(imagem recebida por email)
Estava há dias a ver um anúncio feito por um grupo que se tornou conhecido pelo seu humor, com justo sucesso, e lamentei que afinal agora só apareçam a fazer palhaçadas, podem até suscitar o riso, pelo ridículo, mas não têm humor nenhum. A propósito desse meu comentário deram-me a ler um texto muito interessante, o prefácio de de Carlo M. Cipolla ao seu ensaio “Allegro ma non tropo”, que aqui reproduzo na parte que interessa.
“(…) A seriedade é também uma qualidade relativamente fácil de entender, de definir e, de certo modo, de praticar. Mas o que é difícil de definir, e nem toda a gente é capaz de perceber e apreciar, é o cómico. O humorismo, que consiste na capacidade de entender, apreciar e expressar o cómico, é um dom bem mais escasso entre os seres humanos.
Entendamo-nos: o humorismo foleiro, fácil, vulgar, prefabricado(=chiste) está ao alcance de muitos, mas não se trata de autêntico humorismo. É uma deformação do humorismo. O termo humorismo deriva do termo humor e refere-se a uma subtil e feliz disposição mental solidamente baseada num equilíbrio psicológico e bem estar fisiológico. Muitos escritores, filósofos, epistemólogos e linguistas tentaram repetidas vezes definir e explicar o que é o humorismo. Mas dar uma definição do humorismo é uma coisa difícil, para não dizer impossível. E tanto assim é que se uma situação humorística não é percebida como tal pelo interlocutor é praticamente inútil e até contraproducente, tentar explicá-la.O humorismo é, claramente, a capacidade inteligente e subtil de por em relevo e destacar o aspecto cómico da realidade. Mas é também muito mais do que isso. Em primeiro lugar (…) não deve supor uma posição hostil, mas antes uma profunda e frequentemente uma indulgente simpatia humana. Além disso, o humorismo implica a percepção instintiva do momento e do lugar em que pode ser expressado (…). Está tão intimamente ligado à escolha cuidadosa e específica da expressão verbal com que se manifesta que dificilmente se consegue traduzi-lo para outra língua. O que significa, também, que está tão imbuído das características da cultura em que se manifesta que muitas vezes resulta totalmente incompreensível se se mudar para um ambiente cultural diferente. O humorismo é diferente da ironia. Quando alguém é irónico está a rir-se dos outros. Quando faz humorismo está a rir-se com os outros. A ironia gera tensões e conflitos. O humorismo, quando é utilizado na medida justa e no momento oportuno (se assim não for não é humorismo), é o melhor remédio para dissipar tensões, resolver situações que poderiam resultar penosas e facilitar o convívio e as relações humanas".
Os portugueses têm um grande sentido de humor, tantas vezes expresso em pequenas anedotas que retratam as dificuldades e os azares da vida, talvez porque somos um povo dotado de grande humanidade, avesso a violências gratuitas e que dá ao desprezo os que lhe querem fazer mal. E esse sentido de humor, como bem explica o texto, significa também uma percepção inteligente da realidade, embora às vezes, por comodismo, deixemos que nos tomem por parvos...
Enquanto um facto, uma situação toma outras proporções quando explicadas a quem não as entende à primeira, o humor perde o seu momentum se for seguido de esclarecimentos. Interessante.
ResponderEliminarTambém concordo que os portugueses – não os pessimistas, os queixosos, os que estão sempre do contra – têm um grande sentido de humor; quanto a se deixarem passar por parvos... já não tenho a certeza... Mas por outro lado alguns exibem um comportamento passivo ou talvez passivo-agressivo... Reconsiderando... talvez a cara Suzana (desta vez não me esqueci do “z”) acabe por ter razão. : )
O maior ou menor humor no espaço público depende muito das firewalls de vida de cada um. Para quem se sente agredido pelo cheiro a podre que grassa no reino de portugal a vontade de rir é pequena, mesmo que as expectativas no homem já fossem pequenas.
ResponderEliminarDuas posições se podem tomar na vida: uma, cínica, arrivista e provinciana, oportunista, de adaptação ao meio para não pôr em causa os seus pequenos interesses que não se confundem com o verdadeiro interesse público; a segunda, uma posição de combate pela civilidade com coragem, apontando aquilo que verdadeiramente corrompe a cidadania e a felicidade dos povos. Mesmo que se confunda com voluntarismo seródio, ingenuidade, falta de sentido de humor, pessimismo, queixa, sentido do contra...
este exemplo Espanhol, infra, é bem a imagem do país que gostariam alguns que fosse diferente:
«Auto-estrada do BES e Mota-Engil declara falência
Concessionária deve 380 milhões à banca e 150 milhões a proprietários de terrenos expropriados
A concessionária da auto-estrada que liga Madrid a Toledo, participada pelo BES e pela Mota-Engil, solicitou voluntariamente a falência junto do Supremo Tribunal de Justiça de Albacete. É a primeira falência do setor, que se encontra praticamente em coma no país vizinho, escreve o «Jornal de Negócios».
A empresa apresenta uma dívida de 380 milhões à banca, a que se juntam mais 150 milhões de dívidas a proprietários de terrenos expropriados para a construção da auto-estrada.»
"...se uma situação humorística não é percebida como tal pelo interlocutor é praticamente inútil..."
ResponderEliminarPois é, mas os humoristas encartados, quando o seu humor não é entendido, logo proclamam a falta de cultura e de preparação de quem não atinge tais alturas.
Quanto ao grupo das palhaçadas, bom, deficiência total minha, já não os aguento. Mas, pelos vistos, há muita gente que diz que sim...
Começando pelos anúncios, são poucos aqueles que fazendo uso do humor, me ficaram na memória.
ResponderEliminarNo entanto, cara Drª Suzana, surgiu recentemente na televisão, um anúncio da Optimus "Aldeia Global" rodado numa aldeia transmontana com a representação do Maestro Vitorino de Almeida - um homem a quem reconheço um enorme sentido de humor - que tenta dirigir os habitantes da aldeia na interpretação do velhinho tema dos Beatles «All Together Now».
Para mim, nota excelente!
;)
Suzana
ResponderEliminarFazer humor é realmente um dom, não é para todos. Aprecio imenso aquelas pessoas que perante uma situação difícil, por exemplo uma reunião, são capazes de contar uma história bem humorada para desanuviar a pressão ou a crispação ou até permitir uma saída.
Concordo que somos um povo dotado de grande humanidade, mas quanto ao humor tenho dúvidas...