Quando li o artigo na Nature idealizei algo do género: "amanhã será executado no estado do Mississipi mais um médico por ter assassinado um embrião congelado. A execução será realizada através da tradicional injecção letal". Hipótese estúpida? Não propriamente, porque se a Emenda 26 fosse aprovada seria um risco, na medida em que, constitucionalmente, no momento da conceção, o embrião passaria a ter o estatuto de "pessoa", e como a destruição dos seres humanos é um homicídio passível de condenação, que nalguns países é paga com a morte de quem a pratica, então, a minha notícia futurista teria alguma razão de ser.
Mas afinal o que é que se está a passar? Certos movimentos defendem que a condição de pessoa é um atributo inerente ao preciso momento em que um óvulo é fertilizado, nem mais.
A Emenda 26, Emenda de Personificação do Mississipi, concederia direitos legais como pessoa ao embrião, "incluindo qualquer ser humano a partir do momento de fecundação, da clonagem ou do seu equivalente funcional". O movimento que defende este princípio sabe perfeitamente que com esta medida alcançaria muitos objetivos, desde a proibição total do aborto, à impossibilidade de utilizar as células estaminais dos embriões, assim como criar enormes dificuldades a algumas técnicas de procriação medicamente assistida. Ou seja, em termos práticos ninguém seria autorizado a mexer na "vida" deixando à "vontade divina" o futuro ou o não futuro de muitos seres humanos, desrespeitando os direitos das mulheres e dos homens. Confrange-me estas iniciativas que não deixam de ser perigosas, porque poderiam estender-se a outras áreas da atividade humana.
Também não posso deixar de comentar alguma hipocrisia por parte destes movimentos fundamentalistas que não se preocupam minimamente em lutar conta a pena de morte no seu Estado com a mesma "determinação e coragem", ou melhor, são pateticamente silenciosos perante a morte de seus semelhantes.
A Emenda foi a votos no dia oito deste mês. Respirei fundo com o resultado, o "Não" à emenda ganhou. É mesmo para dizer: Graças a Deus! Vou adiar por mais algum tempo a minha imaginação quanto à eventual execução de um médico por assassínio de um embrião, congelado ou fresco.
Concordo consigo,as boas razões encobrem muitas vezes as más razões, é essa a melhor forma de as fazer passar de modo que, quando damos por ela, já as boas passaram à História e só ficam as outras que parecem legitimadas.
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