Tenho acompanhado a torrente de comentários sobre a escolha de Fernando Nobre para cabeça da lista de candidatos a deputados pelo círculo de Lisboa, apresentada pelo PSD. No fundamental as análises e sentimentos recaem sobre a coerência do candidato e sobre a soberba de quem o candidata. Confesso que pouco me interessa o caso sobre qualquer um destes pontos de vista. O que verdadeiramente ele convoca – pelo menos o que mais me chamou a atenção – é o chocante paradoxo entre o que o exercício da função parlamentar pressupõe e exige, e aquilo que - por menos desastrados ou convincentes que sejam os desmentidos - realmente motiva Fernando Nobre e quem o escolheu.
Explico.
Nobre candidata-se em nome da “liberdade” e da “independência”. Chega mesmo a dizer (entre outras coisas dificilmente imagináveis) que elegê-lo para presidente da AR significa escolher pela primeira vez alguém verdadeiramente livre e independente para exercer as funções que o cargo exige. Mas observo que quem o convidou não só alinha neste discurso como acrescenta que candidata Nobre para o lugar cimeiro da lista por Lisboa e proporá para presidente do Parlamento, porque tem a seu crédito um passado de luta pela cidadania.
Este discurso transmite a inaceitável ideia de que os demais eleitos, filiados nos partidos políticos, não são livres e independentes. Nem apóstolos da cidadania. É esta sensação de desprezo pela liberdade e independência do cidadão filiado num partido, eleito deputado (que a Constituição expressamente consagra no artigo 155º/1), que não é tolerável quando o partido agita, como valor seguro de um cabeça de lista, exactamente a facilidade com que ele se desliga do interesse partidário para dar prevalência à autonomia da sua vontade ou à sua consciência, ao mesmo tempo que anuncia a pré-decisão de o fazer eleger presidente da AR. O paradoxo, é, pois, uma desconsoladora evidência.
Mas mais importante do que isso, este discurso, para além de perigoso para os próprios partidos, ignora que é à consciência e à autonomia da vontade de cada deputado que se apela quando se elege, inter pares, o presidente da Assembleia da República. Por isso é que, com a garantia do segredo de cada voto, a Lei Fundamental faz repousar na consciência dos deputados a decisão sobre quem é mais apto para o desempenho da função de presidir ao parlamento.
Tudo o mais que sobre o assunto se vai dizendo é folclore comum nestas épocas.
É isso mesmo: lapidar e definitivo. Tudo o que se diga, para mais ou para menos, fora do quadro traçado pelo Autor do post, é irrelevante!
ResponderEliminarCumprimentos
Fernando Pobre
Uma pequena ajuda:
ResponderEliminarhttp://mentesdespertas.blogspot.com/2011/04/fernando-nobre.html
Caro Ferreira de Almeida,
ResponderEliminarSubscrevo integralmente o seu texto e interrogações.
Apenas acrescento: um cidadão independente que para execer a sua independência exige que aos outros seja amputada parte da sua independência ao serem "forçados" a votar nele. Que "belo" paradoxo...
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarPrezado Paulo,
ResponderEliminarNada me move contra as candidaturas de independentes nas listas de partidos. Só isso faz sentido num sistema que dá o exclusivo das candidaturas ao parlamento aos partidos políticos. A questão, não é, porém essa. A questão é tão somente a inaceitável superioridade de quem se apresenta como bactereologicamente puro, a tal ponto puro que os impuros deputados só podem elegê-lo para um local no hemiciclo a uma razoável distância deles próprios, e, como convém num nível superior.
O que escrevo seria correcto num mundo ideal. Percebo. Mas não o troco pela "correcção" do mundo real.
Paulo:
ResponderEliminarhttp://www.ami.org.pt/media/pdf/OrganogramaAMI.pdf ?
Já tem barbas longas.
Cumprimentos
Fernando Pobre
Concordo com o Ferreira de Almeida, é um paradoxo e foi exactamente assim que foi percebido ou, pelo menos, intuído, quando se recebeu a notícia. Como um ministro que se junta a uma manifestação contra ele próprio. Haver independentes nas listas não é a mesma coisa, pelo contrário, é cativar para dentro dos partidos os que podem e querem colaborar e se identificam com eles.
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