terça-feira, 19 de setembro de 2006

"Taxas estimuladoras”...

As medidas destinadas a diminuir as despesas com a saúde tornaram-se no prato diário. Raro é o dia em que não são proclamadas iniciativas. Por um lado compreende-se, já que os gastos com as despesas nas áreas das doenças atingem níveis incomportáveis, e as perspectivas futuras não apontam para qualquer melhoria, bem pelo contrário. O pior, no meio disto tudo, é a ausência, quase total, das chamadas medidas de prevenção.
As pessoas envelhecem e, consequentemente, correm mais riscos. A par deste fenómeno, o facto de não terem adoptado os melhores estilos de vida e comportamentos agrava e desencadeia muitas situações que, de outro modo, poderiam ter sido evitadas. Sendo assim, é pertinente colocar a seguinte questão: por que razão não adoptaram os ditos estilos de vida saudáveis? A resposta mais adequada está ao alcance de qualquer um: porque, na grande maioria dos casos, não foram educados nesse sentido e não têm cultura.
Realmente, as principais causas de doença e, também, de morte prematura têm a ver com o nível cultural.
Portugal, nesta área não se pauta por grande coisa. Temos o nível mais elevado de analfabetismo, de iliteracia, de abandono escolar prematuro, as mais baixas taxas de licenciados, enfim, um panorama que nos persegue há alguns séculos e que, ainda, não conseguimos resolver. Ao contrário de outros países, que invejamos, não fomos capazes de aproveitar a época do iluminismo para dinamizar tão importante sector da vida humana.
Se analisarmos o que acontece, entre nós, a propósito do nível escolar e saúde, verificamos aspectos muito curiosos. Por exemplo, a prevalência da diabetes, da hipertensão arterial, do colesterol elevado, dos enfartes, das "tromboses", da morte por doenças cardiovasculares, só para citar algumas situações que, pela sua natureza, constituem fontes de gastos astronómicos para qualquer serviço nacional de saúde, revela uma relação inversa com o nível escolar. Por ordem decrescente, os analfabetos são os mais atingidos, seguidos dos que têm o nível básico e o nível secundário. Os que frequentaram ou possuem o nível superior são os que correm menos riscos. As relações são tão gritantes que poderíamos afirmar: para travar e inverter as situações patológicas mais prevalentes em Portugal há necessidade de melhorar a qualidade de ensino das nossas crianças e jovens propiciando-lhes uma excelente formação cultural e académica. Ora, como é do conhecimento geral, estamos a anos-luz do objectivo já enunciado. Também não podemos esquecer que a "produção" de um adulto culto demora 20 a 25 anos. Sendo assim, e partindo do princípio de que seríamos capazes de um "milagre" educacional, seria necessário uma geração de esforço e muito investimento, o que não se compagina com as nossas tradições. Trabalhar tanto e esperar uma eternidade?
Aqui está a melhor solução para resolver os nossos problemas de saúde e, naturalmente, reduzir os correspondentes gastos.
É através dos ministérios da educação, da ciência e da cultura que poderemos resolver muitos dos males que afligem o corpo e a alma de grande parte dos nossos concidadãos. E, em jeito de "efeitos secundários" de tais medidas, ainda poderíamos alcançar o almejado desenvolvimento económico que tarda a manifestar-se.
Tudo isto sem taxas moderadoras, mas com "taxas estimuladoras”...

2 comentários:

  1. Caro Professor
    A questão é cultural mais do que de ensino e de vida saudável.
    Nos últimos cinquenta anos andámos muito em termos de saúde e o trabalho realizado nos últimos trinta é louvável.
    O problema é que a maioria dos portugueses (não me incluo nesse número) não pode ir ao médico sem "trazer" um remédio e acha que qualquer achaque deve ser objecto de uma consulta pessoal; vá lá dizer que pode ser "observado" pelo telefone pelo seu médico assistente que lhe dá uma "coisa".
    Agora, não lembra, nem mesmo em países mais "cúpidos", impor taxas para cirugias, ou será que o Sr Ministro quer conseguir o que nenhum dos seus colegas conseguiu: impor políticas de consulta e diagnóstico?
    Cumprimentos
    Adriano Volframista

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  2. A Irlanda começou precisamente por aí. Não desatou a construir estádios, TGV's ou aeroportos. E nem precisaram de esperar muito tempo para terem resultados. Quando entramos na então CEE, em '86, o nível de riqueza era comparável. Durante boa parte do período cavaquista, tivemos taxas de crescimento comparáveis. No entanto, eles continuaram a crescer a um ritmo acelerado, enquanto nós paramos. A Irlanda é, já, um dos países mais ricos da Europa, enquanto nós ficamos no último lugar da UE 15 e a ver os países do Leste a ultrapassarem-nos com facilidade (já lá vão 2...).

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