e exequíveis não são aceites. Sei do que falo, porque participei em alguns debates e propostas, que acabaram por ser aprovadas. Para mim, o facto de virem da oposição não era o factor crucial. O mais importante era se tinham ou não interesse e impacto positivo na vida dos nossos concidadãos. Se tinham então deviam ser discutidas e aprovadas com as correcções necessárias de forma a produzir um produto final de qualidade. Em consciência foi o que fiz. Bem sei que posso ser rotulado de ingénuo ou mesmo de provinciano, porque as regras de jogo utilizadas são outras. Pois são! As queixas de que nenhuma proposta do PSD ter sido aceite pela maioria PS é um paradigma deste estado de coisas. Sinceramente, não consigo compreender estas atitudes. É capaz de ser uma insuficiência minha e deverá ter sido um dos motivos para ter sido remetido para a Província. No entanto, se quiserem encontrar verdadeiros cultores do “provincianismo” basta dirigirem-se ao Palácio de São Bento, onde podem encontrar alguns dos mais puros representantes. Entretanto, cá vou vivendo e desfrutando das comodidades e das "alegrias" da Província...

4 comentários:

  1. Muito bem, caro Professor.
    E boas manhãs de sol outonal.

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  2. Anónimo11:21

    Meu caro Professor, um importante depoimento.
    É pena que não faça doutrina...

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  3. essa conversa do provincianismo e a superioridade de lisboa ja mete um certo nojo...afinal de contas gostava de saber quantos alfacinhas de gema coabitam aquela podridao que é a assembleia da republica..

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  4. sabe mesmo bem ler este testemunho!

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