terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Aeroporto de Beja e a governabilidade do País

1. O nosso ilustre companheiro Pinho Cardão, no seu estilo neo-realista que muito aprecio, já aqui introduziu o tema em Post editado no dia 19 do corrente “Aeroporto para aviões que não voam”...
2. Com a devida vénia ao Pinho Cardão, retomo este tema que na minha perspectiva assume um significado muito particular nestes tempos conturbados que estamos vivendo, como paradigma do gasto sem nexo de recursos públicos e de consequente endividamento.
3. Começo por recordar que, como é de norma, este “investimento” foi anunciado há pouco mais de 2 anos pelo incumbente PM, em grande estilo, como um caso de “Baixo investimento para um grande benefício”...
4. O “baixo” investimento já se conhece: terão sido € 33 milhões, números redondos, depois das habituais derrapagens...
5. O “grande benefício” é que não se descortina:
- Não existem operadores interessados...
- Vai ser utilizado como parque de estacionamento de aviões inactivos que estarão a ocupar espaço noutros aeroportos, em que o parqueamento será mais caro, em Beja devem beneficiar de “desconto de promoção”...
- Quanto a tráfego só lá para 2014, na melhor das hipóteses, mesmo assim sem qualquer estudo que dê credibilidade à previsão...depois de ter sido anunciado há pouco tempo, também sem qualquer fundamento, o início do tráfego para Setembro de 2010...
6. A EDAB, SA, empresa quase-pública (97,5% do capital pertence ao Tesouro e outras entidades públicas) que desenvolveu este projecto, para o qual contou com generosos fundos públicos, tanto do FEDER como do PIDDAC – e mesmo assim não pode deixar de se endividar - estará agora a preparar-se para entrar na fase de “engorda” do endividamento pois vai ter de financiar os défices de exploração.
7. Curiosamente, já no relatório anual desta empresa para 2008 se podia ler, no tocante as expectativas do negócio, que “As melhores perspectivas de tráfego para o Aeroporto de Beja apontam para um arrastamento de mais 3 a 5 anos até se poder atingir um EBITDA positivo na nossa actividade...”.
8. Deve notar-se que em 2008 e 2009 ainda terá sido possível disfarçar o problema, contabilizando como encargos de investimento muitas despesas que a partir do fecho da obra passarão a ser despesas de exploração, afectando directa e negativamente os resultados e gerando necessidades de endividamento (já não haverá fundos públicos)...
9. Como aqui no 4R temos persistentemente chamado a atenção, estamos defrontados com uma total ausência de cultura de rigor na gestão dos escassos recursos públicos. Os maus exemplos sucedem-se e, no final, é sempre aos cidadãos que cabe pagar a factura...
10. Parece ser este, que não outro, o verdadeiro cerne da tão badalada (por razões fátuas) governabilidade ou ingovernabilidade do País... Com a sucessão de episódios como este - outros de resto em escala muito maior nos esperam - o País dificilmente poderá ser governável, pela razão bem prosaica de que não haverá dinheiro para os pagar...

14 comentários:

  1. Caro Tavares Moreira,

    A solução para o fosso económico-financeiro em que estamos enterrados, passa em grande parte pelo saneamento das contas públicas. Este tipo de despesa frívola e sem qualquer ponta de racionalidade onera a nossa economia e, infelizmente, há muitos " aeroporto de Beja" por aí.

    Mas agora, o país parou para assistir ao teatro do PS, de muito má qualidade, diga-se, relativamente ao PR e à discussão do casamento e adopção de homossexuais.

    ResponderEliminar
  2. A esses "investimentos" costuma dar-se o nome de Elefantes Brancos, caro André...mas talvez fosse mais apropriado passar a chamar-lhes Formigas Brancas, em homenagem à sua capacidade de destruição de recursos...

    ResponderEliminar
  3. Aqui deixo mais uma construção de quadras, bem prosaica, sobre...

    Os delírios fantasiosos
    de construções faustosas
    revelam gastos ociosos
    em aberrações ventosas.

    A vegetante existência
    num regime vegetativo
    atrofia a competência
    do idealismo putativo.

    Tanta gentalha sentada
    à mesa do orçamento,
    com a nação alimentada
    por tão escasso alimento.

    As obras emblemáticas
    de políticas apodrecidas
    terão encenações temáticas
    de formigas embranquecidas.

    Votos de Boas Festas!

    ResponderEliminar
  4. «uma total ausência de cultura de rigor na gestão dos escassos recursos públicos»

    Ainda esta manhã, tentando fazer humor com um piloto da Força Aérea,
    lhe dava conta dos 4.900 passageiros dia (por dia), que os inteligentes gestores do Beja International Airport atiram para 2020.
    Não sendo eu economista nem matemático, pergunto-me em que escolas andou esta gente.

    Isto está a pedir outro tipo de linguagem: a de crime económico de lesa sociedade.
    A cargo de alguns criminosos.

    A fazer-me lembrar alguns dos desmandos do PREC, com os resultados que se viram. Ou podiam ter visto.

    ResponderEliminar
  5. Mas a culpa é do governo, caro Tavares Moreira? Ontem o PM mandou com os "estudos" para cima de MFL. Onde é que está a contestação aos estudos? O facto é que político não se mete com profissional e não contesta estudo nenhum. Pelos estudos do NAL, hoje nem se devia ver o céu de Lisboa com tanto avião lá em cima. Temos alguém a dizer que o estudo está uma porcaria? Não, porque foi feito por um qualquer respeitável prof do técnico que fez o estudo onde nas recomendações finais deve recomendar mais estudos destes feitos por ele. Porque se faz estudos é respeitável e como é respeitável deve ser respeitado e está fora de causa que se suspeite do estudo. É toda uma economia sanguessuga montada em cima do meu dinheiro.
    Agora, o governo fez um aeroporto onde um qualquer prof do técnico lhe diz que ia ser mais movimentado que Frankfurt. Podemos continuar a falar na razoabilidade económica dos investimentos do estado ou podemos assumir de vez que isso não existe....

    ResponderEliminar
  6. Caro Tavares Moreira

    No comentário ao post similar de Pinho Cardão aludi ao facto de este aeroporto ter um concorrente directo próximo, com a agravante que esse concorrente, já se encontra a funcionar.
    Como estas infraestruturas não se montam em dois dias, há muito que se sabia da existência e os efeitos que pode(ria) ter na viabilidade do aeroporto.
    Não se apressou a finalização do mesmo nem se elaborou um plano "B" para estas eventualidades.
    Um governo pró activo, atraíria clientes, "oferecendo" aos operadores de carga condições excepcionais, desde isenções fiscais a aterragens sem horário.
    Ajudava a aumentar a população de Beja e criaria as condições para atrair investimentos complementares.
    Assim, vamos ter um mono para ser objecto de visita dos bejenses ao fim de semana.
    Com estes exemplos não ajudamos a imagem da nossa economia, nem do nosso "rating".
    Cumprimentos
    joão

    ResponderEliminar
  7. Caro José Monteiro,

    Formiga branca, é o nome apropriadoo para estes predadores de recursos públicos...

    Caro Tonibler,

    como bem saberá, os estudos, estes estudos, são feitos em função dos objectivos previamente desenhados pelo Cliente...ou seja à vontade do freguês...

    Caro João,

    O tema que refere parece tão óbvio que até se pasma que não lhe tenham prestado atenção...
    Mas ilustra bem a forma como as decisões políticas estão hoje inquinadas por factores que afastam liminarmente a variável bom-senso, por ser manifestamente "old fashioned"...

    ResponderEliminar
  8. Como ninguém contesta o estudo, então o primeiro-ministro está certo. Pelo menos até ao dia em que se demonstra que está errado que é quando se vê que afinal não era preciso nenhum aeroporto...

    ResponderEliminar
  9. Caro Tavares Moreira

    Apenas uma achega e uma preocupação:

    A achega é que o aeroporto em causa fica demasiado próximo da futura grande obra do regime, Alcochete. Não há espaço para dois....

    A preocupação:
    Aproveito este comentário para lhe alertar para uma situação deveras preocupante:
    Ao ler um comentário de Michael Henningan do site Finfacts Ireland, sobre a economia irlandesa este constatava um sinal preocupante:
    de 1998 a 2008 foram criados quase 500.000 novos postos de trabalho, mas, no sector de bens transacionáveis a criação líquida, para o período tinha sido, apenas, de 4.000???!!!
    Em 2006, ano do pico da criação de novos empregos, criaram-se 83.000 postos de trabalho, mas, destes, apenas 6.000 foram para sectores de bens transacionáveis??!!

    Como está a par e atento ao que se passa, o caminho para a recuperação, tem muito mais actores e mais competição...Sinceramente, neste contexto, algumas atitudes e comportamentos a que tenho assistido em Portugal e em Espanha só são explicáveis por uma dose incomensurável de insensatez....

    Cumprimentos
    joão

    ResponderEliminar
  10. Muita confusão faz a Lisboa quando se investe no interior...

    ResponderEliminar
  11. Investir no interior??? Só de for no interior do empreiteiro que fez aquilo...

    ResponderEliminar
  12. Caro Tonibler,

    Absolutamente, vamos pelo caminho de concluir no fim que seria melhor nem ter começado...é uma bela conclusão, que nos deve deixar a todos muito orgulhosos dos lideres que escolhemos...
    Quanto ao famoso "investimento no interior" reveste-se de particular humor a expressão "investimento", não concorda?

    Caro João,

    Apesar de tudo, de acordo com os números que cita, a Irlanda sempre foi criando alguns empregos no sector dostransaccionáveis...nós estamos a destruí-los a ritmo frenético.

    ResponderEliminar
  13. Anónimo12:13

    Não esquecer que o nosso PM é um voluntariosos e quer fazer obra e investimento público onde for possível. Tem a esquerda a incentivá-lo.
    O Povo votou nele, muito por esta capacidade de fazer. Agora...aturem-lo.

    ResponderEliminar
  14. Pois é, caro Agitadior, esse comentário vem carregado de realismo...o problema é que a função "aturar" cabe igualmente aos que escolheram e aos que não escolheram - assimetria bem pouco equitativa, convenhamos!
    Os que escolheram deveriam, por exemplo e por uma questão de equidade, suportar em exclusivo os aumentos de impostos...se eles é que gostam disso...

    ResponderEliminar