terça-feira, 19 de julho de 2011

EURO mais fraco: ganharíamos alguma coisa com isso?

1.Em 7 do corrente editei neste 4R um Post intitulado “Portugal voltando ao passado? O que virá a seguir?”.
2.Nesse texto apontei dois tipos de factos: (i) os indignados ataques à agência Moody’s por ter reduzido o rating da dívida pública portuguesa para o nível “junk”/lixo e (ii) os apelos à compra de bens de origem nacional - ambos como sinal de regresso a um passado já relativamente longínquo, bem anterior ao 25/IV.
3.Quanto à pergunta que deixei no ar “O que virá a seguir?”, temos agora a resposta na expressão do desejo, por responsáveis políticos de topo, de um EURO mais fraco, o que, supostamente, ajudaria a nossa economia e a da zona Euro.
4.São certamente as saudades dos tempos em que nos habituamos a desvalorizar o Escudo como meio de corrigir os desequilíbrios acumulados por força de políticas erradas...
5.Estamos pois, de novo, expressando ideias emblemáticas de um passado glorioso", tal como no caso das ferozes críticas à Moody’s e do apelo à compra de produtos nacionais...
6.Mas continuamos também, muito provavelmente, a errar o alvo pois, em 1º lugar, de pouco ou nada nos adianta pretender um EURO mais fraco...a força ou a fraqueza do câmbio do EURO serão ditadas pelo comportamento da economia da zona Euro no seu conjunto e não pelas necessidades dos países aflitos e altamente endividados...
7.E a economia da zona Euro, no seu conjunto, evidencia um desempenho bastante sadio, que explica que o EURO, não obstante os graves problemas das dívidas de alguns países membros, mantenha um valor externo bastante sólido.
8.Em 2º lugar, será que ganharíamos mesmo com um EURO mais fraco? Importa ter presente que cerca de 2/3 do nosso comércio externo concentra-se nos países da zona Euro, pelo que nessa parte é quase indiferente que o Euro esteja forte ou fraco, as transacções de saída e de chegada de bens são todas expressas em Euros...
9.Poderíamos talvez retirar algum benefício de um EURO mais fraco no restante 1/3 das nossas transacções com outros países, embora fosse sempre um benefício limitado...mas importa indagar se o EURO mais fraco não seria sintoma de problemas que nos poderiam atingir, compensando (ou mais do que compensando) os eventuais benefícios da fraqueza do câmbio...
10.Por exemplo, o câmbio do EURO tem oscilado nas últimas semanas com as incertezas que rodeia a questão da dívida e que nos têm imposto taxas de juro muitíssimo mais altas – será que retiramos algum benefício desta situação?
11.E importa não esquecer que se nesta altura nos estamos a sentir mal no EURO, isso não é consequência da força da taxa de câmbio do dito mas sim da acumulação de erros graves de política económica, ao longo dos últimos 15 anos (pelo menos), que nos arrastaram para uma situação de quase insolvência...
12. Estou pois numa posição bastante céptica em relação aos benefícios de uma correcção do valor externo do EURO...de pouco ou nada serviria para resolver os problemas graves com que estamos defrontados...

12 comentários:

  1. Caro Tavares Moreira,

    Quando ouvi essa fiquei com a ideia de que a ideia é vender essa ideia aos alemães para eles imprimirem mais dinheiro para nos pagarem as contas. Mas a ideia que tenho, é que os alemães têm muito boas ideias relativamente a isso e que essa ideia não é uma delas. Aliás, até devem ter ficado com a ideia de que nós temos a ideia de que eles são burros....pelo menos foi essa a ideia com que fiquei.

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  2. Uma desvalorização do Euro ia ser uma coisa bonita de se ver. E as importações de matérias-primas em dolares? Depois escamoteia a questão de que o problema da periferia europeia é em boa parte um problema de dumping salarial por parte da Alemanha e este dumping implica que o 'escudo' está sobrevalorizado perante o ‘marco’.

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  3. Não estou certo que seja essa a intenção, caro Tonibler...
    Mas, em qq caso pouco importa, reconheço, pois a expressão deste desejo de um € + fraco será, em última análise, um voto de romantismo cambial, sem consequências graves para o ambiente...

    Caro Wegie,

    Essa do dumping salarial por parte da Alemanha é que me parece bastante forçada...onde foi dexcobrir isso, importa-se de desvendar?

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  4. Dear TM

    A Alemanha, desde a criação no euro, e com o apoio explícito dos sindicatos, tem sistematicamente restringido as subidas nos salários dos seus trabalhadores, mesmo em face a ganhos importantes de produtividade.(Não consigo enfiar aqui o gráfico do eurostat que mostra a evolução por um lado, dos custos unitários do trabalho, e, por outro, da produtividade (medida em PIB per capita). Ambas as variáveis assumem valores nominais, com base (100) em 2001).
    os salários não têm acompanhado os ganhos de produtividade. Esta é a principal explicação para os excedentes na balança comercial registados pela Alemanha, que têm, como identidade contabilística, espelho em parte dos défices crónicos e na subsequente dívida dos países periféricos da zona do euro. O sucesso comercial da Alemanha foi conseguido em boa parte com base no sacrifício dos trabalhadores alemães, cuja contribuição para o aumento da produção nacional não foi devidamente compensada. Este sacrifício, que foi aceite, está a ser finalmente compensado através de uma redução nos impostos pagos pela classe baixa e média. A estratégia é assim simples: Primeiro cria-se uma união monetária, impedindo os países que comercializam com a Alemanha de desvalorizar as suas moedas, o que tornaria os produtos alemães relativamente mais caro e, portanto, menos apetecíveis. Depois reduzem-se os custos de produção na Alemanha, numa estratégia alinhada com os sindicatos, severamente restringindo a capacidade competitiva dos países com os quais concorre. Depois devolve-se o dinheiro aos trabalhadores, que apoiaram esta opção. A estratégia pode ser inteligente, mas foi longe demais, e a Alemanha poderá ser vítima do seu próprio sucesso, caso o euro colapse e a dívida (que, repita-se, é o outro lado do espelho dos défices comerciais, pelo que as duas realidades são absolutamente indissociáveis) não seja paga na sua totalidade.

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  5. Tendo trabalhado durante muitos anos em empresas que exportavam fundamentalmente para os Estados Unidos, confesso que tive uma certa compreensão pelo apelo a "um Euro mais fraco". Mas os argumentos de Tavares Moreira, claros como habitualmente, convenceram-se. Reconheço que eu, como o PR e outros, estava afinal enganado. Para dizer a verdade, o crawling peg, que se praticou antes da entrada no Euro, sempre me fez uma certa impressão (assim como as altas taxas de inflação associadas).

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  6. Caro Tavares Moreira

    Completamente de acordo.
    Apenas para reforçar o seu argumento:
    Não são 2/3 são 4/5 das exportações vão para a zona euro ou ligado à zona euro.
    Uma parte das exportações para países terceiros, cerca de 30% são realizadas pelas multinacionais alemãs que se encontram aqui instaladas.
    A desvalorzação do euro teria um impacto pequeno no nosso comércio externo salvo, porventura um ligeiro aumento das exportações para Angola e Moçambique.
    Cumprimentos
    joão

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  7. Caro Wegie,

    tenho que lhe confessar que esse modelo explicativo é demasiadamente elaborado para o comum dos mortais...
    A noção que tenho é que a Alemanha prosseguiu a política económica que qulaquer país sensato e que tivesse a noção das implicações da participação numa zona monetária como a do EURO deveria ter prosseguido.
    Quem se equivocou foram os países que pensaram que com a entrada no EURO tudo estava resolvido e que era a altura de gastar de qualquer maneira, tanto no sector público como no privado.
    Aproveito para lhe lembrar que as vendas da Alemanha para Portugal+Grécia+Irlanda representarão não mais de 2% das exportações totais alemãs...o que significa que o seu suposto "dumping social", neste caso, de pouco terá valido aos alemães...

    Caro Freire de Andrade,

    Só para situar esta tranquila troca de impressões, posso dizer-lhe que o "crawling peg", como instrumento de política cambial em Portugal, terminou praticamnte no início dos anos 90 e que o Escudo passou a integrar o mecanismo de taxas de câmbio do Sistema Monetário Europeu a partir de Maio de 1992.
    O "crawling peg" - que consistia numa desvalorização deslizante e previsível da taxa de câmbio do Escudo - procurava compensar os diferencais de inflação registada em Portugal e nos seus principais parceiros comerciais.
    Tinha uma vantagem, da previsibilidade, mas tb era um mecanismo alimentador da inflação, como aliás refere.

    Caro João Jardine,

    Eu servi-me dos números do comércio externo para os primeiros 5 meses de 2011 que dão exactamente 66% de concentração nos países da zona Euro das "nossas" vendas de bens para o exterior...
    Admito que esteja a pensar na União Eurpeia, em que o número é naturalmente superior - aí tem acrescentar o Reino Unido, com 5%, a Suécia e a Polónia, com 1% cada um, etc, sobe para os 75% (+ ou -).
    Mas o argumento que usei só é válido para os países do Euro, obviamente.

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  8. Quando o meu caro Dr. Tavares Moreira escreve no ponto 6 do seu post, que "de pouco ou nada nos adianta pertencer ao euro mais fraco" está a meu ver, a concordar de certa forma, com a saída de Portugal, da moeda única.
    Vendo por outro ângulo, a nossa economia poderia beneficiar dessa desvalorização do euro, se Portugal estivesse fora da moeda única, mas se mantivesse dentro da UE. Esta situação poderia resultar numa produção para exportação, mais barata na origem, permitindo uma margem de lucro superior, dentro do mercado europeu.

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  9. Caro Bartolomeu,

    Se quiser ter a amabilidade de voltar a ler o ponto 6 do Post, verificará que na passagem que cita eu escrevi "pretender" e não "pertencer"...
    Isso altera substancialmente a conclusão que desse trecho se pode extrair, ficando claro que eu não quis sugerir a saída do Euro, nem era esse o ponto da minha modesta argumentação.
    Mas é óbvio que se não corrigirmos significativamente, desde já e por muitos anos, a política económica que erradamente prosseguimos ao longo de mais de 15 anos até Junho último - com o curto intervalo de MFL, que é de elementar justiça referir terá sida a única que percebeu a natureza do nosso problema económico, tentou confronta-lo, mas sem apoios não teve hipótese - acabaremos por ser forçados a sair do EURO...

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  10. Caro Tavares Moreira

    Sim e interpretei bem dos seus cálculos. Daí que tenha mencionado a "ligação" à zona euro. As moinhas desculpas por não ter mencionado, na altura, essa precisão.
    Angola é o nosso principal destino para as exportções para países terceiros. Aqui a desvalorizção poderá ter algum efeito mas pouco, dado que as exportações para este mercado atingiram um patamar que se irá manter por mais algum tempo.
    Cumprimentos
    joão

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  11. Peço-lhe imensa desculpa, caro Dr. Tavares Moreira, porque apresentei a minha leitura do seu ponto 6, entre aspas. Erro meu, sem dúvida, quanto à colocação das aspas e quanto à suposição.
    Quanto ao resto... o futuro (próximo) dirá.

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  12. Caro João Jardine,

    Tudo bem, só quis precisar este ponto para não pensar que atirei uns números "para o ar" só para valorizar o meu raciocínio: faria bem mais jeito, na perspectiva da tese que sustento,como compreenderá, que a dita % fosse de 75% ou de 80%...
    Mas factos são factos e números são números, temos de os tratar com um mínimo de rigor ainda que isso não ajude os nossos argumentos...

    Caro Bartolomeu,

    Não tem que pedir desculpa, ora essa!
    Um engano desses qualquer um de nós pode cometer, sem intenção!
    Quanto ao resto e como bem diz, o futuro, já o próximo, dirá como vai ser...
    Eu acrescentaria que esse futuro está nas nossas mãos, faremos dele o que quisermos, agora que as ilusões rosa chegaram ao fim, desfeitas pela cruel realidade dos factos...
    E não há fraqueza do EURO que nos possa valer, insisto...

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