quarta-feira, 30 de outubro de 2013

"Programa Cautelar"? A que propósito?

1. Nos últimos tempos a expressão Programa Cautelar entrou, com grande sucesso, no precioso vocabulário do politicamente correcto: toda a gente discute se vamos ou não vamos ter um “Programa Cautelar” ou um “2º resgate” – muito provavelmente sem ninguém ou quase ninguém ter uma noção, aproximada tampouco, do que significará o tal “Programa Cautelar”...nem mesmo os mais brilhantes comentadores...

2. Confesso que me causa alguma estranheza esta expressão: numa interpretação literal, parece tratar-se de um programa que visa acautelar alguma coisa – supostamente, acautelar o regresso da República aos mercados em condições tão suaves quanto possível...

3. Mas isso será a componente “cautelar”...e a componente programa, o que pretenderá significar? Dificilmente outra coisa do que continuarmos a ter de adoptar medidas do tipo daquelas que têm vindo a ser aplicadas, nomeadamente no saneamento das finanças públicas, no domínio estrutural e ainda da estabilidade financeira, ainda que numa dose porventura menos exigente (a ver vamos)...

4. Mas, se assim for, o dito “Programa Cautelar”, não traz novidade nenhuma: o PAEF em vigor também visa restituir à República Portuguesa a capacidade de se financiar por si própria, nos mercados, uma vez concluído (supostamente com sucesso); o PAEF não é pois menos cautelar, será tão cautelar ou até mais cautelar que o dito “Programa Cautelar”...

5. Para tentar perceber melhor este arranjo verbal, socorri-me de uma breve passagem do relatório do FMI relativo à penúltima avaliação do PAEF da Irlanda, no qual é utilizada uma expressão que vem de encontro a esta ideia do “cautelar”, e que diz o seguinte “...the authorities continue to consider a financing backstop once the current ends, which could include possible PRECAUTIONARY ARRANGEMENTS with the ESM and the IMF as means to support a durable return to market financing.

Such backstops could cushion financing against a range of potential risks in the immediate post program period”.

6. Assim, no caso da Irlanda, fala-se em “precautionay arrangements”, aparentemente significando a organização de uma linha de financiamento de “back-up”, pelo ESM/FMI, para garantir o retorno da República da Irlanda ao mercado da dívida sem perturbações, de forma suave...mas não é referido qualquer programa...

7. Não nos esqueçamos, no entanto, que a cotação actual da dívida pública irlandesa, no prazo de 10 anos, tem implícita uma yield de 3,5%; e no caso da dívida pública portuguesa, para o mesmo prazo, a yield continua, teimosamente, acima de 6%; são, pois, realidades bem distintas.

8. Em resumo e após esta tentativa de perceber a ideia do tal “Programa Cautelar”, chego à conclusão de que a expressão “Programa Complementar” seria bem mais apropriada para traduzir aquilo que poderá estar por detrás desse famoso programa ...

9. Ou seja, um Programa que visa completar e consolidar os resultados obtidos com o PAEF – e que implicará a concessão de algum apoio financeiro adicional (não se resumindo a uma linha de back-up, como no caso da Irlanda) – uma vez que com o PAEF, e não obstante os trabalhos ciclópicos, ainda não ficaram criadas as condições para um regresso bem sucedido aos mercados...

10. Mas duma coisa tenho a certeza: vamos continuar a ouvir falar do dito “Programa Cautelar”, a torto e a direito, sem que ninguém se esforce por explicar (ou perceber, tampouco) o que significa esse estranho ente...o politicamente correcto tem hoje uma força avassaladora, não há nada a fazer...



10 comentários:

  1. Exmo Senhor Dr. Tavares Moreira:
    “Programa cautelar” é um eufemismo que quer dizer mais ou menos isto:
    Quando Portugal for aos “mercados,” para continuar a viver como agora, pedir dinheiro emprestado, os tais mercados só vão emprestar, mediante uma caução, isto é, desde que Portugal apresente um fiador. Este será o BCE. Essa caução do Banco Central Europeu é que constituirá o tal “programa cautelar”, pois ninguém se convença que os tais mercados vão emprestar dinheiro sem garantias.
    Peço-lhe aceite os meus mais respeitosos cumprimentos

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  2. Caro Dr. Tavares Moreira, li com a máxima atenção, tudo o que expõe e concordo com o ponto de vista que apresenta. Contudo, chegando ao ponto 8, sobrevem-me a dúvida: como se poderia alterar o “Programa Cautelar” para “Programa Complementar”, um programa - como o caro Dr. muito bem explica no ponto 9 - destinado a completar e consolidar os resultados obtidos com o PAEF – que implicaria a concessão de algum apoio financeiro adicional, se em simultâneo acrescenta: "uma vez que com o PAEF, e não obstante os trabalhos ciclópicos, ainda não ficaram criadas as condições para um regresso bem sucedido aos mercados..."?
    Neste caso, o "programa" complementaria aquilo que apesar de tantas medidas extremamente recessivas e penalizantes para toda a sociedade portuguesa, não foi obtido?!

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  3. Caro Tavares Moreira,

    O que também está muito mal explicado é porque é que o Banco Central Europeu (BCE) empresta dinheiro (que cria a partir do nada – out of thin air)a juros irrisórios aos bancos (a cerca de 1% ou menos) e está proibido pelos próprios estatutos de emprestar directamente aos Estados, Empresas e Famílias.


    Diário Económico – 21.12.2011:

    «…Numa operação sem precedentes, o BCE vai emprestar 489 mil milhões de euros a 3 anos, bem acima do previsto, com um juro de 1%.»


    Depois estes bancos emprestam diligentemente este dinheiro aos Estados Nacionais a juros de 5%, &%, 7% e mais.

    Por exemplo: um banco que pede um empréstimo de 100 mil milhões de euros ao BCE a um juro de 1%, e depois o empresta a um Estado a uma taxa de 6%, este banco arrecada, num único ano, 5 mil milhões de euros. Convenhamos que é um óptimo negócio!

    Estes «negócios das arábias» dão azo a que os programas de a «ajustamento e cautelares» se sucedam eternamente, com a população a ser despachada para a miséria, a fome e a morte.

    Agora, caro Tavares Moreira, haverá roubo maior no universo?

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  4. Pois eu quero mesmo é a parte do programa. Ou seja, fiquem eles com a república portuguesa: aturem os departamentos que "não sabiam que estavam em crise" e que gastam mais 100 milhões de salários, os Ĉavacos e as propostas comunistas, os Seguros e as propostas imbecis, os TC e demais justiça angolana,etc. porque isso é que precisa de "cushions" (o que é de estranhar face às décadas que passam deitados...). Esse sim, seria o regresso da soberania!

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  5. O meu filho que vai nascer em 2014...e a mim pouco me importa qual será nome dele!


    para mim o importante é que ele CRESCA com SAUDE!

    Ou seja, podem por os rotulos que quizerem :
    -ProgramaDoBomAluno
    - ou Cautelar
    - ou Complementar
    - ou 2º Resgate
    - ou Canibal e Alarve
    - ou Vendilhoes
    - ou Vira-Casacas
    - ou Irrevogavel
    - ou SucessoAus-Histerico
    - ou FracassoPósCrescimentista

    ou sei lá, até mesmo: ProgramaTaniaVánessa.

    O que importará será o seu conteudo e respectivas medidas...e se terá em linha de conta multiplicadores validos, e tabelas de EXCEL com 2 RR's sem serem truncadas...

    ...isso sim, é que irá definir a nossa servidão e subserviencia nas proximas decadas!

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  6. Caro António Rodrigues,

    Em 1º lugar retribuo, com não menor respeito, seus cumprimentos.
    Quanto ao resto, seria bom se assim fosse, ter a protecção do BCE, sem mais...
    Mas pode o ilustre Comentador ter por certo que as coisas não vão ser assim tão simples: o BCE não prestará tal caução sem o aval da União Europeia e do FMI...e nas condições para obtenção desse aval é que vai estar o busilis, ou se preferir, o tal Porgrama Complementar...

    Caro Bartolomeu,

    Permita-me um breve reparo quanto ao uso da expressão "extremamente recessivas"...Caso se confirmem as perspectivas mais recentes, a recessão estará de malas aviadas, é certo que nunca se pode dizer nunca mais (never say never)...
    Quanto à sua reserva, aliás compreensível, aquilo que se pode dizer, nesta altura, é que os objectivos de estabilização das finanças públicas ainda não foram cumpridos, ainda falta tocar um trecho de programa não despiciendo (os 10º, 11º e 12º andamentos, pelo menos).
    Caso esse final não seja satisfatório, a contento geral 8dos credores), não sei como poderemos evitar um Programa Complementar...mas pode ser que tudo corra bem e nessa altura só teremos razões para nos felicitarmos.

    Caro Diogo,

    O BCE através da sua facilidade principal de refinanciamento, empresta aos bancos (com colateral de títulos ou créditos à economia, não é em branco)à taxa de 0,5% nesta altura.
    A razão pela qual não pode emprestar aos Estados é muito simples, está bem explicada: os seus estatutos proibem esse tipo de financiamento.

    Caro Tonibler,

    Ora aí temos uma síntese perfeita de um Porgrama de Saneamento geral! A partir daí, não há défice que resista, oxalá o ouçam!

    Caro Pedro,

    A receita que preconiza, em meia dúzia de palavras, não ouso duvidar, é certamente muito melhor que qualquer programa cautelar que andam para aí a badalar!
    Mas não seria possível, quando dispuser de tempo, dar-se ao trabalho de a trocar por miúdos, para que o comum dos mortais consiga entender melhor o respectivo conteúdo programático?...

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  7. O caro Diogo, "dá o tiro na mouche"; o sistema bancário europeu parasta os cidadãos através dos impostos induzidos encargos financeiros das obras públicas faraónicas dos Governos incentivadas por ele(SB).

    Tal não só é do agrado dos partidos no Governo, que assim fidelizam clientelas, como desincentiva os bancos de promoverem o desenvolvimento das economias.

    Passe a imodéstia, mas...assim também eu!

    Veja-se o que diz George Soros sobre a crise europeia!

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  8. Poderia mesmo chamar-se:

    P.E.C 5 !

    apesar de na altura a oposição ter rejeitado o 4, a Europa validou-o e aceitou-o.

    então oprque não chamar-lhe P.E.C 5 ?

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  9. Não seria bem melhor chamar-lhe PEC N ou N+1, caro Pedro? Assim poderia ser-lhe dado um número inteiro qualquer, à escolha do freguês!

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  10. Não seria bem melhor chamar-lhe PEC N ou N+1, caro Pedro? Assim poderia ser-lhe dado um número inteiro qualquer, à escolha do freguês!

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