quinta-feira, 18 de agosto de 2005

KORO

O interessante post da Suzana Toscano sobre Hikikomori que tive oportunidade de ler e uma bela reportagem emitida alguns dias antes na TV, sobre o mesmo assunto, despertou-me a atenção para as chamadas síndromas culturais.
Quase todos os povos apresentam um ou outro tipo de problemas que se encaixam perfeitamente num vasto grupo de doenças ou sindromas ligados à cultura. De um modo geral os povos orientais são mais propensos.
Além do Hikikomori, uma outra síndroma diz respeito à morte por excesso de trabalho designado por Karoshi. O primeiro caso foi descrito em 1969 num jovem de 29 anos trabalhador de um importante jornal. Nos finais dos anos oitenta, com o avolumar de casos em jovens quadros superiores das empresas que morriam subitamente, sem qualquer história prévia de doença, acabou por ser considerada como morte súbita ocupacional. Claro que tudo isto acontece no Japão e não é por acaso.
Outra síndroma curiosa tem a designação de Koro (“cabeça de tartaruga” em malaio e que é muito apropriada!). É um fenómeno de massas, qual verdadeira histeria, e que leva os atingidos a entrarem em pânico com medo de que o pénis encolha e desapareça dentro do corpo provocando a morte. Os chineses são mais atreitos e a explicação tem a ver com feitiçaria ou a crença de que determinados actos sexuais tais como relações com prostitutas ou masturbação possam perturbar o equilíbrio yin/yang. Consequência: redução do pénis e o seu desaparecimento no interior do corpo. Volta e não volta manifesta-se sob a forma epidémica.
Recordo-me de um jovem que, desde cedo, revelava ansiedade nas mais diversas situações. Um dia, já adulto, solicitou-me que o ajudasse porque o meato urinário estava a ficar cada vez mais largo. Estava com medo de que o pénis se rasgasse ao meio e, então, o que seria dele! Claro que o meato urinário era perfeitamente normal. Mas ele dizia que não. Chegou a afirmar: - Então o senhor doutor não está ver que está muito largo? Não vê! Olhe que está. Perguntei-lhe quando é que tudo isto começou. - Foi já há alguns meses. Tive relações com uma rapariga e ela deu-me uma bebida para me fazer feitiço. Desde então o buraquinho está a alargar-se cada vez mais. Estou com medo senhor doutor. Lá tentei controlá-lo o melhor possível e prescrevi uma medicação sintomática adequada ao caso.
Passados uns tempos, apareceu-me, desta vez, para eu lhe dar uma purga. – Uma purga? Para quê? Respondeu-me: - Para quê? Ora essa! Para deitar fora o mal que me fizeram. Então o senhor doutor não se recorda de eu lhe ter dito que uma rapariga deu-me uma mistela para fazer mal? Lá tentei explicar que isso não era provável. – Não é? Ai isso é que é! Pois olhe eu fui a uma das tais mulheres, compreende senhor doutor? – A uma bruxa? – Sim… e ela disse que tinham-me dado uma mistela e só posso livrar-me desse mal com uma purga. - Ah! – E, sabe senhor doutor, ela deu-me estas sementes para eu fazer um chá – e vai daí abre um lenço com umas coisas esquisitas brancas que não consegui identificar – só que eu não consigo beber isto. Fico com uns saibros de boca, que o senhor nem imagina. - Não imagino não! – Como eu não consigo tomar isto, o senhor doutor tem que dar qualquer coisa para me purgar! Foi tal a insistência e o desespero do homem que acabei por ter de lhe prescrever uns laxantes a fim de o purgar. Era novo e bastante forte, pelo que não lhe deverá ter feito muito mal.
Penso ter sido a primeira vez que fui utilizado como alternativa ao sistema nacional da bruxaria…

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