segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Certificados de Aforro: são estas incongruências que nos deitam a perder...

1. À medida que se aprofunda a crise financeira em que o País se encontra mergulhado, torna-se cada vez mais evidente o tremendo absurdo da política de “extermínio” dos Certificados de Aforro (CA).
2. Desde que atingiu um pico em 31 de Janeiro de 2008, com € 18.186 milhões – correspondente a 16,24% da dívida pública directa - o saldo da dívida representada por CA tem vindo a cair quase ininterruptamente, cifrando-se em € 16.096 milhões em 30.09.10 – apenas 10,89% da dívida pública directa.
3. Aliás o ritmo de resgates tem vindo a acentuar-se, pois só nos primeiros 9 meses do corrente ano atingiram, em termos líquidos, € 775 milhões - mais de € 86 milhões/mês - contra uma quebra média mensal de € 57 milhões nos anteriores 23 meses (Fev/2008 a Dez/2009).
4. Mesmo a criação dos novos Certificados do Tesouro (CT), cuja emissão se iniciou em Julho do corrente ano, não mostra aptidão para compensar a perda das poupanças em CA – de Julho a Setembro foram colocados € 286 milhões em CT, menos do que os € 331 milhões de saídas de CA no mesmo período.
5. E dos € 286 milhões de CT colocados, mais de metade (€158 milhões) foi em Julho, mês de lançamento, nos dois meses seguintes a colocação foi muito inferior e largamente superada pela saída dos CA...
6. Quando nos apercebemos do elevadíssimo custo da colocação da nova dívida pública e da cada vez maior dificuldade em coloca-la, seja no País seja sobretudo no exterior, e pensamos que a redução do saldo dos CA obriga o Estado a emitir dívida de substituição, custa a crer no grau de absurdo atingido por esta política...
7. Sabemos que se mostra absolutamente necessário (i) estimular a poupança dos particulares no sentido de reduzir o imenso “gap” entre a despesa e a produção, (ii) estimular os residentes a adquirir dívida pública em ordem a reduzir o recurso a poupança externa, (iii) minimizar a subida dos custos da dívida, muito mais elevados como se sabe nas outras formas de dívida titulada do que nos CA.
8. Sabemos ainda que a crescente escassez da procura externa de dívida pública portuguesa – que nos pode impor custos elevadíssimos na colocação de dívida nos tempos mais próximos - aconselharia vivamente a que se procurasse por todos os meios incentivar os residentes a canalizar as suas poupanças para aplicações em dívida pública.
9. Sabendo de tudo isto, a política de penalização das poupanças aplicadas em CA é um erro tão grande que suscita naturais interrogações quanto ao que a possa justificar, parecendo transpor ousadamente o umbral da insanidade...
10. São estas incongruências que nos deitam a perder...

14 comentários:

  1. Permito-me trazer à colação um texto de 20 de Maio p.p., postado da Drª Margarida Corrêa de Aguiar sobre, precisamente, o então anunciado lançamento dos certificados do tesouro, que tomei a liberdade de comentar.
    Com a intuição própria de um leigo, aventei que, na melhor das hipóteses, os certificados do tesouro poderiam atenuar a sangria dos resgates verificada nos certificados de aforro, bastando, para tanto, que aqueles comparassem favoravelmente com estes.
    O rigor do diagnóstico do Dr. Tavares Moreira demonstra que, ainda assim, terei sido optimista…

    Mas suscitei, então, outra questão, para a qual gostaria de beneficiar da S/ douta opinião, Caro Dr.Tavares Moreira.
    Tendo em conta a escassez aguda de poupança, uma postura mais “agressiva” do Estado não seria susceptível de agravar a já de si precária liquidez dos bancos (sobretudo das IC de menor dimensão), em resultado da consequente migração de depósitos para aqueles instrumentos de dívida pública?
    Se esta questão for pertinente, como ultrapassar o problema?

    Numa perspectiva oposta, a esta questão adiciono outra, que, curiosamente, me ocorreu esta tarde, quando nomeava à penhora, justamente, créditos titulados por instrumentos de dívida pública, numa das inúmeras execuções que patrocino…
    Entre 1960 e 1998, os certificados de aforro gozaram de uma garantia de impenhorabilidade, a qual se perdeu com a entrada em vigor do novo regime geral de emissão e gestão de dívida pública.
    Desde então, e numa fugaz dúzia de anos, as famílias deslumbraram-se com o crédito fácil, desenvolveram hábitos consumistas, em detrimento da poupança, endividaram-se e, em última instância, tornaram-se insolventes.
    Ao ritmo a que crescem as acções e procedimentos judiciais para cobrança de dívidas, não andarei, certamente, longe da verdade ao afirmar que são mais as famílias executadas que as que não o são.
    Neste contexto, que conheço bem, haverá um número considerável de pessoas que preferirá não subscrever qualquer produto de poupança, por mais ínfima que esta possa ser, pelo risco de imediata apreensão judicial a que ficará sujeita.
    Não valeria a pena, então, readoptar um mecanismo de garantia de intangibilidade de, pelo menos, um limar mínimo de poupança?
    Não seria esse, no actual contexto, um factor porventura mais aliciante, até, que o da rentabilidade?
    Não poderia uma solução desta natureza ser financeiramente interessante para o Estado, socialmente importante para as famílias e, ao cabo e ao fim, pedagogicamente útil para um País que se habituou a viver muito acima das suas possibilidades?

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  2. Dr. Tavares Moreira
    É doloroso lembrar o "extermínio" dos Certificados de Aforro, em particular quando olhamos para as necessidades e dificuldades de financiamento.

    Caro Henry
    Fui ler o post que recordou. O seu palpite de que os “certificados do tesouro”, quanto muito, serviriam para atenuar os resgates em massa dos certificados de aforro não teve resposta positiva.
    Era um palpite bondoso, mas os aforradores não pensaram assim e optaram por fazer outras aplicações.

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  3. Bem, se os estrangeiros já não emprestam dinheiro ao estado português então aqueles que o conhecem bem vão emprestar?

    Até podiam fazer a fazer uma campanha na televisão a dizer "meta as suas poupanças na mão do Teixeira dos Santos! Vai ver que é desta que ele acerta"...

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  4. Caro Tavares Moreira

    Tem razão quando afirma no seu post que as incongruências do governo são um elemento assassino na nossa credibilidade externa e compromete qualquer política que pretenda tirarmo-nos da "enrascada" em que nos metemos.
    Acompanho totalmente a interpretação de Tonibler sobre o comportamento face aos Certiifcados de Aforro; quem melhor que os portugueses para conhecer a natureza do governo que têm?
    Comportando-se o estado como um rendeiro rapinante, os certificados de aforro, na perspectiva do potencial aforrador mais não será do que a oferta de um meio de financiamento futuro sem qualquer contrapartida. Ou seja um esbulho legal.
    Neste, como em outros, é que considero que o emagrecimento do estado é uma medida de profilaxia social e não de racionalidade económica; isto pela simples razão que o nosso estado é um ente parasita e, como se passa com todos os parasitas ou os eliminamos ou controlamos de modo a evitar que nos matem.
    Cumprimentos
    joão

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  5. Concordo com o Tonibler. Que português vai emprestar dinheiro ao Estado com este governo a gerir as contas públicas? Só se for obrigado e parece que vai ser esse o caminho.

    Depois de se terem nacionalizado diversos sistemas de pensão, depois de se terem funcionalizado diversas profissões, depois de se terem rasgado diversos contratos de forma unilateral, talvez falte apenas obrigar os cidadãos que ainda sobrevivem a comprar dívida pública alegando, mais uma vez, o superior interesse nacional (seja lá o que isso for).

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  6. Caro Henry,

    Sobre os 3 pontos que suscita:
    1- Quanto à aptidão dos CT para funcionar como substituto dos CA a experiência disponível, se bem que bastante curta, sugere naturais dúvidas...parece que a hemorragia dos CA irá suplantar em muito as aplicações em CT...
    De resto, o perfil dos CT concentra os benefícios no muito longo prazo o que, no actual contexto, não deixará de constituir um elemento dissuasor deste tipo de aplicação.

    2- A dívida pública eventual canibalizadora dos depósitos e outras aplicações nos bancos.
    Repare que não se está a propor atribuir aos CA um estatuto mais favorável do que aquele de que disfrutaram até ao início de 2008 e foi então subita e inexplicavelmente descontinuado...
    Tanto quanto se sabe, os bancos conviviam bem com essa concorrência dos CA - porque haveria agora de ser diferente?

    3- A questão da impenhorabilidade desta classe de activos poderia ser até uma ideia interessante, seguindo a sua sugestão: um último refúgio para as famílias sobre-endividadas.
    Mas parece-me nesta altura uma questão meramente teórica: quem está apostado em "exterminar" os CA, jamais irá atribuir-lhes qq tipo de benefício para os tornar mais atractivos...
    O erro, a teimosia no erro, terá de ir até ao fim...

    Cara Margarida,

    É realmente doloroso, bem o diz. E deprimente, também...

    Caros Tonibler, João e Fartinho da Silva,

    Sou um confesso apreciador do sentido de humor do Tonibler, não raras vezes - como no caso presente - um humor carregado de tons negros...
    Mas peço-lhes que procurem ao menos ver esta questão à luz dos interesses objectivos do Estado - será que é benéfico para o Estado dispensar os CA e, para isso, ter de emitir dívida com um custo de 3 a 4 vezes o juro pago aos CA?
    Ou estarei eu a ver mal o problema?

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  7. Caro Tavares Moreira,

    Eu é que me expliquei mal! É para mim claro que o seu post é acertado e o Caro Tavares Moreira tem chamado a atenção para este problema de forma recorrente e há vários anos.

    O meu comentário destinava-se apenas a antecipar o que, muito provavelmente, irá suceder: obrigar todos os assalariados a comprar dívida pública portuguesa.

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  8. Caro Tavares Moreira,

    Os interesses do estado só são importantes se forem o interesse do país. No caso, não acho que seja do interesse do país meter o dinheiro das poupanças das pessoas nas mãos do estado. Posso ter respondido em tom jocoso, mas a minha opinião é mesmo essa. Juros mais baixos dá despesa menor dá justificação para construir uma pista de submarinos entre a Póvoa do Varzim e Vila Real de SA.

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  9. Caro Tavares Moreira

    Estamos no problema de paralaxe.
    A um ente público que prosseguisse o interesse geral seria lícita a sua interrogação.
    Para um ente rendeiro (rentier) e rapinante como o ente público português a pergunta não tem cabimento.
    O interesse é manter o nível de vida do rendeiro e assegurar que a actividade (que domina bem) de rapina não seja alterada.
    Mais uma vez insisto, o emagrecimento forçado do estado português é uma medida de profilaxia social e não uma medida económica.
    Tonibler tem toda a razão

    Cumprimentos
    joão

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  10. Caro Dr. Tavares Moreira,

    Começo por agradecer a resposta às questões colocadas.

    Relativamente ao ponto 2, a minha preocupação reside no facto das dificuldades de financiamento da banca serem, hoje, mais graves do que eram no passado.
    Aliás, se bem me recordo, no último trimestre de 2008, quando os efeitos da crise paralisaram o mercado interbancário, houve, por parte da banca, em geral, uma fortíssima campanha de captação de depósitos.
    Se não tivesse ocorrido, uns meses antes, a "morte tutelarmente assistida" dos CA, não sei se a banca teria, já na altura, sido bem sucedida nessa campanha...

    Quanto ao ponto 3, será teórico no actual cenário governativo; mas esse, creio (e, acima de tudo, espero!), não tardará a muito a mudar!

    Concordo com Fartinho da Silva, quando diz que, com este governo, todos seremos voluntários à força!
    Mas não confundo Estado com governo.
    Aquele, é sempre e só um; somos todos nós;
    Este, já deu o que tinha a dar (rectius, já tirou o que tinha a tirar).

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  11. Caro Fartinho da Silva,

    O senhor explicou-se muito bem, colocando o "dedo na ferida", tal como o Tonibler!
    Só que estamos em ângulos de anãlise distintos....
    Se o Estado é forçado a recorrer a fontes de financiamento muito mais dispendiosas - por necessidade mal calculada e pessimamente gerida, ou por birra absurda e auto-flagelante como no caso em discussão - quem é que paga? Não são os pobres contribuintes?
    Pelo menos se formos mais bem remunerados nos títulos de dívida a que os particulares têm acesso, conseguiremos alguma compensação...
    Assim, nem recebemos e pagamos na mesma!

    Caro João,

    Estamos absolutamente de acordo quanto à prioridade do emagrecimento forçado do Estado...mas permita-me reiterar o argumento que acabei de explanar (supra) ao Fartinho da Silva.

    Caro Tonibler,

    Um parque de estacionamento de submarinos na Póvoa de Varzim seria, indubitavelmente, um investimento bastante produtivo e defensável...
    Pista de submarinos, só se for em Trás-os-Montes para ajudar o desenvolvimento mais harmonioso do território...
    Implicando a construção de um grande lago artificial, a partir da Barragem do Alto-Rabagão, com canal de ligação ao Atlântico, para não acontecer o mesmo que ao TGV Poceirão-Caia...obrigando os submarinos a fazer a viagem até Trás-os-Montes de autocarro...

    Caro Henry,

    Não tenho por certo que as dificuldades de financiamento da banca sejam hoje muito mais agudas do que em 2008...
    Repare que os bancos não estão oferendo taxas de remuneração dos depósitos assim tão atractivas...
    Quanto ao rseto OK, deixo apenas a remissão para a resposta que dei (supra) ao Fartinho da Silva.

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  12. Caro Tavares Moreira,

    Mas está a partir do pressuposto de que a resolução de um problema, o custo do financiamento, resolve parte do problema geral, os custos gerais e os problema de financiamento. Tal não é verdade, como o Sr. Teixeira dos Santos já o provou à exaustão, metam-lhe dinheiro para gastar que ele gasta. Amanhã teríamos o mesmo problema de financiamento e menos dinheiro nas pessoas. Quero com isto dizer que os custos do financiamento e a dificuldade de o obter é a forma da economia corrigir o estado que o país não conseguiu encontrar. Vai-nos sair do bolso? Claro que vai, mas quem é que fez dos tipos ministros? Não fomos nós?

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  13. Caro Tonibler,

    Aprecebo-me de que estamos a fazer uma discussão sobre linhas paralelas...que, como se sabe, só no infinito é que convergem...
    O que eu pretendo significar é que o facto de os CA serem mais ou menos atractivos não altera em nada a escala da despesa pública - esta é um dado, monstruoso é certo, insuportável é certo tb, mas um dado...
    E, sendo o nível de despesa pública um dado, é sempre preferível que os contribuintes possam ter alguma forma de compensação - por hipótese subscrevendo CA xcom uma remuneração compatível - do que pagar para que sejam terceiros, nomeadamente não-residentes, a comer todo esse bolo...
    Que a despesa pública é dolorosamente excessiva e que urge corrigir esse monstro, estamos absolutamente de acordo, mas o meu ponto não é esse, agora...
    Se não o conseguir convencer, mesmo assim, então paciência, encontraremos por certo outros temas em que esse entendimento será mais fácil...

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  14. Caro Tavares Moreira, a perda de confiança tem um preço muito alto, não acredito que se reestabeleça agroa com mais leis e mais incentivos, todas as garantias que são dadas num dia são retiradas à primeira dificuldade, a miopia dos governantes na altura (que ainda são os mesmos) foi para poupar uns tostões porque o dinheiro era mais barato lá fora. Pelo menos no valor facial, que é sempre o que custa menos a avaliar.O mesmo se passa com os PPR, quantas vezes já foram incentivados e desincentivados? A pergunta que mais se ouve entre quem ainda não gasta tudo o que tem é:onde colocar as poupanças?

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