Hoje a lua estava vermelha, parecia que os incêndios que atormentam o nosso pobre país se tinham reflectido nela.
Já não conseguimos olhar a beleza das coisas sem pensar neste pesadelo que não tem fim, áreas e áreas ardidas, pelos vistos as supostamente protegidas ainda são mais vulneráveis que as outras...
Ouvi nos noticiários da rádio que "foi presa uma mulher que ateou pelo menos oito incêndios na zona de Leiria" e que já foram presas muitas dezenas de presumíveis incendiários. As notícias acrescentavam ainda o número de processos abertos pelo mesmo motivo - umas centenas - dando assim a ideia de que se estáa trabalhar bem e depressa para castigar os ditos incendiários.
Acontece que as notícias não falam do que se terá passado com as outras centenas anteriores, nem referem que presumíveis motivos terão tido os tais suspeitos, nem adiantam qualquer explicação para esta súbita paranóia nacional que cria incendiários por todo o lado sem que se consiga prevenir ou castigar o que conduz a isso.
Fica-se com a ideia de que é necessário ir dando a ilusão de que a culpa é de uns quantos criminosos que actuam em revoadas no tempo do calor, desviando-se assim as causas do desleixo, da irresponsabilidade e da falta de acção na prevenção dos incêndios... O mais certo é iniciar-se acesa polémica sobre alterações ao Código Penal, falarmos da falta de meios dos tribunais, das condições das prisões para encarcerar estes incendiários todos. Falarmos de tudo até que a próxima onda de calor nos mostre que continuamos a dormir à sombra da bananeira, se é que ainda vai haver sombras!
Revejo-me nas palavras da Suzana.
ResponderEliminarTambém eu julgo que se procuram iludir as realidades sem qualquer vantagem para o País. Começa, aliás, a ser uma característica marcante da nossa vida política. Quando as coisas adquirem contornos de alguma gravidade não se encaram com verdade porque se temem as imputações de responsabilidade e as habituais agressões mediáticas.
Quase sempre ocorrem um de dois, ou os dois seguintes fenómenos: ou as manobras de diversão destinadas a desviar a atenção do que é essencial; ou o lançamento da ideia de que paira por aí uma conspiração, mais ou menos organizada por criminosos a soldo não se sabe bem de quem, apostados em destruir o País, interesses obscuros interessados nas cinzas, e não um conjunto de loucos a quem a visão recorrente das chamas alimenta as suas tendências incendiárias.
Pelo meio aparecem as inqualificáveis afirmações dos governadores civis que do alto da sua menoridade pretendem negar o que está à vista de todos, apagando mais depressa a esperança das vitimas do que os incêndios que continuam a lavrar.
Mas existe algo neste contexto que não é ilusão, é bem real: a diferença de tratamento que a comunicação social, as organizações e os cronistas do reino dispensam às atitudes e omissões políticas deste governo e de governos anteriores.
Este foi o ano em que mais recursos naturais desapareceram das áreas protegidas. Não só em extensão mas sobretudo em importância e raridade. Foram atingidas reservas biogenéticas assim declaradas pelo Conselho da Europa. Foram consumidos habitats prioritários cuja protecção já fez parar barragens, estradas, empreendimentos de valia económica indiscutível mas achados por alguns incompatíveis com esse valor mais relevante que é a conservação da natureza e da biodiversidade. Diminuiram, seguramente, os stocks de espécies cuja capacidade de regeneraçã o se não conhece ainda.
Ontem, o Senhor Secretário de Estado do Ambiente, que tutela as áreas protegidas, veio dizer que a situação não era grave para a conservação da natureza. A QUERCUS, essa ONG depositária da sapiência universal, limitou-se a considerar "infelizes" tais declarações. A Liga para a Protecção da Natureza, sempre tão ciosa do seu vanguardismo conservacionista, veio candidamente declarar que não é bem como o Senhor Secretário de Estado diz.
Em 2002, a responsabilidade política pelas áreas protegidas cabia ao Secretário de Estado do Ordenamento do Território. Logo em Maio foi montada uma operação - imperfeita embora - de mobilização do Exército para a prevenção e vigilância de parques e reservas naturais. Todavia, em Agosto, começou a arder uma área de mato na Serra Amarela, zona não prioritária. Debelou-se o fogo rapidamente e sem grandes estragos muito devido ao esforço do dirigente de então do Parque Nacional da Peneda-Geres e da sua cadeia hierárquica. Um pouco de mato ardeu também na Serra da Estrela. Recordo-me bem do que foi então dito e escrito pela comunicação social sobre o governo e sobre o secretário de estado, prenunciando catástrofes de dimensões dantescas. que felizmente não vieram a acontecer. Mas ao invés do que acontece agora, nessa altura o governante não deixou de encarecer a importância negativa para a conservação da natureza daquelas ocorrências. E garanto que não dormiu tranquilo nalgumas noites desse verão também quente.
Meu caro JMFA, este comentário merecia estar em lugar de post. Aliás, merecia estar num qualquer jornal da nossa praça onde se escreve sobre (ou para) os secretários de estado e ministros (e onde os mesmos escrevem, ao que parece). Também ouvi as declarações do SE do ambiente e fiquei boquiaberta. E se as organizações de defesa do ambiente assim reagiram ainda mais fico. Reafirmo, com alguns dados quantitativos mais precisos sobre os efeitos dos incêndios nas áreas protegidas que certamente o JM tem, este comentário devia estar num jornal para que pelo menos alguém rebatesse as palavras do Sr. SE. Mas eu nada sei de política, nem de jornalismo, nem... Fica só uma sensibilidade sobre.
ResponderEliminarO que é perceber de política ou de jornalismo, Sandra?
ResponderEliminarSe estas manobras de desresponsabilização encontram explicação na política, então eu também não percebo nadinha.
Não estranho como as ONG nem sequer disfarçam as simpatias partidárias. Estranho e que se considere heresia denunciar isso mesmo.
Do jornalismo que se pratica em Portugal só sei o que aprendi por experiência própria. Que não é neutral. Que não existe verdadeiro respeito pelo direito de ser informado, porque o correlativo dever de informar se rende à máxima do "quanto pior melhor", porque só o pior vende jornais e atrai a benfazeja publicidade para que a imagem se venda também. Donde resulta que a VERDADE para nada interessa.
Sei também que a sua parcialidade condenará essa prática, mais tarde ou mais cedo, por razões de profilaxia social.
Já agora, por homenagem à verdade, uma correcção.
Tenho aqui escrito que não entendia como o governo não tinha ainda mobilizado as forças armadas para a prevenção e vigilância das florestas. O EXPRESSO de hoje divulga que estão no terreno não sei quantos pelotões do exército português que foram já responsáveis não só por inúmeras detecções de ignições, como procederam a primeiras intervenções de combate.
Ainda bem.
Faço votos para que em breve o mesmo se possa dizer da força aérea.
Há uma coisa que me alegra no meio disto tudo...
ResponderEliminarSaber que apesar da nossa insistência incompreensível de destruir o nosso habitat a troco de dinheiro, ou satisfação pessoal, amanhã voltará a chover, as plantas vão voltar a brotar do chão, os animais (ditos irracionais) e os insectos vão voltar a tomar o lugar que é seu por direito e que nós (ditos racionais) teimamos em destruir, e a Natureza seguirá inexoravelmente o seu caminho, por mais que nós nos empenhemos em impedi-la...
Como me dizia alguém um dia:
"O Homem é o único animal que conheço que mata por prazer, e não por qualquer necessidade de sobrevivência"
PS-> OS ÚNICOS MEIOS AÉREOS DE COMBATE AOS FOGOS NÃO DEVIAM PERTENCER A PRIVADOS, MAS SIM À FAP, À PROTECÇÃO CIVIL E AOS BOMBEIROS...E NÃO ME DIGAM QUE É UMA QUESTÃO DE ORÇAMENTO, POIS ASSIM GASTA-SE MUITO MAIS DINHEIRO.
NOS ÚLTIMOS DOIS ANOS JÁ SE FORAM EM FUMO MAIS DE UM QUARTO DE MILHÃO DE HECTARES...E OS GOVERNOS O QUE DIZEM???...DEIXA ARDER...