A interrogação em título parece, numa primeira análise,
destituída de qq sentido: todos sabem que a Grécia é um membro do Euro e até
um membro muito especial, que, pela sua irreverência e (agora) singular
incompetência, tem trazido as maiores dores de cabeça para os responsáveis
pela condução da política económica desta zona monetária.
Formalmente a interrogação não faz, pois sentido…mas,
quando começamos a analisar dados da realidade económica e financeira da
Grécia dos nossos dias, a interrogação começa a ganhar justificação face
ao incrível isolamento monetário e financeiro para o qual os actuais responsáveis deste País o têm estado a arrastar…
Curiosamente, esta interrogação assaltou-me hoje,
quando, como habitualmente, registava a evolução das yields (taxas de juro
implícitas na cotação) da dívida pública dos países do Euro para o prazo de 10
anos: a yield da dívida da Grécia situa-se em torno de 11,5%, sendo as
mais próximas as de Portugal, com cerca de 1,6%, da Itália, com 1,29% e da
Espanha com 1,21% (a Irlanda já vai em 0,75%...)…destaque ainda para a
yield da dívida grega a 2 anos que ultrapassa 22%...
E a mesma interrogação reforçou-se quando pensei na situação
de isolamento dos bancos gregos, que agora (graças a Varoufakis & cª) não
têm acesso ao mercado por grosso em Euros, estando desgraçada e
exclusivamente dependentes, para sobreviver, da ajuda do BCE, feita a conta-gotas (e a
contragosto, muito provavelmente)…
A interrogação ainda mais se reforçou quando
pensei no facto de ninguém, absolutamente ninguém, a não ser os infelizes
bancos gregos – esses seguramente a contragosto, embora a taxas altíssimas
e só a muito curto prazo – estar disponível para comprar dívida grega no
actual contexto (não era assim há poucos meses, antes do início desta
aventura muito mal calculada)…
Acresce, para agravar o cenário, que os próprios
cidadãos gregos parecem agir como se o seu País já não fosse membro do
Euro (ou esteja à beira da porta de saída), quando a sua principal
preocupação será levantar dinheiro depositados nos bancos locais…nos últimos
4 meses terão sido levantados, em termos líquidos, cerca de € 28 mil milhões,
qq coisa como 12% do PIB…
Se nem os gregos acreditam na viabilidade de
soluções para o seu País, quem mais poderá acreditar?
Depois disto tudo, ainda se poderá dizer,
afoitamente, que a Grécia pertence, realmente (e não apenas formalmente) à
zona Euro?
Só espero que o velho e sábio Warren Buffett
tenha razão quando, citado pela imprensa de hoje, afirma que “A saída da
Grécia pode até não ser má para o Euro, pois poderá servir como exemplo do
que não deve acontecer e contribuir, assim, para que os restantes membros
ponham as contas em dia”…
Estou certo que à última hora a vontade do povo grego de resistir às políticas austeritaristas da Sra. Merkel e de combater as agências de rating ao serviço dos especuladores da economia de casino, será apoiada com grandes fluxos de fundos vindos dos camaradas portugueses como o Prof Reis, Pureza, Boaventura, Louçã, ... e todos aqueles que sentiam o povo português representado pelos irmãos do Syriza.
ResponderEliminarCaro Pires da Cruz,
ResponderEliminarNo caso das altas e ilustres individualidades que menciona, o "apport" de fundos para a Grécia em armas seria apenas uma operação de retransmissão de fundos...provenientes do OE português e do Orçamento da UE.
Não creio, sem ofensa, que a solidariedade internacionalista de tais individualidades seja tão intensa que os leve ao ponto de prescindir de parte dos seus rendimentos pessoais para acudir à Grécia em armas!
Abril poderá ser por isso o mês em que o jogo se joga. Ou o governo continua a apresentar listas de novas medidas, que serão sempre criticadas por Berlim e Bruxelas por serem austeridade a menos, e haverá sempre a exigência de mais medidas, ou prepara um referendo ou outra mobilização democrática para medidas excepcionais. Tem várias ao seu dispor: o incumprimento da dívida e o controle de capitais, mesmo sem sair imediatamente do euro, porque não há meio legal nos Tratados europeus para o obrigar a tal. Mas, para essa resposta, precisa de controlar o sistema bancário que, aliás, será imediatamente estrangulado pelo Banco Central Europeu. E essa guerra só pode conduzir à emissão do dracma, ou seja, à soberania monetária.
ResponderEliminarLouça
Portugal estaria no mesmo caminho da Grécia se tivesse seguido os cantos de sereia da esquerda. Felizmente, com todos os erros cometidos até aqui, o caminho de Portugal é outro para desespero dos "profetas dos amanhãs que cantam". Já agora, o link para um interessante documento do Banco de Portugal intitulado Projeções para a economia portuguesa 2015-2017:
ResponderEliminarhttp://www.bportugal.pt/pt-PT/EstudosEconomicos/Projecoeseconomicas/Publicacoes/projecoes_pt.pdf
Caro Pedro de Almeida,
ResponderEliminarPermita-me que comece por lhe dizer que foi um grande prazer conhecer a Senhora sua Mãe, na segunda-feira passada, durante um debate em que participei na Associação Comercial de Lisboa, dedicado ao tema da Reforma do Estado e em que tive oportunidade de tratar o sub-tema da reforma da despesa pública, num painel em que também participaram o Prof. João Duque, que fez uma excelente apresentação, muito pedagógica, e o nosso confrade Pinho Cardão, que actuou como moderador.
A sua Mãe esteve muito atenta aos debates, aguardando com especial expectativa a intervenção da Margarida Correa de Aguiar, que intervinha num painel seguinte.
Permita-me, pois, que lhe dê os meus parabéns pela Mãe que tem; além de ser uma pessoa muito simpática, com quem conversei alguns instantes, percebi que nutre um grande amor pelo Filho que está lá longe...
Quanto ao tema que nos ocupa no âmbito deste Post, o seu comentário vem mais uma vez muito a propósito: ainda bem que, contra ventos e marés, fomos capazes de seguir uma via bem diferente da Grécia. beneficiando, por isso, de uma posição imensamente mais favorável nos planos económico e financeiro.
Repare, por outro lado, no desespero dos pró-syrizistas, que chega ao estado de perfeita alucinação quando acusam o BCE de estrangular os bancos gregos!
O BCE, que tem mantido os bancos gregos a flutuar, concedendo-lhes apoios de emergência de liquidez (Emergency Liquidity Assistance, ou ELA) muito para além do que seria razoável, do que resulta que os outros bancos centrais nacionais, incluindo o Banco de Portugal, arriscam vir a sofrer elevadas perdas caso a situação da Grécia tenha uma evolução desfavorável como parece neste momento muitíssimo provável...
Trata-se de uma alucinação total, pois as dificuldades dos bancos gregos são causadas, como todos sabem - com excepção destes fantasistas - pela fúria dos levantamentos que os gregos, não acreditando no seu governo, têm vindo a fazer das suas contas bancárias - € 28 mil milhões nos últimos 4 meses, em termos líquidos!
Relativamente ao documento do BdeP para que chama a atenção tive oportunidade de o analisar, esperemos que as previsões se confirmem.
Já agora, uma informação fresca, de hoje mesmo: as vendas de automóveis novos, ligeiros e pesados, cresceram em Portugal 33,1% durante o 1º trimestre em relação ao mesmo período do ano passado...e em 2014 tinham já crescido a ritmo semelhante ou mesmo superior - é a crise, dirão estes arautos da desgraça, agora em fase de alucinação com a Grécia.
El primer acto de “guerra” (y es la manera de definirlo) se produjo ya diez días después de las elecciones, cuando el BCE cortó de pronto y a rajatabla su liquidez a los bancos griegos, en las condiciones que antes había recibido el gobierno anterior. Fue una decisión cruel, de enorme hostilidad y totalmente innecesaria, pues el acuerdo aceptado por el anterior gobierno griego permitía la continuación de dicha liquidez hasta más de tres semanas más tarde. La intención de tal decisión del BCE era provocar la huida de capitales de Grecia, desestabilizando la economía y generando un colapso financiero. Este era el objetivo de una decisión tomada, repito, solo diez días (ha leído bien, diez días) después de que el gobierno Syriza fuera elegido. El BCE quería la rendición rápida del gobierno griego.
ResponderEliminarEs importante resaltar que las cantidades que se están manejando son extraordinariamente pequeñas para el BCE.
Navarro
Caro Dr. Tavares Moreira,
ResponderEliminarMuitíssimo obrigado pelas suas palavras tão amáveis. Foi também um grande prazer por parte de minha mãe em o conhecer, assim como em conhecer a Drª Margarida. Tem toda a razão no que afirma quanto ao desespero dos pró-syrizistas. Como nós os compreendemos...Vamos assistindo a esse desespero, porém evitando pacientemente o confronto direto...
Caro Pedro de Almeida,
ResponderEliminarClaro que evitamos o confronto directo com os syrizistas...até porque esse confronto é perfeitamente dispensável, eles acabarão, através de um talentoso processo de cissiparidade, como o nosso confrade Pinho Cardão aqui tem assinalado com muita graça, por resolver o problema muito higienicamente (não evitando alguma turbulência, certamente, mas desde que esta se confine ao mesmo universo Syriza & Cª Lda, tudo bem).
A UE só tem mesmo de ser um pouco paciente, aguardando que os gregos façam o trabalho que lhes compete.
"Já agora, uma informação fresca, de hoje mesmo: as vendas de automóveis novos, ligeiros e pesados, cresceram em Portugal 33,1% durante o 1º trimestre em relação ao mesmo período do ano passado...e em 2014 tinham já crescido a ritmo semelhante ou mesmo superior - é a crise, dirão estes arautos da desgraça, agora em fase de alucinação com a Grécia."
ResponderEliminarÉ certo. Em todo o caso - e sem (nem remotamente!) alinhar com os alucinados com a Grécia syrizista - convirá talvez usar de um módico de moderação na invocação e consequente congratulação com este facto.
É que - sem poder agora apontar valores exactos - parece largamente aceite que este crescimento da venda de veículos automóveis se deve em apreciável medida à renovação generalizada das frotas das empregas de aluguer de automóveis. Será assim este ano e assim terá já sido o ano passado.
Ou seja, o português-médio (esse e não o "gestor", ou coisa parecida, que tem carro de empresa integrado no seu pacote remuneratório) não terá tido ainda a possibilidade, longamente adiada, de adquirir ou trocar o seu automóvel. Poderemos é ver um crescente número de estrangeiros - ou portugueses, por curtos períodos - ao volante de numerosos carros, recentemente matriculados por cá.
Ou que não é necessariamente mau, evidentemente, pois significará algum robustecimento de um sector que andou e anda em situação bem difícil. Mas não representará, temo, uma melhoria significativa na sorte da generalidade dos que andam por cá a pagar isto tudo.
Presta-se, mais ainda num povo muito dado à inveja e mesquinhez (é um facto...), é à demagogia e ao sofisma.
Coisa que, peço-lhe creia, não encontro nas suas palavras.
Costa
Caro sobrevive-se,
ResponderEliminarNão encontra nas minhas palavras escritas a propósito da venda de automóveis qq ideia de congratulação, que aliás é um tipo de manifestação a que sou muito pouco dado, pode crer.
Para mim, esta evolução das vendas de automóveis serve como indicador de animação da actividade económica - por outras palavras, se quiser, que há mais actividade, há mais transacções, gasta-se mais.
Exactamente o oposto do que clamam os amigos da desgraça, que em tudo encontram sinais para se lamentarem.Mas esses, como tenho dito, lutam contra a realidade, não lhes posso gabar o gosto.
Quanto ao argumento das frotas, perdoar-me-á mas trata-se de algo que não se entende muito bem.
Em primeiro lugar, o negócio das frotas-automóveis não serve para explicar o crescimento das vendas de veículos pesados.
Em segundo lugar, se os empresários que se dedicam ao negócio das frotas de automóveis compram mais, é porque têm mais clientes a utilizar os automóveis, eles não são clientes finais, como saberá.
E se há mais utilizadores, isso também significa, necessariamente, que há mais actividade.
Finalmente é obvio que isto nada tem a ver com a perfeita desgraça em que a Grécia se encontra e em que se vai atolando, cada vez com maior profundidade e convicção.
Sim, tem razão. É indubitavelmente um sinal de animação da actividade económica.
ResponderEliminarNão que me apeteça divagar em torno do tema que aqui nos trouxe, mas parece-me é que essa animação não se traduz em palpável melhoria da condição de vida do português-médio (aliás o nosso país, cheio de "empresas de regime" - na falta de melhor nome - protegidas por legislação habilmente preparada e dotadas de quase-monopólios de facto, se não de direito, é pródigo em reportes de excelentes resultados e brilhantes lucros que nada têm a ver com a realidade dos cidadãos).
Mas, se calhar, nem é suposto haver tal tradução. Talvez o nosso futuro esteja, ainda esteja por muitos, muitos, anos, em admirar, entre a boçalidade e a inveja, atordoados pela voracidade fiscal e na melhor hipóteses "remediados", os turistas passeando-se nos novos carros de aluguer e os gestores nos novos carros de empresa, em frotas regularmente renovadas, permitindo reluzentes indicadores homólogos.
Dir-me-á que é discurso demagógico e populista. E é bem possível que tenha razão. Mas o rumo das coisas e as receitas aplicadas para alegadamente as resolver fundamentam essa demagogia e esse populismo.
E é isso que me assusta: que se a Grécia não estoirar antes, ou não servir de suficiente vacina, ainda por cá se queira ensaiar receita semelhante. São de temer as reacções de gente em desespero, e a tentação dos demagogos, perante classes políticas há muito dominantes e há muito entretidas, com crescente desfaçatez, a governar as suas clientelas e vidinhas de nepotismo, venalidade e afins.
Costa
caro sobrevive-se,
ResponderEliminarDevo confessar que partilho de algumas das suas preocupações, sobretudo quanto aos benefícios auferidos, injustamente, por rendistas que desenvolvem a sua actividade num regime de mercado muito imperfeito.
Parece-me, todavia, com o devido respeito, que existe uma razoável dose de abstracção ou um certo generalismo inconclusivo nalgumas das suas expressões de insatisfação.
Elas parecem com efeito radicar num conceito - a (inexistência de) "palpável melhoria da condição de vida do português médio" - conceito que parece de medição quase impossível.
Como manifestação de insatisfação, respeitável certamente, será até de algum gosto literário.
Mas não sendo susceptível de qq medição concreta, fica-se pelo plano da abstracção, ou do impulso literário, como referi.
Mas olhe que tenho todo o gosto em apreciar as suas análises, que me parecem provir de uma mente honestamente preocupada com o futuro do País, espero que volte mais vezes.