terça-feira, 15 de julho de 2014

Joelho esfolado

A noite premiava-me com algum descanso e atividade lúdica televisiva e facebookiana quando, subitamente, bateram à porta com alguma insistência, desprezando a campainha. Levantei-me meio surpreso e deparo-me com a minha netinha chorosa ao colo da mãe. Não foi difícil fazer o diagnóstico, o joelho esfolado era o motivo daquele bater intempestivo. Os olhos aflitos e em lágrimas da pequenina pediam socorro. Tomei-a nos braços e levei-a para fazer o respetivo curativo. Agarrou-se ao meu pescoço denotando um mistura curiosa de confiança e de medo. Tranquilizei-a e, com a natural autoridade associada ao carinho que lhe é devido, fiz o que tinha a fazer. No final, ficou admirada por não lhe ter doído. Encheu-me de ternura sem fim. Um doce. Depois, como é curiosa, e já tendo a certeza de que não lhe iria fazer mais nada, começou o seu interrogatório. Perguntou-me se em pequeno também esfolava joelhos. Expliquei-lhe que se houvesse essa modalidade nos jogos olímpicos decerto que ganharia uma das três medalhas. - Sim. Eu era um esfolador de joelhos profissional. Dei cabo deles vezes sem conta, e a tua mãe também era uma artista. Olha para os joelhos dela. Estás a ver? Ainda tem algumas cicatrizes. E foi mesmo ver. Enfim, conversa puxa conversa acabou por ficar convencida que afinal é normal dar cabo dos joelhos. Deitou-se em cima de mim e abraçou-me cheia de confiança. Tirei-lhe o casaco e vi que tinha uma pequenina esfoladela no cotovelo. - Olha, também tens aqui uma coisita. Começou a estremecer com medo e disse-lhe que ia colocar um produto para não infetar. Deu-me a mão e ao colocar o desinfetante disse-me meio chorosa: - A mim acontece-me tudo! - Acontece-te tudo? Deixa-te disso. Isto não vale nada. Pronto, já está. - Já? - Sim. Deu-me a mão e fomos para a sala onde me mimoseou novamente com carícias deliciosas. Foi então que a mãe lhe disse: - Sais mesmo ao teu avô! Qualquer coisita e ficam meio apardalados. Esta observação fez-me recordar o passado e os tormentos que sofri por causa das quedas e das esfoladelas que ia colecionando, realmente eu era um caguinchas do caraças. Não era muito diferente da minha neta. Foi quando me perguntou: - Quem é que te tratava das tuas feridas? - A minha mãe. Agarrou-me e disse: - Eu quero o meu vovô...

6 comentários:

  1. Uma ternura de texto.
    Quando as crianças acordam e deixam chover as perguntas, apetece deixá-las falar até que lhes apeteça.

    ResponderEliminar
  2. Já o meu filho é um todo-o-terreno. Aos sete anos começou a fazer windsurf; aos oito saltou pela primeira vez de uma prancha de 5 metros; faz skate (já torceu um pé e andou duas semanas de canadianas); faz habilidades em patins em linha; faz surf; faz bodyboard (uma vez foi parar em cima de uma rocha e esfolou-se todo (graças a Deus não lhe aconteceu nada)); faz acrobacias com bicicletas com as inevitáveis quedas e feridas. Já o tive de proibir de cair mais de uma vez por dia. E agora, o principal interesse são as miúdas…

    ResponderEliminar
  3. Obrigado pelos seus textos deliciosos.
    Também esfolei os joelhos q.b., apesar de ser temerário.
    Já a minha filha, saltou de uma prancha de 5 metros com 7 anos, coisa que eu nunca fiz e nunca farei!

    ResponderEliminar
  4. Em minha casa era o meu pai o cuidador das mazelas, quem me dera abraçá-lo agora como fez a sua neta com o vovô!

    ResponderEliminar
  5. Que ternura!
    Gostei de ler. : )

    ResponderEliminar