Dei uma saltada a Coja. Não estava longe. Sabia que havia uma feira de artesanato. Adoro percorrer as aldeias e vilas da minha região. Não me canso de rever velhos lugares e descobrir novos. Descanso e fico com a alma mais arejada. Foi o que fiz. Vi a feira. Passeei pelas ruelas. E ouvi o belo rio Alva, tranquilo e sedutor.
Subi a encosta e deparei-me com um memorial a um médico, Alberto da Maia e Cruz do Valle (1875-1956), a vigiar o rio. A ladear o seu busto deparo-me com palavras sublimes de Miguel Torga que não resisto de transcrever: “Era um homem bom como já não há. Viveu e morreu discretamente com medo de acordar os interesses da vida e as pompas da morte, e quem o conheceu só poderia desejar que a limpidez do Alva ficasse a refletir-lhe a memória pela eternidade fora”.
Valeu a pena o passeio. Li um belo poema a um homem bom.
Subi a encosta e deparei-me com um memorial a um médico, Alberto da Maia e Cruz do Valle (1875-1956), a vigiar o rio. A ladear o seu busto deparo-me com palavras sublimes de Miguel Torga que não resisto de transcrever: “Era um homem bom como já não há. Viveu e morreu discretamente com medo de acordar os interesses da vida e as pompas da morte, e quem o conheceu só poderia desejar que a limpidez do Alva ficasse a refletir-lhe a memória pela eternidade fora”.
Valeu a pena o passeio. Li um belo poema a um homem bom.
Penso que cada um de nós, busca a oportunidade, anseia porque surja o momento ou da "conjuntura" que o transformem num «Homem Bom».
ResponderEliminarDentro de cada um de nós existe o "equipamento" necessário para que tal possa suceder mas, poucos de nós se encontram no local e no tempo, rodeados dos que irão influência-lo, ou motiva-lo a utilizar todo o seu potêncial, em prol do bem comum.
Esses poucos homens bons que influênciam uma pequena comunidade, são geralmente reconhecidos pelo mérito ou pelo altruísmo que lhe dedicaram.
Estou a lembrar-me de um outro médico, Dr.Guilherme, a quem a população de Seia erigiu um busto no largo em frente ao consultório onde em miudo, quando passava ali as férias grandes escolares lhe ía mostrar o resultado do adesivo que me colavam nas costas.
Lembro-me bem da primeira consulta. Na rua sentados no muro de pedra, muitas pessoas das aldeias em redor esperavam para ser atendidos, as mulheres embrulhadas em xales, com as crianças ao colo, os homens de pé, ao lado, ar derrotado pelas agruras da vida pobre iam fumando cigarros sem filtro e olhando melancólicamente quem chegava e quem partia.
O consultório do Dr. Guilherme, no piso térreo de uma casa de granito, era exíguo, no gabinete logo à entrada, sobre uma mesa, encontrava-se uma caveira, ou a cópia muito fiel de uma.
A visão daquele crâneo, provocava arrepios em qualquer um e a mim, lembro-me muito bem que tambem provocou. Lembro-me de ver doentes a desviarem o passo naquele lugar.
Passados uns bons anos, estava a passar uns dias na aldeia e um dos meus filhos ainda muito pequeno adoeceu, uma otite. Consultei o Dr. Guilherme, já com muita idade mas ainda a trabalhar e, surpreza, lá continuava a caveira e a mesa onde repousava. A minha mulher que não conhecia o consultório e o médico, ao deparar com o "bibelot" encostou-se muito a mim e perguntou-me ao ouvido: tens a certeza que é aqui?
-Sim, claro, porquê?
-E o senhor é mesmo médico?
- Claro que é médico, qual é a tua dúvida?
- De certeza que não é um curandeiro?
Percebi o motivo de tantas interrogações, quando ela muito encolhida apontou para a caveira.
O Dr. Guilherme foi durante muitos anos o médico de ricos e de pobres, atendendo do mesmo modo todos quantos o procuravam, saindo a meio da noite em qualquer altura do ano, por caminhos e carreiros, ao princípio montado a cavalo, depois em automóvel, recebendo por vezes um coelho, uma galinha, uma ou duas dúzias de ovos, que não raras vezes, deixava em casa de famílias que sabia muito necessitadas, a muitos que sabia não possuirem meios, mandava os remédios pagos do seu bolso.
Um homem bom sem dúvida, merecedor da memória e do reconhecimento de todos.
Caro Massano, aí está uma homenagem digna de um homem bom, que ele sem dúvida teria preferido a um lugar no panteão.O seu busto na aldeia cujos habitantes tratou e que nele confiaram, junto ao rio, e com uma dedicatória que mais não podia dizer que valesse a pena. Uma verdadeira homenagem.
ResponderEliminarcaro Bartolomeu, também aqui nos trouxe uma bela história, numa prosa que nos obriga a ler sem parar até ao fim. Muitos parabéns, gostei imenso. Isso da caveira...seria para os doentes seguirem à risca as recomendações do médico, com medo de se tornarem só osso, ou seria um sinal de humildade, a permanente lembrança da finitude inexorável?
Aposto nas duas, cara Drª Suzana.
ResponderEliminarO médico aqui da Zona, que é de características rurais, costuma dizer-me referindo-se aos doentes: Estes gajos, receito-lhes os remédios, não os tomam e depois voltam cá "ai doutor que não me sinto nada melhor" pois como é que podem melhor se não tomam o que lhes receito!?
Assim é a vida dos tristes mortais
;)))
Ah... se me permitem, desejo só comunicar-lhes que no próximo dia 16 em Arruda dos Vinhos, incerida nos festejos tradicionais em honra de Nossa Senhora da Salvação, irá realizar-se uma tourada à antiga portuguesa.
ResponderEliminarCaro Professor Massano Cardoso
ResponderEliminarQue bonita homenagem nos trouxe ao Homem bom e dedicado que muitas ajudas terá dado às gentes da sua terra e que lindas as palavras de Miguel Torga.
Estive no fim de semana passado na minha casa na Beira e como sempre fui passear e visitar os locais bonitos que nunca me canso de procurar. Desta vez não fui a Coja mas estive lá perto em Avô e na Aldeia das Dez, com a sua bela Ponte das Três Entradas por baixo da qual corre o lindíssimo rio Alva animado pelos seus açudes.
Como compreendo que nunca se canse de rever os lugares afectivos e como sei bem que há sempre algo de novo para descobrir.
Caro Bartolomeu
Gostei muito da sua história. Muitos médicos da aldeia naquele tempo eram tal e qual como nos conta!