1. Ainda a procissão da nova Administração americana não chegou ao adro, tampouco, e já se verificam os primeiros sinais de dúvida, séria, quanto às orientações das políticas que pretende adoptar.
2. Para lá das peripécias pouco felizes com a escolha de alguns dos seus mais destacados membros do seu executivo, que tiveram que renunciar à nomeação por atrasos no cumprimento de obrigações fiscais – trata-se de acidentes de percurso que causam sempre algum dano de imagem mas são sanáveis - há um ponto que nos deve merecer especial atenção: o proteccionismo económico.
3. Encontra-se neste momento semi-encalhado no Senado americano um Programa de Apoio à Economia não Financeira, num total de USD 900 mil milhões - proposto pela Administração Obama na esteira do famoso TARP de USD 700 mil milhões da Adiministração Bush, muito protagonizado pelo competente mas infeliz Secretário do Tesouro Paulson.
4. Nesse Programa de USD 900 mil milhões, que contempla apoios fiscais e financeiros que vão desde os consumidores até empresas produtoras de automóveis, encontra-se prevista uma provisão que, a ser aprovada, forçará as empresas industriais que vierem a receber esses apoios a adquirir matérias-primas e semi-acabados de origem comprovadamente americana (“Buy american”).
5. Exemplificando, uma empresa produtora de automóveis que receba apoio ao abrigo do Programa teria de passar a comprar aço e componentes de automóveis produzidos nos USA.
6. Esta provisão está causando apreensão na Europa pois, a ser aprovada, pode ser o início de um conflito comercial de proporções dificilmente imagináveis neste momento.
7. São quase evidentes os problemas suscitados pela introdução de uma tal medida: ela significa que os produtores americanos obrigados a comprar americano iriam em última análise comprar mais caro – de outro modo a medida não se justifica – pelo que o preço do produto final não poderá deixar de reflectir esse encarecimento dos custos...
8. Quer isto dizer que por exemplo os automóveis produzidos sob esse regime proteccionista irão encarecer...tornar-se-ia ainda mais difícil vende-los...será que depois os consumidores americanos vão receber um estímulo fiscal ou financeiro para comprar americano apesar de mais caro?...
9. Curiosamente o notável colunista Martin Wolf, de opinião insuspeita – zurziu a política económica da Administração Bush com grande intensidade – em artigo publicado no F. Times de 4 do corrente “Time for shock and wave” ataca esta eventual medida com particular violência.
Diz Wolf, referindo-se a essa medida: “...for a country that has made an open global economy the keystone of its foreign policy for two generations, IT is vandalism – Is this the change we must believe in?”.
10. Barack Obama, a quem nesta tribuna sempre manifestei apoio desde candidato à nomeação pelo Partido Democrata – quando muitos dos queridos apoiantes de hoje apoiavam H. Clinton – deve pensar duas vezes antes de assumir medidas de tipo proteccionista, especialmente na área comercial.
11. Se o não fizer, pode inaugurar uma guerra comercial fratricida.
O proteccionismo é das piores medidas que se podem tomar. Com a ilusão de "protegerem" as economias no imediato, tornam-nas incompetitivas no curto, médio prazo. Podem atalhar a uma dor de cabeça, mas não curam a doença, que virá mais forte e mais reforçada, como bem diz o TMoreira, nomeadamente nos pontos 7 e 8.
ResponderEliminarAinda bem que a adesão ao euro nos impede de outra medida proteccionista, como a desvalorização da moeda, que muitos desejariam, mas que nunca produziu efeitos benéficos duráveis, antes impedediu a restruturação das empresas.
Obama não começou muito bem. Ou, melhor, começou como eu esperava, embora não o desejasse.
Percebo o impacto que medidas protecionistas decretadas pelos EUA pode ter na economia global, dada a importância daquele mercado.
ResponderEliminarMas pergunta a minha ignorância: para um país como Portugal, com o nível de dependência e de endividamento externos e dificuldades de escoamento de alguma produção lusa, são ou não legítimas, na actual conjuntura, políticas de estímulo a um Buy Portuguese?
"(...)e dificuldades de escoamento de alguma produção lusa, são ou não legítimas, na actual conjuntura, políticas de estímulo a um Buy Portuguese?"
ResponderEliminarExcelente, caro Dtº Ferreira de Almeida. A lógica das coisas indica que nos deviamos defender, consumindo o que produzimos...
Caro Pinho Cardão,
ResponderEliminarObama tem muito boas intenções, talento para as realizar, mas isso ainda não é suficiente...entre outros requisitos adicionais, é preciso que não apareça muita gente a perturbar...e para já este requisito parece estar a falhar!
Por exemplo a escolha de Hillary Clinton para a pasta dos negócios externos vai-lhe custar caro, estou convencido...
Caro Ferreira de Almeida,
No quadro da UE e da zona Euro, o buy portuguese é a mesma coisa que buy spanish ou italian ou semelhante...
Mas já temos uma proxy de tal política, o All-Garve, com o imenso sucesso que estamos a testemunhar...não há, nesta altura do ano, uma cama disponível no All-Garve!
Caro Tavares moreira,
ResponderEliminarNa verdade, não se tratam de "medidas protecionistas", no sentido que habitualmente lhes é dado; isto é, proteção de empresas do mercado interno em desfavor de outras.Trata-se de protecionismo das empresas americanas em desfavor das empresas não americanas. O que é bem diferente.Um protecionismo contra o mercado global, externo, seguramente. Mas será que este protecionismo interno americano só agora surgiu? Talvez não tão declaradamente, mas ele sempre esteve presente nas diversas administrações americanas ao longo dos tempos.Os americanos estão abertos ao "mercado" global para venderm, mas nunca estiveram assim, do mesmo modo, abertos para comprar.
Claro que a situação económica e social americana nunca esteve nos últimos anos tão dificil pelo que é natural que surja um reforço deste protecionismo. Com Obama ou sem Obama.
Caro ruy,
ResponderEliminarPermita-me observar que sua afirmação é avassaladoramente desmentida pelos sucessivos e gigantescos défices da balança comercial americana, ao longo dos últimoa anos...
E não será nada natural que haja um reforço do proteccionismo, deixe-me também dizer-lhe.
Em 1º lugar não existe reforço, existe uma nova ideia de proteccionosmo, que é bem distinto.
Em segundo lugar, o proteccionismo dificilmente pode levar a melhoria das condições de vida, nomeadamente nos USA: o simples exemplo que avancei, dos automóveis, ilustra a falsidade das vantagens do proteccionismo...
E se os outros países começarem a usar o slogan "Do not buy american"?