1. Tenho acompanhado com algum divertimento, confesso, esta autêntica paródia em que se transformou a discussão pública, alimentada por uma infinidade de comentadores mediáticos de serviço ao desvario nacional, sobre a aspiração nacional às condições de financiamento que os credores oficiais da Grécia, quase em desespero de causa, resolveram conceder a este país.
2. Em contraste cada vez mais impressionante com o que se passa na Irlanda - que segue o seu caminho tranquilamente, trabalha com eficácia para ultrapassar as debilidades que conduziram o País a uma situação de resgate financeiro, regista crescimento económico graças a um forte contributo do investimento estrangeiro, vê as taxas de juro implícitas na cotação sua dívida pública caírem para níveis de 4,5% (no prazo dos 10 anos), está preparada para regressar em condições normais ao mercado da dívida no próximo ano, não participou na greve geral/internacional de 14 de Novembro (por aqui evitou falar-se nisso, claro)...
3. ...em Portugal discute-se animadamente o sexo dos anjos, agora na forma moderna do acesso às mesmas condições de financiamento da Grécia...embora, ao mesmo tempo, se proclame com uma vaidade um tanto inóspita, que “Deus nos livre de estarmos como a Grécia”, “a nossa situação nada tem a ver com a da Grécia”, e outras considerações que o precário orgulho luso, tendo já tão pouco a que se agarrar, vai debitando dia sim, dia não...
4. Trata-se, na minha modesta análise, se mais um sintoma da total falta de sentido útil das discussões públicas que desde há alguns anos se apoderou dos media de uma forma geral e a que a classe política se entregou de alma e coração, nalguns casos por ignorância em relação aos problemas fundamentais da economia do País, noutros casos por se convencer que será uma forma "gira" de entreter a opinião pública...
5. Confesso não perceber que, ao mesmo tempo que tentamos convencer o Mundo das enormes diferenças em relação à Grécia, nos voltemos para esse mesmo Mundo suplicando que nos concedam condições idênticas às que os credores oficiais aceitaram facultar à Grécia, quase em desespero de causa como já acima referi, e em termos que sugerem uma completa abdicação da Grécia da autonomia de condução da sua política económica e financeira...
6. Compreendo que se pretenda a melhoria das condições dos empréstimos oficiais, especialmente quanto às taxas de juro e outros encargos e como contrapartida do enorme esforço que estamos a fazer, embora as taxas sejam muito inferiores às que vigoram nos mercados, como ontem salientou o Presidente do BCE, e tenham sido já reduzidas no corrente ano...
7. Mas não compreendo, de todo, que se insista em pretender as mesmas condições que a Grécia, um doente quase-terminal (em termos financeiros), quando ao mesmo tempo que protestamos e nos gabamos de gozar de muito melhor saúde...
8. Ocorre-me comparar esta “conversa” ao comportamento de uma Empresa A, que gozando de boa saúde económica e financeira e tendo por isso acesso a crédito bancário em condições normais, tem conhecimento de que os seus bancos fecharam um acordo, em processo de insolvência, com a Empresa B, que atingiu o ponto de ruptura e à qual os bancos, na falta de outras soluções (para evitar um processo de liquidação em que provavelmente acabariam por não receber 1 Euro) aceitaram perdoar 50% da dívida e o pagamento do restante a X anos, incluindo uma carência generosa de capital e até de juros...
9. ...e a Empresa A resolve dirigir-se aos seus bancos solicitando as mesmas condições que as da Empresa B, com o argumento de que está em muito melhores condições económicas e financeiras mas que por uma questão de igualdade...alguém compreenderia tal disparate?
Caro Tavares Moreira
ResponderEliminarComo pode constatar o "isto" ao que chegamos foi porque o governo fez com toda a convicção,(e quase sempre) o seu melhor e, muito raramente, o que tinha e tem de ser feito.
Cumprimentos
joão
Comparar o Portugal actual “a uma Empresa, que goza de boa saúde económica e financeira e tendo por isso acesso a crédito bancário em condições normais” como faz o ilustre economista TM, é que não passaria pela cabeça do mais optimista opinador económico cá do burgo. Mas, pelos vistos, TM está numa galáxia tão distante da realidade que se permite opinar deste modo. Segue no fundo as pisadas do ministro Victor Gaspar, capaz de desmentir no dia seguinte o que afirmara um dia antes. Começam a ser hilariantes estas tentativas de tapar o Sol com a peneira dos ilustres opinadores do credo neoliberal.
ResponderEliminarEu tenho a impressão de que ouvi o Ministro das Finanças dizer publicamente que iríamos ter as mesmas condições em nome do "princípio do tratamento mais favorável", o resto veio na sequência, mas se calhar o que se ouve não tem nada a ver com o que se disse.
ResponderEliminar... mas não são bancos, nem são empresas. Há um detalhe que tem sido omitido, não sei se pelos media, se pelas autoridades, que é: QUEM VAI PERDOAR 50% À GRÉCIA SOU EU!!!
ResponderEliminarPara este pessoal que vive do dinheiro do contribuinte o perdão é coisa positiva, mas para quem é contribuinte não. O perdão de Grécia vai-se acumular aos nossos problemas, não vai tirar nada. Eu que já tinha um estado português para pagar, agora ainda vou ter que juntar 50% daquilo que tinha emprestado aos gregos.
Como se agora os bancos portugueses resolvessem perdoar 50% da dívida do estado português. Iam tirar o dinheiro a quem, aos seus depositantes?
O bom de tudo isto é que quando é para eu pagar, como no caso de um perdão, "somos todos um povo uno, solidário e indivisível", quando é para cortar despesa, vem uma equidade à la cavaco em que não se pode ir aos funcionários do estado e tenho que escolher os serviços que quero antes de cortar e conversa molde do género.
Sinceramente, o melhor é mesmo fechar isto tudo.
Qualquer redução dos juros e posterior alongamento dos prazos de pagamento dos empréstimos oficiais é muito benefica para o país quer de imediato, pela redução do deficit que traz, quer pelo sinal que dá aos mercados que os nossos sócios nos apoiam tal como apoiam a Grécia.
ResponderEliminarPor outro lado um alongamento dos prazos tira pressão sobre os mercados o que originará menores juros.
Assim se cria um ciclo virtuoso, além de ser uma questão de honra e de justiça.
Nesta, como em outras discussões, a comunicação social portuguesa., infelizmente, é parte do problema quando deveria ser parte da solução.
ResponderEliminarhttp://jornalismoassim.blogspot.pt/
Bem, tudo isto seria bonito (o post e o consequente comentário do caro tonibler), se realmente conseguíssemos pagar o que devemos no estado em que nos encontramos. As dívidas são para pagar, desde que se possa, claro! Podemos!? Veremos o próximo semestre...
ResponderEliminarCaro Tavares Moreira,
ResponderEliminarpela sua analise dever-se-á concluir que, de facto, o povo portugues e as suas discussões publicas são muito inuteis e estranhas.
Ainda assim, deixo-lhe a uma pequena sugestão que considero pertinente e que poderá trazer alguma inteligencia ás tais "discussões publicas" que refere.
Então cá vai!
Em vez de avaliar a coerencia mental dos portugueses, que tal um post sobre:
- a coerencia inteletual da Troika ? - que a uns diz uma coisa, e a outras diz outra
- O custo do dinheiro ? ("X" para Portugal e "X-qqrcoisa" para gregos.)
- As comissões cobradas pela Troika ? ("X" para Portugal e "X-qqrcoisa" para gregos.)
- A coerencia e inutilidade das posições do nosso Governo ? ( a terça o Gaspar diz que sim, na quarta o PM diz q simsenhor, na quinta o Gaspar diz q não e que ninguem percebeu bem, etc etc etc )
Ou seja, aceitando que as incongruencias e inutilidades das conversas de café são confrangedoras, parece-me de todo mais util que se avaliem as contradições dos mandantes e das troikas.
Mas é só uma sugestão....se calhar basica e inutil, como as discussões publicas.
Caro João Jardine,
ResponderEliminarImporta-se de ser um pouquinho mais explícito, na distinção entre "o seu melhor" e o que "tinha de ser feito"?
O ilustre comentador poderá partir do princípio que "a bom entendedor meia palavra basta..." mas de facto não está em presença de um bom entendedor...
Caro Carlos Sério,
Era quase inevitável que na reacção a este Post viesse comentar coisas que nele se não encontram...e aconteceu!
Ao dizer que comparo Portugal a uma empresa em boa situação económica e financeira - partindo daí para o habitual arrazoado peudo-moralista social - o ilustre comentador comete um lapso básico: eu não comparei Portugal a coisa nenhuma.
No ponto 8 do Post está bem explícita a comparação "desta conversa ao comportamento de uma empresa...".
Portanto, é absolutamente meridiano que a comparação de Portugal que está a fazer não existe, nem isso teria fundamento.
E, despido de ponto de partida ou com um ponto de partida falso, o seu arrazoado anti-neoliberal fica entregue aos "vultures" que, não tarda, o dizimarão!
Caro Tonibler,
Com a sua típica linguagem de guerrilheiro anti-despesismo do Estado e pró-contribuinte, aporta conclusões que não se afastam muito, creio eu, da "filosofia" subjacente a este Post...mas o senhor confirmará!
Cara Suzana,
Como terá percebido, ste Post não constitui qq defesa do Ministro das Finanças ou do Governo, exprime apenas e com total independência um ponto de vista pessoal.
Se o Ministro das Finanças emitiu tal declaração, tem o meu desacordo, muito simplesmente.
Como tem o meu desacordo a declaração do PR nesta mesma matéria.
Caro Paulo Pereira,
As suas conclusões quanto a uma possível reacção dos mercados parecem-me eivadas de um esperancismo radical, que a realidade rapidamente provavelmente se encarregaria de contrariar...
Como eu referi, melhores condições de juros até seriam bem-vindas, pois permitiriam por exemplo abrir espaço para algum alívio fiscal (numa análise ceteris paribus, nem sempre válida é certo).
Prazos mais longos para o cumprimento do serviço da dívida oficial poderiam ser interpretados como sinal de dificuldade em cumprir a dívida - não vejo outra justificação para tal concessão - não me parece que tal sinal fosse bem acolhido pelos mercados.
Em qq caso nunca em nome de que estamos a receber o mesmo tratamento que a Grécia...isso é que nos seria fatal...
Caro Murphy V.
Não posso deixar de lhe dar imensa razão...
Caro jotaC,
Veremos,certamente, acho muito sensata a sua sugestão (como é habitual, de resto, permita-me o comentário).
Caro Pedro,
O ilustre comentador foi muitíssimo além do que eu disse e não posso, por respeito elementar ao povo português, aceitar a sua conclusão.
Como terá reparado eu não me referi ao povo português, muito menos me debrucei sobre a coerência mental desse povo, os meus comentários forma dirigidos de forma expressa ao "povo" dos comentadores mediáticos e aos insignes membros da classe política - todos somados não chegam a 0,1% do povo português...e ainda bem!
A partir daqui, pouco mais posso acrescentar a não ser que acho pitoresca a sua sugestão.
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarComo temos de financiar o deficit e refinanciar divida continuadamente os mercados estão continuamente a monitorar a situação real das contas do estado e menos juros de divida anterior é sempre bom para quem empresta de novo.
Os mercados sabem que sem apoio da UE / FMI a nossa divida é impagável com juros acima do crescimento do PIB.
E quanto menos tivermos de obter dos mercados nesta fase de recessão e desconfiança melhor, ainda para mais se a taxa baixar para 1,25%.
Ou seja os juros de emissões nos mercados tenderão a baixar, caso exista com um acordo semelhante ao da Grécia.
O caso melhor seria mesmo ter 10 mil milhões a 1% para recomprar divida que está a pagar 8% tal como a Grécia.
Os analistas que cobrem a Grécia acham que foi um bom acordo.
Não consigo entender como é que um investidor sofisticado iria achar mau um acordo como o da Grécia.
Oh Caro Paulo Pereira, já se esqueceu das outras condições do acordo dos credores oficiais com a Grécia? Ou acha possível que sejamos nós a escolher o que nos convém desse acordo, eliminando a parte restante a nosso exclusivo critério?
ResponderEliminarAcha que os credores nos levariam a sério se lhes fossemos apresentar uma proposta do tipo queremos "o sol na eira e a chuva no nabal"?
Não lhe parece que há aí uma dose altamente corrosiva de ingenuidade e que estas coisas se forem tratadas com base na ingenuidade se tornariam simplesmente fatais para quem tomasse tal iniciativa?
Pense um bocadinho, se não se importa...
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarEstá a referir-se à necessidade da Grécia reduzir o deficit de 6,5% em 2012 para 5% em 2013 ?
São as condições que já temos impostas, e que são precisamente mais fáceis de atingir com uma redução de juros, directa e indirecta pelos mercados.
Não existe nenhuma justificação racional para o governo não ter pressionado logo de inicio para o alargamento das condições a Portugal.
Foi um erro crasso do governo, que ontem já começou a emendar, face às posições do PR e do P.Portas.
Caro Paulo Pereira,
ResponderEliminarDevo confessar-lhe que o considero um felizardo, aliás simpático! Opina sobre decisões/escolhas de política económica como se tivessem lugar num universo em que tudo é simples, fácil e barato!
Quem nos dera que assim fosse, não estaríamos aqui a discutir com um pano de fundo de tanto sofrimento!
Não, não é a esse detalhe da negociação das dívidas da Grécia que me refiro, mas sim a coisas mais importantes como a "segregated account" - já ouviu falar disso, ou sabe o que implica?
Caro Tavares Moreira,
ResponderEliminarAgradeço as suas palavras de simpatia.
As escolhas de politica económica podem ser certas ou erradas aqui neste universo e como tal passiveis de serem opinadas.
A ideia de não pedir condições análogas à Grécia em termos de juros de de prazos é um erro crasso politico e económico, porque seria sempre objecto de negociações.
Quanto à "segregated account" explique-nos que maleficios daí adviriam .
Já agora os 6 mil milhões que estão no BdP parados não serão já uma pequena segregated account que estamos a pagar ?
Caro Paulo Pereira,
ResponderEliminarHá uma passagem no seu último comentário que me deixa enormes dúvidas ou mesmo perplexidade, quando diz:"A ideia de não pedir condições análogas à Grécia (às da Grécia ficava melhor, perdoe-me) em termos de juros e prazos é um erro crasso político e económico, porque seria sempre objecto de negociações".
Confesso-lhe a minha perplexidade: é um erro (crasso, ainda por cima, o Senhor não é nada meigo nestas apreciações!) porque seria objecto de negociações?
E se as negociações a nada conduzissem, deixava de ser um erro crasso?
E se das negociações saíssemos piores do que estamos, tb deixava de ser um erro crasso?
Resume tudo a uma questão metodológica, sem ter em conta o resultado?
Quanto aos 6 milhões que refere (vejo que está devidamente informado, acho muito bem): (i) não estão parados, deverão ser utilizados ao longo do tempo e até é normal que esse saldo venha a diminuir bastante nos próximos meses , (ii) são obviamente remunerados, (iii) têm condições de movimentação, a débito e a crédito, que em nada se assemelham à "segregated account" imposta à Grécia.