1.O PCP já anunciou A apresentação, no início da próxima legislatura,de uma proposta de lei com o objectivo de reestruturar a dívida pública portuguesa - tema que, tanto este partido como o BE, glosaram amplamente durante a campanha eleitoral, com os excelentes resultados que sabemos.
2.Não deixa de ser curiosa esta concepção de dívida segundo a qual o devedor é quem define as regras do jogo, independentemente da vontade do credor...se temos dificuldade em pagar, reestrutura-se a dívida e pronto, está o problema resolvido - os credores que tenham paciência, recebem mais tarde, recebem quando for possível, recebem quando for oportuno, se não receberem tudo têm de se dar por satisfeitos com o que recebem, etc...
3.Em suma, os credores “que se amanhem”, temos mais que fazer do que respeitar os compromissos assumidos...
4.Para quem esteja a seguir a novela em curso reestruturação-sim/reestruturação-não da dívida grega – devendo sublinhar-se que neste caso não foi a Grécia quem tomou a iniciativa de falar em reestruturação, foram os seus credores – percebe muito bem quais seriam as consequências de uma decisão unilateral de reestruturação da dívida por iniciativa da República Portuguesa...
5.As consequências seriam, muito simplesmente e pelo menos, as seguintes:
(i)declaração pública de “default” da República Portuguesa
(ii)suspensão de toda e qualquer forma de crédito externo
(iii)reclassificação da dívida portuguesa como “junk”
(iv)corrida em massa aos depósitos bancários para levantar o dinheiro “enquanto é tempo”
(v)falência generalizada dos bancos, que em poucas horas ficariam com os cofres vazios e sem possibilidade de obter crédito do BCE
(vi)congelamento legal dos depósitos bancários por tempo indeterminado
(vii)falência em massa das empresas industriais, comerciais e de serviços impossibilitadas de efectuar pagamentos e recebimentos
(viii)subida astronómica do desemprego, para níveis talvez superiores a 30%
(ix)quebra brutal do nível de vida da generalidade das pessoas
6.Será mesmo isto o que o PCP pretende? Será que o PCP, ou algumas pessoas no PCP pelo menos, não percebem isto, ainda vivem na ilusão de que a economia portuguesa funciona em regime de autarcia, ou de que somos tão auto-suficientes na produção de matérias-primas, bens de consumo intermédio, bens de consumo final e de bens de capital que podemos dispensar o crédito externo?
7.Confesso que não sou capaz de responder a tal questão, embora me custe a crer que tenham bem a noção das consequências catastróficas de tal proposta caso a mesma, por absurdo, viesse a ser aprovada...
8.Se tivessem uma noção aproximada das realidades, não me parece que, por puro tacticismo político – inconsequente é certo - quisessem mesmo insistir numa iniciativa legislativa tão irracional...
9.É o que se pode chamar, com propriedade, uma proposta SUICIDA...
Dr. Tavares Moreira
ResponderEliminarÉ uma proposta suicida que não irá longe. Infelizmente, o PCP e o BE continuam a fazer política da terra queimada.
Perigosos são alguns ilustres economistas que volta e meia gostam de levantar o tema da reestruturação da dívida e da saída do euro. Francamente que considero que este assunto deveria ser tabu.
Agora temos que nos empenhar em cumprir o acordo com a Troika - vai ser uma missão muito difícil - para provarmos que somos capazes de assumir compromissos, incluindo com os nossos credores. É aqui que nos temos que concentrar, seria muito mau seguirmos os passos da Grécia.
No PCP houve sempre dois conceitos que nunca conseguiram compreender: Portugal e democracia. No resto, deverão ter a sua utilidade como adubo, mas não consigo ver muitas mais...
ResponderEliminarA realidade do nosso país, como bem sabe, caro Dr. Tavares Moreira, é que temos uma dívida imensa para pagar. Temos uma taxa enorme de desemprego, temos uma crescente falência das empresas privadas, temos uma pesadíssima administração pública, temos um número imenso e crescente de dependentes das receitas do estado, temos um número crescente de contribuintes que deixam de o ser, temos os principais sectores produtivos paralisados, temos uma taxa de exportação ínfima e uma taxa de importação, exageradamente alta, temos uma população altamente desmotivada e sem prespectivas de saída para a situaçãoeconómica precária em que se encontra.
ResponderEliminarEste cenário que tracei, considero-o minimalista, perante a sua verdadeira dimensão.
Não me parece que a renegociação da divida, ou do seu pagamento, seja a solução de que o nosso país desesperadamente precisa para sair do afogo em que se encontra.
No entanto, não tenho qualquer dúvida, de que outras negociações podem e devem inevitávelmente ser feitas, para que sejam dadas ao nosso país, dentro do quadro da união europeia e dos direitos que lhe assistem como membro de plenos direitos, ajudas e condições para que se reerga, económica, financeira e socialmente.
Caro Tavares Moreira, temo que o cenário que descreveu nas alineas do seu ponto 5 seja precisamente o que irá suceder, com PCP ou sem PCP. Infelizmente temo-o há vários anos e o que está a suceder agora não me apanhou desprevenido e vejo, aliás, como apenas uma paragem do percurso. Esta história de atirar dinheiro para cima de dinheiro sem fundo tem os dias contados e nem os cidadãos dos paises ricos irão aceitar isso eternamente.
ResponderEliminarTendo a concordar que é um tema sobre o qual quanto menos se falar melhor. Mas não sei se será má ideia pelo menos acautela-lo e prever essa possibilidade.
Fora, claro, tudo o que virá atrás disso e que culminará no golpe de misericordia na UE. Talvez dos cacos fique o que era a antiga CEE... talvez, talvez.
Sim senhor, ora aí está um cenário optimista! :D
ResponderEliminarSabe Dr. TM estou cada vez mais convencida de que temos uma paixão intensa e assolapada pela ditadura dos mercados financeiros. Jamais seria possivel conceber a existência humana sem um mercadito financeiro que nos proporcione um creditozito para adquirir bens de 1ª necessidade.
Recentemente descobri que - para mim - uma valisezita Louis Vuitton (original é claro) é, não só, um bem de 1ª necessidade, como também, uma emergência nacional. Eu não sou ninguém sem aquela carteirita específica, o que por sua vez significa que não sou ninguém sem o creditozito (Viva os cartões!) e por sua vez também não sou ninguém sem o mercadito financeiro.
Pergunto-me quantas pessoas em Portugal já tiveram de recorrer aos seus bancos para renegociar os empréstimos à habitação? Bom, pelo menos aquelas que ainda conseguem pagar qualquer coisita, porque há outras que já estão bem além disso não é verdade? O lado positivo da coisa é que os bancos podem agora inovar as suas áreas de negócio e concorrer com as imobiliárias.
Bem sei que os bancos trabalham, geralmente, com dinheiro mas quem não tem cão, caça com gato.
Curiosamente, cheguei da Grécia no passado fim-de-semana. Deixe-me dizer-lhe como estão as coisas por lá:
- dos dias que lá estive, houve manifestações todos os dias;
- as manifestações podem ocorrer a qualquer momento, sem que estejam anunciadas e não há garantias de que sejam pacíficas;
- à partida as greves são informadas com antecedência, ou podem acontecer a qualquer momento;
- os gregos já não estão somente descontentes, estão a ficar muito zangados e sem qualquer problema em apelar ao uso da violência armada.
Isto, no norte da Grécia, que foi onde estive, porque em Atenas a coisa está a ficar negra muito mais rapidamente. Mas não há nada a temer, afinal a guerra é apenas a continuação da política por outros meios, logo está tudo bem.
De resto Dr. TM, estou perfeitamente de acordo consigo. É claro que quem define as regras são os credores... a não ser que se lhes dê um tiro.
Cara Anthrax, admira-se desse cenário social na Grécia? Pois eu garanto-lhe que não. Tal como tenho como certo que tal ocorrerá em Portugal dentro de uns tempos (1-2 anos talvez) e dependendo de certos factores poderá acontecer em Espanha.
ResponderEliminarNa Grécia não sei o que acontecerá, não conheço minimamente a sociedade grega para poder minimamente articular um raciocinio sobre o que acontecerá no rescaldo dessa explosão social. Mas em Portugal e Espanha tenho poucas dúvidas sobre onde isso tudo acabará ao fim dum tempo de confusão nas ruas.
Caro Zuricher,
ResponderEliminarNão, não me surpreende nada o cenário grego e faltou-me dizer que os "indignants" estão acampados à volta da Torre Branca em Salónica e devo dizer que o acampamento já tem uma dimensão considerável.
Considerando a história recente da Grécia, também não me surpreenderá se a explosão social adquirir contornos bastante violentos e também não me espantará se houver um efeito de dominó.
O que me atrai, particularmente, nesta questão não é a análise da situação grega como se fosse um caso isolado. O que me atrai nesta questão é, exactamente, o facto de não o ser e as consequências que isso tem em termos de U.E. O valor da Grécia não reside no facto de ser um excelente destino de férias, o valor da Grécia assenta no elemento geoestratégico e nos desíquilibrios que pode provocar no status quo da região. Retirá-la da U.E por causa de um problemazito financeiro, seria o princípio do fim da União e deixar que ocorra uma explosão social, não produz consequências muito melhores.
Eu compreendo o raciocínio do Dr. TM e estou certa de que terá razão no que diz ao nível daquilo que são as consequências locais. Mas aquilo que eu vejo são as correlações de força em termos geopolíticos e geoestratégicos e neste preciso momento, aquilo que vejo é a quem quer que seja que interesse esta situação, fez xeque-mate à UE (o que também revela bastante acerca de quem a dirige).
O não-pagamento da dívida é uma necessidade imperiosa para os países que estão presos neste círculo vicioso, ainda que, por certo, não seja a única medida imprescindível.A reestruturação dirigida pelos devedores (debtor-led default), ao contrário da reestruturação dirigida pelos credores (creditor-led default), supõe a realização de uma auditoria prévia da totalidade da dívida, controlada pelas cidadãs e cidadãos. Trata-se de determinar que parte da dívida é ilegal, imoral ou directamente insustentável. Por exemplo, pode declarar-se imoral qualquer contrato de dívida subscrito por bancos resgatados com dinheiro público ou, inclusivamente, por bancos que tenham comprado dívida pública com dinheiro obtido junto do Banco Central Europeu. Nesse caso, pode reestruturar-se o prazo, o volume ou, simplesmente, declarar que não se paga. O objectivo é reduzir a carga da dívida.
ResponderEliminarÉ claro que este processo tem custos políticos e económicos importantes. Os mercados financeiros (os credores: bancos e outros agentes financeiros) actuariam conjuntamente para atacar e especular contra o país em questão. Também haveria reticências radicais, a nível institucional, por parte da União Europeia e do Banco Central Europeu, além dos bancos nacionais. Por isso, seria recomendável que a reestruturação fizesse parte de um plano mais amplo e que, além disso, estivesse coordenado, pelo menos, pelos países que dele têm mais necessidade. Estes países são periféricos, como Portugal, Grécia ou Espanha. O desejável, ainda assim, seria uma auditoria a nível europeu.
O plano mais amplo deveria incluir, como têm recomendado autores como Onaran, Husson, Toussaint o Lordón, a nacionalização das entidades financeiras e a contrução europeu de um novo sistema sancionatório que puna especialmente as rendas parasitárias do capital e as grandes fortunas, além de servir para reverter a tendência para desigualdade na distribuição de receitas entre capital e trabalho. Também seriam necessárias medidas correctivas dos desequilíbrios europeus (como apontado pelo relatório da Research on Money and Finance) e da altíssima dívida privada.
Minha querida Anthrax, o principio do fim da UE aconteceu há uns anos já, aquando da invasão do Iraque pelos Americanos e as divisões que isso criou dentro duma união que era suposto (mas apenas suposto como nem nunca podia deixar de ser) falar para fora a uma só voz. Neste momento assistimos apenas a mais episódios da série chamada "O fim da União Europeia".
ResponderEliminarA UE teve cheque-mate desde o momento em que nasceu. Sempre foi uma impossibilidade física, um sonho de líricos que está a transformar-se em pesadelo como não podia deixar de ser e nunca entendi sequer como é que se pôde acreditar na sua viabilidade. Se deste escaqueiramento todo ficar o que era a antiga CEE já não será mau.
Caro Wegie,
ResponderEliminarPor acaso já tinha ouvido falar nisso e por acaso é algo com o qual até concordo.
Meu caro Zuricher, isso até é verdade mas o desafio acabou por ser ultrapassado apesar das discordâncias. De facto houve aí uma falha grande quanto à adopção de uma posição comum face a um estado terceiro, mas na política externa com terceiros os Estados-Membros podem dar prioridade aos acordos bilaterais. Os Estados-Membros não têm que ter uma posição comum em termos de política externa.
No que respeita ao que é interno à UE é que a coisa já pia de maneira diferente.
“Debt restructuring will happen. The question is when (sooner or later) and how (orderly or disorderly). But even debt reduction will not be sufficient to restore competitiveness and growth. Yet if this cannot be achieved, the option of exiting the monetary union will become dominant: the benefits of staying in will be lower than the benefits of exiting, however bumpy or disorderly that exit may end up being.”
ResponderEliminarRoubini on Greece and Portugal
Nada como um testemunho local,
ResponderEliminarcomo se deduz do relatado por miss A.
Caro Dr Tavares Moreira,
dizem-nos que a Grécia precisa de novo empréstimo para não cair na banca rota.
Pode isto ter outro significado, que não o de que a Grécia está em banca rota, de facto e já?
Curioso, é que a queda da Europa democrática, esteja a começar pelo berço grego.
Desta vez e na nossa Aldeia Global, não vai haver fogo grego que resulte.
Cara Anthrax, essa historia de falar para dentro em uníssono é muito bonita mas não funciona assim. É que continuamos todos a ser Portugueses, Espanhois, Franceses, Italianos, Alemães, etc, etc, primeiro e mais do que tudo. Depois da terra ou região tal. E só lá muito para o fundinho é que somos Europeus. Precisamente por isto a solidariedade implícita no "falar para dentro" é inviavel. As coisas simplesmente não funcionam assim e nem os cidadãos tal aceitam. Repare que os alemães ocidentais aceitaram plenamente o dispendio de milhares de milhões de euros com os alemães orientais. Porquê? Porque se sentem todos alemães, sabem que estão a ajudar os seus, o seu país, a sua terra, gente igual a si. Mas andam cada vez mais resmungantes (e é compreensivel) com uns trocos para a Grécia e para Portugal. É que os alemães orientais são sentidos como Alemães. Os Gregos e os Portugueses são Gregos e Portugueses.
ResponderEliminarCara Margarida,
ResponderEliminarO mais "interessante" nesta triste história é que tanto PCP como BE parecem entender que devemos ir bem além da Grécia em matéria de irresponsabilidade financeira!
Parefrasenado um velho professor do meu tempo de liceu, quando já estava muito zangado com a indisciplina dos alunos: "Irra, que já é demais"!
Caro Tonibler,
É de perder a paciência esta demonstração de irresponsabilidade exacerbada...até compreendo a sua tirada satírica, perante um espectáculo de teatro político do mais deplorável gosto!
caro BMonteiro,
A Grécia não está ainda em bancarrota, embora para lá caminhe a passos largos...
O mais curioso é a aparente falta de vontade interna para ultrapassar a situação apesar das tentativas, cada vez mais desesperadas, do PM Papandreou para encontrar um compromisso dentro do seu próprio partido.
Será que a mensagem do PCP e do Bloco encontrou na Grécia o eco que lhe parece faltar por cá?
Meu caro Zuricher,
ResponderEliminarComo se demonstra em anexo, está claro que não funciona :) Isto faz lembrar aquelas birras de partilhas entre familia quando a herança é - neste caso - um monte de dívidas.
Meu caro B.
Sabe que a democracia grega sempre foi, ligeiramente, diferente daquilo que é a democracia actual. Seja como for, lembre-se que a democracia é e sempre será um regime degenerado :)) - Nota: Não fui eu que o disse! Foi o Aristóteles. Não o Onassis mas o outro, curiosamente, ambos são gregos.