quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Magalhães, as operadoras de telecomunicações e o apoio social escolar

À primeira vista não passaria pela cabeça de ninguém relacionar o computador Magalhães com Acção Social Escolar (ASE) e esta com um acerto de contas feito pelo governo anterior com as operadoras, no âmbito da Fundação para as Comunicações Móveis (FCM). Mas nos tempos que correm não existem improváveis. A edição on line da revista Visão revela que, pouco tempo antes das eleições legislativas, o ex-ministro Mário Lino terá procedido a um acerto de contas com as operadoras móveis à custa de uma transferência de 180 milhões de euros provindos da ASE.
Salta à vista que há algo que não bate certo na notícia. Se é verdade que a Mário Lino cabia a tutela da FCM, a gestão das verbas alocadas à ASE era da responsabilidade da ministra da educação e do secretário de estado adjunto do ME em que estaria delegada esta competência.
Parece, aliás, ter passado despercebido um despacho do referido secretário de estado, publicado na II S. do Diário da República de 17 de Agosto de 2009 (Despacho nº 18987/2009), que regulamenta as comparticipações do ministério nos encargos escolares dos alunos mais carenciados. No seu artigo 12º estabelece-se o "direito a apoio especial no quadro do programa de acesso aos computadores pessoais e à banda larga os alunos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário". Pelos vistos ninguém na altura reparou na porta que por aqui se escancarou, apostando eu que a defesa do governo vai ser feita exactamente por aí. O tal "acerto de contas" mais não é do que a expressão desta extensão do apoio social, prevista no despacho.
Seja como for, as informações agora divulgadas são politicamente relevantes porque há que dar resposta pelo menos as estas duas questões:
1ª - É legítimo ao governo alocar os recursos da ASE (que calculo que sejam parcos perante tanta necessidade!) a procedimentos de aquisição de computadores ou para facilitar o acesso à banda larga, ainda que se considere (e eu estou entre os que considera assim) ser muito importante a democratização das novas tecnologias no âmbito do processo educativo?
2ª - É admíssivel que o "acerto de contas" com as operadoras de telecomunicações, no quadro de uma Fundação que - imagino - foi instituida com o propósito de captar meios de apoio ao acesso universal às tecnologias de informação, se faça não com recursos das próprias operadoras (primeiras beneficiárias do alargamento do mercado assim conseguido)? Ou então que não se faça com meios do Estado destinados ao investimento nesta área - necessariamente a cargo do ministério competente -, mas à custa de dinheiros que o Parlamento destinou ao apoio social dos alunos quando aprovou o OE para 2009?

6 comentários:

  1. Caro Ferreira de Almeida,

    Como comentário a este excelente texto finalizado com questões pertinentes, aqui fica mais uma quadra:

    O Magalhães navegador
    deve sentir-se humilhado
    na pele deste computador
    de um regime tresmalhado.

    ResponderEliminar
  2. Grande poeta, Manuel Brás! «Ridendo castigat mores»...
    Será que água mole em pedra dura tanto dá até que fura?
    Precisa-se!

    ResponderEliminar
  3. Mas a metade do PIB que nos é subtraída, não é toda com a desculpa da redistribuição da riqueza? E não sabemos todos para onde ela é redistribuída? Então, o que isto tem de diferente?

    ResponderEliminar
  4. Anónimo10:02

    Meu caro Manuel Brás, as suas quadras são um verdeiro estímulo!

    ResponderEliminar
  5. Caro Alberto Valadão e caro Ferreira de Almeida,

    Agradeço as palavras simpáticas constituindo mais um estímulo para os meus devaneios... Assim sendo, aqui ficam mais umas quadras:

    Na sua longa aventura
    de contas mal explicadas,
    questiona-se a fartura
    destas práticas intrincadas.

    O Magalhães foi audacioso
    na viagem de circunvalação,
    mas neste regime falacioso
    não se espera tal elevação.

    ResponderEliminar
  6. Caro Manuel Brás

    Na parte que me toca não tem que agradecer absolutamente nada! Bem pelo contrário. Ainda por cima, «mimoseou-me» - e creio que aos demais leitores - com mais duas excelentes quadras. Não é Poeta quem quer mas quem já nasceu Poeta!

    ResponderEliminar