1. Distraídos com as peripécias do World Soccer na África do Sul, nem nos damos conta de que na frente financeira se assiste a um agravamento da crise das dívidas soberanas - nesta altura a Grécia tem de pagar mais de 10% na dívida a 10 anos (!), Portugal e Espanha continuam sob suspeita dos investidores, à medida que vão emitindo dívida, vão pagando cada vez mais caro.
2. Neste contexto, percebe-se que as soluções ensaiadas pela União Europeia e pela Zona Euro em especial parece não convencerem os mercados (os temíveis “especuladores” na retórica da desculpabilização dos apaniguados do regime...) – nem mesmo a criação do “Fundo de Apoio às Vítimas da Especulação e das Agências de Rating” (FAVEAR), apesar de ter reunido € 750.000 milhões de compromissos dos Estados membros e de ter dado já a mão à Grécia, consegue superar a falta de credibilidade destes emitentes soberanos.
3. Talvez esta seja uma boa oportunidade para dar atenção a uma proposta original, avançada por um colunista do F. Times na edição de 15 do corrente, Cambiz Alikhani, visando uma solução radical para este problema larvar das dívidas soberanas da zona Euro.
4. Curiosamente, Alikhani,tal como o 4R (será visita habitual deste blog?) considera “naive” a reacção dos políticos europeus quando acusam os especuladores de causarem um problema de liquidez das dívidas europeias, iludindo dessa forma a verdadeira natureza do problema com que estamos defrontados, que é na sua opinião um problema de solvência e não de liquidez apenas.
5. Exemplificando com o caso da Grécia, Alikhani sustenta que, não fora o apoio de emergência facultado pelos seus Pares do Euro, a Grécia teria já entrado em incumprimento, necessitando de uma reestruturação da sua dívida pública,tendo desencadeado um “event of default”.
6. Mas vamos à proposta de Alikhani, que se desenvolve em 4 pontos, a saber:
- Criação imediata de um Fundo Monetário Europeu (FME), que seria dotado de um capital de € 750.000 milhões, valor idêntico ao do pacote de emergência acordado pelos países do Euro para o dito FAVEAR;
- A primeira missão do FME consistiria em adquirir no mercado a totalidade da dívida grega, calculada em € 260.000 milhões, passando a negociar as condições dessa dívida com a Grécia, como credor único. Em contrapartida desta “benesse”, o FME ficaria com autoridade absoluta sobre a política orçamental e financeira grega até que a situação das finanças públicas deste país se pudesse considerar normalizada, ficando teoricamente em condições de voltar aos mercados;
- Ao mesmo tempo, o FME anunciaria que, durante um período de 18 meses, cobriria a totalidade dos financiamentos do Estado em Portugal e Espanha, tendo igualmente como contrapartida um controlo directo sobre a política orçamental e financeira dos dois países;
- A União Europeia assumiria o objectivo de, até 2015, adoptar uma política orçamental unificada – os países que não quisessem aceitar essa nova dimensão da politica europeia anunciariam desde já a sua intenção de se retirar do Euro embora podendo manter as suas novas moedas ancoradas ao Euro através de uma relação cambial explícita.
7. Alikhani sustenta que deste modo a União Europeia seria capaz de comandar os acontecimentos em lugar de andar a reboque destes como até agora tem sucedido.
8. Será este plano proposto por Alikhani técnica e politicamente viável? Tecnicamente até admito que sim, embora não fosse fácil...mas parece-me que o seu destino é o fundo da gaveta...e talvez tivesse condições para resolver o problema, quem sabe?
Continuamos, Sr. Dr. Tavares Moreira à espera que das opiniões e contra-opiniões expressas pelos gurus da economia e finança mundial, uns já estabelecidos, outros, ansiosos de que às suas opiniões seja reconhecido o mérito que julgam merecerem, surja a solução mágica, o ovo de Colombo, a ideia salvadora, que irá salvar a Europa desta crise.
ResponderEliminarAqui do nosso cantinho, encolhidos numa pequenez que ha séculos nos tolhe, vamos assistindo alienadamente,ao apodrecimento das nossas estruturas económicas, convencidos de que ja nada se pode fazer, que resulte na reversão e recuperação da nossa economia, esperançosos que a solução, se vier a surgir, nos será oferecida de bandeja, talvez pela mão de um país rico que nos dirá; -como vocês são bons rapazinhos e se portam bem, tomem lá este doce, vão em paz e que o Senhor vos acompanhe.
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarNem o município de Vila de Bispo aceitaria tais condições, pelo que a proposta parece absurda. Nem tecnicamente viável é, pelo simples facto que está a resolver um problema financeiro sem perceber o problema económico gerado.
Ao contrário do que é dito, acho que o fundo chega e sobra. Basta esperar e deixar o tempo correr. às primeiras notícias de redução da dívida, estes génios da economia estarão a clamar pelas virtudes dos estados enquanto motor da economia europeia e como forma de combaterem o perigo chinês.
Caro Bartolomeu,
ResponderEliminarEsse final radioso do "...tomem lá esta doce, vão em paz e que o senhor vos acompanhe" parece dificilmente compaginável com a ideia de substituir os estados nacionais na condução da política orçamental...
Se me permite a sugestão, eu talvez dissesse "...vão em paz mas a partir de agora deixam de mandar na vossa casa...".
Caro Tonibler,
Não o sabia tão europeista, tão convicto da renovação dos políticos europeus...
Tiro-lhe o chapeu pela metamorfose, meu Caro, ou então não percebi o que li...
Abyssus abyssum invocat...
ResponderEliminarA escassez de liquidez
é, cada vez mais, notória,
tal tem sido a languidez
como força probatória.
Os impasses sucessivos,
de total desorientação,
são retratos bem expressivos
de uma clara degradação.
É tal a desorientação
na Europa esfrangalhada
sendo a plena constatação
da política tresmalhada.
Precioso esse breve intrito latino, caro M. Brás!
ResponderEliminarMas não é só a escassez de liquidez...é pior ainda o excesso de dívida, ou seja uma forma negativa de liquidez!