terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Recriação



A evolução da espécie humana é muito aliciante, em todos os aspetos, cativando mesmo os não especialistas ao quererem saber mais sobre o seu passado. 
Quando se esbarra em enigmas somos de imediato confrontados com a elaboração de teorias e vários tipos de especulações. Criam-se deste modo explicações deliciosas, que, apesar de nem sempre corresponderem à verdade, enchem os sonhos míticos de uma espécie que até hoje ainda não provou a razão da sua existência. Somos um artefacto, uma singularidade sem pés nem cabeça, uma espécie que deixa muito a desejar e que, pelo andar da carruagem, nunca irá a lugar nenhum. Nem mesmo certas iniciativas, algumas conquistas e interessantes manifestações artísticas e culturais são capazes de manter viva a esperança num futuro melhor, porque somos submergidos nas ondas da tortura, do sofrimento, da iniquidade e da intolerância. 
Observo com algum cuidado a emergência de explosões provocadoras por parte de alguns pensadores. Foi o caso de um cientista que afirma ser possível recriar uma espécie já desaparecida graças às novas tecnologias. Não se trata de nenhum mamute, dinossauro ou de um dodó, apenas do Homem de Neandertal, desaparecido há 28.000, tendo como última residência conhecida a península ibérica. São conhecidas algumas das suas características morfológicas, às quais não é estranho um ar tremendamente façanhudo, feio mesmo, grosseiro, parece que pouco ágil e que não conseguiu sobreviver face à nossa espécie. Se desapareceu por inadaptação, por perda de capacidade de competição ou por aniquilação provocada pela bela obra de deus é coisa que não se sabe. 
O que surpreende são as razões que o cientista arvora para o recriar, sendo diferente, tendo um cérebro maior, talvez tivesse um modo peculiar de pensar e de ver as coisas. 
Sendo assim, a produção em série, através de clonagem apropriada, permitiria dar vida a uma espécie que sendo também humana poderia transformar o mundo. Para isso é preciso usar as novas tecnologias e arranjar uma hospedeira que carregue durante nove ou talvez doze meses um velho ser. 
Considero muito interessante repescar da noite dos tempos seres que poderão ter uma atitude e forma de pensar mais humana do que a nossa espécie. Renasceriam, teriam acesso à nossa cultura, e, talvez, com mais sabedoria, dar outro significado à existência. Talvez não adotassem livros sagrados que provocaram e continuam a provocar descalabros, talvez criassem novas formas de estar em sociedade, talvez fossem mais tolerantes, mais humanos, menos agressivos, talvez fossem isso tudo ou até mesmo nada. De qualquer modo, seria uma experiência muito interessante, um verdadeiro ato de criação, em que o homem substituiria deus, como é seu paradigma, corrigindo uma qualquer falta decorrente de alguma sesta mais prolongada do criador que permitiu que vingasse a nossa espécie em vez da outra. É uma hipótese que nunca será estudada e muito menos comprovada, mas que ajuda a situar-nos na tristeza de um mundo sem soluções. E como o homem de Neandertal até se pode cruzar connosco, a fazer fé de algumas descobertas científicas, talvez conseguíssemos disseminar os seus bons genes substituindo muitos dos nossos, mesmo que isso provocasse alguma fealdade. 

1 comentário:

  1. Seria inevitável a influência de uma Sociedade pré-dogmatizada. Faz-me até ponderar sobre as antigas experiências, da Psicologia, em que as éticas ainda pouco aportavam, e muito se provou ou concluiu.

    No entanto, recordo-me perfeitamente do que pensei quando li dita noticia na imprensa estrangeira: automaticamente me fez pensar em romantismo, tal qual sempre me ocorreu quando se fala de espécies como o Lince (animal esse que em 100 tentativas de caça tem uma margem de falhanço a rondar os 85%-90%).
    Admito que não vejo a nossa espécie como um catalisador de caos e destruição, somos meramente outro agente de selecção natural, mas a nossa continua busca de um romantismo inexistente ou ilógico pouco ou nada nos beneficia.

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