1.No início da campanha eleitoral apresentamos aqui, como tem sido hábito noutros pleitos eleitorais, uma previsão dos seus resultados, que agora recordamos:
- Abstenção: 40%
- C. Silva: 57,5 a 60,5%
- M. Alegre: 22,5 a 25,5%
- F. Nobre: 6 a 8%
- F. Lopes: 6 a 8%
- Outros: 1 a 2%
- Brancos e Nulos: 1 a 2
2.Podemos hoje constatar que esta previsão, não constituindo um rotundo fracasso – não foi pior nem melhor do que sondagens divulgadas por empresas profissionais - falhou em alguns pontos capitais: no nível de abstenção e nos chamados votos de protesto.
3.A abstenção, 53%, foi bastante superior à nossa previsão. Não dramatizando excessivamente este fenómeno, como alguns comentadores do regime têm feito por razões que facilmente se entendem – basta recordar que na reeleição do Presidente Sampaio a abstenção foi superior a 50% e ninguém parece ter-se incomodado com isso – julgo terem existido factores específicos que explicam este agravamento relativo da abstenção, para além dos factores comuns que foram o facto de haver um vencedor antecipado e de já então, como hoje (embora não tanto como hoje) existir um elevado cansaço da política.
4.Dos factores específicos destacarei três: (i) a “CAMPANHA de SUJIDADE”, sobretudo por parte de Manuel Alegre e de Defensor de Moura, (ii) as anomalias técnicas com a identificação dos números de eleitor a partir do cartão de cidadão (indesculpável e que num país civilizado teriam já determinado a demissão do Ministro responsável pelo serviço em causa) e (iii) o intensíssimo frio que se fez sentir em quase todo o País e que terá desincentivado muita gente de se deslocar até às secções de voto.
5. Uma referência especial ao factor “CAMPANHA de SUJIDADE”, estratégia materialmente executada por Alegre e Defensor (este último nem no dia das eleições desistiu de voltar ao tema...). Refiro-me a “sujidade” em sentido literal: a campanha desses dois candidatos foi especialmente dirigida a "sujar" a imagem do candidato C. Silva...e quase conseguiram os seus objectivos – ao contrário da opinião da maior parte dos comentadores que entendem que essa estratégia não resultou.
6. Essa estratégia só não resultou em termos de votação nos seus executores materiais – Alegre e Defensor foram os grandes derrotados da noite eleitoral – mas só por ingenuidade se pode pensar que os objectivos da campanha de sujidade consistiam em obter votos para os executores materiais...o objectivo seria precisamente provocar uma abstenção tão elevada que forçasse a uma segunda volta...e ficaram perto de conseguir os seus intentos...
7. Portanto e em relação à nossa previsão, C. Silva e M. Alegre ficaram um bom bocado aquém das percentagens previstas (-4,5% e -2,75% respectivamente), F. Nobre ficou muito acima (6%) e tb ficou muito acima o candidato “Gavroche” da Madeira (+3%), este último conseguindo a proeza de quase provocar uma revolução na R.A. Madeira...
Ainda bem acima ficaram também os votos brancos e nulos, que excederam 6%.
Acertamos em cheio apenas na votação de F. Lopes – uma votação bem mais previsível, refira-se.
8.O chamado voto de protesto superou também bastante as nossas expectativas, certamente impulsionado, entre outros factores (cansaço, já referido, desilusão com a classe política) também pela tal “CAMPANHA de SUJIDADE” que terá funcionado como “driver” das diversas formas de protesto: abstenção, voto branco ou nulo, voto nos candidatos independentes...
9. Está feita a história destas eleições, realizadas num dia de clima muito hostil, nem S. Pedro quis ajudar....
Resta saber as suas consequências.
10.Uma delas, ou me engano muito ou vai consistir na alteração do que até agora se convencionou chamar "cooperação institucional".
Vamos continuar a ter cooperação, certamente, mas em vez de "institucional" ela vai ser "amarga"...muito "amarga", mesmo...
Caro Tavares Moreira
ResponderEliminarDestas eleições a principal conclusão que temos de retirar (e que é muito preocupante) é o divórcio entre o eleitorado e os actores políticos.
53% de abstenção, 4.6 % de votos em branco, 14.1 % de votos em FNobre e 4.5% de votos em José M Coelho, signifam que 63% de todo o universo eleitoral nacional, (cerca de 9.6 milhões de cidadãos) não estão de acordo (caso dos que votaram) ou não se reveiem no actual quadro de representação política (caso dos que se abstiveram).
Só estes números deveriam fazer tocar a rebate todos os que se auto denominam "democratas" e "interventores cívicos".
Ontem à noite não se viu ou ouviu nada nesse sentido, apenas aqui e ali alguns "afloramentos".
Não podemos continuar a pensar que o modelo, tal como está é o adequado, apenas os eleitorres é que não estão motivados. É um tipo de raciocínio que pode servir para a Igreja ( que cuida do imaterial) mas, não para um quadro terrenal como é o sistema político.
Torna-se essencial reformular todo o sistema político actual, escolhendo as opçoes que, no contexto presente sejam as mais adequadas.
Anda tanta gente a perorar sobre o "cliente" e a "satisfação do cliente" que me interrogo porque não se deve aplicar ao sistema político a mesma filosofia ou prespectiva.
A campanha "suja" mais não é do que um "afloramento" do mal que prepassa o actual sistema político. Deixou de ser um instrumento enquadrador de acções/projectos para ser um fim em si mesmo: a "política da telenovela" que se refere Joaquim de Aguiar. Há que mudar rapidamente sob pena de nos mantermos enrredados no lodaçal em que nos encontramos.
Por estes argumentos é que discordo completamente da sua conclusão, ao arrepio do que outros pensam/desejam, nada vai ser como dantes depois de 23/01/11.
Cumprimentos
joão
É muito sintomático que desta vez tenha sido o derrotado Sócrates a oferecer - ou, melhor, a pedir - uma cooperação institucional. Tudo indica que o presidente eleito estará muito menos inclinado a grande cooperação do que esteve no primeiro mandato.
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ResponderEliminarPrimeiro queria dizer que, tal como o Banco de Portugal, só farei as previsões finais dos resultados das presidenciais na semana que vem. As boas práticas são para seguir.
ResponderEliminarDepois, relativamente aos problemas do cartão de cidadão, quero dizer que se as pessoas já têm o cartão todo pinoca podem deixar de protestar só porque não conseguem votar. Esse tipo de discurso botabaixista não se admite num país que se quer moderno e europeu e onde a modernização dos processos é muito mais valiosa que o seu funcionamento.
Finalmente, gostava de falar da forma como o estado continua a conspurcar o país. Nós continuamos a insistir que o presidente seja eleito entre as pessoínhas que vivem para e do estado, deixando o resto do país em paz. Se conseguirem fazê-lo sem a barulheira do último fim-de-semana, agradecíamos, embora tenhamos que reconhecer que estão muito melhor porque fizeram muito menos barulho e foram muito mais discretos desta vez. Não entendemos é porque é que continuam a escrever o nosso nome nos vossos cadernos à espera que a gente vá a vossa festa, mas enfim...
Outra coisa, podiam parar de chamar ao presidente "representante de todos os portugueses"? É que começa a ser ridículo que alguém que é eleito por menos de uma pessoa em cada 5 portugueses, se reclame de "todos". É que 4 de nós todos estamos mesmo nas tintas para ele e para o que ele faz.
Felizmente que agora existe TV Cabo e temos alguma coisa que ver durante as eleições sem ser incomodados.
Caro Drº Tavares Moreira:
ResponderEliminarSobre a abstenção seria interessante sabermos algumas coisas, entre essas o grupo etário e o estrato social dos abstencionistas para assim ajuizarmos das razões que levam 50% dos eleitores a não votarem, deixando que outros o façam por eles, expondo-se desta forma àquilo que for decidido e, por fim, com obrigação de cumprimento.
Compreendo que haja pessoas que não se revejam no sistema vigente; mas uma coisa é não se reverem, outra bem diversa é tornarem-se vítimas voluntárias, pois à falta de sistema alternativo acabam por ter uma minoria a decidir o futuro de uma maioria.
Pela minha parte quando vislumbrar uma alternativa real a este sistema, confesso que também deixo de votar. Até lá, voto umas vezes por aqueles que acabam por se tornarem vencedores e outras pelos vencidos. É um direito de que não passo procuração a ninguém
Muito bem, caro jotac, é assim mesmo, nada melhor do que ser prático e não deixar a decisão em mãos alheias enquanto se discute se haverá um método melhor para escolher.
ResponderEliminarCaro Tonibler, por muito que isso o contrarie, o Presidente da República é o representante de todos os portugueses, se tivesse sido eleito o Coelho graças ao voto dos que não ficaram a ver a Tv Cabo, era o Coelho que o representaria a si e a todos nós onde quer que se apresentasse.De nada lhe serviria a si protestar.
Caro Tavares Moreira, concordo consigo quando diz que o estilo de campanha que os candidatos ditos de esquerda adoptaram só podia ter como objectivo afugentar os eleitores, convencidos de que iriam "bloquear" os votos no candidato a quem dirigiram os seus impropérios. Aquele tipo de táctica não pretendia certamente seduzir os eleitores para votar neles. Enganaram-se e foram eles a sair fortemente penalizados, os portugueses viraram-lhes as costas.cada eleição tem uma história, a destas eleições é muito evidente.
Caro João,
ResponderEliminarPermita-me discordar da interpretação de que o nível de abstenção agora verificado traduz algo de novo no que respeita ao chamado divórcio entre os cidadãos e os actores da política.
Essa abstenção não diverge significativamente da verificada há 10 anos e, se tivermos em conta a aberração da proibição do voto a milhares de portadores de cartão de cidadão bem como a severa hostilidade do clima, provavelmente esta abstenção poderá ser considerada inferior à registada em 2001...
Mais do que a abstenção, o voto em candidatos anti-sistema é que traduz, a meu ver, o cansaço dos eleitores com o actual regime...
O que não deve constituir surpresa depois dos resultados de um inquérito terem revelado, há poucos dias, que cerca de metade dos portugueses (residentes) sentem que hoje se vive pior do que antes do 25/IV...
E não foram inquiridos os não residentes...
Quanto à campanha de sujidade ela foi muito simplesmente uma opção consciente de um determinado estado-maior, bem localizado, de que os dois candidatos referidos foram mais ou menos fiéis executores materiais, visando levar a abstenção a limites impensáveis e retirando toda a força ao candidato vencedor ou, ainda melhor e se possível, forçando uma segunda volta...
Qq outra interpretação, parece-me, entra pelo domínio diáfano da ingenuidade...
Caro Freire de Andrade,
Pedir cooperação nada custa...sobretudo quando quem pede, no caso sub-judice, já se habituou a andar de mão estendida por esse mundo fora...
Caro Tonibler,
O meu amigo assume-se, cada vez mais, como um digno sucessor do velho Diógenes o Cínico...por mais que procure, não consegue encontrar um político com estatuto de decente...
Só lhe falta mesmo a candeia acesa durante o dia, percorrendo as ruas, cada vez mais esburacadas, da capital lusa...
Caro jotaC,
Não possod eixar de concordar coma sua conclusão...não votar, baster-se, é conceder um mandato em branco aqueles que votam...considero tb a abstenção um acto de negação da inteligência, se tiver como motivação o protesto...
Cara Suzana,
Estamos pois de acordo, apenas uma breve nota de esclarecimento: na minha opinião, os candidatos ditos de esquerda não optaram propriamente por um estilo de campanha (de SUJIDADE). Eles foram, primafacie, executores materiais dessa campanha...a opção foi tomada a outro nível...
Concorda?
Caro Tavares Moreira
ResponderEliminarApenas as seguintes notas:
a)Voluntária ou involuntária o nível da abstenção, adicionado aos votos nulos e nos candidatos anti sistema, atingiu níveis preocupantes. Uma solução será envolver mais os eleitores no processo político e não "aproximar" os cidadãos do processo político;
b)O "profissionalismo" da campanha suja que, de facto, existiu, não elide, nem obnubila a questão que coloquei:existe um terreno adequado para medrar esse tipo de métodologia porque, os cidadãos não estão envolvidos e deviam-no estar.
No resto estou genericamente de acordo com as suas observações, ainda que, no modo como lá se chega, possamos divergir.
Cumprimentos
joão
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarEu não questionei a decência de ninguém. Eu não acho que o cargo de presidente da república deva ser ocupado seja por quem for, muito menos por alguém que já dedicou um mandato a espezinhar princípios constitucionais básicos, ainda mais quando muito menos de um quarto dos portugueses o considera digno de tal. Até admito que a minha opinião seja irrelevante, quando se trata da opinião de mais 7,5 milhões de pessoas... Agora, se ele é decente ou não, imagino que sim. Escolhido é que não é de certeza.
Cara Suzana,
Nem os mais antidemocráticos dos princípios republicanos admitem tal coisa. Cavaco é o presidente da república, só. É o chefe do estado, não é chefe do país, muito menos de um país em que a maioria absoluta dos seus habitantes não quer o cargo ocupado. E é só isso que representa - o estado. Apesar de tudo, isto ainda não é a República Popular da Coreia.
Devo a ele, aliás, e à forma como exerceu a sua anterior magistratura, a minha convicção de que o cargo de presidente da república é uma inutilidade redundante e de que Portugal (é este o nome do país, embora o estado não o reconheça) deveria ter uma monarquia que defenda cada um dos seus cidadãos do poder do estado.
Ele nunca será o representante de todos os portugueses porque nunca soube (e demonstrou-o) nem nunca saberá defender cada um deles. E esta defesa não pode ser uma ocupação temporária de alguém que resolveu ir passar uns tempos a Belém, por muito mérito que essa pessoa tenha noutras funções.
Para mim, Cavaco matou a república.
Caro João,
ResponderEliminarCom algumas ligeiras dissonâncias quanto ao valor interpretativo da abstenção, no resto estamos essencialmente de acordo: estas eleições, como provavelmente as próximas, revelam um crescente afastamento e desencanto dos cidadãos em relação ao fenómeno político e aos actores políticos.
O que torna ainda mais condenável a deliberada opção dos candidatos da SUJIDADE pela táctica de incentivo à abstenção!
Caro Tonibler,
Peço-lhe que releia o que escrevi: reparará que eu não disse que o meu amigo tinha questinado a decência dos agentes políticos, mas que "não consegue encontrar um político com estatuto de decente"...
Portanto "não consegue encontrar" não significa que tenha questionado a decência de A ou B, pela simples razão de que não os consegue encontrar...
Diógenes cruzava-se diariamente com muitas pessoas, homens e mulheres, mas não conseguia encontrar um homem...no seu conceito de homem, evidentemente, ele não negava a existência dos que encontrava!
Fique tranquilo, pois, quanto à intenção do meu comentário, não extravasamos o domínio do politicamente correcto!...