terça-feira, 23 de novembro de 2010

Todos contra todos

Está marcada uma greve geral. Esta greve é geral e contra tudo em geral, não há muito que perceber. O maior exemplo de discórdia é entre o Estado e os seus empregados, mas também entre o Estado e os governados, entre a Europa e os Estados, muitos dos que vão desfilar com bandeiras não estão contra os que os empregam ou contra quem os desempregou, mas contra quem manda no País, ou mesmo contra quem manda em quem manda no País, talvez mesmo contra quem manda em quem manda nos que pensam que mandam nos Países. Também já ninguém sabe o que é a classe média e o proletariado, essa palavra desaparecida, nem a luta de classes que animava as greves de outrora, agora há ricos, mesmo que muito pouco ricos em risco de ficar pobres, e pobres, mais ou menos pobres e muito pobres. O que parece também é que todos parecem estar convencidos de que não há grandes alternativas às decisões de que agora se queixam, estas ou outras parecidas, venha o Diabo e escolha. Por cima desta confusão pairam umas entidades estranhas que passámos a tratar pelo nome próprio mas de que só os especialistas de mercados antes tinham ouvido falar, umas tais agências, que tratam de números e não de pessoas, que olham papéis e estudam contas e dossiers mas não conhecem Países, e chega-se ao absurdo de já ninguém saber ao certo quais são afinal as diferenças entre a Grécia, a Irlanda, Portugal, Espanha ou mesmo a Califórnia.
Não se percebendo quem manda, nem porque manda o quê, nem no que manda, não se percebendo quem protesta porque quem está pior não pode protestar, não se percebendo o que querem porque parece que o que querem ninguém lho pode dar, então a única coisa que se percebe ainda é o que é uma greve. Um protesto. Sendo geral, é de todos. Sendo contra incertos, é contra todos. Mas talvez alivie a sensação de impotência, quem sabe?

7 comentários:

  1. Se bastasse ocorrer uma greve geral, para que o sentimento de impotência se "desinstalasse" das nossas tristes realidades, bem andaria este país, as suas consciências e a capacidade reivindicativa da sociedade. Mas... se essas qualidades existíssem, nunca o país teria chegado ao estado em que se encontra...

    Agora... uma histórinha, se me dá lecença...
    Lá pelos idos de mil quatrocentos e tal, mil e quinhentos, viveu no Porto, um rico ocmerciante, conhecido pelo epíteto de "Pedro-Cem", a quem a Fortuna sempre bafejara. Certo dia, ao receber novas da numerosa frota que enviara às terras da Índia e do Brasil, indicando que em breve demandaria a barra do Douro, transportando tesouros que o tornariam ainda mais rico e poderoso, o rico negociante abriu as portas do seu palácio e convidou os amigos para o espectáculo magnífico que, do alto da torre, iriam oferecer os navios mal se chegassem à orla do horizonte, apontados que fossem à foz do rio. A frota, constituída por dezenas de grandes barcos, com as velas bojadas, navegava a todo o pano, demandando o porto, aproximando-se cada vez mais, podendo até divisar-se que vinham mui carregados, com as bordas a tocar as águas serenas do mar. Orgulhoso e maravilhado, julgando já a frota a salvo, junto à embocadura da barra, Pedro-Cem, no auge da sua euforia e desmedida sobrançaria, por se supor já na posse daquela imensa fortuna, exclamou:
    - Agora nem Deus seria capaz de me fazer pobre! No mesmo momento, o horizonte, até ali sereno, entre o branco e o azulado, enuviou-se num só instante: uma tempestade estalou, violenta! As vagas encapelaram-se, medonhas, e ao rugido incessante e infernal toldado de negro, todas as naus foram violentamente atiradas à costa, despedaçando-me, uma a uma, contra os rochedos da praia vizinha. A tempestade descontrolada e brutal, ao mesmo tempo, fez descarregar dois, três ou mais raios sobre o palácio que, depressa, se transformou em fogo por todos os cantos, transformando em cinzas e escombros, deixando apenas as paredes a testemunhar o castigo divino.
    O poderoso comerciante, omnipotente, concho e fanfarrão, caiu de súbito, fulminado, do seu pedestal de espavento, como ídolo de ouro a quem tivessem rachado os pés de barro, resvalando, inexoravelmente, para os abismos da miséria.
    Tal como nesta história, quem se trama são sempre aqueles que tripulam a nau e, não têm forma de evitar a tormenta provocada pela arrogância, sobranceria e blasfémia daqueles que empoleirados nas suas altas torres, desafiam o poder da razão...

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  2. Sempre achei que greves gerais são sempre um excelente oportunidade para perceber quem faz falta e quem não faz.

    Tirando isso, este post parece (presunção à parte) ter sido escrito para eriçar os meus pelos todos."Manda", "Estado e governados" ?? Estamos a falar da Coreia do Norte?

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  3. Começo pela parte final do post para logo voltar ao início.
    Esta greve não é mais do que uma manifestação de impotência perante uma conjuntura adversa, em que todos somos culpados e vítimas. Como V. Exa. sintetiza de forma brilhante no curto título - "todos contra todos".
    De facto, esta é uma greve sui generis, pois não há "inimigos" a abater, nem políticos nem capitalistas, nem sequer a forte convicção de que alguma coisa mudará!... É apenas e só uma greve organizada por sindicalistas inseguros quanto ao seu futuro (julgo eu!). Por arrasto levam muitos desempregados, muitos empobrecidos, muitos sem futuro, dispostos a extravasar a “raiva contida”!
    Diz o provérbio que a conversa é como as cerejas! …
    Lembrei-me agora a propósito de “raiva contida”, se ela for muita, este governo tem a oportunidade de justificar o investimento dos cinco milhões em equipamento para as polícias. Por isso é melhor que o próximo governo releve este péssimo ato de gestão, não vá dar-lhe jeito…

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  4. Please allow me to second the motion. Uma greve geral...to vent frustrations, helplessness, despair. Uma boa manifestação, ou várias, pode(m) evitar uma má revolução. Má, porque inútil. Já não vivemos na "Casa da Mariquinhas" mas no "Colégio dos Ouvidores" e pouca gente se apercebeu disso.
    A propósito do interessante comentário de "Bartolomeu", as minhas tias do Porto contaram-me a mesma história há muitos anos, com a mesma moral acerca do castigo de Deus. O que seria cruel ter dito às boas (e já falecidas) senhoras, é que o castigo da arrogância é um tema moral objectivo, comum a muitas culturas. Que esse castigo venha da parte de um deus, uma construção mental subjectiva mesmo que partilhada pelo imaginário colectivo, não tem nada a ver com a razão, pelo contrário. But it brings the reassuring confort of Linus blanket, of Peanuts fame, yes it does... particularmente nestes tempos conturbados.

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  5. Caro Caged, se entendermos o Homem como expressão maior do Divino, entenderemos que a razão é a base mais sólida do equilíbrio...
    Seja como for... impõe-se um grito de solideriedade "Libertem os Albatrozes!!!"
    http://www.youtube.com/watch?v=Rn21OaOd80E&feature=related

    (Não é bem um albatroz, mas é da família... e depois conta ao outro que lhe dedicaram uma canção, aqui no 4R)
    ;)

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  6. Suzana
    É um grito de indignação! As pessoas estão zangadas e revoltadas com tudo e com todos porque sabem que no dia seguinte os problemas não serão resolvidos sem os sacrifícios que estão a ser exigidos, mas sem a certeza de que desta vez serão suficientes.
    Talvez que seja uma ocasião para as pessoas reflectirem sobre os erros do passado e como podem contribuir para que o futuro seja melhor.

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  7. Caro Bartolomeu, agradeço a solidariedade a a música dedicada as aventuras do primo Jonathan. Uma espécie de Fernão Mendes Pinto no mundo das gaivotas. A distant relation...

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