A vida é misteriosa, não por ter aparecido neste canto perdido de um universo sem sentido, mas pelos sentimentos que transporta. Corre, salta, sonha, ama, grita, canta, ri, chora, encanta, desespera, mata, fere, cura, salva, mas consegue mostrar algo que não sabe explicar, o porquê da saudade que alucina qualquer um.
Conheço-o há muito. De manhã e à tarde seguia a “dona”. Digo dona entre aspas, porque no caso de gatos é sempre problemático considerar que tenham dono. Admito que sim. Segui-a como se fosse um cão. Não entrava. Ficava à porta e depois regressava a casa, não dele, mas da “dona”. Nunca lá entrou. Comia à porta e depois ia à sua vida. Onde dormia? Não sei, e acho que a “dona” também não. Não importa, a dualidade estava instituída e a cumplicidade também. Assisti tantas vezes a este ritual a lembrar algo de militar, o abrir a janela de manhã e o encerrar ao fim da tarde, tudo porque as plantas da sala exigiam alimentar-se da luz do dia. Nunca se queixaram, e nem tinham razão para tal, o ritual era escrupulosamente respeitado. O gato segui-a e sentava-se à porta. Depois retornavam a casa. Devia comer e cessava o turno.
A “dona” desapareceu, como acontece a todos. Nesse dia lembrei-me dele. O que vai ser do gato? A sua estranha e enigmática autonomia dá-lhes vantagens sobre os restantes animais ditos domésticos. Comida não lhe faltaria. Por estas bandas vejo que “abunda”.
Na semana passada, chovia que “Deus a dava”, vi um gato na ombreira da porta. Resguardava-se do mau tempo. Olhei. Pareceu-me conhecê-lo. Querem ver que o animal continua no seu ritual, mas agora sozinho? Hoje, fim de tarde, encontrei-o sentado junto da porta da “dona” à espera dela para ir fechar a janela. Semblante triste, descuidado como sempre, marcas de sujidade evidentes, deixou que me aproximasse. Não fugiu, Olhou-me e começou a andar em direção à porta numa passada indolente como se fosse dominado pela saudade de uma vida que não sabe onde paira e porque razão não aparece. Um sentimento estranho, talvez o mais estranho de todos, ter saudade de uma vida sem saber o que é a própria vida...
Conheço-o há muito. De manhã e à tarde seguia a “dona”. Digo dona entre aspas, porque no caso de gatos é sempre problemático considerar que tenham dono. Admito que sim. Segui-a como se fosse um cão. Não entrava. Ficava à porta e depois regressava a casa, não dele, mas da “dona”. Nunca lá entrou. Comia à porta e depois ia à sua vida. Onde dormia? Não sei, e acho que a “dona” também não. Não importa, a dualidade estava instituída e a cumplicidade também. Assisti tantas vezes a este ritual a lembrar algo de militar, o abrir a janela de manhã e o encerrar ao fim da tarde, tudo porque as plantas da sala exigiam alimentar-se da luz do dia. Nunca se queixaram, e nem tinham razão para tal, o ritual era escrupulosamente respeitado. O gato segui-a e sentava-se à porta. Depois retornavam a casa. Devia comer e cessava o turno.
A “dona” desapareceu, como acontece a todos. Nesse dia lembrei-me dele. O que vai ser do gato? A sua estranha e enigmática autonomia dá-lhes vantagens sobre os restantes animais ditos domésticos. Comida não lhe faltaria. Por estas bandas vejo que “abunda”.
Na semana passada, chovia que “Deus a dava”, vi um gato na ombreira da porta. Resguardava-se do mau tempo. Olhei. Pareceu-me conhecê-lo. Querem ver que o animal continua no seu ritual, mas agora sozinho? Hoje, fim de tarde, encontrei-o sentado junto da porta da “dona” à espera dela para ir fechar a janela. Semblante triste, descuidado como sempre, marcas de sujidade evidentes, deixou que me aproximasse. Não fugiu, Olhou-me e começou a andar em direção à porta numa passada indolente como se fosse dominado pela saudade de uma vida que não sabe onde paira e porque razão não aparece. Um sentimento estranho, talvez o mais estranho de todos, ter saudade de uma vida sem saber o que é a própria vida...
Uma bonita história, como só o meu amigo sabe contar, caro Professor!
ResponderEliminarCaro Professor, fico sempre emocionado.
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