segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Defice externo em 2008: "direcção proibida" para política económica

1.A extensão do défice externo de 2008 – 10,6% do PIB segundo as estatísticas provisórias divulgadas no final da semana passada, muito acima das recentíssimas previsões do BdeP - confirma a extrema fragilidade financeira em que nos encontramos e que aqui temos comentado com frequência.
2. Tendo em conta o elevado nível de endividamento de todos os sectores institucionais, não é mais possível esconder ou pretender que não estamos a criar um grave problema de financiamento da economia e que, sendo assim, se justifica uma reviravolta, um verdadeiro U-turn na condução da política económica.
3. Não será mais possível continuar a engordar um sector protegido da economia, consumindo enormes recursos em projectos de rentabilidade negativa ou desconhecida ou gerando saldos negativos de exploração como se a capacidade de financiamento do País não tivesse limites.
. Não é mais possível continuar a gerir o sector público – Administração Central, Regional e Local, com seus respectivos e inumeráveis apêndices empresariais, quase todos deficitários – como se nada se passasse, como se não estivéssemos à beira de enfrentar uma grave escassez de recursos financeiros.
5. A insistência, a que presentemente ainda assistimos, nessa política de sacrifício de recursos irá lançar o País numa crise sem precedentes, de contornos bem mais graves e de solução bem mais dolorosa do que as experimentadas em anos passados (75/77 e 83/84) quando o FMI nos vinculou a programas de ajustamento de bastante dureza para quem ainda se recorda disso.
6. No entanto, parece que nada disto se passa ou que estamos aqui a levantar fantasmas...a política económica prossegue com aparente indiferença a esta realidade, mergulhada num imenso lago de autismo, desbaratando os escassos recursos que ainda podemos mobilizar.
7. Entre muitas outras coisas seria necessário: (i) suspender imediatamente todos os projectos chamados de investimento público ainda não iniciados ou apenas em fase de arranque, para se organizar um urgente balanço dos meios disponíveis e das prioridades indiscutíveis de despesa, (ii) apertar dur(issim)amente os orçamentos de exploração dos institutos públicos e das centenas de empresas públicas, regionais e locais, (iii) aliviar, drasticamente, a carga fiscal e para-fiscal sobre as empresas que se situam nos sectores expostos à concorrência e (iv) criar incentivos muito mais poderosos ao investimento e ao emprego nestes últimos sectores.
8. A política económica a que temos assistido tem agora pela frente mais um claríssimo sinal de “direcção proibido”...se esse sinal não for tomado a sério, vamos assistir, lamentável e desnecessariamente, a um dos mais dolorosos períodos da nossa vida colectiva.

8 comentários:

  1. Este post, merecia uma leitura e reflexão por algumas entidades: o PR e o PM; o Conselho de Estado.
    Talvez assim resolvessem adoptar o qualificativo utilizado por um antigo PR numa conferência recente: "Austeridade"(Eanes).
    Em conjunto com um escrito recente de António Barreto, sobre onde e como investir e dar trabalho/emprego nesta conjuntura..
    Vantagens da visão exterior (e disponibilidade mental para ver a realidade).
    Uma questão de liderança (como disse Belmiro de Azevedo) há dias.
    BMonteiro

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  2. Caro bravomike,

    Regista-se o cumprimento, amabilidade sua.
    Quanto à expressão "Austeridade", que menciona, só temo que seja de uma brandura extrema comparada ao que vamos experimentar (já começamos, mas ainda vamos no aperitivo).

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  3. Anónimo23:24

    Caro Tavares Moreira, que os Portugueses vão experienciar tempos terriveis, não tenho dúvidas e há muito tempo que as não tenho.

    Mas tenho questões a montante e a jusante do sofrimento. Conseguirão os eleitores perceber a origem dos males? Saberão donde ele veio? E, a jusante, é a cultura Portuguesa propícia a resolver uma crise dessa magnitude? Não tenho certezas em relação a nenhuma destas perguntas. Palpita-me, porém que, não, não conseguirão discernir a origem dos males e continuarão a querer soluções iguais às já havidas, ou seja, Estado, Estado, Estado. Por fim Portugal será a Argentina europeia. Um país que nos anos 50 e 60 prometia vir a ser uma economia pujante e um país com um lugar no mundo e que, afinal, caiu irremediavelmente num buraco e por fim faliu. No que toca a, no caldo de cultura Português, ser possivel resolver o problema, sinceramente tenho dúvidas. O Português não gosta de sacrificios, trabalho árduo, empenho, mérito, excelência, trabalho de formiguinha de labutar arduamente no Verão para colher os frutos no Inverno. Mas isto é o que eu penso da minha experiencia e do que conheço de Portugal e dos Portugueses. Serei pessimista? Estarei errado? Alguém tem ideias diversas sobre o tema?

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  4. Caro Zuricher,

    Sua análise sociológica é bem capaz de estar muito próxima da realidade...exactamente por isso é que estamos como estamos e acompanhamos com notável indiferença (excepção feita aos muitos milhares que, num processo de acumulação diario, vão sentindo as agruras da situação) o exercício absurdo de dissipação dos escassos recursos que ainda dispomos...

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  5. Caro Tavares Moreira,

    Este seu post está correctíssimo, desde que se assuma como válido o pressuposto de que as direcções estão a ser tomadas de acordo com o interesse público e que a política actual se trata apenas de um erro de paralaxe. E aí não concordamos, porque tudo indica que esse pressuposto não é válido.

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  6. Caro Tonibler,

    Discordância original esta, em que no essencial concordamos...
    Concordamos discordando ou discordamos concordando - até nós, veja lá, seremos vítimas desta comédia em que à força acabaremos envolvidos!

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  7. Caro Tavares Moreira,

    Mas para concordarmos totalmente, o meu caro teria de, tal como eu, suspeitar que a condução da política económica do país é feita de má-fé e em favorecimento de interesses distintos do interesse do país. Ora, isso só passa pela cabeça de gente desqualificada e sem consciência política, como é o meu caso.

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  8. Caro Tonibler,

    Se for capaz de acrescentar à sua receita uma vultosíssima dose de ignorância, o nosso acordo será próximo do pleno...

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