segunda-feira, 13 de julho de 2015

Economia portuguesa: discurso Crescimentista tornado obsoleto?


  1. Em Maio, segundo o INE, as vendas de bens ao exterior cresceram 3,5% (o que nem foi mau), mas as importações aumentaram 6,2% - foi o 3º mês consecutivo em que as importações cresceram mais do que as exportações…
  2. Com este resultado, o défice comercial até Maio subiu para € 4.106 milhões, quase igual ao registado em igual período de 2014 (€ 4.181 milhões), mas com a importante diferença de que nesse período de 2014 não beneficiávamos da queda acentuada do preço do petróleo, registada a partir de Setembro desse ano…
  3. Note-se que, excluindo as transacções petrolíferas, o saldo comercial nos primeiros 5 meses de 2015 se agrava 56% em relação a igual período de 2014, sendo especialmente relevantes as importações de automóveis e outro material de transporte.
  4. Também há dias foi notícia que as vendas de automóveis novos no mercado português aumentaram 31,2% nos primeiros 6 meses de 2015, em relação ao mesmo período de 2014, e que o número de automóveis vendidos até Junho superava já o total das vendas de 2013…
  5. Face a esta evolução, confesso não conseguir entender o discurso Crescimentista, que insiste na tese de que é necessário aumentar o rendimento disponível dos particulares e das empresas…
  6. … é certo que sem explicar como é que esse desiderato seria atingido - se por via fiscal, com desagravamento dos impostos em sede de IRS e de IRC , ou se através do já famoso “helicóptero do dinheiro”, que, ao contrário dos helicópteros de serviço no combate a incêndios, visa mesmo incendiar a procura interna…
  7. Mas, para além desse "detalhe" processual, cumpre indagar: será que a dinâmica que vem sendo  revelada pela procura interna justifica algum estímulo extra para o rendimento disponível?
  8. Tendo em conta as estatísticas acima referidas, fica a noção de que qualquer estímulo adicional à procura interna, nesta altura, que não resulte de investimento produtivo, em sectores de bens transacionáveis, terá como principal efeito criar maior pressão sobre a balança de pagamentos, acelerando ainda mais as importações…
  9. …e arriscando levar-nos de volta para a zona de défices crónicos, de agravamento do endividamento, sem retorno…
  10. Confesso não perceber como é que os distintíssimos Crescimentistas ainda não se deram conta de que a realidade está a tornar o seu discurso seriamente obsoleto.

11 comentários:

  1. Estimado Dr. Tavares Moreira,
    Deixe-me lá tentar estabelecer um raciocínio que me permita compreender a relação entre o aumento da venda de automóveis e o crescimento económico do país. Refere o meu estimado amigo que: contrariando as opiniões à "velho do Restelo" dos abomináveis crescimentistas, as vendas de automóveis subiram nos primeiros 6 meses deste ano. Este dado é efectivamente demonstrativo de que muita gente que neste país reclama a falta de incentivos fiscais e de apoios aos diversos sectores da produção, como forma de fazer crescer a produção, criar postos de trabalho, aumentar a receita para o Estado; esse mundo de gente incomodativa, anda ceguinha! Eu, que li o post com a máxima atenção mas também com alguma prudência, de forma a evitar que a areia me entrasse para os olhos, pergunto: No igual periodo de 2014, qual foi o número de automóveis novos vendido? É que, suponhamos, se foram vendidos 100 automóveis nos priemiros 6 meses de 2014, então, nos primeiros 6 meses de 2015, terão sido vendidos... (ora deixa cá ver Bartolomeu merceeiro...) 131 automóveis e, 2 rodas do 132º que provávelmente será vendido por tranches. Mas, para que eu possa compreender melhor essa relação entre crescimento e aumento da venda de automóveis novos, precisaria também de conhecer outro dado estatístico; se os automóveis foram comprados a pronto, ou a crédito, se foram comprados por quadros superiores de empresas, por desempregados, por reformados, por dealers de droga, pelos múltiplos Varas e outros lavadores de dinheiro, ou se pelos tipos que se formaram em economia, em advocacia, em engenharia, etc e trabalham nos call-center a 500€ por mês. Existirão esses dados estatísticos?

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  2. Dr Tavares Moreira

    Exactamente, insuflar a procura neste momento parece uma loucura a não ser que se queira, e estão no seu legítimo direito, ajudar a pobre indústria alemã, pois, segundo julgo saber, a maioria das importações dos veículos são bólides alemães, enfim, gente remediada não pode chegar aos super desportivos italianos!... Somos uns desgraçadinhos :-)
    Pergunta: aprendemos alguma coisa enquanto povo com esta crise? Duvido...

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  3. Caro Bartolomeu,

    Tive a dita de este Post ter encontrado o ilustre Comentador com uma óptima disposição, certamente estimulada pelo ambiente descontraído dessa bela Estremadura!
    Relativamente aos relevantíssimos dados estatísticos que reclama, para melhor entender a matéria em discussão, apenas o posso remeter para o INE, que tive o cuidado de citar como fonte da informação utilizada. E também para a ACAP, que divulga mensalmente a informação sobre as vendas de automóveis novos.
    Deixo breve esclarecimento adicional: não pretendi estabelecer qualquer tipo de relação entre o crescimento económico e a venda de automóveis...o meu Amigo deve ter feito interpretação extensiva do meu pobre texto!

    Caro Brytto,

    Não creio que tenhamos aprendido o que quer que seja, talvez tenhamos mesmo desaprendido parte do pouco que sabíamos.
    Pelo menos a avaliar pela paupérrima, infelicíssima, produção opinativa de grande parte dos opinion makers que consegui ouvir/ler, em particular dos Tudólogos de serviço aos canais de TV!

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  4. Caro Dr. Tavares Moreira,
    felizmente, apesar de tudo o que se vai passando no nosso país, a nível político e social, vou conseguindo manter a minha natural boa disposição, talvez fazendo jus ao provérbio popular que diz « muito riso, pouco siso». Ou então, como refere o meu estimado amigo, estes ares estremadurenhos que sorvo em profundos tragos, enibria-me ao ponto de achar graça àquilo que a outros, com melhor sentido de leitura, faria chorar.
    Remete-me o caro Dr. para os dados do INE e os da ACAP, na tentativa de esclarecer a minha dúvida acerca da "qualidade financeira" dos compradores dos 31% vírgula dois automóveis vendidos a mais.
    Eu, que me considero ao nível do mais analfabeto dos analfabetos, não consigo encontrar outros dados para além dos números percentuais, das marcas e dos modelos... dos compradores... nada.
    Mas certamente não estou a saber ler convenientemente.

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  5. Caro Bartolomeu,

    Existe um ponto básico nesta discussão que haverá vantagem em clarificar: quem quer que sejam os compradores das novas viaturas vendidas, quaisquer que sejam os meios mobilizados para as comprar - aforro privado ou financiamento bancário/ parabancário - o impacto sobre a balança de pagamentos é sempre o mesmo, exactamente o mesmo.
    Daí que talvez possamos dispensar suas louváveis cogitações semi-metafísicas em torno deste tema, uma vez que não alteram os termos da (in)equação que apresentei à consideração dos formidáveis e sonâmbulos Crescimentistas...
    Concorda?

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  6. Não, caro Dr. Tavares Moreira, não concordo!
    Mas não discordo só para o areliar ou para ser uma voz discordante.
    Eu não concordo porque, ao contrário do meu estimado amigo, não consigo dissociar os dados. Do meu ponto de vista, tudo tem a ver com tudo, e se algo se destaca, é porque a montante desse algo, outro algo existe, mesmo que não o consigamos enxergar.
    Ou seja, para ser menos meta e mais físico: Se nos primeiros 6 meses de um ano se vendem no noss país mais carros do que nos primeiros seis meses do ano anterior, isso não quer dizer que nos 6 meses que intermediaram os dois períodos, a economia do país tivesse conhecido um crescimento. Aquilo que é liquido, é que, no nosso país, independentemente de visões crescimentistas ou recessivas, existe instabilidade política, em matéria de fiscalidade, não existem políticas sociais e laborais claras, definidas e equilibradas (tanto para trabalhadores como para empresários), próprias de um estado de direito que se rege por uma constituição e que tem como objectivo revitalizar a economia. Não existe uma política de estabilidade para o funcionamento das instituições, que permitam ao cidadão sentir-se mobilizado e incentivado para participar a fundo no equilíbrio dessa balança tão desequilibrada, com tendência a tombar.
    Concordo, por exemplo com aquilo que o meu estimado amigo expõe no 8º ponto do texto. O desequilibrio entre as exportações e importações, impõe como muito bem diz, uma política de estímulo à produção interna, à revitalização dos sectores de produção nacionais, à regulamentação e agilização de métudos de fiscalisação, de transação e comercialização dessa produção e a complementar, a imposição de cotas de importação e até de proibição de importação de produtos idênticos aos que se produzem cá dentro.

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  7. Caro Bartolomeu,

    Por mais esforços que faça não consigo vislumbrar a ratio do seu raciocínio: acha mesmo que a forma como a aquisição das viaturas automóveis (importadas) é financiada - com mobilização de poupanças privadas, com crédito de bancos ou parabancárias - tem consequências sobre o saldo da balança de pagamentos?
    Isto é, uma aquisição de viatura financiada por poupança privada terá menor impacto sobre a balança do que no caso de ser financiada por um banco?
    Não consigo entende-lo, de todo, mas admito que seja limitação minha.

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  8. Caro Dr. Tavares Moreira,
    Na verdade estamos com dificuldade de nos entender nes te assunto, ou seja; a limitação é comcerteza minha, por não conseguir fazer-me entender.
    Aquilo que estou a tentar comentar é precisamente o contrário, que o crescimento das vendas automóveis no meu ponto de vista, não reflete qualquer crescimento na nossa economia, precisamente porque entendo que as viaturas não terão sido adquiridas pelo trabalhador que aufere um vencimento, digamos... entre o ordenado mínimo e... os 1.500€.

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  9. Isto não está mesmo nada fácil, caro Bartolomeu...já tentei explicar-lhe, varoufakianamente, que não pretendi estabelecer qq ligação entre o crescimento económico e o rápid(íssim)o crescimento das vendas de automóveis novos.
    O que as vendas de automóveis nos dizem é que a procura interna não precisa, na minha opinião certamente, de receber estímulos de política adicionais...e que os Crescimentistas, quais sonâmbulos da política económica, estão completamente a nadar quando andam para aí a apregoar esses estímulos...
    Quanto ao crescimento da economia isso é um tema mais "sério", que, pelos vistos, precisa de ser protegido das fantasias Crescimentistas!

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  10. Os portugueses sempre adoraram comprar automóveis. E com o dinheiro dos bancos e das sociedades financeiras de vendas a crédito ainda sabe melhor. Poupar é para os parvos, que até se arriscam a perder as poupanças nalgum banco mais manhoso, e há tantos por aí. Como é difícil educar os consumidores, porque não desincentivar fortemente o veículo individual e as grandes marcas que, por sinal, são as preferidas do povo consumidor. Só vejo a via fiscal e a imposição de requisitos de capital acrescidos para a concessão de crédito automóvel. A bolha automóvel pode mesmo acontecer.

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  11. Caro Vieira Águas,

    Seja muito bem-vindo a este Blog.
    Quanto aos remédios que sugere, parece-me que aqueles que se encontram em prática, na componente fiscal, são suficientes, ir mais longe seria quase absurdo.
    A sugestão dos requisitos de capital poderia fazer sentido, bastaria, por exemplo, ponderar os riscos em causa em 120 ou 130% do seu valor nominal.
    Mas admito que a introdução de mais regras deste tipo, para este e para aquele tipos de crédito, venham a transformar a regulação da actividade bancária numa pesadíssima teia normativa, exigindo recursos sem fim, na implementação e no seu controlo, com resultados finais escassos.
    O comentário sobre os bancos afigura-se um tanto excessivo, embora as experiências já conhecidas não sejam muito animadoras, isso é verdade.
    Volte sempre, cordiais cumprimentos.

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