Sábado, rumo até ao Algarve. Amanhã tenho que dar o meu modesto contributo no congresso. Ao chegar perto do destino, eram horas de jantar, optei por parar e tratar do corpo. Solícito e demasiado simpático para o meu gosto, a transpirar vontade de querer engordar a conta final, pedi ao empregado um dos pratos constantes da ementa. - Ah, não temos. Acabou-se. - Pois! Antes que continuasse com os meus comentários, desfiou o nome de vários peixes. Escolhi um, o que me soou melhor, nem o vi, nem queria vê-lo, o que eu queria era terminar com aquele sorriso estampado numa fácies oblonga encimada pela crista meio mixeruca a lembrar um garnizé à espreita de dar alguma bicada.
O raio do peixe estava mesmo bom. - A conta se faz favor. Esperei alguns segundos e trouxe-me um papel com a quantia. Com o dedo passei pelas linhas e não foi difícil concluir a inclusão de "coisas" que não tinham sido consumidas. Chamei-o e pedi-lhe uma fatura com a nota, dita em surdina, para retirar aquelas "coisas" que não tinham sido pedidas. - Ah, com certeza! Foi engano da minha colega. Disse num tom que me levou a pensar que não deveria ser a primeira vez. Trouxe a fatura, agora corrigida, e também trouxe o troco, mas calculado com a prévia "nota da mesa", sempre com um ar sorridente e enjoativo. Pirou-se. Esperei que me olhasse lá do fundo, sempre com o suor da vida treinada a ser fácil a botar dos lábios esticados. Fiz-lhe sinal para que se aproximasse. Nem foi preciso, parecia que estava à espera. Aproximou-se com o sorriso enjoativo. Expliquei-lhe o erro. - Ah, deve ter sido a minha colega que se enganou. Depois de ter tratado com discrição a situação, ao sair, sempre com um ar sorridente e enjoativo, dá-me uma palmada nas costas, um tique de intimidade, provavelmente treinado, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
O raio do peixe estava mesmo bom. - A conta se faz favor. Esperei alguns segundos e trouxe-me um papel com a quantia. Com o dedo passei pelas linhas e não foi difícil concluir a inclusão de "coisas" que não tinham sido consumidas. Chamei-o e pedi-lhe uma fatura com a nota, dita em surdina, para retirar aquelas "coisas" que não tinham sido pedidas. - Ah, com certeza! Foi engano da minha colega. Disse num tom que me levou a pensar que não deveria ser a primeira vez. Trouxe a fatura, agora corrigida, e também trouxe o troco, mas calculado com a prévia "nota da mesa", sempre com um ar sorridente e enjoativo. Pirou-se. Esperei que me olhasse lá do fundo, sempre com o suor da vida treinada a ser fácil a botar dos lábios esticados. Fiz-lhe sinal para que se aproximasse. Nem foi preciso, parecia que estava à espera. Aproximou-se com o sorriso enjoativo. Expliquei-lhe o erro. - Ah, deve ter sido a minha colega que se enganou. Depois de ter tratado com discrição a situação, ao sair, sempre com um ar sorridente e enjoativo, dá-me uma palmada nas costas, um tique de intimidade, provavelmente treinado, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Ia a pensar nisso quando entrei na receção do hotel. A menina, sem esboçar um sorriso, pediu os elementos, cumpriu as formalidades, com uma antipatia capaz de exasperar São Juliano, patrono da hotelaria. Ainda estive para lhe perguntar em que escola tinha tirado o curso. Optei pelo silêncio. Lembrei-me que estava no Algarve. Sorri e revivi experiências de outros tempos e ocasiões. Nada agradáveis. O habitual. A antipatia da menina não conseguiu neutralizar o sorriso enjoativo do empregado do restaurante. Dois pequenos incidentes a relembrar muitos outros, e estamos na época baixa e em crise, mas há tiques que nunca se perdem. Terça-feira regresso. Falta pouco.
Eu também, quando me esqueço destas coisas, volto lá. Mas cada vez levo mais tempo a esquecer.
ResponderEliminarUm drama insanável:
ResponderEliminarRestaurantes, gasolineiras,pequeno comércio ou supermercados, onde continua a eterna pergunta:
quer factura?
Ingovernáveis, ou chefias incapazes de governar os outros?
Deve ser por serem democratas.
Sou um muito esporádico frequentador do Algarve e por conseguinte, das suas unidades hoteleiras.
ResponderEliminarNão me recordo de UMA vez que fosse atendido em restaurante ou em recepção de hotel algarvio, com metade da simpatia e afabilidade que encontro do meio do país para cima.
E não atribuo esta indiferença pelo som da lingua portuguesa ao possível facto de o turismo algarvio ser em maior número de estrangeiros. Tenho experiência de outros locais a norte do Tejo, onde o turismo estrangeiro tem preponderância e onde os nacionais são excelentemente atendidos.
A minha mulher é de opinião que em qualquer lugar, é possível encontrarmos pessoas afáveis e educadas e o contrário; eu insisto, no país, verifica-se inversabilidade entre o calor climático e o calor humano.
Como "no meio é que está a virtude", prefiro seguir a minha natureza, se me atendem com simpatia, sou simpático, se não, ignoro-os... e cada um vai à sua vidinha e o mundo prossegue na sua marcha incansável de rodar sobre o seu eixo.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarHá muito que não ponho lá os pés. basta! disse há muito tempo...
ResponderEliminarNa dúvida o melhor é não descer de Odeceixe. Não vou ao Algarve há anos largos e relatos como este que nos trás o professor Massano Cardoso relembram-me porquê!
ResponderEliminarSendo nós, algarvios, gente baixa, rasteira, antipática e calculista como esta generalização tão bem ilustrou e os comentários sublinharam , talvez não seja surpreendente que consiga facilmente encontrar semelhante qualidades para lá do Caldeirão. Talvez gente que tenha uma gota deste meu mau sangue. Só isso poderá explicar não encontrar a palavra afável, a porta aberta, o sorriso sincero que aqui se implica existir em todo o Verdadeiro Portugal.
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