terça-feira, 7 de setembro de 2010

O reconfortante argumento da Estabilidade Política...

1. Anda para aí uma teoria, muito generalizada, segundo a qual o País precisa agora de Estabilidade Política, dada a gravidade da situação em que nos encontramos...como corolário, os seus porta-vozes afirmam que é o próprio interesse nacional que reclama Estabilidade Política.
2. Esta teoria, entre outros aspectos, omite que temos vivido em Estabilidade Política há mais de 5 anos e que, nem por isso, a situação do País melhorou...muito pelo contrário, os sintomas de pioria agravam-se continuamente: (i) impostos cada vez mais pesados, (ii) economia em declínio, (iii) desemprego sempre a crescer, (iv) endividamento externo galopante e tendencialmente asfixiante...
3. Esta teoria converte a Estabilidade Política num fim em si mesma...ou seja não importa como é que a Estabilidade Política é utilizada, se para bem do País ou não – o que importa é a estabilidade enquanto tal, se temos estabilidade e vivemos cada vez pior pouco importa, temos estabilidade e isso nos basta...
4. Confesso que esta teoria me impressiona pela sua intrínseca perversidade, uma vez que converte aquilo que deveria ser um instrumento de realização do bem-estar – tanto quanto possível – num fim autónomo e auto-justificado, que dispensa qualquer legitimação em função dos resultados que se mostre capaz de produzir...
5. Sendo assim e em última análise esta teoria da defesa da estabilidade “à outrance” passa por cima do interesse colectivo para se fixar exclusivamente no interesse daqueles que detêm o poder e que o querem manter a todo o custo independentemente do interesse dos cidadãos...
6. Os naturais defensores da Estabilidade Política, ou seja os que dela beneficiam em detrimento da grande maioria dos cidadãos, encontraram agora um aliado de peso: os mercados que, alertam, não nos perdoarão um período de instabilidade...sofreremos um agravamento brutal dos juros da dívida externa, quem sabe se não nos vão mesmo fechar a torneira do crédito...
7. Não deixa de ser curioso verificar que este aliado estratégico dos situacionistas era não há muito tempo um inimigo a abater...
8. Quem não se recorda da teoria da conspiração organizada pelos mercados, pelas agências de rating e pelos Americanos que pretendiam (sem o conhecimento de Obama, claro) destruir o Euro e atingir em 1ª linha as economias do sul da Europa - até há poucos meses tema obrigatório dos discursos situacionistas?
9. Viva pois a Estabilidade Política! Com ela temos assegurado pelo menos que: (i) a economia nacional vai continuar a declinar, (ii) o rendimento dos cidadãos e o nível de vida continuarão por isso a baixar sustentadamente, (iii) o desemprego não parará de subir, (iv) os impostos continuarão a agravar-se, (iv) o endividamento externo crescerá a ritmo galopante, (v) a dependência financeira externa acabará por nos deprimir...
9. Mas que importa tudo isso se podemos gozar de uma invejável Estabilidade Política?

9 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderEliminar
  2. Haja paciência...

    Neste mundo de aparências
    e falsas estabilidades,
    germinam tantas deferências
    lotadas de boçalidades.

    Por um caminho espinhoso
    tão duro como decadente,
    este regime vergonhoso
    é totalmente imprudente...

    ResponderEliminar
  3. Quando prestei serviço militar, fui colocado em Mafra, Escola Prática de Infantaria, onde fiz a recruta e a especialidade. Um dos serviços que me calhou, foi de fachina à cozinha. Como se sabe, as instalações da E.P.I., ocupam uma vasta área do Convento de Mafra e a cozinha e o refeitório são os originais, com as enormes mesas em pedra mármore, os paineis de azulejos a forrar as paredes e o lajedo no chão. Nesse lajedo existiam uns sulcos que ligávam aos primitivos esgotos. Sucedia que desses rêgos, surgiam como se aquilo fesse a sua casa, ratos do tamanho de coelhos... já grandotes.
    Aquilo causou-me enorme estranheza, mais ainda quando constatei que tanto o cuzinheiro como os ajudantes, já achavam aquilo normalíssimo.
    Quando numa das "sessões plenárias" que aconteciam mensalmente com a presença do comandante e oficiais do quartel, me foi dada oportunidade de colocar uma questão, aludi àquela experiência e perguntei directamente ao Comandante se não seria possível fazer nada para eliminar a "praga" dos roedores.
    O comandante ficou uns momentos hesitante e um dos oficiais tomou a palavra e justificou; que não, que não se podia fazer nada, porque a cidade de Mafra encontrava-se, segundo um estudo feito por técnicos da matéria, completamente "minada" pelos bichos que escavavam um emaranhado de túneis subterrâneos, que lhes permitia chegarem a todo o lado.
    Que a única solução, seria evacuar a cidade durante um tempo indeterminado e proceder a técnicas de desratização.
    Terminada esta explicação, o comandante perguntou-me se desejava colocar mais alguma questão.
    Respondi-lhe que não senhor, que uma vez que a rataria já tinha minado subterrâneamente a cidade toda, só esperava que enquanto ali estivesse aquilo não se desmoronasse tudo e não fôssemos todos, tropas e moradores, devorados pelos ratos.
    Pelos vistos, a rataria, leva sempre a melhor, caro Dr. Tavares Moreira. E então, com a desculpa da estabilidade, é vê-los avançar, minar e escavar túneis...

    ResponderEliminar
  4. Caro Tavares Moreira

    Toca num ponto muito importante, tal como há mais de 40 anos, nessa altura também, não se tocava no ultramar e na unidade nacional; assuntos tabú, provocavam (na época)mais divisões do que as que o futebol hoje levanta.
    Nessa altura, como agora, os bonzos do regime viviam do imediatismo/imediato, o horizonte do acontecimento ficava-se pela semana ou, na melhor das hipoteses pelos dois meses.

    Há cerca de um ano Jaime Nogueira Pinto recordou que, em 1968 o regime comemorava 35 anos e 70 % da população estava excluída da participação política, (eram mulheres, analfabetos, sem curso superior, etc); em 2009 este regime comemorava 35 anos e 70% da população não participa no processo político;
    A roda da nora volta sempre ao mesmo sítio.
    A diferença é que, para fugir às responsabilidades nossas e só nossas, o futebol serve, com ainda mais intensidade, de escape às responsabilidades.

    Por último, é um argumento para ileterados, esse da "estabilidade política". Democracia é um sistema em permanente tensão e conflito; o voto é o meio de exercício da democracia, por isso, que raio de argumento é esse que nega, aos cidadãos o meio de exerçer os seus poderes?

    Cumprimentos
    joão

    ResponderEliminar
  5. Se uma economia, qualquer que seja, dependende políticos (estabilizados ou não), já foi! Portanto, quando se houve falar nisso é tempo de nos preocuparmos.

    Quando vemos o Mário Soares a falar nisso, então é mesmo altura de pegar no papelinho que andam a distribuir no Pingo Doce, sobre a constituição de reservas alimentares caseiras, com outros olhos.

    Mas isto sou eu irresponsavelmente a atentar contra as conquistas do estado social ao serviço dos especuladores da economia de casino.

    ResponderEliminar
  6. Caro Paulo,

    Estática, tem toda a razão...mas também Estatista, se concordar...
    De resto, neste folclore político, Estática e Estatista estão em relação de promiscuidade recíproca - quanto + Estática, + Estatista; quanto + Estatista, + Estática...

    Caro M. Brás,

    Já lá dizia o Poeta "Neste mundo de aparências e falsas estabilidades...", muito bem dito!

    Caro Bartolomeu,

    Quer dizer que seguimos percursos semelhantes, pois tb eu percorri as veredas da Tapada, provei o terrível rancho e ouvi as fantasmagóricas histórias dos ratos que infestavam os subterrâneos do Convento...
    Evocações à parte, aqui estamos com histórias de ratos muito bem organizados, ontem como hoje, com a diferença de os de ontem não conhecerem ainda a arte do controlo da comunicação social...

    Caro João,

    Bem lembrada essa comparação com o período da "outra senhora"...
    Estamos a aproximar-nos, a passo estugado, dessa delirante fase em que o interesse nacional justificava sempre o apagamento das diferenças de opinião política...
    Também agora o suposto interesse nacional justifica a manutenção, a todo o custo, de um "status quo" de folclórica decadência...

    Caro Tonibler,

    Esse atentado contra o Estado Social, que tanto custou a erguer e que os nossos dirigentes tão estoicamente defendem - ainda que ao serviço da economia de casino - é mesmo uma grande irresponsabilidade...
    Espero que meu Amigo repense este tema e se torne um devotado apreciador e mesmo um prosélito da Estabilidade Política, em nome do interesse nacional!

    ResponderEliminar
  7. Caro Dr. Tavares Moreira, pelo facto de ter nascido 10 anos depois do meu Amigo, conferiu-me a vantagem de ter sido hospede da EPI, dois anos após a revolução de 25 de Abril.
    Por isso, a minha experiência foi substancialmente diferente no que respeita à qualidade do rancho que era servido. Com efeito, na minha época, o cozinheiro era um civil avençado, a cozinha estava equipada com modernos equipamentos.
    Apesar disso, após aquela faxina que referi no comentário anterior e por ter feito uma boa amizade com o cozinheiro e o restante pessoal, passei a almoçar e jantar, na salinha reservada, e o menu era sempre diferente do que era servido ao restante pessoal.
    Depois o resto da recruta foi uma brincadeira passada no "recreio" da tapada.
    Terminada a recruta, passei a jantar fora do quartel.
    Terminada a especialidade, saí de Mafra, para o Forte de Alto do Duque, como morava em Algés... olhe, usando o termo militar, foi "uma peluda"!
    ;)

    ResponderEliminar
  8. Quando a estabilidade política se confunde com a estabilidade... dos políticos e acólitos!
    É que o mercado do "desemprego" não está para brincadeiras!
    Mas, afinal, de quem é a culpa?
    Dos "meninos", ou de todos nós que permitimos este pútrido charco?

    ResponderEliminar
  9. Um verdadeiro privilegiado, o caro Bartolomeu, como não podia deixar de ser, com tratamento de 5 * até no quartel de Mafra, enquanto que os restantes cadetes sofriam as agruras do temível Regimento de Infantaria!
    Não deixei de ir ao Frederico, uma ou outra vez, mas isso era considerado um luxo, naquela época...e não será que agora volta a ser?
    Quanto à diferença de anos, meu Caro, tenho a comunicar que é de 7 e não de 10...
    Abraço de camaradagem!

    Caro maioria quase silenciosa,

    Boa pergunta a do final do seu comentário...direi que em especial dos "meninos", mas com a "nossa" cumplicidade (excepção feita, se me permite, aos alertadores de cosnciências como os do 4R...).

    ResponderEliminar