sexta-feira, 23 de maio de 2014

Comboio CELTA: interessante exemplo de investimento "estratégico"...

1. Foi esta semana noticia, rapidamente omitida, uma história curiosa que ilustra bem como se continua alegremente a desperdiçar recursos neste encantador País - sempre em nome do interesse público e de estratégias de desenvolvimento que, apesar de perfeitamente obscuras, são proclamadas como verdades indiscutíveis...

2. Pois bem, esta notícia dizia que o comboio Celta, que faz 2 X dia a ligação directa Porto-Vigo, entre Julho de 2013 (altura em que recebeu beneficiações importantes, ditadas por razões de “desenvolvimento estratégico”, muito impulsionado pelas autarquias da região) e Março de 2014, transportou em média 26,9 passageiros por viagem (representando uma taxa de ocupação de 12%) e acumulou prejuízos (apenas operacionais, suponho, não contará os financeiros) de € 1,2 milhões.

3. Não é evidentemente por causa dos prejuízos acumulado pela Comboios de Portugal (ex-CP até 2009) com esta patética exploração do comboio Celta, como tb não é por causa dos prejuízos que a Câmara de Sintra acumula com a manutenção do comboio que liga a cidade até à encantadora praia das Maçãs, nem é por causa de cada uma das rotundas que enchem o País de norte a sul e de leste a oeste...

4. ...nem é por causa de cada uma das muitas outras infra-estruturas que proliferaram neste País nos últimos 15 ou 20 anos, desde AE quase sem tráfego até aos estádios de futebol quase sem utilização ou até à miríade de pavilhões multi-usos e muitas outras obras sumptuárias...

5. ... que o País chegou ao ponto de sobre-endividamento que nos sufoca e impõe níveis de tributação claramente excessivos e desalinhados do nosso estádio de desenvolvimento.

6. O País chegou aonde chegou por causa disso tudo junto, e sobretudo por causa do permanente equívoco em que temos vivido e em que pelos vistos queremos continuar a viver em relação às prioridades da política económica – basta atentar na esmagadora vaga das mensagens de fantasia e promessas de ilusões que se vão ouvindo nesta folclórica e pouco inspirada campanha eleitoral que hoje atinge o seu termo.

7. O infeliz episódio do comboio Celta é exactamente apenas mais um episódio ilustrador do nosso talento para desperdiçar recursos e de contrair encargos para o futuro, indefinidamente, sempre a coberto de excelentes slogans – desenvolvimento regional, solidariedade nacional, estratégia de desenvolvimento, etc, etc.

8. E não esqueçamos que a dívida financeira da desamparada Comboios de Portugal lá teve de ser integrada no perímetro da dívida pública, agravando os indicadores desta, exactamente por não ter receitas que cubram minimamente os seus custos...pudera, tem de levar às costas estes investimentos estratégicos...

14 comentários:

  1. E ainda assim, caro Tavares Moreira, tudo isso é peanuts comparado com o défice que a função pública acumula todos os anos de diferencial entre o valor do que produz e o valor que recebe. Este ano lá resolveram fazer os exames em Maio para não faltar aos professores as férias a partir de Junho... Mas pronto, como se sabe não se pode reduzir o ordenado em função do valor que produzem porque viola o princípio da confiança. Eles confiantes de que cada vez fazem menos e nós confiantes que cada vez somos mais lixados. Equidade, portanto...

    ResponderEliminar
  2. Anónimo19:40

    Caro Tavares Moreira, esse comboio existe unicamente por decisão política o que ainda é pior. Nem a CP nem a RENFE foram tidas nem achadas para o assunto. O ministro Santos Pereira e a ministro Ana Pastor decidiram que era para fazer e deram as ordens pertinentes. Os governos manda. As empresas, CP e RENFE, arcam com o prejuízo. Para as contas da RENFE, enfim, é dinheiro mas ninguém morre por causa de, vá, um milhão de euros no fim do ano, metade do prejuízo total. Agora para a CP sim, faz efectiva diferença dado a empresa andar literalmente a raspar o cofre para coisas urgentes e que não consegue fazer.

    ResponderEliminar
  3. Comboio Celta. O nome é bonito!

    ResponderEliminar
  4. Para além de tudo isto, não deixo de pensar que ainda há bem pouco tempo, as gentes do norte pugnavam e gritavam bem alto por um TGV entre o Porto e Vigo. Enfim.........

    ResponderEliminar
  5. Para além de tudo isto, não deixo de pensar que ainda há bem pouco tempo, as gentes do norte pugnavam e gritavam bem alto por um TGV entre o Porto e Vigo. Enfim.........

    ResponderEliminar
  6. Caro Dr. Tavares Moreira perdoará a minha obstinação mas considero que «O país chegou aonde chegou...» porque ninguém com poder decisório "deu ouvidos" às eloquentes e visionárias estratégias que Paulo Futre apresentou. Se os nossos decisores possuíssem metade da visão empresarial e metade do dinamismo fantástico do ex jogador, teriam estendido a linha ferroviária até à China e hoje, o comboio Celta gozaria de uma taxa de ocupação de 5.000% na época baixa. Acho até, que agora, depois da visita do nosso Presidente da República àquele país, onde foi levar a língua Lusa, que era algo que fazia tanta falta aos Chineses como o ar que respiram, eles até viajariam pendurados nos estribos. Iam ser favas contadas, sempre a faturar a uma velocidade vertiginosa. O deficit anulava-se em menos de uma semana e em 15 dias deixaríamos de ir aos mercados e seriam eles a vir-se (?!) financiar a Portugal. Oh larecas!!!

    ResponderEliminar
  7. Caro João Pires da Cruz,

    Assim é, com efeito: faltou-me acrescentar o tema/argumento equidade (perfeita) aos grandes slogans do desenvolvimento equilibrado, da visão estratégica do País, da solidariedade inter-regional, etc,etc.
    E nós sempre "lixados", como bem diz, sempre mais e mais impostos para financiar estas parvoíces, este suposto "investimento" em que, após o dito investimento, em vez de um rendimento é gerado um custo periódico, sem fim, a acrescentar ao custo inicial...
    Que imbecilidade, lembrava bem, hoje, um dois grandes arautos deste tipo de estratégias!

    Caro Zuricher,

    Este comboio é bem mais antigo, creio bem, o que é novo e gerador de perdas adicionais, ano a ano, sem fim, é o "up-grade" que entrou em funcionamento em Julho de 2013!
    E agora, por espantoso que pareça, andam à procura de uma solução que consiste em fazer o CELTA parar em diversas estações, satisfazendo diversos cérebros promotores de desenvolvimento regional...
    E com isso alongando o tempo de viagem, agravando os custos de operação...mas talvez consigam aumentar a média de passageiros transportados de 26,9 para 26,93!

    Caro SLGS,

    Esse TGV lá haverá de chegar, não se apoquente!
    Não li, mas não me surpreenderia que figurasse nas 80 medidas de um famoso Programa de (Re)Afundamento do País, a cuja leitura o nosso ilustre Comentador J.P. Cruz se entregou, estoicamente, tendo conseguido sobreviver, não sei bem como...
    mas felizmente!

    Caro Bartolomeu,

    Eu creio que a única solução para o Celta aumentar expressivamente o número de passageiros, será estabelecer paragens em locais aprazíveis, como o Capoeira e o Treze %, atraindo novos clientes mediante a atribuição de um chorudo subsídio de refeição a quem fizer a viagem!
    A exploração tornava-se ainda mais deficitária, mas pelo menos as composições andariam repletas de gente bem disposta!

    ResponderEliminar
  8. Anónimo23:49

    Caro Tavares Moreira, havia antigamente comboios Porto-Vigo mas com imensas paragens pelo meio. Nestes moldes de comboio directo nasceu em 2013. Tem muita razão no que diz das paragens adicionais. Irá acrescentar tempo e é bem provavel que acabe por ter efeitos negativos na receita.

    ResponderEliminar
  9. claro que a culpa é dos profs...ate pq foram eles que elaboraram o calendario de exames para irem de ferias a meio de junho e so voltarem as escolas a meio de setembro...enfim..

    ResponderEliminar
  10. Caro Dr. Tavares Moreira,
    Sem lhe querer tirar razão, estranho um custo tão elevado com a operação Porto/Vigo, duas ligações por dia que não ocuparão mais do que meia dúzia de funcionários. E não acredito que esse dinheiro será poupado se a ligação em apreço for eliminada.
    Também estranho que uma ligação destas seja feita em comboio directo, impedindo o aparecimento de mais passageiros, como poderia acontecer se os comboios parassem em Barcelos, Viana e Valença.

    ResponderEliminar
  11. Caro Tiro ao Alvo,

    A fonte da informação, que me limitei a citar e foi objecto de divulgção pública, é a própia Comboios de Portugal...
    Como deve calcular, os custos da operação não se limitam aos funcionários afectos a este serviço: há ainda os custos da energia consumida, os custos de utilização da ferrovia, os custos da amortização do equipamento, os custos de manutenção do equipamento, os custos com serviços de limpeza,etc, etc...
    Salvo erro, essa ligação era até Julho de 2013 feita com algumas paragens, terá sido entendido que na perspectiva de um mais puro desenvolvimento regional a ligação directa faria mais sentido, agora parecem querer voltar à 1ª forma...
    Com mais paragens terá pelo menos uma vantagem: os custos operativos deverão aumentar...

    ResponderEliminar
  12. Caro Tavares Moreira,
    Obrigado por ter "respondido" ao meu comentário, mas mantenho as minha estranheza, bastando dizer que as carruagens ou locomotivas eram (são) bastante usadas e que a infraestrutura já deve estar amortizada. Continuo a pensar que 1,2 milhões de euros em 8 meses de operação, é muita guita. O que me parece é que nem a CP nem a Renfe estão a pensar uma forma de melhorar a operação. Estarão interessadas, isso sim, em acabar com a linha.
    Privilegiar o transporte ferroviário é só para pôr no papel; desencorajar o transporte rodoviário, sobretudo o particular, é coisa para programas eleitorais.

    ResponderEliminar
  13. Caro Tiro ao Alvo,

    A questão que suscitou pareceu-me merecedora de resposta (não de "resposta"), em tom, necessariamente, de diálogo construtivo.
    Volto a dizer que sendo a fonte de informação a própria empresa que presta o serviço, tenho dificuldade em admitir que tenham "fabricado" prejuízos só para construir argumentos a favor do encerramento da linha.
    A infraestrutura, lembro-lhe, pertence (do lado português) à REFER, que cobra uma renda pela sua utilização - pelo facto de já estar amortizada, não faço ideia, a REFER não deixará de cobrar renda...
    Se o material circulante tem já bastante uso, então os custos de manutenção serão mais elevados...
    Etc, etc.

    ResponderEliminar
  14. Caro Tiro ao Alvo,

    A questão que suscitou pareceu-me merecedora de resposta (não de "resposta"), em tom, necessariamente, de diálogo construtivo.
    Volto a dizer que sendo a fonte de informação a própria empresa que presta o serviço, tenho dificuldade em admitir que tenham "fabricado" prejuízos só para construir argumentos a favor do encerramento da linha.
    A infraestrutura, lembro-lhe, pertence (do lado português) à REFER, que cobra uma renda pela sua utilização - pelo facto de já estar amortizada, não faço ideia, a REFER não deixará de cobrar renda...
    Se o material circulante tem já bastante uso, então os custos de manutenção serão mais elevados...
    Etc, etc.

    ResponderEliminar