Em apenas 2 semanas, a força das realidades - neste caso uma realidade de tipo
apocalíptico, traduzida numa iminente corrida aos bancos (na verdade já
iniciada, só faltando a última etapa) e na consequente insolvabilidade do
Estado grego – operou uma metamorfose política que à partida se consideraria
inimaginável…
…mediante a transformação de um partido
auto-proclamado de extrema esquerda, que se mostrou capaz de arrebatar o
voto popular na base de um programa de governo cheio de promessas
delirantes, num partido com um programa de governo de tipo social-democrata
de pendor claramente conservador, que enterra, virtualmente, todas as ditas promessas!
Pessoalmente, só posso exprimir a minha admiração
por esta manifestação de realismo dos protagonistas de tal metamorfose política,
reveladora de uma insuspeita capacidade de adaptação a um cenário
claramente adverso, que naturalmente limitava, drasticamente, as opções de
política económica…
…embora compreenda as dificuldades que o governo
grego terá, certamente, para explicar esta formidável pirueta política a
um eleitorado que lhe confiou o voto com a finalidade de executar um
programa de medidas totalmente oposto, bem com a alguns “hard-liners” do
próprio partido (ou partidos) do governo, que já começaram a revelar forte indisposição…
Ao mesmo tempo desejo desde já (aqui por
antecipação) exprimir a minha admiração pelos muitos militantes do “papa-açordismo”
nacional no tratamento do tema grego, que, tendo sido incansáveis na
proclamação das virtudes do anterior programa de governo, repudiando, com
toda a veemência, a intolerância do Euro-grupo face às mais que legítimas
pretensões da Grécia explicitadas nesse programa…
…não deixarão certamente de proclamar esta
importante vitória do governo e do povo da Grécia, impondo uma clamorosa
derrota ao todo poderoso Euro-grupo e, melhor ainda, à toda poderosa
Alemanha (com Portugal e Espanha a tiracolo)…
Em suma, um grande “saludo” a todos estes protagonistas
da Nova Ordem Europeia.
Social-democratização? Meu caro, tirando alguns pormenores, a carta que li hoje poderia ter sido escrita por Milton Friedman!
ResponderEliminarMas não cantemos vitória. Há ainda muitos escolhos no caminho da Grécia, um dos quais a aprovação desta carta no Parlamente Grego. Acho que esse debate vai ser lindo de ver! Uma delícia. :D
Mais importante que tudo, porém, é que apenas esta declaração de boas intenções não chega e é preciso pormenorizar tudo muito bem sem o que o dinheirinho não vai.
Menos bom é já estar aberta a porta a um terceiro resgate, ou seja, mais dinheiro de Espanha e Portugal para aquele poço sem fundo habitado por mal agradecidos que fazem a quem os tem sustentado e os salvou da bancarrota o desplante de votar nestes impresentaveis... e a seguir ir não pagar impostos e ir a correr tirar o dinheiro do banco.
Caro Zuricher,
ResponderEliminarEu compreendo bem o que diz, mas também considero que não devemos imprimir excessiva velocidade a esta análise comportamental. Isso poderia induzir o risco desta bondosa gente (não esqueçamos, em particular, a Brigada da Inadimplência) entrar em crise existencial, coisa que, de todo, não se deseja.
Não se preocupe com a Brigada da Inadimplencia, caro Tavares Moreira. Não se preocupe que eles lá vão tentando arranjar forma de tentar sair airosamente da coisa esperando que toda a gente esqueça o que disseram há escassos 10-15 dias.
ResponderEliminarOra repare aqui o fraco General de Brigada a levar a cabo um recuo muito pouco estratégico.
http://www.publico.pt/politica/noticia/costa-diz-que-nao-se-pode-prometer-quando-o-resultado-depende-de-muitos-factores-1687153
Depois de ver a carta do min das Finanças grego fico apavorado. Não é que me parece que deixámos outra vez de ser defendidos? Espero que o camarada Louçã no elucide com alguma urgência porque estamos sem rota, sem timoneiro, sem farol e sem mais analogias marítimas. Que vamos nós fazer, meu deus!?!
ResponderEliminarCaro Zuricher,
ResponderEliminarEssa valorosa Brigada só dará por terminada a sua missão estratégica quando a Inadimplência, sem consequências jurídicas, for erguida a princípio constitucional de primeiro nível...
Pode estar certo que eles não desasrmarão até lá, aquilo é gente de "antes quebrar que torcer"...
Caro Pires da Cruz,
À primeira vista, seria tentado a dar-lhe razão quando exprime esse sentimento de quase orfandade política, bem expresso na expressão "quem nos vai agora defender?"...
Mas, bem vistas as coisas, deverá concordar que já não necessitamos de qualquer defesa agora que as "bêtes noires" da cena económica e financeira europeia - a Alemanha e seus satélites , a Espanha, Portugal e a Eslováquia só para citar os mais detestáveis, além, claro está, do famigerado Eurogrupo - acabam de ser literalmente cilindrados pelas imposições do novo governo grego, que os vai por na ordem por muitos e bons anos.
Nada há, assim, que recear.
Mas é claro que, substituída a Troyca pelas Instituições, o "hair-cut" da dívida pelo "hair-cut" do Varufakis e similarmente resolvidas mais umas importantes questões semânticas, e ultrapassada a questão dos aumentos salariais decididos e revogados, voltamos à primeira forma com uns acertos pelo meio para salvar a face.
ResponderEliminarNão tarda, e teremos o Varoufakis a apresentar-se de fato e gravata no Eurogrupo, a abjurar do seu comunismo libertário, a saudar efusivamente a Senhora Merkel e a defender o sistema financeiro internacional pela solidariedade com a causa grega.
Depois, emigra para o seu país de recuo, a Austrália, ou para o país da mulher, EUA.
Quanto ao Tsipras, o caso é mais bicudo, pois não tem país de recuo no caso de o povo grego se sentir ludibriado...
Caro Pinho Cardão,
ResponderEliminarUm processo de social democratização (de nível conservador) ao ritmo estonteante a que estamos a assistir, tendo como base de partida uma esquerda radicalíssima, é susceptível de deixar marcas profundas no tecido económico e social...
Mas os personagens referidos encontrarão sempre acolhimento em meios progressistas, quanto mais não seja no CES, da Lusa Atenas, após provas de doutoramento bem sucedidas, nas quais o nosso amigo Pires da Cruz poderá ter um importante protagonismo como um dos arguentes...
O autor do Post nada concretiza: Nem sobre que “promessas delirantes” foram feitas nem, agora sobre “esta formidável pirueta política” a que alude. O autor do Post deve ter-se em tão alta conta que prescinde de quaisquer explicações. Os sábios são assim.
ResponderEliminarVamos então ver, do que constam as “promessas delirantes”: Numa palavra, parar com a austeridade, o que significa não aumentar impostos sobre o trabalho, não cortar salários nem pensões, acudir às emergências sociais, reintegrar funcionários públicos ilegalmente despedidos, aumentar o salário mínimo e reformar a administração e a fiscalidade.
Quanto à “formidável pirueta política” que o autor do Post afirma que foi dada pelo governo grego ela traduzir-se-á em: Os gregos conseguiram desactivar o acordo deixado por Samaras e pelo Eurogrupo para o corte das pensões e o aumento do IVA. O BCE irá desbloquear os lucros obtidos com a dívida grega, que ascendem a 1,9 mil milhões de euros, cerca de 1% do PIB grego. Apesar da regra de não-reversão das medidas do anterior governo, o governo grego irá reintegrar 2100 funcionários públicos ilegalmente despedidos, proceder a um aumento faseado do salário mínimo, parar com a política de privatizações e dar acesso à Saúde aos desempregados, efectuar uma reforma na Administração Pública que elimine serviços paralelos parasitários e combata a corrupção, proceder a uma reforma fiscal com lançamento de impostos sobre os mais ricos, sem falarmos já da diminuição do saldo orçamental primário anteriormente exigido.
Os amantes da austeridade e do dogma neoliberal não se conformam com a hipótese de um governo de um país do euro apresente uma alternativa à austeridade, daí que seja compreensível mas condenável, porque fogem à verdade, que tentem denegrir e falsear o acordo dos gregos com o eurogrupo e assim justificarem o seu dogma do caminho único.
Ao conseguir aplicar as suas políticas alternativas, o governo grego poderia demonstrar a grande falsidade, a ineficácia e inclusive a crueldade das políticas impostas às classes populares da Grécia e dos outros países da Eurozona, com a cumplicidade e apoio das elites conservadoras e neoliberais governantes em cada um destes países.
Na verdade, serão estes amantes da austeridade sem fim que terão de dar “formidáveis piruetas” para tentar encaixar a realidade em seus dogmas neoliberais.
Caros Comentadores,
ResponderEliminarPor me parecer bastante curiosa, e a propósito, no contexto deste debate franco e ameno, aqui reproduzo uma passagem de artigo publicado na edição de hoje do DE, da autoria do seu director António Costa:
" A retórica ideológica do Syriza cedeu à realidade de uma bancarrota iminente, a uma tragédia grega, mas continuam por responder as 2 questões mais importantes: o governo grego quer e vai aplicar o plano? Mesmo assim, evitará a saída do Euro?".
Apenas para que conste...
Relativamente às perguntas que A. Costa deixa no ar, eu nesta altura não consigo responder, mas suspeito (é apenas uma suspeita, repito) que o cumprimento do programa vai ser uma "paródia" permanente, de recuos e de avanços...
Avançará, quando o espectro da bancarrota se repetir; recuará, quando essa ameaça se atenuar (como sucede exactamente no momento presente, com declarações contraditórias de Varoufakis e do Ministro da Energia, Lafazanis, um dos elementos mais radicais do governo, acreca da suspensão de processos de privatização).
Não excluo, adicionalmente, que este governo se esfrangalhe no percurso...
Caro Tavares Moreira, or aí está uma tarefa que faria com enorme prazer. Agora, de quando em vez, lá vou ao site do CES ver que novas publicações têm sido produzidas para esse repositório incontornável da vida científica nacional. O último que me lembro era de uma senhora especialista em Feminismo Pós-Bélico do Índico, um tema a todos os títulos apaixonante e bem capaz de projectar o país para um futuro que não imaginávamos. Eu. na minha humildade académica, quase me atreveria a sugerir um tema para doutoramento no CES sobre a Importância da Capilaridade Marxista-Libertária na Península Balcânica...
ResponderEliminarCaro Tavares Moreira, penso haver um risco muito importante de o governo Grego estar a aceitar tudo e mais alguma coisa neste momento para receber o dinheiro e depois não fazer nada, enganando toda a gente. Felizmente o dinheiro, todo o que está previsto ir, só irá depois de tudo muito certinho, direitinho e não antes. Mas, ainda assim, os riscos existem.
ResponderEliminarQuanto a se sai do Euro, respondo-lhe à questão que transcreveu com uma outra. Dependendo do que lhe parecer a resposta a esta segunda assim será uma coisa ou a outra a resposta à primeira. Estão os contribuintes dos restantes países Europeus dispostos a pagar um terceiro resgate à Grécia?
Ao que parece, para lá de toda a retórica os meios de comunicação local vão dizendo que o Syriza se vai ver grego para explicar ao povo grego o alcance das medidas a que se propôs. Afinal, uma tradução atual da fábula de Esopo, em que o sátiro ficou amigo de um homem mas acabou por desconfiar dele quando percebeu o sopro lhe servia tanto para aquecer as mãos como para esfriar a sopa...
ResponderEliminarCaros Comentadores,
ResponderEliminarUma pequena adenda, para traduzir a perfeita harmonia que reina no seio do governo grego, relativamente às medidas de política a implementar - citando o JNegócios de hoje, "Varoufakis diz que privatizações podem avançar mas ministro da Energia garante que vão parar"...
Pelos vistos as dificuldades não se esgotam na explicação das medidas aos gregos, caro F. Almeida, começando mais a montante, pois existem membros do governo a quem ainda não terão sido devidamente explicadas...